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segunda-feira, 20 de junho de 2022

Análise: Sara

Sara, de Garth Ennis e Steve Epting - G. Floy Studio Portugal

Sara, de Garth Ennis e Steve Epting - G. Floy Studio Portugal
Sara, de Garth Ennis e Steve Epting

Devo começar por dizer que estava muito curioso em ler este Sara, da autoria de Garth Ennis e Steve Epting, originalmente lançado pela TKO Studios, a partir de 2018, e que a editora G. Floy Studio publicou por cá, num só volume, há umas semanas.

Os autores têm já provas dadas: Garth Ennis é o argumentista de obras como Preacher, The Boys ou O Justiceiro, enquanto que Steve Epting é o ilustrador de Capitão América e The Velvet, a minissérie em 3 volumes que a G. Floy também já publicou por cá e que muito me convenceu.

Sara é um livro que, como reúne todos os números lançados, funciona como se fosse um one shot, já que nos oferece uma história completa e auto-conclusiva, que decorre na zona de ocupação nazi da Rússia, em plena Segunda Guerra Mundial, no ano 1942.

Sara, de Garth Ennis e Steve Epting - G. Floy Studio Portugal
Começo por dizer que gostei de duas premissas algo novas que este Sara nos tenta oferecer. Em primeiro lugar, não é tão usual assim – embora haja algumas exceções – que o foco de uma obra sobre a Segunda Guerra Mundial se ancore na posição russa. É muito mais frequente que a grande maioria das obras sobre este conflito militar nos mostrem o lado americano, inglês, francês, italiano ou mesmo alemão. Os russos acabam quase sempre por serem um pouco esquecidos das obras que retratam esta guerra. Portanto, é refrescante que Sara nos mostre o lado russo.

E, em segundo lugar, a outra coisa "diferente" que esta obra nos tenta dar, assenta logo no mais óbvio, assim que olhamos para a bela capa do livro: é que, embora sejam muitos os livros, os filmes e até as bandas desenhadas que retratam a Segunda Guerra Mundial, não é, de todo, comum que sejam as mulheres militares a protagonizar a história. E isso é exatamente o que acontece nesta obra. Os soldados masculinos também aparecem, naturalmente, especialmente no outro lado da barricada, mas são as militares femininas, em particular, as atiradoras furtivas, o verdadeiro ponto de interesse aqui. E, claro está, é Sara, uma dessas atiradores-furtivas em quem a história é centrada. 

Sara, de Garth Ennis e Steve Epting - G. Floy Studio Portugal
Como eu era totalmente ignorante face a este tema, fiz alguma pesquisa e fiquei a saber que, realmente, as mulheres russas desempenharam um papel crucial na Segunda Guerra Mundial, defendendo a bandeira da Rússia, e ocupando posições do exército tão diversificadas como a unidade de pilotagem de aviões, a unidade de tripulantes de tanques, a unidade de atiradores-furtivos, a unidade de artilharia pesada ou diversas funções nas unidades médicas. Quando a Alemanha atacou a União Soviética, em 1941, milhares de mulheres que se voluntariaram para o exército russo, acabaram por ser rejeitadas. Mas, com a escalada da guerra, essa atitude foi alterada e as mulheres passaram a ser admitidas no exército.

A história deste Sara coloca-nos exatamente nesse segundo inverno do cerco de Leningrado, em que Sara e as suas seis companheiras da unidade de atiradoras-furtivas se encontram numa imparável luta contra o invasor alemão. Sara é uma verdadeira ás do gatilho, sendo a atiradora mais mortífera e também aquela que, aparentemente mais demónios interiores carrega consigo. No entanto, quando se está em plena guerra violenta, esses demónios interiores têm que ser prontamente colocados para trás das costas, para melhor combater o inimigo. É lutar pela vida, basicamente.

