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terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

Duke chega ao fim!



A Arte de Autor prepara-se para lançar o sétimo e último volume da série western, Duke, da autoria de Hermann e de Yves H!

Trata-se de mais uma série que a editora portuguesa termina, o que merece, por esse motivo, os meus parabéns! Já é a décima série integralmente publicada pela Arte de Autor.

O livro deverá chegar às livrarias a partir da próxima quinta-feira, dia 2 de Março.

Mais abaixo, deixo-vos com a sinopse da obra e com algumas imagens promocionais.
Duke #7 - Este Mundo não é o Meu, de Hermann e de Yves H

Duque e Swift dirigem-se ao rancho de King com os 100 000 dólares para um último confronto, impiedoso e sangrento. 

Diante deles perfila-se a brutal dupla constituída por Terry e Buddy, os terríveis "irmãos siameses", guarda-costas de King, Manolito, o seu anjo da guarda transformado em anjo da morte, Ogden... e o próprio King.

No final do caminho, o sonho que ele acalenta há tantos anos estende-lhe finalmente os braços: mas apesar do sonho estar agora ao seu alcance, Duque sabe que o caminho que lhe falta percorrer é ainda longo e perigoso...
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Ficha técnica  
Duke #7 - Este Mundo não é o Meu
Autores: Hermann e de Yves H
Editora: Arte de Autor
Páginas: 56, a cores
Encadernação: Capa dura
PVP: 18,00€

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Spaghetti Bros está de volta com o volume final!




A Arte de Autor prepara-se para lançar o quarto e último volume da fabulosa série Spaghetti Bros, de Trillo e Mandrafina!

Estou bastante empolgado com esta novidade e aconselho-vos, por isso, a ler as minhas análises aos volumes um, dois e três.

Este quarto e último livro reúne os volumes de 13 a 16, que completam a série, e deverá chegar às livrarias já no próximo dia 2 de Março.

Abaixo, e como habitual, deixo-vos com a sinopse da obra e com algumas imagens promocionais.
Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina

Trillo e Madrafina dão-nos a sua visão peculiar -- cruel e trágica -- da história da América moderna. 

Para tal, servem-se dos membros de uma família atípica, a dos irmãos Centobucchi, emigrantes italianos cujos vínculos se estendem a instituições tão diversas e ao mesmo tempo tão afins como a Máfia, a Polícia e a Igreja.

Uma imersão admirável na América impiedosa de 1929!

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Ficha técnica
Spaghetti Bros - Volume 4
Autores: Trillo e Mandrafina
Editora: Arte de Autor
Páginas: 196, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Formato: 210 x 285 mm
PVP: 25,50€


sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

Análise: Um Conto de Natal

Um Conto de Natal, de José-Luis Munuera - Arte de Autor

Um Conto de Natal, de José-Luis Munuera - Arte de Autor
Um Conto de Natal, de José-Luis Munuera

Foi já bem no final do ano passado, já perto da quadra natalícia, que a Arte de Autor lançou este Um Conto de Natal, numa adaptação para banda desenhada da autoria de José-Luis Munuera. Digamos que a obra original de Charles Dickens já recebeu inúmeras adaptações. E dentro daquelas que já pude conhecer, recordo, com ternura, a adaptação para desenhos animados e para banda desenhada, da Disney, mas também gostei muito da versão dos Marretas ou, mais recentemente, da versão para cinema de Robert Zemeckis, que conta com Jim Carrey no papel de Scrooge.

Em banda desenhada, tirando a adaptação da Disney, com Tio Patinhas enquanto personagem principal, não conheço tantas versões assim. Li, há uns tempos, a versão que a Levoir editou na sua coleção dos Clássicos da Literatura em BD e li, também na mesma altura, esta versão de José-Luis Munuera. Entre uma e outra versão, estamos perante um no-brainer, como dizem os ingleses: a versão da Arte de Autor é infinitamente melhor do que a da Levoir. Sendo verdade que a versão publicada pela Levoir cumpre com os mínimos e não é, propriamente, horrível, nem nada que se pareça, esta versão publicada pela Arte de Autor, tem outra qualidade. E, sejamos sinceros, até eleva - ou, pelo menos, tenta elevar - de alguma forma a obra original de Dickens.

Um Conto de Natal, de José-Luis Munuera - Arte de Autor
E isso acontece, essencialmente, pela forma equilibrada, entre a livre adaptação e a lealdade para com a obra original, que foi encontrada por Munuera nesta sua adaptação. Com efeito, se é verdade que a narrativa que nos é dada obedece à estrutura montada por Charles Dickens, não deixa de ser menos verdade que a simples opção por optar por apresentar Scrooge como sendo uma mulher, trouxe mudanças de sobeja relevância à história.

Assim, e começando por aí, em vez de Scrooge ser um velho rezingão e sovina, nesta adaptação Scrooge é uma bela mulher, bem mais jovem, cujo nome é Elizabeth. A ação decorre em Londres, no ano de 1843, e começa no ponto em que todos os habitantes se preparam, de forma entusiasmada, para a celebração do natal. Bem, há uma exceção em termos do entusiasmo pelo natal que dá pelo nome de Elizabeth Scrooge. Esta, é uma mulher de negócios, extremamente rica e que não se preocupa com desgraças alheias. Talvez por isso, não surpreende que, para ela, toda a ideia do natal não faz qualquer sentido, visto que este serve apenas para que se gaste dinheiro de forma desenfreada e irracional. Para Elizabeth, interessa é o lucro, o trabalho e o dinheiro.

