sexta-feira, 10 de abril de 2020

Análise: Dylan Dog: O Imenso Adeus

Dylan Dog: O Imenso Adeus, de Marcheselli, Sclavi e Ambrosini


Dylan Dog: O Imenso Adeus, de Marcheselli, Sclavi e Ambrosini

Depois de recentemente ter sido publicada uma análise a Dylan Dog: Após um Longo Silêncio, chega agora a vez de Dylan Dog: O Imenso Adeus, receber a sua análise. Ambos os livros foram publicados ao mesmo tempo, em Março de 2020, pela Editora A Seita.

E, mais uma vez, A Seita merece uma palavra de apreço por estar a oferecer ao mercado português banda desenhada de qualidade superior, que marcou (e marca) o género europeu, mais concretamente o fumettiDylan Dog: O Imenso Adeus é uma verdadeira maravilha. Narrativa soberba, com uma profundidade a roçar o poético, que remete todo e qualquer leitor para os seus tempos de adolescência. Quando os sentidos eram virgens, os sonhos eram infinitos e as possibilidades eram inesgotáveis. 

Se alguém que nunca leu um livro de Dylan Dog me perguntar qual será o primeiro livro que deve escolher para se iniciar nas aventuras desta personagem incontornável da banda desenhada mundial, direi este O Imenso Adeus. É um excelente ponto de partida para começar a desbravar este herói misterioso.

A história de O Imenso Adeus, foi imaginada por Mauro Marcheselli, com o argumento escrito por Tiziano Sclavi e as ilustrações asseguradas por Carlo Ambrosini, e é marcada pelo reencontro de Dylan Dog com uma paixão antiga da sua juventude, Marina Kinball, uma sensual loira, que aparece no escritório de Dylan, passados cerca de vinte anos, desde a altura em que tinham estado juntos, num verão que viria a ser inesquecível para ambos. Porém, Marina não sabe como ali chegou e, suspeitando tratar-se de uma viagem que foi feita ao nível do inconsciente, presumivelmente devido a um estado sonambulismo, ambos começam uma viagem de carro para levar Marina, de volta a Moonlight, a sua localidade. E embora esse retorno seja feito no célebre Volkswagen carocha de Dylan Dog, depressa este caminho se torna metafísico, carregado de simbolismos, como se a viagem de ambas as personagens os levasse às profundezas do seu passado a dois, dos seus sonhos, das suas inseguranças naturais da juventude.

É um livro puro, carregado de uma intensa melancolia nostálgica que nos arranca da nossa realidade e nos transporta para mil lugares perdidos no (nosso) passado, por aventuras vividas, por palavras que ficaram por dizer e por gestos que ficaram por fazer. Possivelmente, todos nós vivemos algo assim nas nossas vidas, em algum tempo e em algum lugar. Romances de verão que nos faziam imaginar um futuro por acontecer. E independentemente dos nossos desejos da adolescência, a vida até pode ter seguido outro rumo. Mas por vezes, as memórias assaltam-nos o pensamento, remetendo-nos para esses tempos felizes, que não voltam mais. Podemos voltar a esses momentos, através do pensamento, mas cada vez que o fazemos – e à medida que vamos amadurecendo – a nossa percepção vai mudando ligeiramente. E por vezes, já nem sabemos se determinada memória feliz foi exatamente como a recordamos ou se o passar do tempo e os nossos sentimentos e saudade, não salpicam essas memórias de floreados, romancendo, talvez, e ainda mais, a memória de uma existência feliz já longínqua. Será que quem relembra um conto, floreia sempre um ponto?

Quanto à arte, diria que é um livro que está ao nível daquilo a que Dylan Dog já nos habituou, mesmo tendo em conta, que os ilustradores vão mudando entre livros. Por vezes a arte, pareceu-me algo arcaica e que alguns pormenores, especialmente algumas expressões de Dylan, poderiam ter recebido mais trabalho e aperfeiçoamento. No entanto, isso não belisca a qualidade do livro. Assinale-se ainda um destaque positivo para a alternância entre estilos de ilustração, quando somos remetidos para o passado (uso de aguarelas) e quando regressamos ao presente (o clássico uso de tinta da china).

