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quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Análise: O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos

O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos, de Delep e Dorison - Arte de Autor

O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos, de Delep e Dorison - Arte de Autor
O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos, de Delep e Dorison

Foi preciso esperar cerca de um ano e meio por um novo volume da linda e maravilhosa série O Castelo dos Animais, mas posso dizer-vos que valeu a pena cada momento de espera. É que, se não havia dúvidas acerca da qualidade da série até ao momento, parece-me que este terceiro tomo ainda consegue elevar mais a qualidade da obra. Quer no texto, quer na mensagem, quer nas ilustrações. Esta é, afinal, uma das melhores séries de banda desenhada da atualidade!

Mas vamos por partes.

Antes de avançarmos nesta análise ao terceiro volume, intitulado A Noite dos Justos, convido-vos a (re)lerem as minhas análises aos volumes 1 e 2, Miss Bengalore e As Margaridas do Inverno, respetivamente, para melhor se ambientarem ao tema desta belíssima série.

O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos, de Delep e Dorison - Arte de Autor
Livremente inspirado no clássico da literatura O Triunfo dos Porcos (Animal Farm, no título original), de George Orwell, O Castelo dos Animais apresenta-nos um universo onde os vários animais de uma quinta são liderados (e subjugados) por um infame touro e pelos seus cães que funcionam enquanto seu exército pessoal. Perante todas as injustiças praticadas, começa a haver, tímida mas gradualmente, uma força de oposição a este regime totalitário, que é encabeçada por uma gata viúva e mãe de duas crias, um coelho gigolo e um velho rato sábio e viajado.

Neste terceiro volume, essa luta, que se pretende feita sem violência, levam a gata Miss B, o coelho César e o rato Azelar a focarem-se, pois, nesse ponto: o de convencer os outros animais da quinta a não cederem à violência, de forma a terminarem com o reinado do touro Sílvio. O primeiro instinto para resolver um confronto é, quer em animais, quer em humanos, o de recorrer à violência. Mas esse instinto também acaba por ser muito primário e, por esse motivo, é relevante - embora mais difícil, sem dúvida - que a luta justa pelos direitos seja pacata e sem violência. A rude e rigorosa ditadura do ditador Sílvio mantém-se bastante ativa e, face ao movimento pacifista das margaridas, o touro começa a claudicar nas suas ações que, antes do início da rebelião, pareciam tão bem sedimentadas. Afinal, como controlar um povo, deixando-o feliz mas, ao mesmo tempo, à sua mercê, lucrando com o fruto do seu trabalho? Não é tarefa fácil.

O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos, de Delep e Dorison - Arte de Autor
E se no início, a luta dos animais começou por procurar ter direito ao acesso a coisas mais básicas, como a comida ou o calor, em A Noite dos Justos, os animais começam a reclamar o direito à democracia e à eleição daquele que os governa. Não falo mais da história para não vos tirar o prazer da leitura, mas posso assegurar-vos que tudo está meticulosamente bem pensado e bem feito.

E tudo aparece carregado de um forme humanismo que faz o leitor criar um elo emocional com as personagens e com todos os obstáculos que as mesmas têm que ultrapassar.

Sinceramente, olhando agora para o terceiro tomo, aquilo que me parece mais brilhante em O Castelo dos Animais é a tentativa, bem sucedida e graciosamente bem arquitetada, dos autores em nos proporcionarem uma breve síntese da introdução à génese de vários sistemas políticos. À primeira vista até pode parecer que estamos a ler uma simples “historiazita com animais simpáticos”… mas a verdade é que estamos a ler uma muito bem pensada e extremamente madura, história política. Quase como se fosse “totalitarismo, socialismo e luta de classes para dummies”. 

O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos, de Delep e Dorison - Arte de Autor
Mas tudo isto é feito de forma natural, sem que a história pareça cinicamente política ou paternalista ou que se procure, sequer, fazer do livro um instrumento para veicular correntes de pensamento de forma maniqueísta. E que grande feito isto é! Já li muitas belas histórias de Dorison, mas esta parece-me ser aquela que vai mais fundo, que consegue ser mais do que um mero argumento com boas ideias. É, sem dúvida, a história mais humana que o autor já fez. E quão curiosa esta afirmação é, se tivermos em conta que nem sequer aparecem humanos nesta história.

E já para não falar das ilustrações de Delep que, por incrível que possa parecer, me parecem estar a melhorar, em termos qualitativos, de volume para volume. Desde o início, que os belos desenhos de O Castelo dos Animais me conquistaram, sim. Mas sinto que o autor não parou de evoluir desde então. E a maneira como ilustra a expressividade das feições dos animais, tornando-os tão humanos, por um lado, mas, ainda assim, preservando, por outro lado, as suas características naturais de animais; ou a forma como ilustra momentos tensos, momentos tristes ou momentos de redenção; ou mesmo o modo como desenha as diferentes estações do ano – sejam elas o branco manto de neve, as tristes chuvas outonais ou os verdejantes cenários primaveris, tudo é feito com uma singular mestria. Um verdadeiro gáudio para os olhos, garanto-vos!

A própria maneira como o autor utiliza a planificação das páginas, com uma diversidade impressionante, que junta ilustrações de grande dimensão, a outras mais pequenas, e alterando entre planos de todo o tipo, fazem com que fiquemos rendidos ao modo como Delep se mostra um magnífico narrador visual. A título de exemplo, a página 19, que mostra a passagem das estações por uma árvore; ou as flores que, nas páginas, 36 e 37, circundam as pranchas, são, aos meus olhos, verdadeiras obras de arte. Algo não tão comum assim em banda desenhada. E é também por isso que digo que este terceiro volume é o melhor de todos. Os primeiros foram muito bons. Este é ainda melhor!

O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos, de Delep e Dorison - Arte de Autor
Com efeito, se há autores que estão bem alinhados, em termos de inspiração, esses autores são Delep e Dorison. Cada um, na sua vertente, parece estar demasiado mergulhado e focado em nos dar uma banda desenhada que, se não for perfeita, não anda nada longe disso.

A edição da Arte de Autor, que acompanhou o lançamento mundial da obra, mantém-se em linha com o que já havia sido feito nos tomos anteriores. O livro é provido de uma bela capa dura, com textura aveludada, tão agradável ao toque, e vários detalhes a verniz, como o título da obra e as folhas verdes que adornam a capa, cuja ilustração é qualquer coisa de maravilhoso. O papel é brilhante, de boa qualidade e o trabalho de encadernação e de impressão também não apresenta defeitos.

Nota ainda, positiva, para a breve síntese dos primeiros dois tomos que foi colocada no início do livro. Tendo em conta o espaçamento temporal que existiu entre o lançamento do volume 2 e este livro, parece-me uma excelente ideia para captar, novamente, a atenção dos leitores.

Em suma, estou rendido a esta série! O terceiro volume de O Castelo dos Animais melhorou o que era possível melhorar e aproximou a série da perfeição. A mesma está pensada para 4 volumes, o que deixa apenas a dúvida se Xavier Dorison saberá fechar, com chave de ouro, esta brilhante e obrigatória série de banda desenhada. Estou muito curioso para como a série irá acabar e apenas tenho pena que tenhamos que esperar um ou dois anos – digo eu! - por esse desfecho.


NOTA FINAL (1/10):
9.9



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos, de Delep e Dorison - Arte de Autor

Ficha técnica
O Castelo dos Animais #3 - A Noite dos Justos
Autores: Delep e Dorison
Editora: Arte de Autor
Páginas: 64, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Novembro de 2022

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