Mas, ao contrário do Scrooge original de Dickens, a Elizabeth de Munuera, parece ter uma noção clara da sua persona. E mesmo que muitos a considerem egoísta e avarenta, Elizabeth acha-se apenas inteligente, racional e extremamente prática.

Um Conto de Natal, de José-Luis Munuera - Arte de Autor
Eventualmente, os espíritos aparecem para a visitar, levando-a ao seu natal passado, presente e futuro, mas mostrando, também, que pessoa ela poder-se-ia ter tornado se tivesse feito outras escolhas na vida. Apesar daquilo que lhe é mostrado, Elizabeth não opera em si mesma uma revolução de comportamento e atitude tão drástica como aquela que o Ebenezer Scrooge original efetua. Pelo contrário, estas visitas dos espíritos até parecem sedimentar uma certa forma de estar que Elizabeth defende. É óbvio que surgirão alterações na personagem – afinal de contas, todos temos coisas a melhorar – mas, não é uma mudança (tão) radical.

E acho que é aí mesmo que, em termos de argumento, Munuera mais nos surpreende. É que o facto de a protagonista ser uma mulher, acaba por significar uma diferença nos comportamentos adotados face aos mesmos estímulos. É certo que o facto de esta ser mais uma história que se junta ao leque de obras WOKE, tão em voga nos dias de hoje, que pega em premissas passadas e substitui, por exemplo, o homem pela mulher, o branco pelo negro, o heterossexual pelo homossexual, foi algo com potencial negativo, quanto a mim. E digo-o apenas por esta razão: essa postura de tentar resolver o passado do universo, assumidamente paternalista, já começa, na minha opinião, a ser algo um pouco forçado e pouco natural. Mas, mesmo assim, e felizmente, não acho que Munuera tenha abusado neste tipo de questões, mesmo sendo verdade que é uma obra que procura mostrar a igualdade (ou superioridade?) da mulher face ao homem, ao mesmo tempo que declara – e bem! – que a mulher deve ousar ser e seguir aquilo que quer ser e seguir, e não aquilo que a sociedade espera de si.

A leitura é fácil e escorreita, podendo ser feita pelos mais novos ou, com adicionais camadas de reflexão e interesse, pelos mais velhos.

Um Conto de Natal, de José-Luis Munuera - Arte de Autor
Quanto às ilustrações contidas neste livro, posso dizer-vos que fiquei muito, muito agradado. Afinal de contas, já conhecia o trabalho do autor de outros livros, e já tinha como garantia que o mesmo tem um estilo que muito me agrada. Com um traço dinâmico, bem ao jeito do estilo de Spirou e de séries congéneres em termos de ilustração – ou, aliás, não tivesse já o próprio Munuera ilustrado álbuns do Spirou – os desenhos do autor oferecem-nos personagens com um estilo bastante "cartoonizado" e com expressões muito vincadas. Algo de que muito gosto e a que chamo, muitas vezes, o “franco-belga moderno”. Este livro não é exceção e vamos encontrado belos desenhos ao longo do mesmo.

O que eu não estava à espera, e que me surpreendeu bastante, é que, neste Um Conto de Natal, o autor parece dar-nos duas das suas facetas ilustrativas. Se as personagens são “abonecadas” e muito europeias no estilo de desenho, os cenários apresentam um estilo completamente diferente, mais realista, parecendo ter sido desenhados por outro autor. Aliás, basta olharmos para a capa do livro para percebermos isto que acabo de dizer: na capa vemos Elizabeth Scrooge num estilo bastante "cartoonizado", enquanto que o cenário – neste caso, o prédio que rodeia a personagem – é feito num estilo muito mais realista e estilizado. Mas isto vai acontecendo por todo o livro.

Um Conto de Natal, de José-Luis Munuera - Arte de Autor
Confesso que, ao princípio, fez-me um bocado de confusão, pois dava-me a ideia de que as personagens estavam algo deslocadas dos cenários onde se inseriam. Contudo, devo dizer que, à medida que a minha leitura foi avançando, comecei a habituar-me à convivência destes dois estilos de ilustração. Na verdade, até me quer parecer, que foi um claro objetivo do autor, que acabou por ser bem sucedido. E, convenhamos, qualquer um dos “estilos” de que estou a mencionar é extremamente bem executado.

Já para não falar que a conceção dos diferentes fantasmas que visitam Elizabeth - e os belos efeitos visuais que rodeiam estas cenas - também me deixou muito agradado, sublinhando ainda mais os diferentes estilos de ilustração que o autor nos consegue dar, sem perda alguma de qualidade de execução. Portanto, olhando para a ilustração, "primeiro estranha-se, mas depois entranha-se". Acaba por ser um álbum lindíssimo no cômputo visual.

