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segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Análise: A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen

A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen, de Anne-Caroline Pandolfo e Terkel Risbjerg

A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen, de Anne-Caroline Pandolfo e Terkel Risbjerg
A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen, de Anne-Caroline Pandolfo e Terkel Risbjerg 

A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen é uma novela gráfica assinada por Anne-Caroline Pandolfo e Terkel Risbjerg, e funciona como uma biografia da célebre autora dinamarquesa Karen Blixen, mundialmente famosa por ser autora, sob o pseudónimo de Isak Dinesen, da obra África Minha, que foi um romance icónico da literatura contemporânea e que recebeu uma marcante adaptação cinematográfica do realizador Sydney Pollack, que contou com as atuações memoráveis de Meryl Streep e Robert Redford. 

Os autores desta obra, publicada pela G. Floy Studio, já haviam nos dado O Astrágalo – igualmente editado pela mesma editora portuguesa. Mas se O Astrágalo é uma obra interessante, este A Leoa é uma obra maravilhosa e inesquecível! Quer em termos de agilidade narrativa, por parte de Pandolfo, quer em termos de ilustração, onde Risbjerg assume-se como um artista singular. 

A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen, de Anne-Caroline Pandolfo e Terkel Risbjerg
Em primeiro lugar, interessa dizer que a forma que a autora utiliza para contar esta história, a fazer lembrar o registo da fábula, funciona de forma exímia. Quase como se a história de vida de Karen Blixen, à semelhança de uma peça de teatro, fosse dividida por actos e em que houvesse a figura de um narrador, sem corpo presente, que nos conta a história com um carisma e fleuma que me remeteu para o início inolvidável de Dom Quixote de La Mancha, de Miguel de Cervantes. 

A história começa logo na infância de Karen Blixen. Tal como as suas irmãs, Karen recebe uma educação clássica e rígida, onde é esperado que as mulheres desempenhem uma função secundária na sociedade e onde sejam um exemplo moral. Portanto, qualquer iniciativa pessoal que não seja o de ser uma "mulher perfeita", está fora do alcance das mulheres deste tempo e desta classe social. E talvez por ser uma fuga a este aprisionamento criativo, é o pai de Karen a sua grande influência, pela sua forma livre de encarar a vida. Já na idade adulta, Karen casa-se com o barão Bror von Blixen-Finecke e vai viver com ele para o Quénia, onde iniciam uma plantação de café. Sendo detentora de um espírito livre, Karen Blixen sente-se apaixonada por África, pelas suas gentes e pela sua vida animal e vegetal, tão constrastantes com a vida que deixou na Dinamarca. África é tudo aquilo que ela ambicionava, em oposição a uma vida aprisionada na sociedade Dinamarquesa. Entretanto, o seu casamento não dura muito tempo. Mais tarde, Karen conhece Denys Finch Hatton, um piloto do exército, por quem se apaixona perdidamente. Mas este novo romance também termina abruptamente devido à morte de Hatton num acidente de avião. O fracasso na sua plantação também obriga Karen a regressar à Dinamarca, onde inicia a sua carreia de escritora. Daqui em diante, este A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen acompanha assim o seu trajeto de escritora, desde o momento em que nenhuma editora do seu país natal quer publicar a sua obra, até ao sucesso que começa por ter nos Estados Unidos e consequente consagração enquanto autora. É uma história de vida apaixonante e que solidifica a presença e influência de Karen Blixen ainda nos dias de hoje. A sua história acaba por ser um exemplo não só para todas as mulheres do mundo como, igualmente, para os homens. 

