Depois de Tango #1 me ter causado uma experiência agradável de leitura - especialmente devido a conseguir criar um protagonista, John Tango, carismático e misterioso - e de Tango #2, por sua vez, ter sido uma certa desilusão devido a um argumento bastante mal construído e desinspirado, é tempo de olhar, de uma só vez, para os números 3 e 4 desta série cuja edição original já conta com 6 títulos mas que, aparentemente, será rapidamente apanhada pela edição portuguesa da Gradiva, tendo em conta o excelente ritmo e assiduidade do lançamento de álbuns pela editora portuguesa.
Tal como nos álbuns anteriores, John Tango continua a sua saga por países da América do Sul. Se na primeira aventura o protagonista se mantém na Bolívia, rumando, depois, no segundo tomo, às Caraíbas, nestes terceiro e quarto volumes o protagonista ruma ao Panamá e ao Equador, respetivamente. Esta característica da série faz, aliás, com que nos lembremos das viagens à volta do mundo de Corto Maltese, embora John Tango esteja baseado apenas nos países da América Latina. Por agora, pelo menos.
Depois do volume 2, Areia Vermelha, que ter, tal como já referi, deixado algo desiludido, devo dizer que o terceiro volume, À Sombra do Panamá, é o melhor livro da série Tango que li até agora. Isto porque o argumentista Matz é especialmente bem sucedido na forma como consegue construir um argumento bem pensado, com um bom ritmo de história e onde os bons momentos e a sensação de tensão, estilo thriller, são bem executados.
John Tango e o seu amigo, Mario encontram-se no Panamá. Um belo sítio, pleno de beleza natural, com as suas florestas tropicais e as suas ilhas paradisíacas. Panamá também é um local com belas leis de extradição que atraem mafiosos, homens de negócios ou políticos corruptos. E é exatamente no meio dessa corja, diria, que Tango e Mario se refugiam dos eventos de tensão vividos nos dois álbuns anteriores. Ambos procuram descontração, descanso, boa comida e boas mulheres. Algo onde o Panamá também é bom fornecedor. Mas, claro, mais uma vez, por muito que John Tango se queira afastar dos problemas… parece que os mesmos o perseguem. Depois de conhecerem Charles Muller, que depressa demonstra não ser aquilo que aparenta ser, John e Mario terão pela frente um conjunto de adversários que colocará as suas vidas em risco.
A trama é bem montada, com o argumentista a ter a destreza de colocar em simultâneo vários peões, com pretensões diferentes, mas que, inevitavelmente, vão entrar em rota de colisão. Tudo isso faz com que fiquemos mais agarrados ao livro, tentando perceber quais são as reais intenções das personagens. Mais que nunca, senti-me remetido para as bandas desenhadas franco-belgas de grande sucesso XIII, Largo Winch ou I.R.S. Com as devidas distâncias, claro.
Se o argumento do livro três é, de longe, o melhor dos quatro livros que li até agora, o argumento do quarto tomo, Dobro ou Nada em Quito, volta a ficar alguns furos abaixo do pretendido. Nesta aventura, que decorre na cidade de Quito, no Equador, John e Mario trocam, pela primeira vez, o mar pela terra, passando a viajar num jipe, em detrimento do veleiro que os acompanhou nos tomos anteriores.
O livro arranca com uma cena de ação algo gratuita e que, depois, acaba por não ser muito bem aproveitada em termos de história. John e Mario, continuando a sua demanda por umas boas férias tranquilas, encontram um glamoroso alojamento na cidade de Quito e decidem visitar alguns marcos turísticos da cidade. Mas não passa muito tempo até que Reyes, um polícia da DEA com que John Tango já trabalhou no passado, apareça em cena, enquanto que Carmen, uma antiga inimiga e amante, ao mesmo tempo, do protagonista também está em Quito em busca de Tango. Um emaranhado relacional em que, desta fez, John Tango é mais a presa, isto é, o objeto de interesse de outras personagens do que o inverso. E, até ao fim do livro, assistimos a uma certa caça de rato e gato, entre todas as personagens. Este quatro volume também se lê bem, há que dizer, mesmo apresentando um argumento que, quanto a mim, já não tem a desenvoltura narrativa do terceiro volume.
Em termos de arte ilustrativa, o trabalho de Philippe Xavier nestes dois volumes mantém-se em linha com aquilo que já nos foi dado nos tomos anteriores. O seu estilo realista é demarcadamente franco-belga, com uns toques de modernidade, e certamente agradará aos amantes das supracitadas séries XIII, Largo Winch ou I.R.S. São desenhos que funcionam bem e que são bastante apelativos para o olho. São mais eficazes do que virtuosos porque, se olharmos com um olho mais clínico, verificaremos que os cenários e os pormenores até poderiam ser mais polidos. Como referi acerca do tomo 1, “se os cenários fossem, por vezes, mais detalhados, estaríamos perante uma experiência ainda mais impactante, em termos da nossa imersão nas ilustrações do autor Matz. Não obstante, e com a arte ilustrativa ajudada por uma boa aplicação de cores, que oferece ao conjunto total um cariz moderno, acho justo admitir que, visualmente falando, e mesmo sem ser deslumbrante, Tango consegue ser apelativo.”
A edição da Gradiva para estes livros apresenta-se com boa qualidade. Capa dura, bom papel, boa encadernação e boa impressão. A legendagem, que também já referi nas análises anteriores, poderia ser mais bem conseguida. Os balões ocupam demasiado espaço nas vinhetas, as letras são excessivamente grandes em dimensão e o espaçamento entre palavras é muito alargado. Dei-me ao trabalho de ir ver a legendagem original para verificar se esta opção de legendagem seria um capricho dos autores, mas aquilo que encontrei é bastante diferente da edição da Gradiva. Na versão original a legendagem é perfeitamente normal e não apresenta estas fraquezas que refiro.
Em suma, Tango é a uma série que, a julgar pela assiduidade dos lançamentos da Gradiva, está a registar sucesso nas vendas. Não é uma série fantástica ou perfeita mas é uma leitura agradável, com desenhos eficazes, há que reconhecer. E atenção que o volume 3, À Sombra do Panamá, é, de longe, o melhor álbum da série até agora.
NOTAS FINAIS (1/10):
Tango #3 – À Sombra do Panamá: 8.4
Tango #4 - Dobro ou Nada em Quito: 7.0
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Tango #3 – À Sombra do Panamá
Autores: Philippe Xavier e Matz
Editora: Gradiva
Páginas: 56, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Novembro de 2021
Autores: Philippe Xavier e Matz
Editora: Gradiva
Páginas: 56, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Março de 2022
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