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quinta-feira, 30 de novembro de 2023

À Conversa Com: Ala dos Livros - Novidades para 2024!


Hoje trago-vos novidades que vos vão deixar com água na boca! Preparem essas carteiras!

Estive à conversa com Ricardo M. Pereira, um dos responsáveis da editora Ala dos Livros, e um bom amigo, que, bem à semelhança daquilo a que nos tem habituado, falou abertamente das novidades da editora para o próximo ano, enquanto também abordou outras questões bastante interessantes sobre as atividades da editora.

Assumindo que o ano de 2023 foi um ano para "arrumar a casa", Ricardo apresentou algumas das novidades para o próximo ano que, meus amigos, são muito empolgantes!

Não há nem uma novidade que eu não considere de boa qualidade, mas não posso deixar de manifestar o meu entusiasmo com a maravilhosa série Shi, de Zidrou e Homs, e com Le Petit Frère, de Jean-Louis Tripp, que é um daqueles livros para a vida. Uma obra verdadeiramente OBRIGATÓRIA!

Mas há mais novidades para além destas, portanto, não deixem de ler a entrevista mais abaixo.


quarta-feira, 29 de novembro de 2023

À Conversa Com: Escorpião Azul - Novidades para 2024!


Hoje apresento-vos as novidades de banda desenhada que a editora Escorpião Azul prepara para o ano 2024!

Estive à conversa com Jorge Deodato, responsável da editora, com quem falei sobre os 10 anos da Escorpião Azul, sobre o recente prémio, no Amadora BD, para Melhor Álbum de Autor Nacional que o livro Elviro, de Paulo J. Mendes, arrecadou e, claro, sobre algumas das novas obras que a editora prepara o próximo ano.

Falámos até um pouco do meu livro Muitos Anos a Virar Páginas, que é expetável que saia ainda durante este último mês de 2023. Já agora, e a este propósito, aproveito para dizer que ainda não falei sobre este livro e projeto aqui no Vinheta 2020 mas, naturalmente, falarei mais sobre o mesmo assim que estiverem reunidas as condições para tal. Mas posso dizer-vos que será algo muito especial e que já falta pouco para que o mesmo seja lançado!

Por agora, deixo-vos com a entrevista à Escorpião Azul, mais abaixo.

Já está nas bancas o novo volume da BD "O Assassino"!



Hoje chega às bancas o segundo volume da série O Assassino, de Matz e Luc Jacamon! 

Este segundo volume editado pela ASA, que já pode ser encontrado em banca, juntamente com o jornal Público, reúne os tomos 3 e 4, A Dívida e Laços de Sangue, respetivamente.

Mais abaixo, deixo-vos com as sinopses da obra e com algumas imagens promocionais.


O Assassino #3 e #4 - A Dívida | Laços de Sangue, de Matz e Luc Jacamon

3. A Dívida 
O Assassino não consegue levar uma vida tranquila. No entanto, depois da sua última etapa em Paris, ansiava por um pouco de sossego (ver O Assassino 2 - A Engrenagem). Apesar de todas as precauções que sempre tomou, ei-lo de pés e mãos atados, pelo menos durante algum tempo, forçado a pagar uma estranha dívida contraída com um grande manda-chuva da máfia colombiana. 

O Padrinho sabe com quem está a lidar e que o Assassino poderá prestar-lhe um bom serviço. Quanto a este, pode aceitar novos contratos: as suas condições são respeitadas. Não é por mudar de patrão que muda de princípios. E, assim, pode continuar a viajar e a pôr de lado quantias substanciais. Mantendo o controlo, estando sempre sozinho, mesmo quando bem acompanhado. Permanecer atento, não dar nas vistas, adaptar-se… Não importa quem é o mandante, pois o trabalho é sempre o mesmo. Contudo, esta dívida não estava no programa…

4. Laços de sangue 

Uma grande cidade. O melhor lugar para passar despercebido enquanto as coisas acalmam. Para fazer um ponto de situação e preparar o futuro, o Assassino esconde-se em Paris, aguardando também que a sua namorada se restabeleça dos maus-tratos que sofreu na Venezuela. Esperar. Tentar perceber. Em última análise, liquidar os culpados. 

Mariano aparece (ver T3: A Dívida). Como terá conseguido encontrá-lo? O Padrinho, tio de Mariano, apreciou bastante os serviços do Assassino, pelo que enviou o sobrinho para lho dizer e o pôr na pista daqueles que agrediram a rapariga. Mas não há almoços grátis. O Padrinho não lhe faria este favor sem esperar nada em troca. Aliás, Mariano não tardará a informá-lo do que se trata… De qualquer modo, o Assassino está a violar a sua sacrossanta regra da solidão. Há pessoas que são postas à prova, é assim.

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Ficha técnica
O Assassino #3 e #4 - A Dívida | Laços de Sangue
Autores: Matz e Luc Jacamon
Editora: ASA
Páginas: 112, a cores
Encadernação: Capa mole
PVP: 12,90€





Análise: Não Me Esqueças

Não Me Esqueças, de Alix Garin - ASa e LeYa

Não Me Esqueças, de Alix Garin - ASa e LeYa
Não Me Esqueças, de Alix Garin

Não Me Esqueças é uma das bandas desenhadas que a editora ASA lançou nas últimas semanas e marca a aposta da editora portuguesa num registo de BD mais direcionado para um público maduro, a que várias vezes, e também por isso, se tende a chamar de “novela gráfica”. A autoria desta obra pertence a Alix Garin, uma jovem autora belga que se estreou enquanto autora com o lançamento deste livro.

