segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Séries de BD de culto que ficaram esquecidas pelas editoras portuguesas

séries de bd de culto que ficaram esquecidas pelas editoras portuguesas


Séries de BD de culto que ficaram esquecidas pelas editoras portuguesas
Com aquilo a que eu chamo "advento da BD em Portugal" a acontecer, sensivelmente, de há 5 anos para cá, começa agora a ser dada, gradualmente, uma maior aposta na banda desenhada "franco-belga" ou, como me parece mais justo dizer: "banda desenhada europeia".

É óbvio que a continuação na aposta deste tipo de livros, só manter-se-á, por parte das editoras, se os livros venderem bem. Isto parece-me uma verdade la palisse.

Não obstante, começa a haver espaço para mais livros de "bd europeia", que tanto são apreciados pelos leitores portugueses, incluindo a minha pessoa.

E, claro, as editoras poderão fazer várias coisas:
1) Trazer séries que são relativamente novas nos países de origem e que os portugueses ainda não conhecem;
2) Trazer séries que, embora já tenham alguns anos de idade, continuam novas para o público português, por nunca terem tido edição em português;
3) Trazer séries que tiveram edição integral em português mas que já são difíceis de encontrar em loja;
4) Trazer séries que, sendo parcialmente editadas em português, ficaram a meio, tendo sido canceladas antes da publicação da obra integral;

E é neste último grupo que me vou concentrar desta vez. Até porque, a meu ver, será o grupo cuja aposta por parte das editoras me parece ter o risco mais pequeno.

Os leitores de banda desenhada em Portugal saberão, tão bem quanto eu, que isto era uma prática comum por parte das editoras. Apostava-se numa série e, passados alguns números, a mesma acabava por ser cancelada. Sem que fossem dadas grandes razões por parte das editoras. Os leitores ficavam então com duas opções a fazer: ou compravam os números em falta das séries noutra língua (no meu caso, ajeito-me a ler em inglês, em francês ou em espanhol); ou ficavam sem conhecer o resto da história, deixando-a a meio. Para mim, qualquer uma das hipóteses era má. Se é verdade que cheguei a encomendar alguns livros noutras línguas, em termos de colecionismo acabava por ser desagradável pois invariavelmente, os livros de outras editoras eram diferentes em termos de formato, edição, artwork, etc. E claro, é muito mais fácil e agradável lermos na nossa língua mãe, mesmo que dominemos outras línguas. Sei que há alguns leitores – especialmente de comics – que preferem ler na língua original dos livros. Mas não me insiro minimamente nesse grupo. Ler noutra língua é sempre um plano b, para mim.

Dito isto, cada um dos leitores que ler este artigo lembrará, certamente, um bom conjunto de séries de bd das suas preferências, que ficaram a meio, contra sua vontade. Esta poderia, portanto, ser uma lista muito grande.

Mas vou apenas focar-me em três séries que lamento muito que tenham sido esquecidas por parte das editoras. Quem sabe, algum editor português não lê este artigo e não equaciona a possibilidade de editar uma destas obras! Estou certo que seriam "boas apostas". E não digo isto baseado nos meus gostos pessoais apenas, pois tratam-se de séries muito aclamadas por público e crítica, que conquistaram inúmeros prémios.


Sambre, Yslaire
Sambre, de Yslaire
Na verdade, o primeiro ciclo desta série até foi publicado na íntegra em portugal pelas editoras Baleia Azul (Tomo 1) e Witloof (Tomos 2, 3 e 4). No entanto, a história é densa e continuou a crescer para muitos mais livros, o que faz com que a parcela do total da obra que foi publicada em português, seja mínima. Não compreendo como nenhuma editora pega nesta série. Parece-me até que consegue agradar a um público masculino e, ao mesmo tempo, feminino, dada a natureza de "romance vitoriano gráfico". Quando, há uns meses entrei numa livraria em Bruxelas e vi que o maior destaque de toda a loja estava a ser dado à série Sambre, pensei para mim mesmo: "Esta série pode(ria) ter um mercado enorme, também em Portugal". É uma série multi-premiada que nos conta a história de uma família rural burguesa do século XIX, cujo protagonista, Bernard Sambre, se apaixona por Julie, uma jovem vagabunda de olhos vermelhos que a sua família odeia ao nível da superstição. A série principal Sambre já conta com 8 livros publicados e a série paralela, intitulada a Guerra dos Sambre, já tem 9 livros editados. Em Portugal, destes 17 livros, apenas 4(!) foram editados. É verdade que esses 4 álbuns fecharam o primeiro ciclo da saga, repito. Mas há tanto mais para ler desta fantástica série de enorme qualidade! Acredito piamente que a Editora que pegar nesta série vai ter muito sucesso com ela!