Em termos de edição, temos aqui mais um bom trabalho da Arte de Autor. O livro apresenta capa dura e baça, com alguns elementos da mesma a receberem aplicação de verniz. O papel baço utilizado no miolo do livro também me parece ter sido a melhor opção para bem aproveitar a beleza visual das ilustrações do autor.

Em suma, posso dizer que este Um Conto de Natal foi uma bela surpresa, pela forma como reinventa o clássico de Charles Dickens. Confesso que temi que o autor apenas estivesse preocupado em fazer mais uma história de cariz WOKE, que parece ser a norma por estes dias. Mas, felizmente, eu estava errado, uma vez que Munuera vai mais além e acaba por fazer belas reflexões sobre a mulher e os papéis que todos nós, sociedade, esperamos da mesma.


NOTA FINAL (1/10):
8.6



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Um Conto de Natal, de José-Luis Munuera - Arte de Autor

Ficha técnica
Um Conto de Natal
Autor: José-Luis Munuera
Editora: Arte de Autor
Páginas: 80, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 210 x 285 mm
Lançamento: Novembro de 2022

quarta-feira, 15 de fevereiro de 2023

Análise: Tango #6 - O Rio das Três Fronteiras

Tango #6 - O Rio das Três Fronteiras, de Philippe Xavier e Matz - Gradiva

Tango #6 - O Rio das Três Fronteiras, de Philippe Xavier e Matz - Gradiva
Tango #6 - O Rio das Três Fronteiras, de Philippe Xavier e Matz

Foi ainda no passado mês de Setembro que a Gradiva publicou o sexto e último volume da série Tango, de Philippe Xavier. E, começando por falar nisso, acho louvável que, em pouco mais de um ano, a editora tenha publicado a totalidade de uma série que, com os seus seis volumes, até não é tão curta assim. É um bom exemplo da forma como o paradigma da edição de banda desenhada tem vindo a ser mudado, em Portugal, nos últimos anos.

Se há, vamos dizer, 10/15 anos, era comum que várias séries de banda desenhada fossem lançadas por cá e que, depois, acabassem interrompidas, por motivos vários, agora o paradigma é outro: as editoras portuguesas apostam numa série e essa aposta vai até ao fim. Isto é bom por vários motivos. Senão vejamos: para os leitores é bom, porque podem completar coleções e, especialmente, quando há uma história que se desenrola ao longo de vários volumes, podem terminar a história. Mas para as editoras também é bom porque, a jusante, poderão rentabilizar os seus investimentos de forma mais compacta, como consequência de terem publicado toda a série. Já para não falar na notoriedade – esse bem intangível, mas extremamente relevante – que as editoras criam junto do seu público.

Tango #6 - O Rio das Três Fronteiras, de Philippe Xavier e Matz - Gradiva
Tudo isto para sublinhar que a série Tango, é apenas mais um desses exemplos. O sexto volume dá pelo nome de O Rio das Três Fronteiras e coloca, mais uma vez, o protagonista John Tango, bem como o seu fiel amigo Mario, em mais problemas com os mafiosos locais.

Continuando no seu périplo pela América Latina, desta vez os nossos heróis encontram-se num ponto curioso do nosso planeta que junta a fronteira de três países de uma só vez. Falo da Argentina, do Paraguai e do Brasil. É nessa tripla fronteira que toma lugar uma enorme operação de tráfico de droga, de bandidos ocultos e exilados, de negociantes de armas e de branqueadores de capital. 

John Tango e Mario são convocados pelo seu amigo Mike, que já apareceu no segundo volume da série, para uma visita a este local, sem saberem muito bem quais as intenções do seu amigo. Mas logo ficam a saber que Mike e outros amigos foram expulsos da ilhota onde viviam por um rei do crime que procurava construir um resort de luxo no local e operar a partir daquele ponto a sua rede criminosa. E, como se não bastasse, Mike ainda viu um dos seus amigos a ser assassinado pelo referido mafioso. Agora que este se encontra na zona da tripla fronteira, Mike procura vingar-se e pede a John Tango e a Mario o seu auxílio. Mas, eventualmente, como é costume nestes enredos, as coisas acabam por não correr como o esperado e o protagonista vê-se mergulhado, de forma profunda, no submundo local e terá que ser ele o agente da vingança, enquanto acerta algumas contas antigas.

Tango #6 - O Rio das Três Fronteiras, de Philippe Xavier e Matz - Gradiva
Esta é uma série que tem demonstrado alguma volatilidade em termos de qualidade de argumento. Já por vezes, demonstrou mais qualidade, como nos tomos 3 e 5, À Sombra do Panamá e O Último Condor, respetivamente, mas também já se apresentou bastante desinspirada, como sucedeu nos tomos 2, Areia Vermelha, e 4, Dobro ou Nada em Quito. Neste caso, sem que este 6º tomo nos ofereça uma história fantástica, acho que estamos perante um dos melhores da série. 

Apreciei bastante a forma como o livro acaba, com as personagens John e Mario a elucidarem o leitor, através do diálogo que mantêm – sobre aquilo que, realmente, acabou por acontecer com os malfeitores. Mesmo podendo parecer má ideia não mostrar – através do desenho – o desenlace final, especialmente tendo em conta que se trata de uma série de ação, pareceu-me que foi uma maneira diferente e original, que acabou por funcionar bem.