A história centra-se em Clémence, uma jovem adulta que após verificar que a sua avó, Marie-Louise, se encontra a definhar num lar de terceira idade, decide "raptá-la", levando-a a fazer uma longa viagem de carro, com o intuito de regressar à sua casa de infância. Isto porque, com uma galopante doença de Alzheimer, Marie-Louise parece ter apenas algumas memórias difusas e dispersas, nomeadamente a dos seus pais. Não há volta a dar: Marie-Louise sente-se uma criança e teme que os seus pais lhe ralhem por chegar tarde a casa. Clémence decide então embarcar com a avó nesta viagem inusitada.

Não Me Esqueças, de Alix Garin - ASa e LeYa
É claro que esta road trip resulta de uma decisão tomada por impulso e, como tal, acaba por ser mal preparada pela neta, Clémence. E isto vai criar algumas situações delicadas - e outras divertidas - que fazem com que esta viagem, movida por sentimentos de compaixão, acabe por trazer vários momentos de tensão e medo. Peripécias.

É certo que Alix Garin nos apresenta uma história que assenta na doença de Alzheimer e como é difícil e desafiante lidar com a mesma. Mas os intuitos narrativos da autora não se findam apenas aí. Como tal, Alix Garin explora a relação da própria protagonista Clémence com a sua mãe. Porque se há coisas certas na vida, é que todos nós caminhamos para a velhice. Alguns não chegam lá, é verdade, mas a cada dia, cada semana, cada mês, cada ano que passa, estamos mais velhos e vividos. O tempo não deixa de avançar e não tem qualquer complacência por tudo aquilo que não é eterno. Como nós. E se nos deixarmos distrair, essa passagem do tempo pode minar as nossas relações e as nossas vidas. Parece que foi isso que aconteceu a Clémence e à sua mãe. A vida adulta - rápida, implacável e prática - foi criando um fosso entre elas. Poderá, então, a avó Marie-Louise servir como uma lembrança para o quão efémera é a vida e a sanidade mental? As perguntas deixadas pela autora e as reflexões que as mesmas nos incentivam a fazer, fazem de Não Me Esqueças uma obra muito madura em termos narrativos.

Não Me Esqueças, de Alix Garin - ASa e LeYa
Por outro lado, está sempre muito presente uma ponte entre a infância e a velhice. E como os pais e os avós começam por ser uma âncora para as crianças que, mais tarde, desempenharão esses mesmo papel para os seus avós e pais. A vida é um ciclo e, como dizem os ingleses, what goes around, comes around.

A viagem levada a cabo por neta e avó ainda permite que a primeira reflita sobre alguns momentos da sua vida, nomeadamente ao nível de relações abusivas que teve no passado ou na busca pela sua sexualidade. Se a princípio me pareceu que a introdução destes momentos era forçada, por serem meros fillers, sem grande propósito, depressa percebi que estes momentos servem para que Clémence nos mostre que todos temos a nossa caminhada e as nossas vivências, mas que, por vezes, nos esquecemos que os mais velhos já percorreram esses mesmos caminhos. E se nos lembrássemos disto mais vezes, talvez pudéssemos encontrar mais compaixão ou preciosos ensinamentos nos mais velhos, que já passaram por situações semelhantes às que vivemos. Acompanhando a sua avó, Clémence também parece mergulhar nas profundezas do seu ser, para melhor se conhecer. Enfim, o livro é de uma gigante riqueza interpretativa.

Não Me Esqueças, de Alix Garin - ASa e LeYa
E deixem-me dizer-vos que nunca senti que a autora nos desse um relato lamechas, de lágrima fácil. Nada disso! Se ficamos melancólicos ao longo desta leitura, não é bem por vermos coisas tristes na história, mas sim por esta nos fazer pensar e, só depois disso, encontrarmos esse amargo travo da melancolia.

Os desenhos de Alix Garin são bastante belos. O seu traço é muito simples, mas extremamente eficaz, fazendo com que, muitas vezes, os cenários sejam desprovidos de detalhes. Mas a autora parece jogar com essa mesma valência a favor da história que nos quer passar. E no tratamento das emoções faciais, a autora demonstra-se especialmente exímia. São muitas as vinhetas que, mesmo sendo silenciosas, sem qualquer balão de fala, conseguem passar-nos tanta informação e emoção.

A maneira como através desse traço simples e direto, sem grandes apetrechos visuais, Alix Garin oferece emoções às faces das suas personagens e, particularmente, à da avó Marie-Louise - especialmente naqueles momentos em que esta parece meio alienada e a olhar para o vazio - é um verdadeiro tratado e uma inegável força da autora. Basta-nos a observação da avó a contemplar esse mundo distante que já só parece existir no seu próprio mundo, para que baixemos a guarda e fiquemos aturdidos com a força narrativa aqui empregue. Verdadeiramente sublime!

Não Me Esqueças, de Alix Garin - ASa e LeYa
Gosto especialmente de como a autora desenha os interiores e, em vários casos, como "não os desenha". É que isso parece funcionar a favor da narrativa, pois concentra o olhar do leitor naquilo que realmente importa: nas personagens e naquilo que elas estão a viver.

