Análise: Ava - Quarenta e Oito Horas na Vida de Ava Gardner

AVA - 48 Horas na Vida de Ava Gardner, de Emilio Ruiz e Ana Miralles

Lançado durante o último Amadora BD pela editora Ala dos Livros, Ava - Quarenta e Oito Horas na Vida de Ava Gardner, é uma banda desenhada da autoria de Ana Miralles e Emilio Ruiz, que nos oferece um retrato íntimo de Ava Gardner, uma das maiores estrelas de Hollywood dos anos 1950. 

A narrativa, tal como o subtítulo assim faz prever, centra-se em dois dias da vida de Ava Gardner durante a sua visita ao Rio de Janeiro em 1954, com o intuito de promover o emblemático filme A Condessa Descalça. 

Os autores espanhóis partem destas 48 horas para nos pintarem um retrato, quer a nível físico, quer a nível psicológico, de quem foi Ava Gardner, por muitos considerada uma das mulheres mais bonitas de sempre. Mas por detrás de todo esse glamour da época dourada do cinema americano, de toda a beleza e charme de Ava, também havia uma mulher que tinha as suas vulnerabilidades e problemas pessoais. Como qualquer outra pessoa, diga-se, porque - e convém não esquecer - mesmo as pessoas que idolatramos são isso mesmo: pessoas. Que, como é natural, têm virtudes e defeitos. Logicamente, Ava também os tinha.

A escolha desta viagem de Ava Gardner ao Brasil em concreto também permite à narrativa o alcance de duas valências: por um lado, e isto é facto histórico, esta foi uma viagem marcada por muitos incidentes - com episódios que envolveram a polícia brasileira ou a repulsa de Ava pelo constante assédio da imprensa local - não tendo a experiência sido agradável - de todo! - para a atriz; por outro lado, na data desta visita, o Brasil vivia um momento político conturbado, marcado pelo recente suicídio do presidente Getúlio Vargas, e este contexto histórico adiciona profundidade à narrativa, contrastando a exuberância da estrela de cinema com a tensão política do país anfitrião. Com efeito, a presença de Ava Gardner na cidade gera um frenesim mediático e popular, refletindo a adoração do público por Ava e, ao mesmo tempo, a insatisfação da imprensa local perante uma certa altivez de Gardner.

A atriz é, pois, retratada neste Ava como uma mulher que desafiava as convenções da época, procurando a mesma liberdade que os homens, o que muitas vezes a colocava em situações controversas. Esta representação humaniza a figura icónica, mostrando-a como alguém que lutava contra as expectativas impostas pela sociedade e pela indústria cinematográfica onde, naturalmente, havia um grande machismo porque, embora Ava tivesse tido três casamentos - e isso fosse alvo de imensas críticas e controvérsias - ninguém criticava que esses seus três maridos somassem, entre eles, vinte casamentos. Eram homens, portanto estava tudo bem.

A relação de Ava Gardner com a imprensa e com o público acaba por nos ser dada em catadupa, já que a constante exposição mediática e as especulações sobre a sua vida pessoal eram temas recorrentes, evidenciando o peso da fama e as suas implicações na esfera privada. Este aspeto da narrativa bem arquitetada por Emilio Ruiz convida à reflexão sobre a dicotomia entre a imagem pública e a realidade pessoal das celebridades, uma questão ainda pertinente nos dias de hoje.

Se acho que Emilio Ruiz teve o mérito de numa janela temporal de apenas 48 horas nos ter dado uma fotografia bastante plausível da personalidade e dos dramas pessoais de Ava Gardner, por outro lado também considero que senti a falta de um enredo mais denso que acompanhasse uma linha temporal maior e, consequentemente, tivesse mais eventos e pedaços da vida desta singular mulher. Ava acaba por ser um mero vislumbre da célebre atriz que, embora rico, me soube a pouco.

Ana Miralles captura com verdadeira mestria a essência de Ava Gardner, oferecendo-nos um livro que, em termos de ilustração, é lindo da primeira à última página! Os traços delicados e expressivos de Miralles transmitem não apenas a beleza e sensualidade estonteantes da atriz, mas também as suas emoções mais íntimas. E as lindíssimas cores a aguarela, bem como os cenários exteriores detalhadamente pormenorizados, evocam a atmosfera vibrante do Rio de Janeiro dos anos 50, transportando o leitor para o centro dos acontecimentos. O detalhe realista das expressões das personagens - com especial ênfase para a protagonista - é impressionante e a própria ilustração utilizada para a capa do livro é digna de figurar num museu de pintura!

A edição da Ala dos Livros é de belíssima qualidade como, aliás, a editora nos vem habituando. O livro apresenta capa dura baça, bom papel brilhante no miolo e uma excelente encadernação e impressão. Como extras, encontramos um esboço no final do livro e uma nota introdutória sobre Ava Gardner, escrita por Elisabeth Gouslan.

Em suma, Ava - Quarenta e Oito Horas na Vida de Ava Gardner é uma homenagem sensível e bem elaborada à célebre e bela atriz. Ana Miralles e Emilio Ruiz conseguem, em poucas páginas, capturar a essência de Ava Gardner, oferecendo uma perspetiva única sobre a sua vida e personalidade. A obra é recomendada não só para fãs da atriz, mas também para todos os apreciadores de cinema e das vicissitudes que a fama também traz. Como diria Dave Pirner, um dos meus músicos favoritos, "success is not so sweet".

NOTA FINAL (1/10):

8.8

Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020

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Ficha técnica

AVA - 48 Horas na Vida de Ava Gardner

Autores: Emilio Ruiz e Ana Miralles

Editora: Ala dos Livros

Páginas: 112, a cores

Encadernação: Capa dura

Formato: 235 x 320 mm

Lançamento: Outubro de 2024