Ainda o ano 2025 vai tão no seu começo e uma coisa já é óbvia para mim: Um Oceano de Amor figurará entre as minhas melhores leituras de banda desenhada do ano! Este é um livro delicado, belo, poético, original, marcante e que, através de todas as sensações que evoca, nos consegue tocar de tal forma que ora vamos às lágrimas de comoção, ora vamos às lágrimas de riso. Ainda não chegou às livrarias portuguesas - deverá estar disponível a partir de 4 de Março - mas já tive o privilégio de o ler.
E começo por falar da edição. Esta é uma aposta da editora ASA que me parece algo "arriscada". E porquê? Bem, porque estamos a falar de um livro que foi originalmente lançado há mais de 10 anos, em 2014, e que, para além disso, ainda é mudo. Não há qualquer fala ou balão. A aposta da ASA assume-se, pois, como "arriscada", embora extremamente bem-vinda, porque é bem possível que muitos dos leitores portugueses já tenham tomado contacto com uma edição estrangeira deste livro. E, sublinho, tendo em conta que a obra não tem qualquer texto, esses leitores portugueses bem que podem ter comprado a edição húngara ou finlandesa da obra - se existirem - pois, certamente a perceberam do mesmo modo.
Portanto, e tendo em conta a recentemente incrementada aposta da ASA em banda desenhada de primeira qualidade, parece-me que a razão da aposta da ASA neste Um Oceano de Amor se prende apenas com isso mesmo: a sua qualidade intrínseca. É a aposta em depositar no mercado nacional uma banda desenhada de qualidade superior a que é difícil ficar indiferente. E isso merece o meu aplauso!
De resto, este era um livro que há muito eu queria ler. Já o tinha folheado várias vezes em loja, mas, por razõe$ várias, não o tinha ainda comprado. E ainda bem que agora temos o livro disponível em Portugal! Porque é um livro maravilhoso!
A edição da obra é em capa mole sem badanas. No miolo, o papel é baço e de boa qualidade, com uma boa impressão e uma encadernação aceitável. Dada a qualidade da obra, acho que a mesma merecia uma edição em capa dura ou, pelo menos, em capa mole com badanas. No entanto, e pelos motivos apontados mais acima, creio que a editora apostou numa edição mais humilde - ou não tão cara de produzir - devido ao risco de editar a obra. Como se fosse um risco assumido, mas controlado. É uma suposição apenas, atenção. Seja como for, a edição é boa. Não é fantástica, mas é boa. Portanto, não tenham medo de a adquirir. E, sim, este é mesmo um daqueles livros para colocarem na vossa lista de compras.
Falando agora sobre a obra em si, permitam-me dizer-vos que Um Oceano de Amor nos conta a história de um pescador da Bretanha. Como tantos outros, todos os dias se levanta ainda de madrugada para se fazer ao mar, como forma de salvaguardar o seu ganha-pão. Mas há um dia em que o seu pequeno barco é acidentalmente pescado por um gigante navio-fábrica, daqueles que em poucos segundos arrastam cardumes inteiros para as suas enormes redes de pesca. Isso obriga a que o pescador não volte para casa onde a sua devota esposa está à sua espera.
Este é o gatilho para que o leitor embarque nesta aventura que se divide em duas jornadas paralelas: a do próprio pescador, que tenta sobreviver num mar que raramente dá tréguas, e a da sua esposa que, corajosamente, põe mãos à obra de forma pró-ativa e vai tentar encontrar o seu marido onde quer que ele esteja. Sobre a história sinto que não devo dizer mais nada, pois é nesta jornada dupla que a aventura, a ilusão e a beleza deste livro estão contidas.
E ainda que seja um livro sem qualquer fala, permitam-me dizer-vos que o argumento arquitetado por Wilfrid Lupano (também autor de Branco em Redor, da Arte de Autor, entre muitas relevantes outras obras) é verdadeiramente impressionante. A história está carregada de bons momentos - alguns divertidos, outros tristes e ainda outros que até nos fazem refletir sobre a atual sociedade - e nunca parece forçada, longa ou curta demais. Está na medida certa.
Se a história é bela, os desenhos de Grégory Panaccione são um autêntico deleite para a vista! As bandas desenhadas mudas são sempre um grande desafio para os desenhadores, pois importa fazer passar o sentido e significado da história sem a ajuda das palavras. Os desenhos, os eventos, os cenários e as expressões das personagens têm que ser, consequentemente, inequívocos na interpretação. E aqui, são-no certamente. Panaccione consegue mergulhar-nos nas expressões profundas, nos momentos hilariantes e nas situações mais introspetivas de forma magistral.
Os desenhos são bastante "cartoonescos", com Panaccione a oferecer-nos um traço caricatural e incrivelmente expressivo, que facilmente cativa o leitor. São "bonecos" com expressões demarcadas que nos conquistam e nos tocam perante as adversidades com que se deparam ao longo das suas caminhadas. O desenho da imensidão do mar também é especialmente bem conseguido por parte do autor, que parece agarrar em nós, leitores, e largar-nos em plenas vagas do oceano revolto.
Para que os desenhos sejam tão belos e, em certa medida, tão oníricos, também conta que as ilustrações sejam magnificamente coloridas através de aguarela, o que dá um aspeto requintado e artístico a toda a arte visual. No fundo, é um livro que dá gosto apreciar, perdendo em algum tempo com cada ilustração, seja ela grande ou pequena em dimensão.
Acima de tudo, e em conclusão, Um Oceano de Amor revela-nos a quantidade de coisas que podemos dizer sem emitir qualquer palavra, a quantidade de sons que podemos emitir sem produzir qualquer ruído e a quantidade de amor, emoção e ternura que um conjunto de rabiscos coloridos - vulgo, desenhos - conseguem produzir no leitor. É magia aquilo que Lupano e Panaccione conseguem fazer neste livro, transformando-o numa obra prima da banda desenhada e num livro absolutamente obrigatório!
NOTA FINAL (1/10):
10.0
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Um Oceano de Amor
Autores: Lupano e Panaccione
Editora: ASA
Páginas: 224, a cores
Encadernação: Capa mole
Formato: 275 x 206 mm
Lançamento: Fevereiro de 2025
As badanas obrigam a que se gaste mais papel por livro, e por consequência, há menos aproveitamento e gastam-se mais folhas de papel no total.
ResponderEliminarAs badanas também obrigam a um outro processo para fazer os vincos, implicando uma outra máquina + um molde específico que dependendo do tamanho do livro, pode ser necessário criar um novo molde junto dos fornecedores.