Por vezes, há momentos em que os desenhos assumem um estilo mais caricatural e ainda mais rabiscado. São ocasiões mais divertidas onde se procura dar uma certa leveza a uma história que, naturalmente, é pesada no assunto que trata. Leveza também é aquilo que as belas cores, a aguarela, atribuem à história, contribuindo para que as ilustrações sejam muito elegantes, suaves e bonitas.

Quanto à edição da ASA, o livro apresenta capa mole, com badanas, e bom papel brilhante. A impressão e a encadernação são boas. Há um pequeno erro na primeira página do livro, em que se veem linhas vermelhas a circundar a mancha de impressão. Mas, de resto, o trabalho de edição parece-me bem feito. Não obstante, e tendo em conta o tipo de obra em questão, acho que, ainda assim, a obra merecia capa dura como julgo ter sido a opção do lançamento original na Bélgica/França. Acho também que o tipo de ilustração de Alix Garin teria funcionado melhor em papel baço. É uma questão bastante pessoal, reconheço, mas não tenho dúvidas que, olhando para o traço da autora, o papel mate seria melhor opção. Seja como for, a edição da ASA cumpre.

Em suma, não esquecerei o quanto Não Me Esqueças é uma belíssima obra de banda desenhada. A história, os desenhos e as cores são belas, sim, mas a bomba de emoções que a obra perpassa para o leitor, onde imperam sorrisos, mas, acima de tudo, lágrimas e um nó na garganta, são o que de mais marcante fica connosco. Ventos novos parecem vir dos lados da ASA, no que ao lançamento de banda desenhada diz respeito, e este livro é uma clara prova disso. Um dos melhores livros do ano e absolutamente recomendado.


NOTA FINAL (1/10):
9.8



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Não Me Esqueças, de Alix Garin - ASa e LeYa

Ficha técnica
Não Me Esqueças
Autora: Alix Garin
Editora: ASA
Páginas: 224
Encadernação: Capa mole
Formato: 268 x 203 mm
Lançamento: Outubro de 2023

terça-feira, 28 de novembro de 2023

Análise: Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim

Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim, de Bertrand Galic e Roger Vidal - Gradiva

Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim, de Bertrand Galic e Roger Vidal - Gradiva
Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim, de Bertrand Galic e Roger Vidal

Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim é uma das bandas desenhadas mais recentes no catálogo da editora Gradiva. E sendo verdade que esta é uma daquelas obras que se insere na categoria de “banda desenhada educativa”, em que a editora portuguesa é pródiga, diga-se, também não é menos verdade que, neste caso, Fukushima é um livro bem conseguido, que apresenta bons apontamentos, e que é, por ventura, mais e melhor do que outras obras do género.

O acontecimento que a obra trata é o desastre nuclear de Fukushima, com a libertação de radiação para toda a zona circundante à central elétrica japonesa, que ocorreu a 11 de Março de 2011 e que foi impulsionado por um terramoto que, por sua vez, originou um enorme tsunami que abalou as instalações da central elétrica. É um daqueles momentos da história da humanidade em que parece que tudo o que poderia correr mal, correu ainda pior. Tratou-se de um encadeamento de infortúnios que viriam a causar esse desastre nuclear que é tido como o pior acidente nuclear desde o desastre de Chernobyl, em 1986.

Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim, de Bertrand Galic e Roger Vidal - Gradiva
As consequências do desastre de Fukushima foram devastadoras, levando a que cerca de 160.000 pessoas tenham sido evacuadas da região de Fukushima devido à contaminação radioativa. E muitas dessas pessoas, passados mais de dez anos, ainda não puderam retornar às suas casas.

Este livro da autoria do francês Bertrand Galic e do espanhol Roger Vidal, é bastante eficiente nos seus pressupostos, assumindo um registo muito franco-belga, quer na forma como a história nos é passada, quer nos desenhos que Vidal nos oferece embora, deva dizer, também é notória alguma influência do mangá na caracterização visual das personagens.

Mas vamos por partes.

Em termos de argumento, aquilo que Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim procura ser, é um relato bastante verosímil, que tenta recriar todos os acontecimentos vividos na central elétrica de Fukushima Daiichi e como os trabalhadores da central, que eram chefiados por Masao Yoshida, viveram este dia histórico e os restantes dias que lhe sucederam.

Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim, de Bertrand Galic e Roger Vidal - Gradiva
Como tal, o livro acaba por se centrar bastante em Yoshida, pois foi sobre os seus ombros que recaíram numerosas tomadas de decisão, que colocavam em risco a reputação do Japão e, mais importante que isso, a vida de todos os colaboradores que o rodeavam. E da população que habitava perto da central. Central essa que ficou sem energia, em plena escuridão, com comunicações com o exterior dificultadas, com um crescente número de explosões, que se seguiam umas às outras, e com um aumento da radiação, cada vez mais tóxica, à volta de toda a central. Masao Yoshida chegou mesmo a tomar medidas que iam contra aquilo que lhe era pedido, exteriormente, pela sua hierarquia. Entre a teoria e a prática, por vezes há uma grande distância, bem sabemos.

À medida que vamos acompanhando o que se passa, também nos é mostrada a comissão de inquérito que aconteceu posteriormente ao evento e onde são feitas muitas questões a Yoshida, tentando apurar o que realmente se passou e que medidas foram depois tomadas. Na verdade, até é essa comissão de inquérito que abre e fecha a história deste livro, servindo como engodo e “bengala narrativa” para que possamos mergulhar nos acontecimentos vividos no dia 11 de Março de 2011 e dando um cariz mais cinematográfico à obra.

Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim, de Bertrand Galic e Roger Vidal - Gradiva
Apreciei bastante o livro por não tentar ser demasiadamente educativo, aquando a leitura da banda desenhada. Ou seja, o argumentista Bertrand Galic procurou dar-nos uma aproximação dos factos, apoiando-se depois em algumas suposições ou factos inventados para sustentar o enredo. E isso acaba por funcionar bem, sem que o livro se torne pesado ou aborrecido, por estar imbuído em demasiada informação técnica. Essa informação, os factos e um estudo mais cuidadoso, acabam por constar no livro, sim, mas já depois de a banda desenhada ter terminado, através de um dossier de extras informativo.

Se a história e o argumento funcionam, devo dizer que também fiquei bastante agradado com o trabalho de Roger Vidal nas ilustrações da obra. Como já referido, o seu estilo é bastante europeu, com um belo e simples traço moderno e semi-realista que, sendo muito eficiente, também dá um aspeto visual bastante interessante à obra. As expressões das personagens são muito bem encetadas e a planificação dinâmica permite que estejamos sempre a ler o livro com um certo sentido de urgência, face ao que nos é relatado.

Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim, de Bertrand Galic e Roger Vidal - Gradiva
Uma das coisas que contribui para que, em termos gráficos, este Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim seja bastante belo, é devido às cores suaves que funcionam como suave mancha cromática para a história. Impera uma paleta de tons azulados que funciona bem na atmosfera que se procura passar para o leitor.

A edição da Gradiva está bem conseguida, com o livro a apresentar capa dura brilhante e bom papel baço no miolo - o que é o ideal para o tipo de arte de Roger Vidal, diria. De resto, temos boa impressão e boa encadernação. No final do livro, conforme já referi, somos brindados com um dossier de extras, bem documentado, sobre aquilo que se passou em Fukushima. Acaba por ser interessante pois, apesar da história da BD ter eventos fictícios, depois de lermos este dossier informativo, podemos atestar que, ainda assim, os autores foram bastante fiéis aos acontecimentos reais. E, lá está, este conjunto de extras permite aumentar e educar os leitores face a Fukushima, possibilitando que a BD não tenha a função clara e exaustiva de o fazer. Acaba por funcionar bem.

Já agora, faço votos para que a Gradiva não perca de vista o livro La Petite Fille et le Postman, dos mesmos autores, que foi publicado já neste ano de 2023, e que aparenta ser um belo romance de guerra. Fica a sugestão.

Em suma, Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim é um bom livro e uma agradável surpresa. É uma obra com um cariz didático, certamente, mas não se foca em demasia nessa função educativa – como infelizmente muitos livros do género tendem a fazer. Inversamente, aquilo que este livro faz, é dar-nos um relato vívido e intenso do desastre nuclear de 11 de Março de 2011. Dentro do género de “BD educativa”, e mesmo que não seja deslumbrante, é dos melhores exemplares no nosso mercado.


NOTA FINAL (1/10):
8.3


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim, de Bertrand Galic e Roger Vidal - Gradiva

Ficha técnica
Fukushima - Crónica de um Desastre Sem Fim
Autores: Bertrand Galic e Roger Vidal
Editora: Gradiva
Páginas: 136, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 215 x 286 mm
Lançamento: Outubro de 2023

À Conversa Com: Gorila Sentado - Novidades para 2024!



Hoje trago-vos as novidades referentes a uma editora independente portuguesa! 

Refiro-me à Gorila Sentado que, após se iniciar, em 2018, de forma tímida no mercado de banda desenhada nacional, prepara-se para um ano de 2024 com mais lançamentos.

Falei com o simpático Daniel da Silva Lopes, autor e responsável do projeto editorial. 

Conversámos sobre esse lado de se ser verdadeiramente independente na edição de banda desenhada, com as vantagens e desvantagens que daí resultam, e também, e claro, das novas obras que a Gorila Sentado tem projetadas para o próximo ano!

Não deixem de ler a entrevista, mais abaixo.


segunda-feira, 27 de novembro de 2023

À Conversa Com: G. Floy Studio - Novidades para 2024



Hoje trago-vos novidades referentes às novas apostas da editora G. Floy Studio para o próximo ano!

Estive à conversa com Christine Meyer, responsável da G. Floy Studio, e falámos sobre o ano editorial de 2023, abordando também algumas das novidades que a editora prepara para 2024.

Diria que, mesmo sendo, por ventura, o expectável, face àquilo que os leitores mais atentos conhecerão da editora, há boas novidades e, acima de tudo, boas confirmações.

Não deixem de ler a entrevista, mais abaixo.

sábado, 25 de novembro de 2023

Análise: 1629 - O Boticário do Diabo … ou a História Apavorante dos Náufragos do Jakarta

Análise: 1629 - O Boticário do Diabo … ou a história apavorante dos náufragos do Jakarta, de Xavier Dorison e Thimothée Montaigne - Arte de Autor

Análise: 1629 - O Boticário do Diabo … ou a história apavorante dos náufragos do Jakarta, de Xavier Dorison e Thimothée Montaigne - Arte de Autor
1629 - O Boticário do Diabo … ou a História Apavorante dos Náufragos do Jakarta, de Xavier Dorison e Thimothée Montaigne

A Arte de Autor lançou no Amadora BD o mais recente trabalho de Xavier Dorison e Thimothée Montaigne, que dá pelo (longo) nome de 1629 - O Boticário do Diabo… ou a História Apavorante dos Náufragos do Jakarta e que, na forma, é uma BD clássica de piratas. Como tal, é natural que sejamos remetidos muitas vezes para Long John Silver, a fantástica série de banda desenhada do mesmo autor Xavier Dorison onde, curiosamente, Thimothée Montaigne, também colaborou - embora com a função de colorista, apenas.