Quanto ao desenho, o trabalho de Philippe Xavier mantém-se fiel ao que o autor já nos ofereceu nos 5 tomos anteriores. Diria que é um desenho extremamente eficiente e que cumpre, sem maravilhar. Como já referi anteriormente, “o seu estilo realista é demarcadamente franco-belga, com uns toques de modernidade, e certamente agradará aos amantes das séries XIII, Largo Winch ou I.R.S.. São desenhos que funcionam bem e que são bastante apelativos para o olho. São mais eficazes do que virtuosos porque, se olharmos com um olho mais clínico, verificaremos que os cenários e os pormenores até poderiam ser mais polidos.

Tango #6 - O Rio das Três Fronteiras, de Philippe Xavier e Matz - Gradiva
Acima de tudo, e olhando para os seis tomos, acho que consistência é a palavra chave, em termos de ilustrações – quanto ao argumento não é bem assim, como já referi acima. O trabalho de Philippe Xavier, pelo menos no seu todo, nem melhorou, nem piorou ao longo da série. Portanto, quem gostou logo do primeiro tomo, continuará a gostar. Quem não gostou dos desenhos até agora, também não deverá mudar de opinião.

Também em termos de edição, a Gradiva foi consistente ao longo da série. Todos os livros apresentam capa dura, bom papel brilhante, boa impressão e boa encadernação. Houve um dos livros – o primeiro, se não me falha a memória, que tinha um breve conteúdo de extras. Mas, normalmente, os livros de Tango não têm material extra.

Infelizmente, também houve consistência na legendagem que me pareceu apresentar vários problemas, com balões demasiado grandes e uma fonte excessivamente grande e muito espaçada. No entanto, parece-me que fez mais sentido que a editora, ainda assim, fosse fiel a si mesma, não alterando a harmonia com o que já tinha feito nos primeiros volumes. Mas, claro, deixo a nota para outras séries futuras em que a Gradiva aposte.

Concluindo, o último volume de Tango, encerra de forma satisfatória a série e acaba por simbolizar, também, a boa forma editorial da Gradiva que, em cerca de 13-14 meses, publicou integralmente uma série de seis volumes, demonstrando bom músculo editorial.


NOTA FINAL (1/10):
8.1



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Tango #6 - O Rio das Três Fronteiras, de Philippe Xavier e Matz - Gradiva

Ficha técnica
Tango #6 - O Rio das Três Fronteiras
Autores: Philippe Xavier e Matz
Editora: Gradiva
Páginas: 56, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 23,30 x 31,30
Lançamento: Setembro de 2022

terça-feira, 14 de fevereiro de 2023

Análise: O Grão-Duque (Série Completa)

O Grão-Duque, de Yann e Hugault - ASA e jornal Público

O Grão-Duque, de Yann e Hugault - ASA e jornal Público
O Grão-Duque, de Yann e Hugault

Foi já na reta final do ano 2022 que a editora ASA lançou, em conjunto com o jornal Público, a série O Grão-Duque, da autoria da dupla formada por Yann e Hugault. Diga-se que, de há uns tempos para cá, esta parceria entre a editora e o jornal português já nos deu séries muito boas como, por exemplo, Peter Pan, de Loisel, Long John Silver ou Rio, entre outras.

O que têm em comum estas séries é que costumam ser curtas (reunindo entre 3 a 6 volumes) e que são todas de origem e estilo franco-belga. Coisa que, para além de me deixar feliz a mim, também deixará muitos leitores felizes, estou certo.

Desta vez a aposta recaiu em O Grão-Duque, uma minissérie de guerra, com 3 volumes, cujo argumento é de Yann e as ilustrações são de Romain Hugault. Sobre este último, convém dizer que o autor já tinha visto duas das suas obras publicadas por cá, pela editora já extinta Vitamina BD: o volume one shot O Último Voo e o primeiro volume do díptico Do Outro Lado das Nuvens que, lamentavelmente, ficou incompleto, devido ao fecho das portas por parte da Vitamina BD.

O Grão-Duque, de Yann e Hugault - ASA e jornal Público
E, já nesses álbuns, era possível admirar a capacidade, por vezes desconcertante, de Hugault para um desenho super-realista, onde o maior detalhe e enfoque do autor parece residir, especialmente, em duas vertentes: no desenho de belas e luxuriantes mulheres e no desenho de aviões. Entre estas duas coisas, diria que o meu principal gosto são as belas mulheres, mas também não nego que aprecio um bom desenho de veículos terrestres ou aéreos. Portanto, é uma mistura que funciona bem. Especialmente se estivermos a falar de uma BD de guerra, como é o caso.

Começando, pois, este texto dando destaque ao desenho de O Grão-Duque, posso dizer-vos que aqueles que já conhecem o trabalho do autor, decerto não se sentirão defraudados com aquilo que ele nos dá nesta série. O detalhe e perfeição dos desenhos de Hugault chega a ser tanto que nos merece longos períodos a olhar para cada uma das suas belas ilustrações. Os aviões, quer em terra, quer em combate, são representados com um cuidado extremamente perfecionista e as mulheres, que miraculosamente possuem todas seios fartos e magnificamente bem delineados, são representadas com extremo detalhe e beleza. 

