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quarta-feira, 29 de junho de 2022

Análise: Mattéo - Quinta Época


Mattéo - Quinta Época, de Jean-Pierre Gibrat

Recentemente, a editora Ala dos Livros publicou o último livro – até à data – da série Mattéo, da autoria de Jean-Pierre Gibrat. Trata-se do quinto tomo, Quinta Época, que fecha o segundo ciclo da série. O primeiro ciclo é constituído pelos Tomos 1 e 2 (publicados em Portugal pela extinta Vitamina BD) e o segundo ciclo é constituído pelos tomos 3, 4 e 5 e tem sido publicado pela Ala dos Livros. Embora convenha dizer que é suposto a história ser uma só, já que conta a vida de Mattéo, que vai marcando presença em momentos e conflitos históricos relevantes como a Primeira Guerra Mundial, a Revolução Soviética e a Guerra Civil Espanhola, até chegar, inevitavelmente, até à Segunda Guerra Mundial. O autor prepara-se para editar, em França, no último trimestre deste ano, o sexto volume da série.

Neste Mattéo – Quinta Época, Gibrat continua a dar-nos a história e vivências da personagem Mattéo, naquele ritmo mais pausado, que foi introduzido na série a partir do terceiro tomo. Aliás, para aqueles que apenas conhecem os dois primeiros tomos da série, com uma ação agitada e com um enredo mais dinâmico e surpreendente, há que dizer (avisar?) que, a partir do terceiro tomo, a série mudou exponencialmente. Especialmente no ritmo de narração, mais lento, mas também no próprio enredo que se foi desenvolvendo. Como tal, e sabendo já disto, posso dizer que este Mattéo #5, sendo fiel a esse ritmo mais pausado, volta a trazer alguns pontos relevantes para a história no seu todo.

Com a Guerra Civil Espanhola como pano de fundo, Mattéo e os seus companheiros estão estacionados de forma algo estática, sem que muito aconteça, na aldeia de Alcetia, em Espanha. No entanto, depois de Amélie ter sido capturada pelos nacionalistas, Mattéo está disposto a tudo fazer para conseguir libertá-la.

Entretanto, Anechka parece não ter grande empatia com Amélie e acaba por fazer algumas coisas à sua maneira, pondo a missão de resgate preparada por Mattéo em sério risco. Em simultâneo, Mattéo está instalado em casa do maior latifundiário da região, um nacionalista radical, o que leva o autor Gibrat a bem explorar esta relação entre estes dois homens que será, por ventura, um dos pontos mais altos deste quinto tomo da série. É que, sendo aparentemente antagónicos, com o gradual desenvolvimento da relação entre ambos, verificamos que talvez eles tenham mais em comum do que aquilo que gostariam de admitir. Muito interessante este paradoxo que Gibrat aqui explora.

A história torna-se, portanto, mais impactante do que no tomo anterior. Gibrat soube guardar para este quinto volume um bom conjunto de acontecimentos e revelações que, certamente, não vão deixar os leitores indiferentes. O ritmo da narrativa é lento, como já disse. Mas essa característica acaba por permitir algo ao autor: é que, quando achamos que nada de especial vai acontecer, eis que surge algo, de um momento para o outro, que nos surpreende.

Diria que tenho apenas uma certa queixa em relação a uma vertente narrativa da obra. Por vezes, Gibrat passa de um momento para o outro, sem que nada assim o fizesse prever. Não estou bem a falar de plot twists que, logicamente, se alicerçam nesse mesmo t"ruque" narrativo. Não. Estou a referir-me à introdução de certos momentos avulsos, de uma forma repentina e algo aleatória. Portanto, não me parece tanto que seja com o intuito de criar volte-faces na narrativa – esses até são colocados no sítio certo da história. Assim, das duas, uma: ou o autor quis contar alguma coisa de forma apressada para poupar páginas ou, no exato sentido oposto, quis encher a história com um acontecimento, não tão relevante assim, utilizando a chamada técnica de “filler”, por vezes utilizada em banda desenhada, especialmente quando há um número de páginas pré-definidas para o livro.

