sexta-feira, 22 de maio de 2020

Análise: Verões Felizes – 2 (Menina Esterel e O Repouso do Guerreiro)



Verões Felizes – 2 (Menina Esterel e O Repouso do Guerreiro), de Zidrou e Jordi Lafebre

Para aqueles que estão a iniciar esta leitura sem terem lido a análise que foi feita, há uns dias, a Verões Felizes 1, é recomendável que passem por e leiam esse artigo antes deste, pois, de alguma forma, contextualiza esta banda desenhada maravilhosa, explicando, de forma mais extensiva e analítica, porque é que Verões Felizes é tão bom e tão obrigatório para todos os que gostam de banda desenhada. E não só.

Neste segundo livro, publicado pela Arte de Autor em Maio de 2020, volta a ser-nos concedido um posto de observação nas férias da família Faldérault. Como se fôssemos uma pequena mosca que tem o privilégio de observar de perto, como funciona esta família. Sem filtros e sem pudores. Da maneira mais pura e genuína. E a experiência, mais uma vez, continua a ser gratificante, enternecedora e nostálgica, deixando-nos com um nó na garganta, por nos conseguirmos rever em todos os momentos mais difíceis que esta família enfrenta, mas fazendo-nos igualmente sorrir, por todas as experiências que, tal como esta família belga, também nós experenciámos com aqueles que nos são mais próximos: a nossa família.

Neste segundo lançamento, que reúne os tomos Menina Esterel e O Repouso do Guerreiro, recuamos e avançamos no tempo, respetivamente, em relação aos tomos do primeiro livro.

Em Menina Esterel, recuamos até 1962, quando o casal Faldérault era mais jovem e ainda só tinha as duas primeiras filhas - Julie-Jolie e Nicole - e decide ir de férias, com os pais de Madô, com o destino de Saint-Etienne, a contra-gosto de Pierre, que queria ir para a costa mediterrânica. Este tomo assume um tom ligeiramente diferente dos demais, pois traz consigo a introdução de elementos mais negativos, como, por exemplo, todas aquelas discussões e desacordos universais entre pais e filhos – que também existem em todas as famílias, diga-se. Neste caso, quem assume as funções de “pessoa do contra”, sempre a contradizer tudo e todos, e a impor a sua vontade perante a dos outros, é Yvette, a avó das crianças, mãe de Madô. Este número parece-me, talvez, um pouco menos idílico do que os anteriores – e do que o tomo seguinte - porque foca-se nas dificuldades que quaisquer relações interpessoais, seja entre filhos e pais ou entre genros e sogras, enfrentam. Nomeadamente na diferença entre opiniões como, por exemplo, quando os pais discordam em relação à forma como os seus filhos educam os seus netos. No entanto, não é de todo, um livro negativo. A história consegue mostrar-nos a doçura que, pelo menos nas famílias onde impera o amor, acaba sempre por vir ao de cima e superar os momentos de desacordo. Continua, portanto, a mostrar-nos o doce da vida em família, mesmo quando ela parece ser amarga. Além disso, deve destacar-se que é neste tomo que conhecemos a história de como Esterel, a emblemática Renault 4L, entra na família Faldérault.

Já no seguinte tomo, O Repouso do Guerreiro, avançamos ao ano de 1980, quando as filhas mais velhas se tornaram jovens adultas, enquanto que a filha mais nova, Pêpete, se transformou numa pequena diabrete de 9 anos. Louis continua a ser um nerd, substituindo neste quarto tomo, a sua paixão pela banda desenhada dos tomos anteriores, pela paixão pela música, ouvida no seu walkman. Neste verão, o pai, Pierre, comprou uma casa nova, chave na mão, na Provença e a família está entusiasmadíssima por ir fazer férias numa “casa a sério”, ao contrário do que tinha sido até então a prática comum desta família: as férias em campismo. Mas nem tudo é o que parece e muitas peripécias hão-de acontecer nesta história enternecedora em que Nicole, a filha rechonchuda se faz acompanhar pelo seu namorado Jean-Manu, por quem está eloquentemente apaixonada. Um livro que nos mostra aquela fase de se ser pai, em que se começa a olhar para os filhos, já não como crianças, mas como adultos que começam a escolher a sua própria vida, por si mesmos. Ensina-nos também que as alterações de planos podem (e devem) ser encaradas como algo positivo mesmo que, quase sempre, nos obriguem a reajustes de agenda e a uma boa dose de bom senso.

Acima de tudo, este segundo álbum duplo da série, mantém o tom e o estilo do volume anterior. Portanto tudo aquilo que já foi de tão especial nesse primeiro livro, regressa aqui em grande. As histórias presentes expandem-se um pouco mais, ao introduzir novas personagens, em diferentes ambientes e intervalos temporais, mas mantendo o mesmo espírito positivo da série. Há algo de especial nesta família que faz com que facilmente nos identifiquemos com as personagens, como se fossem um espelho de nós mesmos. E, como em qualquer (boa) série, fica criada uma relação entre a história e o leitor, que faz com que queiramos ler a próxima aventura dos Faldérault, mal terminamos uma. Afinal de contas, cada ida de férias desta família traz consigo muitas emoções, aventuras e momentos de introspeção. Uma obra soberba e original que merece ser (re)conhecida por todos.

Em termos gráficos, o livro mantém a qualidade do álbum anterior. Tudo o que já era bom no primeiro volume, nomeadamente um elegante desenho de estilo franco-belga, marcado por uma capacidade enorme de caracterização de expressões, por parte de Jordi Lafebre, se mantém neste segundo volume. No final do livro há cinco páginas com esquissos do autor, em que podemos vislumbrar o seu enorme talento para captação de expressões. Numa história emotiva como esta, conseguir captar tantas e tão diversas expressões, é a garantia de que, no final, temos uma obra com muita harmonia entre o texto e as imagens. A cor, que é assegurada por Lafebre e Mado Peña, também é digna de destaque pela sua beleza e harmonia.

Em conclusão, os que ainda não compraram o segundo volume, bem que podem ir correndo para as livrarias (respeitando o distanciamento social de dois metros, claro está). Quanto àqueles que ainda não compraram o primeiro volume sequer, façam um favor a vós próprios. Este é mais um forte candidato a livro do ano, num ano editorial que está a ser muito bom.


NOTA FINAL (1/10):
9.5


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020

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Ficha técnica
Verões Felizes – 2 (Menina Esterel e O Repouso do Guerreiro)
Autores: Zidrou e Jordi Lafebre
Editora: Arte de Autor
Páginas: 112, a cores
Encadernação: Capa dura

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