Mas se Long John Silver se centra nessa personagem fictícia criada originalmente por Robert Louis Stevenson para o seu clássico da literatura A Ilha do Tesouro, este 1629 é baseado em factos verídicos. Como tal, a história da obra centra-se no evento histórico que envolveu o navio holandês Jakarta (ou Batávia), pertencente à poderosa Companhia Holandesa das Índias Orientais, que acabou por naufragar em 1629 numa ilha perdida no Pacífico. E são mesmo as condições que levam a esse naufrágio que constituem o engodo para tornar a história desta obra mais impactante para o leitor. É que esta viagem com o destino à Indonésia teve elementos dignos de uma thriller! O navio transportava uma incomensurável fortuna em ouro e diamantes que, juntamente com as penosas condições de vida a bordo de um navio à época, aguçaram apetites alheios que deram origem a uma conspiração com o intuito de inverter os papéis designados no navio, de forma a deitar mãos ao enorme tesouro.

Análise: 1629 - O Boticário do Diabo … ou a história apavorante dos náufragos do Jakarta, de Xavier Dorison e Thimothée Montaigne - Arte de Autor
E, mesmo sendo verdade que havia tripulantes de todas as classes sociais a bordo do navio, indo dos mais pobres até à classe alta de Amesterdão, a verdade é que todos eles tinham em comum a necessidade desesperada por embarcar nesta longa viagem com a esperança de mudança de vida. De todos os homens e mulheres a bordo, havia um que se diferenciava: Jeronimus Cornelius, um boticário arruinado, que até era procurado pela Inquisição e que, a bordo, era a segunda pessoa mais importante. Sendo misterioso, carismático, culto e inteligente, a sua presença parece deixar marca em todos à sua volta, incluindo o leitor deste 1629.

De facto, Dorison tem o mérito de nos oferecer um daqueles vilões que, pela sua personalidade e crueldade, facilmente causa impacto no leitor. Aliás, esta capacidade do argumentista para esculpir excelentes vilões não é, de todo, uma novidade, se tivermos em conta que, além do já referido Long John Silver, o autor também deu vida aos cruéis vilões de O Castelo dos Animais, Undertaker ou O Terceiro Testamento.

Ora, voltando ao vil Cornelius, à medida que a história vai avançando, começamos a tomar contacto com o seu plano diabólico e conspirativo de tomar as rédeas, ou o leme, do Jakarta, através de um motim que vai alimentando, pela sombra, nos bastidores da grande embarcação. Mas o boticário parece ter uma oposição inesperada em Pelsaert, o Subintendente do Jakarta; em Hayes, um simples marinheiro; e, especialmente, em  Lucrécia Hans, uma bela mulher a bordo por quem o Boticário sente um crescente desejo. O clima de tensão vai, então, aumentando gradualmente, passando para o leitor, de forma hábil, uma certa sensação de urgência, em que o argumentista Dorison é pródigo nas suas histórias.

Análise: 1629 - O Boticário do Diabo … ou a história apavorante dos náufragos do Jakarta, de Xavier Dorison e Thimothée Montaigne - Arte de Autor
O que é curioso é que o navio Jakarta representa uma dicotomia óbvia: é que, por um lado, torna-se o lugar mais perigoso do mundo e símbolo do desastre e  tragédia iminente para a sua tripulação, por outro lado, representa igualmente o único modo de salvação para todos os que nele viajam.

Não sendo uma história tão original ou inesperada assim, tem nesta vertente de se basear num acontecimento histórico, uma forte vantagem. Não o faz de forma didática. Ao invés, procura ser um verdadeiro livro de aventura que consegue captar e aprisionar o leitor à ação do livro. De facto, assim que começamos a ler 1629, o difícil mesmo é pararmos a leitura. E, também por esse motivo, acaba por ser agridoce que, no final da leitura, fiquemos a meio da história, já que ainda falta o segundo volume do díptico.

A trama que se vai instalando é excelente, mas também aprecei especialmente a forma como nos é mostrada a vida a bordo, à época, bem como todas as privações e sacrifícios que isso representava. Nesse ponto, e com as devidas diferenças, claro está, até me senti remetido para o igualmente fantástico Moby Dick, de Chabouté.

Análise: 1629 - O Boticário do Diabo … ou a história apavorante dos náufragos do Jakarta, de Xavier Dorison e Thimothée Montaigne - Arte de Autor
Xavier Dorison revela-se muito inspirado e tem o mérito de pegar neste incidente da história e transformá-lo num romance impactante. As personagens são marcantes, encetando bons diálogos entre si e o ritmo da narrativa é muito bom.

E não é apenas pelo facto da história e das personagens serem bem trabalhadas por Dorison que este livro vale a pena. Até porque, honestamente, até são as belas ilustrações de Thimothée Montaigne que saltam primeiramente à vista.