Armazém Central, Régis Loisel e Tripp
Armazém Central, de Régis Loisel e Tripp
Antes ainda de falar sobre Armazém Central, faço um comentário sobre o autor. De facto, sobre Régis Loisel e a sua qualidade de desenho e capacidade sublime para contar uma história, apenas posso abanar tristemente a cabeça e pensar: "COMO É POSSÍVEL QUE A OBRA DESTE AUTOR ESTEJA TÃO DEFICIENTEMENTE PUBLICADA EM PORTUGAL?". Desculpem o uso do CAPSLOCK mas é algo que me deixa verdadeiramente indignado. Régis Loisel é incontornável na banda desenhada europeia – e até mundial. Já ganhou inúmeros prémios pelas suas várias obras, tendo até trabalhado para os estúdios Disney em filmes como Mulan ou Atlantis. A sua série mais aclamada, Em Busca do Pássaro do Tempo é também a série mais publicada em Portugal, mas mesmo esta, ficou a meio, tendo sido publicados em português, salvo erro, apenas os primeiros 6 álbuns da série constituída por 9 tomos. Mas ainda que seja uma série excelente de banda desenhada, quero-me debruçar em duas obras que considero ainda mais injustamente esquecidas em Portugal.
A primeira é Armazém Central e apenas um terço da série foi publicado em Portugal. Armazém Central leva-nos a uma pequena aldeia da região do Quebeque, no Canadá, onde são relatados os eventos que aí se passam de forma sublime e adulta, com uma qualidade de desenho e cor que estão, segundo os meus gostos e padrões, entre o que de melhor já se fez em banda desenhada. Eu sou suspeito a falar porque coloco esta entre as minhas 5 séries de banda desenhada preferidas. Dos 9 álbuns que compõem a série original, apenas 3(!) foram publicados em português pela Asa. E lembro-me que houve um grande distanciamento temporal entre o Tomo 2 e o Tomo 3. Também em Bruxelas, cheguei a ver esta série publicada em versão integral, separada por 3 volumes (cada volume com 3 dos 9 tomos). Talvez pedir isso fosse demais (e talvez o mercado português não reagisse) mas, pelo menos, terminar esta fantástica série, estou certo que seria aposta ganha para a editora que o fizesse.


Peter Pan, Régis Loisel
Peter Pan, de Régis Loisel
E o mesmo pode ser dito de Peter Pan. Esta adaptação livre da obra de J. M. Barrie, por Régis Loisel, é como se fosse uma forma mais adulta e menos encantada de olhar para este clássico da literatura. O desenho continua a ter a marca inconfundível de Loisel. É constituído por seis volumes e em Português (pasmemo-nos!) foram editados 4 números, não terminando a série por meros e escassos 2 tomos! Sei também que há uma versão integral – em inglês e em francês - num só volume desta obra. Neste caso, até me parece que a edição integral poderia funcionar em Portugal. Seria um álbum de 300 e muitas páginas e mesmo com um possível preço de 40 ou 50€, acho que haveria mercado para esta obra premiada de Loisel. Mas se isso for sonhar demais, pelo menos a edição normal do quinto e sexto tomo deveria acontecer e penso que registaria boas vendas.





Finalizando, e não querendo ser muito exaustivo, há muitas séries de banda desenhada - para além das 3 que aqui menciono, repito - que foram deixadas incompletas por parte das editoras portuguesas, o que abre uma janela de oportunidade para que, as editoras mais antigas que se mantêm ativas ou as novas que entretanto apareceram, saibam aproveitar este vazio que falta preencher, em seu proveito. Caso algumas destas coleções fossem (re)editadas ou terminadas, estou certo que muitas pessoas comprariam de forma "compulsiva e obrigatória".