O Grão-Duque, de Yann e Hugault - ASA e jornal Público
Se corpos femininos, aeronaves, veículos, cenários, fardas dos soldados são desenhadas na perfeição por Hugault, sinto apenas que certas expressões faciais me parecem, por vezes, pouco naturais. Ou, melhor dizendo, sinto que essas expressões mesmo estando bastante boas na sua conceção, não conseguem estar ao nível da perfeição dos restantes tipos de desenhos que acabo de enunciar no parágrafo acima.

Quanto à planificação, o autor também faz bom uso de diferentes opções de organização de espaço, com a introdução de vinhetas de página inteira, vinhetas sobrepostas, vinhetas ao alto, vinhetas sem limite e até da utilização de margens pretas em alguns momentos da narrativa. Tudo isto faz com que a leitura seja rápida, do ponto de vista narrativo, mas que, como já referi, nos faça acalmar o ritmo devido a toda a beleza gráfica que emana dos desenhos do autor e que merece ser observada com tempo e calma.

Falando, agora, um pouco sobre o argumento que esta série nos oferece, importa referir que a história nos coloca bem no cerne da Segunda Guerra Mundial, entre 1943 e 1945, mostrando-nos, em simultâneo, o lado dos russos e o dos alemães.

Acompanhamos a caminhada de um piloto alemão, Wulf, que, durante a Segunda Guerra Mundial, e aos comandos do mítico avião Heinkel He-219, apelidado por si como "Grão-Duque", tem um improvável encontro com uma combatente inimiga de origem russa, Lilya, também ela piloto, que sendo uma mulher linda e sensual, também é uma feroz guerreira, com um enorme ódio pelos soldados alemães.

O Grão-Duque, de Yann e Hugault - ASA e jornal Público
Wulf é uma personagem bastante interessante porque, embora combata pelo exército alemão, tem uma postura antinazi, recusando-se a ostentar a cruz suástica no seu avião. Logicamente, este tipo de atitude vai despertar algumas inimizades e dissabores junto dos seus camaradas de armas. Mas Wulf não quer saber disso. A sua única preocupação ainda é a sua filha Romy. 

E é então que se cruza com Lilya, uma soldado pertencente ao regimento feminino russo apelidado como “As Feiticeiras da Noite”. O exército russo tem que combater em aviões completamente obsoletos e isto também faz surgir uma certa sensação de injustiça em Wulf.

Se Lilya começa por renegar a bondade que Wulf demonstra para com ela, a verdade é que ambos acabam por criar uma forte relação amorosa. Depois, há algumas reviravoltas na história que não vou referir, pois não quero estragar o prazer da leitura àqueles que, depois deste texto, forem ler a obra.

Parece-me, isso sim, que o argumentista Yann faz aqui um trabalho bastante decente. A história pode apresentar alguns clichets, aqui e ali, reconheço, mas não deixa de ter os seus bons momentos, bem doseados por Yann e duas personagens que, estando em lados opostos do conflito, acabam por fazer nascer uma certa sensação de empatia nos leitores.

O Grão-Duque, de Yann e Hugault - ASA e jornal Público
A edição que a ASA nos propõe neste O Grão-Duque é em tudo semelhante às edições mais recentes da editora: capa dura brilhante, bom papel brilhante, boa encadernação e boa impressão. A editora optou por incluir, no final de cada volume, uma página com a tradução das expressões alemãs e russas que são utilizadas ao longo da série. Se, por um lado, aplaudo a iniciativa, por outro lado, julgo que teria sido mais conveniente se as traduções das expressões fossem aparecendo em nota de rodapé em cada uma das páginas em que são efetivamente ditas pelas personagens. Esta forma de estar a consultar constantemente a "folha de cábula" no final do livro, parece-me que torna a leitura menos fluída e, às tantas, o leitor até já desiste de ir tantas vezes à página em questão, ficando "às escuras" em relação ao que é dito. Teria apreciado também que o conjunto das três lombadas formasse um desenho ou, pelo menos, o logótipo da série. Mas, não obstante, e gostos à parte, tudo isto que refiro são detalhes e a verdade é que a edição está bastante bem conseguida.

Em suma, a aposta da ASA em séries franco-belgas situadas temporalmente na Segunda Guerra Mundial – como Operação Overlord, Airborne 44 ou U-Boot – tem neste O Grão-Duque uma das suas melhores séries, possivelmente suplantada apenas por Airbone 44. Portanto, para os fãs do género, diria que é uma série de compra obrigatória. Do lado da editora – e partindo do princípio que a série vendeu (ou está a vender) bem – a boa notícia é que há, pelo menos, mais duas séries de Hugault, que apresentam o mesmo cariz bélico e o mesmo aprumo visual, e que a editora poderá optar por editar numa coleção semelhante a este O Grão-Duque: Angel Wings (7 volumes) e Le pilote à l'Edelweiss (3 volumes). É uma questão de aguardarmos para ver se tal acontece ou não.