O autor já trabalhou com Dorison na série O Terceiro Testamento e no primeiro volume de Long John Silver, portanto, parece que a ligação entre os dois é estreita e que, em termos de conceção da obra, se entendem às mil maravilhas. Montaigne apresenta um traço semi-realista que, tendo a capacidade de agradar aos mais adeptos do franco-belga clássico, também não está enclausurado nesse estilo e consegue ter um aspeto moderno, ao mesmo tempo. Tudo o que Montaigne ilustra, seja o mar, o navio, as personagens, as paisagens, os momentos de ação, os momentos de dor, os momentos de mistério… é visualmente apelativo e apresenta uma qualidade inegável em termos técnicos. É difícil que não surja no leitor uma certa sensação de maravilhamento pela simples observação de tão belas ilustrações.

Destaque ainda para a brilhante caracterização das expressões das personagens, bem como para a linguagem corporal das mesmas. Tudo bem feito!

Análise: 1629 - O Boticário do Diabo … ou a história apavorante dos náufragos do Jakarta, de Xavier Dorison e Thimothée Montaigne - Arte de Autor
E mesmo em termos de planificação, enquadramentos e até na forma como as legendas são inseridas na obra, 1629 é uma obra de qualidade superior, onde nada parece ter sido deixado ao acaso. Parece uma daquelas grandes produções de Hollywood, mas aplicada à banda desenhada.

Para que nada falhasse, até mesmo as cores – da autoria de Clara Tessier – são magníficas, acrescentando todo o tipo de sensações que o argumento de Dorison e os desenhos de Montaigne precisavam.

Quanto à edição, este livro é um forte candidato a melhor edição do ano. Não o será pelos extras, que não há, mas sim pelo magnífico objeto-livro que esta edição consegue ser! Os acabamentos da capa são tão especiais que podemos considerar como raros de encontrar em banda desenhada. A capa é dura e apresenta uma textura que faz lembrar uma malha têxtil que se torna agradável ao toque. E, depois, o livro também apresenta, quer na capa, quer na contracapa, quer na lombada, numerosos detalhes com acabamento dourado que parecem fazer-nos acreditar que se trata de uma edição do século XVII, do tempo da viagem do Jakarta. Juntando os acabamentos, os desenhos e o próprio arranjo gráfico da capa, lombada e contracapa, é dos livros mais bonitos de banda desenhada que já vi. Lindo, lindo, lindo! De resto, o papel é couché e de boa qualidade, tal como assim é a encadernação e a impressão da obra. Tudo muito bem feito e a roçar a perfeição, pese embora, em termos de revisão, saltem à vista mais gralhas - como repetição de palavras ou erros de sintaxe – do que seria desejado.

Em suma, 1629 - O Boticário do Diabo … ou a História Apavorante dos Náufragos do Jakarta, é uma obra de altíssimo nível – uma das melhores do ano – que certamente agradará a todos os adeptos de uma boa banda desenhada de aventura, onde o argumento, repleto de personagens marcantes e misteriosas, e os desenhos soberbos habitados por belas cores, andam de mãos dadas. E, claro, a edição da Arte de Autor também é das melhores do ano. No fundo, 1629 é aquilo a que, no cinema, chamaríamos de “grande produção”. A única coisa a lamentar é que não sabemos quando nos chegará o segundo e último volume desta história. Mas mal posso esperar!


NOTA FINAL (1/10):
9.7



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Análise: 1629 - O Boticário do Diabo … ou a história apavorante dos náufragos do Jakarta, de Xavier Dorison e Thimothée Montaigne - Arte de Autor

Ficha técnica
1629 - O Boticário do Diabo … ou a História Apavorante dos Náufragos do Jakarta
Autores: Xavier Dorison e Thimothée Montaigne
Editora: Arte de Autor
Páginas: 136, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 235 x 310 mm
Lançamento: Outubro de 2023

sexta-feira, 24 de novembro de 2023

À Conversa Com: ASA - Novidades para 2024!


Hoje ainda vos trago as novidades referentes ao próximo ano editorial da ASA

Estive à conversa com o simpático Luís Saraiva, o publisher dedicado à banda desenhada da editora portuguesa, que abordou vários temas interessantes do mercado de banda desenhada em Portugal, bem como as novas tendências que se verificam no género.

É verdade que na hora de levantar o véu para nos dar a conhecer quais as novas obras que a ASA prepara para 2024, Luís Saraiva optou por ser mais vago, embora tenha deixado algumas luzes no ar, às quais, no final do artigo, tomei a liberdade de acrescentar as minhas especulações. São isso mesmo: especulações. Portanto, não as tomem como confirmações de lançamentos. Embora, também é possível que estas especulações se venham a confirmar como lançamentos durante o próximo ano.

Sem mais demoras, convido-vos a mergulhar na entrevista que se segue:


À Conversa Com: Devir - Novidades para 2024!



Hoje trago-vos duas entrevistas em que falei com duas das maiores editoras de banda desenhada em Portugal.

A primeira dessas entrevistas ocorreu com a Devir.

Tive a oportunidade de falar com Ana Lopes, editora responsável da Devir, que me falou das novidades que podemos esperar para 2024.

É verdade que Ana Lopes, mesmo sendo muito simpática e de bom trato, não abriu muito o jogo relativamente a novas séries que a Devir possa vir a publicar no próximo ano. [Mas continuem a ler o artigo pois parece que, à medida que eu preparava este artigo, surgiram novidades].

Mesmo assim, ficou bem assente que a editora deverá continuar a apostar num mangá mais direcionado para um público maduro. Coisa que aplaudo e que acho muito importante!