A fantástica capa da versão
norte-americana de O Imenso Adeu
Há no entanto algo a dizer que me merece um parágrafo nesta análise. A capa do livro. Se a história é boa, se a a arte é boa... grande parte das capas dos livros de Dylan Dog parecem-me bastante amadoras, muito presas ao passado e com muito pouco appeal comercial. E a capa deste Imenso Adeus, não é exceção. O que é uma pena. Provavelmente, os leitores com mais idade, que já conhecem Dylan Dog, não se importarão com este assunto e talvez até gostem que as capas tenham este estilo revival, em consonância com as capas originais. Mas penso que os leitores mais jovens que deambulam por uma qualquer livraria e dão de caras com uma capa como O Imenso Adeus, simplesmente não pegam no livro. Fui então investigar e detetei que, para o mercado norte-americano há uma capa espectacular que coloco aqui ao lado direito. Essa sim, já é meio caminho andado para que um potencial leitor se aproxime do livro na loja e, por ventura, o acabe por comprar. Seria possível fazer o mesmo para os próximos Dylan Dogs lançados em Portugal? Não sei que poder A Seita terá para escolher as capas dos livros. Se calhar, não tem poder para isso. Mas caso possa escolher entre várias alternativas, penso que pode fazer algo quanto a isto, no futuro. E atenção que este tema das capas pouco sexys de Dylan Dog, não é um tema apenas em O Imenso Adeus. Olhando para todos os Dylan Dogs já publicados em Portugal, apenas Mater Morbi (publicado pela Levoir) e Até que a Morte Vos Separe (publicado pela G. Floy) têm capas que considero magníficas, quer no conceito, quer na arte. Depois temos Terras Profundas (A Seita) que me parece aceitável. Fora essas, O Velho que Lê (G. Floy), Os Inquilinos Arcanos (Levoir), Após um Longo Silêncio (A Seita) e este O Imenso Adeus, têm capas que considero medíocres. “Fraquinhas”. Já para não falar na Saga de Johnny Freak (da Levoir) que é uma capa tão má que até me parece uma anedota. Algo que parece gozar e ofender a qualidade inquestionável desse magnífico livro. Note-se que todos estes livros são muito bons. Mas têm quase sempre capas fracas que simplesmente estão a anos luz do conteúdo dos livros. Um claro exemplo de não devermos julgar um livro pela sua capa.
No entanto, e por mais que essa frase seja bonita, cada vez mais, uma capa de um livro de banda desenhada, é a primeira coisa que desperta vontade de aquisição por parte do leitor. Deixo, pois, o meu comentário e a minha sugestão à Editora A Seita. 

Mas deixemos a capa de lado e concentremo-nos no todo que é O Imenso Adeus: uma autêntica maravilha de ler e de acompanhar, e um regalo aonde mergulhar de tempos a tempos, pressupondo novas leituras no futuro. Portanto, é um daqueles para figurar numa boa estante de bd. Já é frequente e natural que os livros de Dylan Dog tenham algum tipo de introspeção sobre a vida mas aquilo que O Imenso Adeus faz, parece ir ainda mais longe. Um leitor com uma forte sensibilidade e - atrevo-me a dizer – maturidade, vai adorar este livro. É mais do que recomendado. Um dos melhores do ano.

NOTA FINAL (1/10):
9.2

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Ficha Técnica
Dylan Dog: O Imenso Adeus
Autores: Mauro Marcheselli, Tiziano Sclavi e Carlo Ambrosini
Editora: A Seita
Páginas: 104, a preto e branco
Encadernação: capa dura

2 comentários:

  1. Não surpreende este título do dylan dog ser bom,Dylan dog tem histórias muito boas,o que me surpreende é falta de aposta das editores portuguesas nos títulos da Bonelli que tem tanta coisa boa de muita qualidade tanto no argumento como no desenho.uma Polvo que editou meia dúzia de tex é muito pouco e faltam títulos em Portugal como dragonero,Júlia,Nathan never,deadwood dick,Shangai devil,face oculta,dampry,lilth,Morgan Lost,Brad barron mister no,chanbara,Tex Wilker,mágico vento

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  2. Caro, António Silvestre. Obrigado pelo seu comentário. De facto, há muita coisa do universo Bonelli que (ainda) não existe em Portugal. No entanto, é verdade que as coisas estão a mudar de há uns 3 ou 4 anos para cá, não acha? O que é muito positivo, claro.

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