A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen, de Anne-Caroline Pandolfo e Terkel Risbjerg
Anne-Caroline Pandolfo, responsável pelo argumento de A Leoa, conduz a história de uma maneira que muito me agradou, apresentando-a de forma original e dinâmica. E se a vida de Karen Blixen já dava um bom livro por si só, a utilização de algumas influências na vida da protagonista, através de personagens que parecem fabricadas pela sua mente, é um golpe de mestre audaz, que é utilizado com grande inteligência, não tornando a história em algo absurdo mas sim, demonstrando que certas inflências que temos, ajudam-nos, pelo seu exemplo, a enfrentar as dificuldades com que nos deparamos ao longo da nossa caminhada. É por isso que personagens como Nietzsche, o Leão, Xerazade, o Diabo, Shakespeare, o Rei Africano e a Cegonha representam o papel de “fadas” que surgem como consciência de Karen Blixen ao longo da sua vida. Esta utilização que, admito, é arriscada, transformando um texto biográfico em algo do foro mais metafísico ou onírico, funciona aqui muito bem. E digo isto, admitindo que, por muitas vezes, não sou grande apreciador destes vertentes mais do universo "fantástico", que são utilizadas em histórias mais reais. É preciso saber fazê-lo – e com a medida certa – para que não estrague a história. Neste caso não só não estraga, como ainda torna esta obra melhor! 

A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen, de Anne-Caroline Pandolfo e Terkel Risbjerg
Mas não é só Pandolfo que brilha na condução narrativa desta obra. Porque, em relação à arte visual, Risbjerg faz um papel que muito me surpreendeu pela positiva. Li e analisei recentemente O Astrágalo e o trabalho do autor nessa obra, no campo da ilustração, apresentou algumas coisas interessantes, como, por exemplo, a utilização dum forte contraste entre pretos e brancos, mas, a meu ver, não conseguiu alcançar a consistência desejável ao longo da obra. Em A Leoa, o autor força-me a mudar de opinião quanto à sua capacidade de ilustração. É que esta é uma obra bonita de se observar da primeira à última página. E mesmo sendo verdade que o traço do autor se mantém simplista, a verdade é que as ilustrações estão bem mais belas e agradáveis de observar, do que em O Astrágalo. Talvez isso se deva ao uso de bonitas cores suaves em aguarela, fazendo deste livro uma obra sobejamente carregada de ilustrações lindíssimas. Este é um daqueles casos em que o autor, quando utiliza as cores, transforma a sua arte em algo muito melhor e mais profundo do que quando trabalha apenas a preto e branco. Risbjerg aparenta igualmente estar à vontade em diversos tipos de ambientes mas são as suas ilustrações de momentos de reflexão onde a sua arte, que lembra a pintura expressionista, nos faz viajar para esses lugares longínquos, para os quais Klixen também queria viajar, de forma a escapar à sua existência mais mundana. Um trabalho magistral e digno de uma sensibilidade que é raro encontrar em banda desenhada. 

A juntar a isto tudo, a G. Floy oferece-nos uma fantástica edição da obra. Uma capa dura bem espessa, com um papel baço de excelente gramagem, que potencia a arte visual do autor, e uma boa encadernação, com o livro a ser detentor de um bom design e de uma capa bem conseguida. 

Resumindo, aqui tudo parece jogar em perfeita sintonia: a personagem, isto é, a pessoa que foi Karen Blixen é já por si só, uma figura carismática. Uma personagem cheia de significado e com clara apetência para inspirar a vida dos comuns mortais. A maneira como Anne-Caroline decidiu contar a história foi acertada e funciona de maneira perfeita. Tem o rigor necessário, sem ser demasiado rigorosa e ainda sabe usar, de forma muito inspirada, os recursos narrativos tão bem. A arte ilustrativa de Risbjerg, mesmo sendo certo que é naïf no seu traço, apresenta aguarelas de forma vibrante e suave. E a edição da G. Floy é uma maravilha para os olhos e para o tacto. Que podemos pedir mais? Este é um dos melhores livros que a G. Floy já editou. 
Recomenda-se, sem dúvida! 


NOTA FINAL (1/10): 
9.2 


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020 



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A Leoa – Um Retrato Gráfico de Karen Blixen, de Anne-Caroline Pandolfo e Terkel Risbjerg
Ficha técnica
 
A Leoa: Um Retrato Gráfico de Karen Blixen 
Autores: Anne-Caroline Pandolfo e Terkel Risbjerg 
Editora: G. Floy 
Páginas: 192, a cores 
Encadernação: capa dura 
Lançamento: Maio de 2017

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