NOTA FINAL (1/10):
8.7



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O Grão-Duque, de Yann e Hugault - ASA e jornal Público

Fichas técnicas
O Grão-Duque #1 - As Feiticeiras da Noite
Autores: Yann e Hugault
Editora: ASA
Páginas: 46, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Novembro de 2022

O Grão-Duque, de Yann e Hugault - ASA e jornal Público

O Grão-Duque #2 - Camarada Lilya
Autores: Yann e Hugault
Editora: ASA
Páginas: 46, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Novembro de 2022

O Grão-Duque, de Yann e Hugault - ASA e jornal Público

O Grão-Duque #3 - Wulf & Lilya
Autores: Yann e Hugault
Editora: ASA
Páginas: 46, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Novembro de 2022

Análise: Nevada #2 - A Estrada 99

Nevada #2 - A Estrada 99, de Fred Duval, Jean-Pierre Pécau e Colin Wilson - A Seita

Nevada #2 - A Estrada 99, de Fred Duval, Jean-Pierre Pécau e Colin Wilson - A Seita
Nevada #2 - A Estrada 99, de Fred Duval, Jean-Pierre Pécau e Colin Wilson

Se o primeiro Nevada me deixou com grande expetativa para o que poderia vir a seguir, devo dizer que este segundo tomo me deixou algo desiludido. E não o digo por estarmos perante um mau livro. Nada disso! Nevada 2 consegue cumprir, dando-nos uma história eficiente e funcional. No entanto, não é o salto qualitativo desejável, para transformar a série em algo mais marcante, que eu desejaria. É bom, mas não é extraordinário. E a minha ligeira desilusão prende-se com o facto de considerar que, tudo somado, este segundo volume fica uns furos abaixo do primeiro.

A história mantém-se à volta da personagem de Nevada Marquez, um agente oficioso que trabalha para os estúdios de Hollywood, tendo como funções a resolução de missões difíceis e perigosas e outros tantos negócios sujos. Um típico “faz tudo”, portanto. Nevada está, desta vez, em São Francisco para recolher uma encomenda que deverá ser entregue, em Los Angeles, a uma personagem importante de Hollywood. Mas quando o conteúdo desse misterioso pacote atrai a atenção das tríades de Chinatown, Nevada vê-se forçado a realizar uma viagem para Sul, na recentemente inaugurada Estrada 99, que une São Francisco a Los Angeles. E essa viagem torna-se perigosa e longa, pondo as capacidades de Nevada em teste.

Nevada #2 - A Estrada 99, de Fred Duval, Jean-Pierre Pécau e Colin Wilson - A Seita
A grande originalidade desta série é que junta dois universos que, raramente, aparecem juntos: o do oeste americano e o do lado citadino de Hollywood, onde a indústria cinematográfica é uma verdadeira força motriz da economia daquele lado dos Estados Unidos. Por um lado, a série é apetecível para os muitos amantes do western. Por outro lado, também pisca o olho a todos os que gostam do género policial, de estilo pulp. Acaba por ser uma mistura rara, que funciona bem.

Ao contrário do álbum anterior, em que parece que há uma maior predominância de partes mais alusivas ao western do que ao lado mais urbano e moderno da história, neste Estrada 99, são mais raras as partes que nos remetem para o universo do faroeste. É certo que parte da aventura é passada na árida e desértica estrada, mas a história é mais urbana e citadina do que a anterior. Coisa que até sou capaz de apreciar mais, diga-se.

Portanto, Nevada 2 até parecia que ia ser mais do meu agrado. Não o foi por um motivo apenas: os autores parecem menos inspirados neste álbum. O argumento é mais simples e expetável e, até mesmo os desenhos, parecem menos inspirados (embora a um bom nível, ainda assim).

Nevada #2 - A Estrada 99, de Fred Duval, Jean-Pierre Pécau e Colin Wilson - A Seita
Aceita-se que esta seja uma daquelas séries que não procura que os seus argumentos sejam muito profundos ou de um cariz que faça o leitor refletir. E nada há de mal nisso, refira-se. Não obstante, parece que o trabalho dos argumentistas neste segundo tomo é, por ventura, algo superficial em demasia, criando apenas as bases genéricas para que o enredo se sustente. Consequentemente, senti a falta de personagens e vilões mais impactantes. De situações mais extremas. De urgência narrativa. Porém, isso pouco ou nada acontece e, de facto, os argumentistas apenas se preocuparam em jogar pelo seguro.

O desenho de Colin Wilson é quase sempre verdadeiramente impressionante e bem conseguido. Digo “quase sempre” porque, aqui e ali, o autor nos brinda com alguns desenhos onde as expressões faciais de algumas personagens, parecem feitas de forma menos cuidada. Se, por um lado, compreendo que o traço do autor é bastante dinâmico e consegue alguns desenhos fantásticos, por outro lado, fico com pena que, de vez em quando, a expressão do protagonista pareça um bocado deformada. A última vinheta da página 8 deste livro é apenas um exemplo do que estou a dizer. Não há muitos exemplos assim, mas há alguns.

Nevada #2 - A Estrada 99, de Fred Duval, Jean-Pierre Pécau e Colin Wilson - A Seita
Mas, lá está, na maioria das vezes, Colin Wilson impressiona com o seu desenho de traço rápido, mas com bastantes virtuosismos, e capaz de ilustrar com extrema eficácia os vários tipos de ação que a história nos dá: sejam cenas de alucinantes perseguições, sejam cenas de tensão entre personagens, sejam conversas num diner. Os enquadramentos, de cariz cinematográfico, também são agradáveis e permitem uma boa imersão do leitor na história.

