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sexta-feira, 13 de agosto de 2021

Análise: Cañari #1 – As Lágrimas d’Ouro



Cañari #1 – As Lágrimas d’Ouro, de Didier Crisse e Carlos Meglia

Este é mais um dos livros publicados pela extinta editora Vitamina BD e que se podem encontrar por aí – em mercados de livros, feiras do livro de rua, ou nos sites PromoBooks ou MBooks – a preços a rondarem os 5,00€.

Mas, infelizmente, há um duplo sentido de oportunidade perdida nesta série Cañari, que até aparentava ter algumas ideias interessantes. Em primeiro lugar, e isto é algo que aconteceu em várias séries em que a Vitamina BD pegou, com a extinção da editora, os leitores ficaram "agarrados" com o primeiro volume da série, não tendo sido publicado o álbum seguinte. Em segundo lugar, com o falecimento do autor Carlos Meglia em 2008, a coleção original manteve-se incompleta pois só foram publicados dois álbuns. Desta vez, os leitores portugueses ficaram apenas com um dos dois livros publicados em português, mas convenhamos que, mesmo que o segundo livro tivesse sido publicado por cá, a história ficaria incompleta à mesma.


Portanto, admito que pode não ser muito aliciante a leitura deste livro sabendo, de antemão, que ficaremos a meio da história. Ainda assim, não resisti ao preço, à capa fantástica desta obra e à arte do autor Carlos Meglia, onde a expressividade das suas personagens, ao estilo da escola Disney, me convenceu.

Esta é uma história de aventura fantástica que nos remete para o México ancestral - onde a cultura maya marca presença - do tempo que antecedeu as invasões dos conquistadores europeus e, ao mesmo tempo, nos transporta, em simultâneo para o século XXI. Por outras palavras, é uma história que se desenrola em dois tempos distintos.

E até começa no tempo presente quando Wayne, um jovem surfista de Los Angeles que se faz acompanhar pelos seus amigos, viaja para a praia de Tulum, no México, após ter recebido um postal deste local de alguém que nem sequer o assinou. Intrigado, Wayne passou então a visitar várias vezes este local e está de volta a este sítio especial. E mesmo não havendo ondas para surfar, acredita que um dia haverá uma grande onda que ele não quer deixar de aproveitar, em cima da sua prancha de surf. 


E depois a ação transporta-nos para um tempo longínquo(?) do México em que conhecemos a protagonista desta história, de seu nome Cañari. Esta bela jovem tem 3 irmãos mais novos e é tarefa dela tomar conta deles. Mas quando o irmão mais pequeno, Kaotil, desaparece, o seu pai fica fulo e obriga-a a encontrá-lo antes do Dia de IX, o dia em que os homens encontram os seus deuses. E é a partir daí que Cañari, acompanhada pelos outros dois irmãos, parte para a selva em busca do seu irmão perdido.

A partir daí sucedem-se vários eventos, que nos fazem colocar mais questões sobre a trama, enquanto se vão juntando a Cañari alguns personagens curiosos. 

O problema da história é que me parece não saber muito bem para onde quer ir. É legítimo que tenhamos em conta que o autor Crisse estaria neste primeiro tomo a apresentar personagens e a trama sem nos dar muitos desenvolvimentos que viriam, certamente, nos volumes seguintes. Mesmo assim, não achei que a narrativa que nos é oferecida prendesse o leitor de forma suficiente. As bases são lançadas mas parcamente aproveitadas por Crisse para nos envolver no argumento por si criado. O tom é claramente juvenil e, olhando por esse prisma, talvez se compreenda que o autor não tenha aprofundado muito certas questões que poderiam tornar a leitura mais aliciante.


A arte de Meglia neste Cañari tem coisas muito interessantes e outras que, quanto a mim, não funcionam tão bem. O seu estilo é em muito inspirado nas personagens da Disney com a personagem de Cañari a fazer-me lembrar uma mistura feliz entre as personagens de Pocahontas e de Rapunzel, por exemplo. Para mim, que tanto gosto da estética e da “escola-disney” isto são boas notícias. Além de que a expressividade das personagens – podendo até ser exagerada para muitos leitores, calculo – é uma das mais valias na arte de Meglia. Torna-se quase impossível não criarmos facilmente um laço com estas bonitas e bem desenhadas personagens. 

Mas depois, em termos de cenários, o trabalho do autor já me deixou com alguns sentimentos mistos. Tendo uma abordagem mais em estilo de aguarela, parece-me que não encaixa tão bem assim nas personagens que são, todas elas, muito estilizadas e de estilo mais moderno. Ou seja, parece que se juntam dois estilos de ilustração que não encaixam tão bem assim um no outro. Por um lado, temos o estilo das personagens, que é mais computorizado e moderno e, por outro lado, temos, depois, o estilo utilizado nos cenários onde as cores são mais arrastadas, criando muitas vezes a ilusão de imagem desfocada. Não fiquei muito convencido.


Em termos de cores, é um álbum bonito, com uma paleta luxuriante que consegue encher o olho. Mesmo assim, pareceu-me que talvez o autor tenha abusado em demasia da componente digital, tornando a cor em algo “sintético” demais para os meus gostos. Destaque ainda para o facto da linha do autor não ser em tom preto, como é mais normal, mas sim em tom acastanhado. Numas vezes funciona bem mas noutros casos, especialmente quando os fundos ou luzes são amarelos, laranjas, vermelhos ou castanhos, não funciona tão bem e torna-se algo artificial.

Quanto à edição da Vitamina BD, é em formato franco-belga, com capa dura, papel de boa qualidade e boa qualidade de impressão. A qualidade da edição é boa porque já é um livro com muitos anos a circular de feira em feira - imagino! - e, ainda assim, mantém-se em "boa forma física".

Em suma, uma arte bastante interessante, pródiga em oferecer-nos personagens expressivos, com quem nos identificamos, e a temática do México e dos Mayas não chega para considerar este livro espetacular. Ainda assim, é uma leitura interessante, com bons momentos. Pena é que tenha sido mais uma série que não foi finalizada. Oh, esses tempos da edição de bd em Portugal aos quais nenhum de nós quer voltar! Antes poucas séries terminadas do que muitas séries começadas e deixadas a meio. Digo eu!


NOTA FINAL (1/10):
7.0


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Ficha técnica
Cañari #1 – As Lágrimas d’Ouro
Autores: Didier Crisse e Carlos Meglia
Editora: Vitamina BD
Páginas: 48, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Dezembro de 2006

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