Abaixo deixo algumas pranchas das 3 séries que mencionei neste post:


Sambre:




Sambre, Yslaire
Sambre, Yslaire

Armazém Central:
Armazém Central, Régis Loisel e Tripp
Armazém Central, Régis Loisel e Tripp

Peter Pan:
Peter Pan, Régis Loisel
Peter Pan, Régis Loisel
Peter Pan, Régis Loisel
Peter Pan, Régis Loisel
Capa da Edição Integral Francesa










6 comentários:

  1. Tem toda a razão! E também poderiam publicar Lefranc, que por cá só apareceu em 2 ou 3 álbuns, Cavaleiro Ardent quer também parou no 4 volume, Alix que também parou de ser editado por cá já há bastante tempo, e muitos outros. Precisamos de álbuns novos de BD e não repetições contínuas como estão as editoras a fazer.

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    1. Caro António, obrigado pelo seu comentário. Sim, são de facto muitas as séries que ficaram a meio. E noto avidez dos leitores portugueses para comprarem estas séries que ficaram paradas. Vamos ver se as editoras conseguem percepcionar isso e dar o próximo passo.

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  2. Na verdade, não tenho tanta certeza que as várias séries aqui referidas tenham mesmo grandes vendas que justifiquem o arriscar de adquirir os seus direitos e a sua edição. Pessoalmfnte, tenho os 3 Arm. Central em portug. E ja comprei os 6 finais em francês. E estando já cansado de séries qye ficaram a meio, será muito dificil voltar a ganhar a minha confiança. Sendo que a AdL e a AdA estão a arriscar algumss coisas e até agora, estão a cumprir...

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    1. Caro Xico manel, obrigado pelo seu comentário. Pois, eu também não posso ter a certeza que seriam séries com grandes vendas. E tal como comentou o José Hartvig Freitas sobre este assunto, uma das causas do cancelamento de uma série, pode ser as fracas vendas que tem. Ainda assim, sempre que falo com leitores de bd, fico com a ideia que se as colecções que foram interrompidas voltassem a ser lançadas, esses mesmos leitores correriam às bancas para comprar essas séries. E claro, são séries que poderiam ir buscar um novo grupo de leitores que ainda não as conhecem. Também concordo consigo em relação ao bom trabalho que a Arte de Autor e a Ala dos Livros estão a fazer.

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  3. Excelente artigo de opinião com o qual estou completamente de acordo. Dou o exemplo do que a Arte de Autor fez com Corto Maltese e Bouncer e a Ala dos Livros com Comanche e o que vai fazer com Matteo para concluir que é uma aposta válida.
    De realçar também o trabalho excelente que a Gradiva tem vindo a fazer e esperar que as novas séries Bruno Brazil (era excelente a parceria Público/ASA editar a 1ª série na totalidade) e o Guardião tenham muito sucesso.
    Completamente de acordo em relação às obras de R.Loisel (também estou pendurado em todas elas) e aproveito também para destacar O Escorpião e o Ciclo de Cyann como séries que gostava de ter a sua continuação em Português.
    Por outro lado a minha maior desilusão vai para a ASA pois detém os direitos de várias coleções como por exemplo XIII, Largo Winch, I.R.$. que na minha opinião teriam vendas garantidas e não edita a sua continuação em Português.
    Para finalizar estou com o António a pedir a publicação de Lefranc e a continuação de Alix do grande Jacques Martin e um desejo antigo Barba Ruiva de Charlier/Hubinon na totalidade em Português, séries estas que penso que teriam muito boas vendas em Portugal.
    Vamos ter esperança que alguma editora em Portugal faça estas apostas...

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  4. Caro ziggyst, obrigado pelo seu comentário e pelas palavras de incentivo. Sim, a Arte de Autor e a Ala dos Livros parecem estar a perceber esta lacuna e rentabilizar isso a seu favor. Ganham as editoras e ganham os leitores. Mal posso esperar pela continuação de Mattéo, também!
    E sim, a Gradiva parece estar no bom caminho. A série do Escorpião também é um bom exemplo de uma série que conquistou muitos fãs - incluindo a minha pessoa - mas que, uma vez mais, ficou posta de lado.

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