Quanto à edição da editora A Seita, não há nada negativo a apontar. Sendo uma série de formato tipicamente franco-belga, o livro apresenta capa dura; bom papel, com a quantidade certa de brilho; boa impressão e boa encadernação. Nota para o facto de a editora já ter anunciado que editará durante este ano os restantes dois tomos que faltam da série. Coisa que merece os meus aplausos. Relembro que sendo uma série onde as histórias são autocontidas há, não obstante, uma certa linha de continuidade na história de Nevada. E, saber que, em pouco tempo a série receberá os tomos seguintes é positivo para que os leitores possam apostar na mesma.

Concluindo, este segundo tomo de Nevada continua a ser uma leitura agradável, que tem como principal atributo o facto de ser um híbrido entre um clássico western e um policial, de estilo pulp. Mesmo que o segundo tomo fique alguns furos abaixo do primeiro volume da série, continua a ser muito recomendável para todos os que apreciam estes dois géneros de aventuras.


NOTA FINAL (1/10):
8.0



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Nevada #2 - A Estrada 99, de Fred Duval, Jean-Pierre Pécau e Colin Wilson - A Seita

Ficha técnica
Nevada #2 - A Estrada 99
Autores: Fred Duval, Jean-Pierre Pécau e Colin Wilson
Editora: A Seita
Páginas: 56, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 23 x 32 cm
Lançamento: Setembro de 2022

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2023

À Conversa Com: A Seita - Novidades para 2023!


Hoje trago-vos as novidades que a editora A Seita tem preparadas para 2023! E acreditem que há muitas e boas obras no horizonte da editora!

Devo dizer que foram muitas as pessoas que me foram abordando sobre este assunto pois, compreensivelmente, queriam saber quais as novidades d'A Seita para o ano 2023.

E hoje o Vinheta 2020 avança, em primeira mão, os numerosos projetos que a editora tem em mãos.

2023 deverá ser o ano em que a editora deverá lançar mais livros até à data!

Estive à conversa com o simpático André Morgado, um dos vários editores d'A Seita que, de forma transparente, me elucidou sobre as novidades para o primeiro semestre do ano, enquanto levantou o véu para aquilo que ainda há-de chegar às livrarias portuguesas no segundo semestre.

Não deixem de ler esta entrevista e preparem-se para um ano promissor da editora.

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

Análise: Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim

Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim, de Jodorowsky e Ladrönn - Arte de Autor

Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim, de Jodorowsky e Ladrönn - Arte de Autor
Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim, de Jodorowsky e Ladrönn

Par além de Armazém Central ou de Corto Maltese (a preto e branco) outra das séries que a editora Arte de Autor terminou no ano passado, foi Os Filhos de El Topo. Aqui estamos perante uma mini-série, com três volumes, da autoria do consagrado Alejandro Jodorowsky, que se faz acompanhar por José Ladrönn no trabalho da ilustração.

Julgo ter tecido uma apreciação suficientemente completa desta série aquando a publicação da análise ao segundo tomo. Por esse motivo, convido todos os leitores deste texto a acederem a esse texto. Até porque neste artigo dedicado ao terceiro e último tomo da série, Os Filhos de El Topo #3 – Abelcaim, ver-me-ei forçado a citar esse texto várias vezes.

Primeiro que tudo, a série Os Filhos de El Topo é a história que Jodorowsky criou para ser um filme mas que, por circunstâncias várias, acabou por nunca chegar a sê-lo. Mas, não contente com esse fim para a sua história, Jodorowsky decidiu fazer dela uma banda desenhada. Como tal, para recriar a sua visão original, recorreu ao ilustrador Ladrönn.

Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim, de Jodorowsky e Ladrönn - Arte de Autor
A relevância de Jodorowsky para a banda desenhada é de uma força abrupta se pensarmos não só na quantidade, mas, também, na qualidade de alguns dos trabalhos com que o autor já brindou os adeptos da 9ª arte. Mas, se isso é verdade e, praticamente, inquestionável, diria, também não deixa de ser verdade que nem tudo o que o autor lança atinge a qualidade expetável.

Os Filhos de El Topo talvez não seja disso exemplo – porque há aqui qualidade a vários níveis – mas também está longe de ser uma das obras mais relevantes ou recomendáveis do autor. Por ventura, será uma questão de gosto, subjetiva, portanto, mas o que é certo é que Os Filhos de El Topo representa uma viagem onírica, bizarra a muitos níveis, em que o autor tece várias alegorias envoltas nos mitos da religião cristã – ou não estivéssemos a falar de Abel e Caim, os filhos de Adão e Eva, segundo a Bíblia Sagrada –, transportando-os para o seu próprio universo e imaginação.

Assim, à partida, diria que parece logo ser uma ideia vencedora. E, com efeito, esta série tem uma personalidade tão própria que estou certo que será uma obra de culto para muitos entusiastas seguidores do autor. Porém, não deixa de trazer algumas lacunas e de deixar no ar que interessa mais a forma do que o conteúdo.

Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim, de Jodorowsky e Ladrönn - Arte de Autor
Especialmente porque, acima de tudo, Os Filhos de El Topo é bem mais um misto de ideias avulsas e caprichos fetichistas do autor, do que uma narrativa coesa. Como referi, relativamente ao álbum anterior, “há uma consistente inconsistência nesta obra. Ou seja, o autor parece fiel ao seu estilo louco de inventar uma história e há até um bom paralelismo, muito coerente, com o filme El Topo. Esta é a parte em que Os Filhos de El Topo é consistente. Todavia, e goste-se ou não, por vezes a história poderá aparecer algo absurda, levantando algumas pontas que acabam por não ficar bem resolvidas – ou bem exploradas - e introduzindo elementos que, mais do que dotar a história de consistência narrativa, apenas parecem ser introduzidos para chocar e surpreender – gratuitamente – o leitor. Esta será a parte em que considero haver alguma inconsistência na obra, que acaba por ser uma das bandas desenhadas mais niilistas que já li. Neste western, carregado de surrealismo e constantes alegorias religiosas, contem com doses gratuitas de violência, como mortes, violações ou tortura, e com bastante sexo e nudez. Mas todos estes elementos estão envoltos numa aura metafísica e filosófica, que toca nos dogmas religiosos.

Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim, de Jodorowsky e Ladrönn - Arte de Autor
Em termos de história, este terceiro volume conclui a saga. Abel continua a sua viagem, acompanhado de Lillith, satisfazendo os seus caprichos mais curiosos, até que ambos caem nas mãos do Coronel e do seu pequeno exército. A partir daqui, segue-se uma das cenas mais violentas (gráfica e mentalmente) que vi nos últimos tempos em banda desenhada. A situação é tensa e a forma como Jodorowsky a concebe e como Ladrönn a ilustra, está muito bem executada. Talvez não fosse necessária tanta violência? Talvez. Mas não restam dúvidas que a cena é daquelas que nos ficam na memória. O ponto alto do livro, diria.

Já o irmão de Abel, Caim, está desesperadamente a tentar salvar a sua amada. Todos os caminhos arrastam as personagens para a Ilha Sagrada que promete redenção a todas elas, das mais diversas formas.

O que é mais interessante na história de toda esta trilogia – e que está bem patente neste último volume – é a forma tão díspar e, até mesmo, oposta como atuam os dois irmãos. Um move-se pelo amor, outro move-se pelo ódio. Até as próprias mulheres de cada um são o oposto uma da outra. É interessante esta relação de yin-yang, de branco-preto, de bem-mal que as personagens trazem. No entanto, e no final, também fica no ar uma ideia de que talvez cada uma das personagens tenha mais elementos da outra do que aquilo que, inicialmente, seria de antever.

Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim, de Jodorowsky e Ladrönn - Arte de Autor
Se essa foi a moral que Jodorowsky preparou para este Os Filhos de El Topo, até foi uma bela moral. Mas, também não é claro que tenha sido esse o seu objetivo, já que estamos perante uma história que é muito aleatória em diversos pontos. Como se as ideias fossem lançadas para o ar mais pela sua componente estética e respetivo potencial de choque do que, propriamente, pela sua componente narrativa.

Olhando para as ilustrações de Ladrönn, mantém-se neste terceiro livro, o belo trabalho feito até aqui. “Com cores genericamente esbatidas, que por vezes chegam a parecer estar mal pintadas, mas que são alternadas por alguns vermelhos vivos, o resultado estético final é muito interessante e parece remeter-nos automaticamente para o ambiente dos filmes de série b dos anos 70, em especial, e claro está, o de El Topo. Também aqui, na componente gráfica, há uma personalidade muito própria desta obra. É igual a si mesma. Por vezes, as personagens apresentam expressões faciais que me parecem algo mecânicas e pouco expressivas. No entanto, na aridez dos ambientes e cenários, que nos remetem para os clássicos do cinema de Sergio Leone, nas fantásticas ilustrações dos cavalos ou do corpo feminino, Ladrönn faz um excelente trabalho.

A capa volta a ser muito bela. E para isso também contribui a bela edição da Arte de Autor que, mais uma vez, apresenta capa dura com textura aveludada, com belos detalhes a verniz. De resto, a impressão e a encadernação são boas, e o papel é brilhante, com boa qualidade.

Em conclusão, posso dizer que certamente eu teria apreciado mais Os Filhos de El Topo se a minha leitura fosse feita durante o consumo de álcool e substâncias estupefacientes ou psicotrópicas. Como não foi o caso, devo dizer que a experiência deste volume – e desta série – mais não foi do que assistir a um freak show. Por vezes, com bons momentos, noutros casos, sem grande critério e em que se tenta causar uma impacto no leitor através de algo chocante. Mas o autor é Jodorowsky e, talvez por isso, tudo isto acaba por não surpreender tanto assim.


NOTA FINAL (1/10):
7.0


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim, de Jodorowsky e Ladrönn - Arte de Autor

Ficha técnica
Os Filhos de El Topo #3 - Abelcaim
Autores: Jodorowsky e Ladrönn
Editora: Arte de Autor
Páginas: 96, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 232 x 310 mm
Lançamento: Outubro de 2022