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quarta-feira, 16 de abril de 2025

Análise: O Homem Que Queria Ser Howard Carter

O Homem Que Queria Ser Howard Carter, de Rui Sousa - Edição de Autor

O Homem Que Queria Ser Howard Carter, de Rui Sousa - Edição de Autor
O Homem Que Queria Ser Howard Carter, de Rui Sousa

Não é todos os dias que vemos bandas desenhadas a serem lançadas de modo independente, especialmente quando são trabalhos de grande fôlego e editados com um aspeto profissional. Mas foi isso que aconteceu quando, bem recentemente, este O Homem Que Queria Ser Howard Carter, do autor Rui Sousa, foi editado.

Começo até por dizer a todos os que, depois desta minha análise, tiverem interesse em adquirir este interessante livro, que o devem fazer contactando diretamente o autor através do seguinte email: ruis70@gmail.com

Rui Sousa não é propriamente inexperiente em banda desenhada, tendo lançado, no ano 2000, e ainda pela extinta editora Meribérica, o livro Pêro da Covilhã – Viagens.

O Homem Que Queria Ser Howard Carter, de Rui Sousa - Edição de Autor
O Homem que Queria Ser Howard Carter – Diário do Egito
é uma obra muito pessoal, que é fruto do amor do autor pelo Egito e que nos conduz não apenas numa viagem física ao Egito contemporâneo, mas sobretudo numa expedição introspectiva ao âmago do próprio Rui Sousa. O autor português, movido por uma paixão antiga pelas terras dos faraós, parte em busca das areias e da luz do Egito, mas rapidamente o leitor se apercebe de que essa jornada se transforma num percurso interior carregado de simbolismo, memória e reflexão.

Desde os primeiros momentos do livro, fica claro que esta não é, pois, uma narrativa de viagem tradicional. As fronteiras entre o sonho e a realidade diluem-se, criando uma atmosfera onírica onde a paisagem egípcia se funde com os estados emocionais do protagonista Horácio. O deserto, os templos, o Nilo... tudo se transforma em metáforas visuais e narrativas de um mergulho pessoal, onde até há espaço para que figuras históricas e/ou mitológicas do Egito, como Anúbis, o rei Farouk, o sultão Saladino ou o escritor Naguib Mahfouz, aqui apareçam para dialogar com o protagonista, ao longo da sua estadia. 

O Homem Que Queria Ser Howard Carter, de Rui Sousa - Edição de Autor
A escrita de Rui Sousa é um dos trunfos do livro. Trata-se de um texto maduro, poeticamente trabalhado, com frases que têm o dom de se entranhar na memória do leitor — verdadeiramente "quotable", portanto. 

Mesmo assim, e apesar das qualidades do texto introspetivo, é justo apontar um aspeto que poderia ter sido mais bem desenvolvido: o fio condutor da narrativa. Por vezes, a sucessão de episódios e reflexões parece excessivamente solta, o que pode dificultar a orientação do leitor ao longo da viagem. Uma estrutura mais clara teria beneficiado a compreensão global do percurso narrativo e temático.

Quanto às ilustrações da obra, devo dizer que me deixaram bastante agradado. Com um traço rápido e grosso, quase gestual, e com um estilo moderno na execução, as imagens captam a energia e o calor do Egito com impressionante vivacidade. A paleta de cores escolhida é rica e luminosa, com tons quentes que evocam o sol egípcio. É uma componente visual leve que acaba por criar facilmente empatia, não servindo apenas de apoio, mas dialogando ativamente com o texto.

O Homem Que Queria Ser Howard Carter, de Rui Sousa - Edição de Autor
Não obstante, e avaliando o livro do ponto de vista de objeto de arte sequencial, devo dizer que a muito constante escolha de apenas duas vinhetas por página, embora executada com competência e domínio, limita um pouco o dinamismo visual da obra, causando uma certa monotonia gráfica. Creio que uma maior diversidade na composição dos tamanhos e formas das vinhetas teria trazido um ritmo mais envolvente, favorecendo a leitura e a imersão no universo criado.

Ainda assim, não se pode negar que Rui Sousa se mostra à vontade com essa estrutura de grandes vinhetas, sabendo aproveitar o espaço de forma expressiva e explorando silêncios e atmosferas com grande eficácia. 

Outro aspeto digno de grande destaque é a qualidade da edição, que surpreende positivamente por se tratar de um projeto independente. O livro apresenta-se em capa dura baça, com um miolo impresso em papel brilhante de excelente qualidade, e uma encadernação sólida e cuidada. 

Em suma, O Homem que Queria Ser Howard Carter – Diário do Egito é uma obra singular e profundamente pessoal, que conjuga o fascínio pelo Egito antigo com uma exploração honesta e poética da identidade. Rui Sousa oferece-nos uma viagem rara, em que a paisagem e o mito se entrelaçam com as inquietações humanas mais intemporais. Tudo isto servido numa edição de autor muito competente. 


NOTA FINAL (1/10):
7.2


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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O Homem Que Queria Ser Howard Carter, de Rui Sousa - Edição de Autor

Ficha técnica
O Homem Que Queria Ser Howard Carter
Autor: Rui Sousa
Edição de Autor
Páginas: 72, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 25 x 17 cm
Lançamento: Março de 2025

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