A “voz do narrador”, isto é, os comentários de Mattéo na primeira pessoa que, lamentavelmente, quase não existiu no tomo 3, mas que foi recuperada no tomo 4, volta a marcar presença nesta Quinta Época. É um pormenor que muito ajuda para contar-nos bem a história e os seus desenvolvimentos, e onde Gibrat é habilidoso em passar-nos os pensamentos, carregados de cinismo e ironia, que Mattéo vai desenvolvendo. É uma das coisas que muito aprecio nesta série.

Outra característica que estou a apreciar também é que, de livro para livro, a personagem de Mattéo parece estar a endurecer o seu carácter e a ficar  cada vez mais sorumbática e negativa, embora esta mudança seja, compreensivelmente, o resultado de tudo o que este homem já passou. Seja como for, serve para mostrar que o autor Gibrat está a saber trabalhar e evoluir o seu protagonista – mais em termos de personalidade do que em termos de desenho já que, tendo em conta que se passaram muitos anos desde o primeiro tomo até esta parte, o desenho da personagem parece ter envelhecido pouco ou nada.

Quanto às ilustrações de Gibrat, posso repetir-me, dizendo que estamos perante um autor que debita talento, charme, personalidade própria e beleza nos desenhos que nos oferece. Para quem já está familiarizado com as ilustrações do autor – não só na série Mattéo como, também, em O Voo do Corvo, Destino Adiado ou em Pinóquia – posso assegurar que este Mattéo – Quinta Época continua a fornecer-nos a mesma qualidade. Com um traço realista, com belas mulheres (embora algo semelhantes entre si), com boa e subtil capacidade de ilustrar cenários e ambientes e, ainda, com belíssimas cores a aguarela, Gibrat é um autêntico virtuoso da ilustração.

Portanto, e recuperando as minhas palavras acerca de Mattéo – Terceira Época, “considero a qualidade do desenho [de Gibrat] verdadeiramente impressionante, com uma elegância de traço poucas vezes encontrada em livros de banda desenhada.

É verdade que em planos médios de corpo, ou seja, naquelas ilustrações em que as personagens estão um pouco mais ao longe do ponto de vista do leitor, o detalhe é manifestamente inferior ao detalhe aplicado a planos de cara, quando as personagens estão mais próximas. Mesmo assim, e até pela técnica de cor aplicada pelo autor, diria que é apenas uma pequena fraqueza que se aceita e que acaba por ser natural. 

Nota ainda para a sublime capa do livro!

Quanto à edição da Ala dos Livros, está tudo bem feito e em linha com o lançamento dos álbuns anteriores: capa dura, excelente papel, boa encadernação e boa impressão. Nada de negativo a declarar.

Em jeito de conclusão, posso dizer que este Mattéo – Quinta Época, mesmo tendo um ritmo de narração que não se coíbe de ser demarcadamente lento, traz novas e imprevisíveis revelações à trama, que surpreenderão os leitores mais incautos. Por outro lado, é mais um livro para que nos possamos deleitar com as magníficas, belas e singulares ilustrações de Jean-Pierre Gibrat.


NOTA FINAL (1/10):
8.7


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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Ficha técnica
Mattéo - Quinta Época - (Setembro de 1936 – Janeiro de 1939)
Autor: Jean-Pierre Gibrat
Editora: Ala dos Livros
Páginas: 64, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Abril de 2022






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Mais abaixo, deixo o convite para a leitura das análises aos álbuns anteriores da série:






2 comentários:

  1. Já tenho os 5 livros, foi dificil de comprar os editados pela Vitamina BD mas consegui no Market Place da Fnac comprar como novos os dois livros :-) Ainda não consegui ter tempo para ler, mas tenho acompanhado as vossas reviews e estou bastante curioso. Obrigado pelo vosso excelente trabalho de análise.

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    1. Ah que bom! Fico feliz por ti! Olha que não é fácil encontrar esses primeiros dois livros. E acho que a leitura seguida de todos é melhor para uma melhor imersão do leitor. E obrigado pelas simpáticas palavras para com o Vinheta 2020.

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