E há novidades para os adeptos de banda desenhada americana!

Não deixem de ler a entrevista, mais abaixo.

quinta-feira, 23 de novembro de 2023

Análise: O Grande Gatsby - A Novela Gráfica Definitiva

O Grande Gatsby - A Novela Gráfica Definitiva, de Ted Adams e Jorge Coelho - A Seita e Comic Heart

O Grande Gatsby - A Novela Gráfica Definitiva, de Ted Adams e Jorge Coelho - A Seita e Comic Heart
O Grande Gatsby - A Novela Gráfica Definitiva, de Ted Adams e Jorge Coelho

Que Jorge Coelho é um dos melhores ilustradores portugueses de banda desenhada não será, digo - e espero - eu, novidade para ninguém. O seu trabalho é de tal forma reconhecido, que o autor português tem trabalhado para a Marvel em várias séries. Entre os seus trabalhos, poderemos destacar Rocket Raccoon, Venom, Robocop, Loki, Haunted Mansion ou algumas curtas que o autor fez aqui e ali.

No entanto, e não obstante a qualidade que Jorge Coelho tem demonstrado nos trabalhos que referi, considero ser justo dizer que falta(va) ao autor uma obra de grande fulgor e de verdadeira afirmação artística. Essa obra, meus caros, é este O Grande Gatsby que é, de caras, uma excelente e fiel versão da célebre obra original de F. Scott Fitzgerald.

O trabalho foi originalmente lançado para o mercado americano, em números separados, à boa maneira do modo norte-americano de lançar banda desenhada. A edição portuguesa é integral e chegou até nós, recentemente, pelas mãos das editoras A Seita e Comic Heart que, em boa hora, trouxeram para Portugal esta brilhante obra.

Nesse sentido, até acho que isso me merece um comentário, pois considero uma excelente ideia que se tragam para Portugal algumas das obras que, no estrangeiro, têm feito os autores portugueses brilhar. Ora, se os portugueses têm brilhado no mercado estrangeiro, onde há uma concorrência desenfreada, é porque há qualidade ou, pelo menos, algum fator distintivo que tem feito os nossos artistas terem sucesso. Portanto, quer com As Muitas Mortes de Laila Starr, editado recentemente pela G. Floy Studio, quer, agora, com este O Grande Gatsby que A Seita e a Comic Heart nos trouxeram, acho um ótimo sintoma que as editoras portuguesas não “durmam” e andem atentas às obras de origem portuguesa que são lançadas no estrangeiro.

O Grande Gatsby - A Novela Gráfica Definitiva, de Ted Adams e Jorge Coelho - A Seita e Comic Heart
Mas, voltando ao tema central, concentremo-nos neste O Grande Gatsby, cuja história é sobejamente conhecida. Na verdade, o romance original de F. Scott Fitzgerald é considerado uma obra-prima da literatura americana (e mundial) e, tendo uma história ambientada no período dos loucos anos 1920, continua, ainda assim, a ter ressonância no mundo atual. Não espanta que já tenha tido várias adaptações, quer para o cinema, quer para banda desenhada.

Além de ser uma história de amor e tragédia, O Grande Gatsby também tem a valência de traçar uma crítica à sociedade americana do início do século XX. A trama é centrada em torno do misterioso Jay Gatsby e na sua obsessão por Daisy Buchanan. Fitzgerald, através do olhar perspicaz do narrador Nick Carraway, destaca as falhas de uma sociedade obcecada pela ostentação e pela superficialidade. Assim, a representação do "Sonho Americano" traz consigo uma crítica muito presente na obra.

Gatsby, um homem que, aparentemente, alcançou o auge do sucesso material, é retratado como solitário e desencantado. A mensagem é, pois, mais que óbvia: a riqueza não é sinónimo de felicidade e realização. E a tragédia que envolve Gatsby e Daisy, é também uma lembrança dolorosa das consequências da busca cega pelo amor, quando estamos envoltos uma sociedade onde as barreiras sociais e a busca pela riqueza material se metem pelo meio. E fica claro que a figura dos olhos de Dr. T.J. Eckleburg no billboard, representa a observação silenciosa da decadência moral que todos podemos fazer. Autor e leitores.

Além disso, a história está carregada de belos momentos, onde se destacam as ostensivas festas dadas por Jay Gatsby, os belos carros, as incríveis casas. Tudo levado ao extremo.

A adaptação para banda desenhada deste magnífico livro ficou a cargo de Ted Adams, autor americano que nos dá uma adaptação para banda desenhada muito competente. Fica claro que Ted Adams não procurou fazer interpretações da obra, dando-lhe um cunho mais pessoal,  e optou por se limitar a assegurar que o romance original era adaptado para BD de forma fiel. Em boa verdade, considero que O Grande Gatsby não é um daqueles livros muito difíceis de adaptar, pois nem sequer é uma obra muito grande em dimensão que, por isso, obrigue o argumentista a cortar imensas partes. Com efeito, sendo uma obra relativamente curta, cabe depois ao argumentista assegurar que a essência e principais momentos da história são salvaguardados. E Ted Adams cumpre bem essa função. Conheço bem a obra original e não dei conta de algo que fosse verdadeiramente importante para a história e que tenha sido deixado de fora.

Se a história é um clássico da literatura, se a adaptação para banda desenhada por Ted Adams está bem conseguida, resta-nos um olhar atento ao trabalho do português.

