A Velha Guarda é uma nova série de ação, da autoria de Greg Rucka e Leandro Fernández, originalmente lançada em 2017, que chegou ao mercado português há poucas semanas, pelas mãos da editora G. Floy Studio, a propósito do lançamento do filme homónimo na plataforma Netflix, que conta com Charlize Theron no papel de protagonista.
A Velha Guarda é a história de 5 soldados imortais. Bem, na verdade, eles não são bem imortais. Eles podem morrer... simplesmente não sabem, nem quando, nem como. E são incrivelmente resistentes à morte, tendo todos eles já “morrido” várias vezes no campo de batalha mas acabando sempre – pelo menos até agora - por regressar à vida. E por esse motivo, a líder do grupo, Andy, já tem mais de 5.000 anos.
Este grupo de soldados (quase) imortais preocupa-se em deixar a sua existência secreta face à restante sociedade, mas eis que a personagem Copley consegue perceber a invencibilidade destes soldados e monta-lhes uma armadilha para comprovar as suas suspeitas. Mas Copley não agiu por vontade própria. Está a mando de um milionário sem escrúpulos e sedento deste poder da imortalidade. E é esta a ignição para a restante história deste primeiro livro.
No início, o grupo é constituído apenas por 4 soldados de mas ao terem conhecimento de uma nova imortal, uma soldado no Afeganistão, partem em sua busca. Esta nova imortal, Nile, acabará por ser relevante para que o autor permita fazer uma reflexão sobre estes estranhos poderes que as personagens detêm. Eventualmente, a narrativa torna-se algo clichet no final mas, ainda assim, parece-me que o mais importante que aqui é conseguido é, pois, o arranque de uma história original, com uma premissa que pode (e deve) ser bastante aberta e com personagens carismáticas, com destaque para a protagonista, Andy ou para o casal que Joe e Nicky formam.
Mas se isso de resistir a ferimentos mortais e chegar aos milhares de anos de idade parece empolgante à primeira vista, a verdade é que o argumentista Greg Rucka explora bem a história, extraindo dela reflexões mais profundas do que seria de prever, com o cariz aparentemente leve e de ação rápida que esta série aparenta ter à primeira vista. Na verdade, será que seria tão bom sermos imortais se víssemos todos os nossos entes queridos - e todos aqueles com quem formámos relações de afeto - morrerem à nossa frente? E se fossem os nossos próprios filhos? E os nossos próprios netos? Acabaríamos por ficar sozinhos no mundo, certo? É aí que Rucka nos entrega uma história bastante inspirada e que muito me cativou. Com personagens que, mesmo podendo ser derrotadas em combate, são muito difíceis de aniquilar de vez – porque sempre regressam à vida - Rucka foi inteligente ao trazer ao de cima estes dramas pessoais, tão mais reais e conscientes de si mesmos do que um expetável vilão fortíssimo. Teria sido fácil criar um vilão com super-poderes e que, de alguma forma também fosse imortal, tendo passado do lado do bem para o lado do mal. Mas isso seria um dejá vu. Algo demasiado óbvio. Felizmente, a história deste primeiro volume não vai por aí. E é nesta reflexão, que esta série consegue levantar, que está a sua grande mais valia, a meu ver.
Outra coisa que esta premissa permite, ao ter personagens com milhares de anos de idade, é que, em termos narrativos, se possa viajar no tempo para a frente e para trás, de forma a ilustrar sentimentos e a adensar o carácter das personagens. E isso é sempre uma boa “bengala” narrativa pois permite, de forma praticamente infinita, explorar as personagens e moldar as suas personalidades, deixando, por isso, uma porta aberta para usar ao longo da série. Porque é que esta personagem é assim? Que acontecimento a marcou? Será sempre fácil recuar no tempo, escolher um evento de relevância histórica e introduzir personagens ou acontecimentos interessantes.
Rucka aparece em A Velha Guarda especialmente inspirado, com o argumento a ser a grande valência desta banda desenhada. É por isso que vale a pena ler.
Porque em termos gráficos, não fiquei muito convencido assim. Leandro Fernández apresenta um estilo bastante rudimentar no traço, a fazer lembrar Eduardo Risso e, por vezes, os irmãos brasileiros Gabriel Bá e Fábio Moon - ou mesmo um Frank Miller em Ronin. Este tipo de traço, não sendo o meu predileto, também não é a minha queixa neste A Velha Guarda. O problema não é o traço mas sim toda a ilustração que acaba por ficar demasiado pobre na caracterização das personagens, chegando as mesmas a pareceram, por vezes, mal desenhadas e/ou construídas em cima de meros “gatafunhos”, perdoem-me a expressão.
Mas isso, claro, ainda pode ser tido em conta como “é uma questão de gosto pessoal”. Aceito. O que já não aceito tão bem, pois já não é tão subjetivo assim, é a fraca capacidade do autor em ilustrar quer emoções nas caras das personagens, quer as cenas de ação desta história. É uma história com bastante ação e alguma violência mas, muitas vezes, dei comigo a recomeçar algumas cenas de ação, voltar algumas vinhetas atrás, para perceber, sem dúvidas, o que é que estava mesmo a acontecer. E porque é que o fiz? Porque não estava claro, não estava suficientemente bem desenhado para que o leitor percebesse, inequivocamente, o que estava a acontecer.
Não nego que, em termos de arte ilustrativa, há coisas interessantes. Por vezes encontrei vinhetas muito agradáveis de admirar, planos de câmara refrescantes, uma postura ou uma expressão facial de uma personagem que admirei mas, a verdade é que considero A Velha Guarda uma boa banda desenhada, com um argumento muito interessante e cativante mas com um desenho “fraquinho” e que é meramente aceitável. E já estou a ser simpático. Com uma ilustração mais cuidada, poderia ser uma bd mais inesquecível. Julgo que a história merecia melhores desenhos.
Quanto à edição da G. Floy, estamos perante mais um trabalho de excelente qualidade. A encadernação é em capa dura, o papel é brilhante e de boa gramagem e no final ainda somos brindados com algumas capas alternativas. O habitual grau de boa qualidade a que G. Floy já nos habituou.
Em conclusão, posso dizer que tive alguns sentimentos mistos enquanto lia este A Velha Guarda. Se graficamente é uma obra que não me convenceu muito, tenho que admitir que a história e a premissa interessante que ela sustenta, me deixaram bastante empolgado e com vontade de descobrir a continuação desta série em volumes futuros. Que venham os próximos!
NOTA FINAL (1/10):
8.5
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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A Velha Guarda - Livro Um - Abrir Fogo
Autores: Greg Rucka e Leandro Fernández
Editora: G. Floy
Páginas: 184, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Novembro de 2020
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