Sara, de Garth Ennis e Steve Epting - G. Floy Studio Portugal
Este é um livro que nos oferece muitas cenas de ação, que são entrecortadas com algumas cenas do quotidiano das sete mulheres desta unidade e com outras cenas que levantam um pouco o véu, em relação ao passado de Sara. Se em termos de intenção de tornar a história mais densa, esta ideia aparece bem pensada, considero, no entanto, que estes diálogos e estas cenas do passado de Sara, mais não são do que umas ténues e superficiais pinceladas narrativas que Garth Ennis tenta oferecer à trama. Mas, sinceramente, não achei que estes diálogos e estas cenas do passado levassem a grande lado. Parecem quase “fillers” do ponto de vista narrativo, que estão lá só por estar. O que mais gostei até acabou por ser a boa quantidade de monólogo interior que a personagem da Sara vai fazendo ao longo do livro, quando está escondida entre as árvores, à espera que os soldados alemães surjam no horizonte para os despachar com os seus tiros certeiros de sniper virtuosa.

Portanto, é com alguma pena que, finda a leitura de Sara, a pergunta que persistiu na minha mente tenha sido: “e então?”. Como se faltasse algo nas conclusões a retirar.

Já quanto às ilustrações de Epting, fiquei muito bem impressionado. O autor é dono de um traço realista, muito bem conseguido, que desenha com muito talento e inspiração toda e qualquer cena. As caras das mulheres são muito belas, as suas expressões e linguagem corporal são bem executadas. A inteligente e adequada utilização de planos cinematográficos faz com que certos momentos fiquem retidos na retina. Pareceu-me que o trabalho de Steve Epting ainda conseguiu ser mais impressionante na já mencionada bela série Velvet, com argumento de Ed Brubaker, mas, ainda assim, estamos a falar de ilustrações que contribuem para uma ótima experiência visual neste Sara. E que bela capa que este livro tem, relembro! 

Sara, de Garth Ennis e Steve Epting - G. Floy Studio Portugal
Como nota menos positiva nas ilustrações, houve algumas cenas de ação que não considerei muito percetíveis, no sentido de ficarmos sem dúvidas em relação ao que está a acontecer no campo de batalha. Mas, não será um grande problema, diria. É apenas uma coisa que, quanto a mim, o autor não fez tão bem como fez todo o resto. De referir, ainda, que apreciei bastante as cores que são feitas por Elizabeth Breitweiser, célebre pelas cores que fez nas obras, também publicadas por cá pela G. Floy Studio, The Fade Out, de Ed Brubaker e Sean Phillips, e The Outcast, de Robert Kirkman e Paul Azaceta.

Em termos de edição, é um livro muito em linha com as demais publicações da G. Floy Studio: capa dura baça, bom papel brilhante e boa encadernação. Em termos de impressão, creio que pode ter havido um problema com a produção desta obra. É que, no último capítulo do livro, várias páginas apresentam as cores mais esbatidas do que os restantes capítulos. Ora, não consegui comparar com a edição original para tirar a limpo se é uma escolha de cor pelos autores ou se é um simples erro de impressão, mas diria que, quase de certeza, a edição original não será assim. E se o for, será algo incompreensível por parte dos autores. Também não sei, como é óbvio, se isto é um problema que apenas aconteceu com o meu livro e com um pequeno número de exemplares. Também é possível que seja esse o caso. Seja como for, não é algo gritantemente perturbador, mas é chato pois retira – pelo menos a mim – alguma fluidez e imersão à leitura.

Em suma, embora tenha ficado um pouco aquém das minhas expetativas – que eram altas, assumo – Sara é uma boa e madura aposta da G. Floy Studio, que nos traz uma abordagem algo diferente em relação aos livros mais habituais sobre a Segunda Guerra Mundial, e que é adornada por belos desenhos de Steve Epting.


NOTA FINAL (1/10):
7.8



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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Sara, de Garth Ennis e Steve Epting - G. Floy Studio Portugal

Ficha técnica
Sara
Autores: Garth Ennis e Steve Epting
Editora: G. Floy Studio
Páginas: 152, a cores
Encadernação: Capa dura
Dimensões: 18,0 cm x 27,5 m
Lançamento: Abril de 2022

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