O Grande Gatsby - A Novela Gráfica Definitiva, de Ted Adams e Jorge Coelho - A Seita e Comic Heart
E as ilustrações que nos são oferecidas por Jorge Coelho são de tirar o fôlego. Se há castings perfeitos, julgo ser justo dizer que o autor português foi a escolha certa para esta adaptação! Ao longo de toda a obra, o seu estilo de ilustração mantém-se extremamente detalhado, com uma a atenção ao pormenor e uma desenvoltura técnica que chegam a ser impressionantes. Cada personagem, cada cenário, cada casa, cada automóvel, cada ambiente indoor ou outdoor é executado de forma maravilhosamente inspirada por Coelho. Há uma candura e elegância nas personagens, nos trajes das mesmas, na eloquência dos seus gestos e naquilo que a história procura passar.

A noção visual, em termos de organização gráfica de espaço e enquadramentos de Jorge Coelho, também é muito acima da média, tornando-o, também nesse cômputo, num autor de elevado nível. Além de que a própria planificação da obra apresenta um excelente nível cinematográfico que cativa e prende o leitor ao livro. Por vezes, podemos admitir que talvez haja alguma rigidez em alguns gestos das personagens, mas isso será uma coisa menor num trabalho que roça a perfeição. 

A própria capa do livro que, possivelmente, também beneficiou do trabalho de design de Robbie Robbins, é de uma beleza estonteante. Uma das capas mais bonitas do ano!

O que mais admiro em Jorge Coelho é a forma como parece pensar cada ilustração que executa, seja ela uma splash page ou uma pequena vinheta. As coisas não parecem ser deixadas ao acaso. Enquanto músico, costumo dizer que, independentemente de se gostar de uma música ou não, os ouvidos atentos conseguem perceber se um artista deu o seu corpo e alma à criação de uma canção. Ora, transpondo isso para a banda desenhada, neste O Grande Gatsby parece-me óbvio que Jorge Coelho deu a sua alma a todos estes desenhos, cabendo depois ao leitor sorver todo este talento que o autor enverga. E quando assim é – e é-se talentoso, está claro – o resultado acaba por ser muito inspirado e primoroso. Os próprios separadores dos capítulos são de uma beleza desarmante!

O Grande Gatsby - A Novela Gráfica Definitiva, de Ted Adams e Jorge Coelho - A Seita e Comic Heart
Se os desenhos são belíssimos, as cores - nas quais Jorge Coelho foi assistido por Inês Amaro - também são fantásticas, oferecendo ao conjunto todo o ambiente pictórico que seria obrigatório para aproximar a obra original de Fitzgerald a uma banda desenhada moderna. Não me espanta que, em termos de cores, o álbum também tenha sido tão aclamado porque é, de facto, brilhante. No entanto, e apesar disso, o desenho de Jorge Coelho é tão bom que talvez até me faça desejar que a obra fosse a preto e branco. Ou que também a pudéssemos ler dessa forma. Explico: na exposição dedicada à obra no Amadora BD foi possível ver – ou atestar – a beleza, o aprumo visual e a virtuosa técnica do autor nos painéis a preto e branco que estavam expostos. E isso fez-me desejar ter esta obra numa versão a preto e branco, também. Talvez numa edição (ainda mais) especial e comemorativa? Fica a sugestão.

Falando da edição d’A Seita e da Comic Heart, a mesma apresenta capa dura, bom papel brilhante, boa encadernação e boa impressão. No final, há ainda um generoso dossier de extras, com 18 páginas, onde os leitores podem mergulhar no processo de trabalho de Jorge Coelho, através de páginas que nos mostram esboços, estudos de personagem e de indumentária, e onde temos acesso às capas originais dos comics individuais. Ficou uma bela edição, portanto!

Concluindo, se querem que vos diga – e sabendo de antemão o quão estas afirmações implicam coragem de quem as profere – este O Grande Gatsby, de Jorge Coelho e Ted Adams, é bem capaz de ser a melhor BD desenhada por um português. De sempre! Da mesma forma que defendi – e defendo – que Balada para Sophie é o melhor livro da banda desenhada portuguesa, acho que, olhando apenas para as ilustrações, O Grande Gatsby é, reitero, a melhor BD desenhada por um português. Absolutamente imprescindível! Para os que leem e para os que não leem banda desenhada, este é um livro obrigatório para comprar e/ou oferecer! 


NOTA FINAL (1/10):
9.7



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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O Grande Gatsby - A Novela Gráfica Definitiva, de Ted Adams e Jorge Coelho - A Seita e Comic Heart

Ficha técnica
O Grande Gatsby - A Novela Gráfica Definitiva
Autores: Ted Adams e Jorge Coelho
Editoras: A Seita e Comic Heart
Páginas: 176, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 18 x 27,5 cm
Lançamento: Outubro de 2023

À Conversa Com: Arte de Autor - Novidades para 2024!


Hoje é dia de vos dar a conhecer algumas das novidades de banda desenhada que a Arte de Autor prepara para o próximo ano de 2024!

Na entrevista que fiz a Vanda Rodrigues, responsável pela editora, deu para ficar a saber que a editora estará compenetrada na continuação das séries em curso, mas também foram dadas a conhecer algumas novas apostas por parte da editora. 

E algumas dessas apostas - se não todas - correspondem a obras premiadas, pelo que o selo de qualidade parece continuar a ser uma presença nas novas edições da Arte de Autor!

Não percam mais tempo e acedam, mais abaixo, à entrevista completa!