sexta-feira, 2 de agosto de 2024

Análise: À procura de Anne Frank

À procura de Anne Frank, de Ari Folman e Lena Guberman - Porto Editora

À procura de Anne Frank, de Ari Folman e Lena Guberman - Porto Editora
À procura de Anne Frank, de Ari Folman e Lena Guberman

Se há adaptações de livros para banda desenhada que muito me agradaram, O Diário de Anne Frank, de Ari Folman e David Polonsky, lançado em 2017 pela Porto Editora, é um desses livros. O original Diário de Anne Frank, esse rico testemunho de uma das milhentas vítimas judias da Segunda Guerra Mundial, é um livro que conheço muito bem e que já li em várias fases diferentes da minha vida. E devo dizer que essa adaptação para banda desenhada muito me surpreendeu pela forma, por vezes poética, por vezes em forma de homenagem, com que Ari Folman conseguiu (re)criar o original diário de Anne Frank.

Portanto, quando peguei neste À Procura de Anne Frank, do mesmo Ari Folman que, desta vez é acompanhado nas ilustrações por Lena Guberman, as minhas expectativas eram bem altas. Mesmo assim, não há quaisquer dúvidas que, desta vez, Ari Folman não foi tão bem sucedido neste regresso ao universo de Anne Frank. É que, sendo um livro com alguns pontos interessantes e, possivelmente, menos direcionado para adultos do que o primeiro, fica alguns furos abaixo do mesmo.

À procura de Anne Frank, de Ari Folman e Lena Guberman - Porto Editora
E, especialmente, por um motivo: se, em Diário de Anne Frank, Ari Folman adaptou para banda desenhada um diário real, servindo-se, é certo, de alguma liberdade nessa adaptação, em À Procura de Anne Frank, Folman tentou criar todo um enredo que tem como pano fundo a procura pelo conceito que Anne Frank encerra em si mesma, isto é, o facto de se ter transformado num símbolo de perseverança, tenacidade, esperança, inocência e coragem.

Para tal, o autor serve-se de Kitty, a amiga imaginária de Anne Frank, e dá-lhe vida. A história começa quando, no museu de Anne Frank, em Amesterdão, uma tempestade acaba por partir o vidro que protege o diário de Anne, soltando o espírito de Kitty. A partir daí, Kitty procurará encontrar a sua velha amiga Anne. Mas a procura por Anne não será tanto pela sua pessoa, mas por aquilo que ela simboliza. 

Ao fazê-lo, Folman mergulha os leitores nas memórias dos dia passados no anexo secreto onde se escondia a família de Anne Frank, e leva-nos a refletir sobre aquilo que foi o Holocausto e o que isso representou para Anne Frank e para tantas outras crianças e adolescentes que foram afetadas pelo mesmo. Explora também, expectavelmente, a relevância e pertinência de um documento tão indispensável como o diário de Anne Frank para entendermos o que foi o holocausto e como foi a perseguição feita aos judeus numa Europa controlada pelos nazis.

À procura de Anne Frank, de Ari Folman e Lena Guberman - Porto Editora
Os intuitos destes livro - cujo seu lançamento também foi acompanhado pelo lançamento do filme de animação homónimo na plataforma Netflix - são, pois, deveras relevantes. A história de Anne, sendo triste, não deve ser esquecida. Nem pelos adultos do tempo atual, nem pelas crianças. 

Mesmo assim, esta história que se apoia de uma maneira algo rocambolesca em Kitty, pareceu-me um pouco mais forçada do que o aceitável. São feitos vários paralelismos entre a holocausto e a crise de refugiados que tem afetado a Europa no período mais contemporâneo que vivemos. A analogia pode ser interessante - especialmente para uma criança que leia o livro - mas parece-me algo rebuscada para um adulto que saiba discernir o quão diferentes, mesmo podendo ter algumas semelhanças, são os dois momentos da história que Ari Folman compara. 

Repito que é um livro que se lê bem, especialmente direcionado para crianças e adolescentes, mas que talvez não corresponde à expectativa de um adulto. E isso é algo que não aconteceu em Diário de Anne Frank, do mesmo autor. Esse livro - que recomendo vivamente - pode e deve ser lido por crianças, jovens e adultos.

À procura de Anne Frank, de Ari Folman e Lena Guberman - Porto Editora
Os desenhos de Lena Guberman são bastante agradáveis, com um traço moderno, simples e expressivo. Por vezes, sente-se que alguns cenários estão despidos em demasia e isso acaba por ser atenuado pela autora através da utilização de alguns bem conseguidos efeitos de luz e cor, de forma digital. Relembra bastante o tipo de desenhos que hoje em dia podemos encontrar em alguns desenhos animados da televisão, o que faz duplamente sentido por, como já disse, ter saído uma versão animada para filme deste À Procura de Anne Frank. É, pois, um estilo de ilustração que funciona bem nas duas plataformas: no cinema e na banda desenhada.

A edição da Porto Editora é bastante bem feita. O livro apresenta capa dura brilhante, bom papel brilhante e um trabalho bem conseguido ao nível da encadernação e da impressão. No final, há ainda um posfácio do autor Ari Folman.

Em suma, posso dizer que, no geral, À Procura de Anne Frankn não homenageia apenas a vida de Anne Frank, mas também convida os leitores a refletirem sobre as lições históricas e humanas que a sua história oferece, destacando a importância de lembrar e aprender com o passado para construir um futuro melhor. Contudo, e mesmo com boas intenções, este livro fica bastante aquém da adaptação para banda desenhada do Diário de Anne Frank, do mesmo argumentista.


NOTA FINAL (1/10):
6.9



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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À procura de Anne Frank, de Ari Folman e Lena Guberman - Porto Editora

Ficha técnica
À Procura de Anne Frank
Autores: Ari Folman e Lena Guberman
Editora: Porto Editora
Páginas: 160, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 204 x 280 mm
Lançamento: Abril de 2022

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