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terça-feira, 6 de maio de 2025

Análise: Corpos

Corpos, de Si Spencer, Dean Ormston, Phil Winslade, Meghan Hetrick, Tula Lotay e Lee Loughridge - Devir - DC Comics

Corpos, de Si Spencer, Dean Ormston, Phil Winslade, Meghan Hetrick, Tula Lotay e Lee Loughridge - Devir - DC Comics
Corpos, de Si Spencer, Dean Ormston, Phil Winslade, Meghan Hetrick, Tula Lotay e Lee Loughridge

Depois de a Devir editar Batman - Três Jokers, o seu primeiro livro de 2025 oriundo do selo Black Label, da editora americana DC Comics, chegou-nos mais recentemente Corpos, que tem argumento de Si Spencer e conta com as ilustrações de Dean Ormston, Tula Lotay, Meghan Hetrick e Phil Winslade, e cores de Lee Loughridge.

Corpos é uma obra especial, que há muito queria ler - que até já teve direito a adaptação para série televisiva da Netflix - e que se destaca pela sua estrutura narrativa engenhosa e ambiciosa, ao apresentar quatro linhas temporais distintas - 1890, 1940, 2014 e 2050 -, mas que nos surgem interligadas por um único mistério: o aparecimento do mesmo cadáver em cada uma dessas épocas. Esta premissa inicial, ao mesmo tempo estranha e fascinante, estabelece de imediato um tom de mistério e profundidade que guia toda a narrativa.

Corpos, de Si Spencer, Dean Ormston, Phil Winslade, Meghan Hetrick, Tula Lotay e Lee Loughridge - Devir - DC Comics
Nesse sentido, até diria mesmo que o verdadeiro trunfo de Corpos está no modo como a obra lida com a passagem do tempo, pois cada época representa não apenas um estilo gráfico distinto, ilustrado por um desenhador diferente, mas também um conjunto temático e político específico. Londres é o pano de fundo constante, mas é interessante ver como a cidade se transforma radicalmente consoante o tempo e os olhos que a observam. Assim, logo à partida, a obra (também) é um comentário sobre a evolução (ou regressão) social, moral e tecnológica da civilização ocidental.

Embora em cada uma das diferentes linhas temporais surja o mesmo corpo, assassinado da mesma forma, cada período de tempo apresenta-nos o seu próprio detetive: o misterioso detetive Edmond Hillinghead (1890), o inspetor de passado dúbio Charles Whiteman (1940), a jovem polícia Shahara Hasan (2014) e Maplewood, uma misteriosa mulher num futuro distópico (2050). Estas personagens não conduzem simplesmente a narrativa, mas também refletem diferentes aspetos do género policial - desde o noir até ao cyberpunk  - oferecendo variações estilísticas que mantêm o leitor intelectualmente estimulado.


Corpos, de Si Spencer, Dean Ormston, Phil Winslade, Meghan Hetrick, Tula Lotay e Lee Loughridge - Devir - DC Comics
A narrativa de Si Spencer é deliberadamente fragmentada e complexa. Há momentos em que a leitura exige concentração e releitura, sobretudo quando, lá mais para a frente, os quatro arcos se entrelaçam em camadas simbólicas e narrativas. O uso de repetições e frases-chave em múltiplas épocas convida a um aumento do interesse do leitor, sugerindo que as linhas do tempo não são paralelas, mas ressonantes - como ecos que se respondem mutuamente através do tempo. 

Que o passado influencia o presente, e este influencia o futuro, já todos nós sabemos... mas pode o futuro influenciar o presente ou mesmo o passado?

Também a representação da diversidade é um elemento forte e demarcadamente assumido na obra. Que é, aliás, visível na presença de personagens que, de algum modo, desafiam a convenção social do período em que vivem. Consequentemente, encontramos uma mulher muçulmana, um polícia que parece defender as suas principais causas políticas, um detetive que reprime a sua homossexualidade e uma figura feminina misteriosa do futuro. Si Spencer trata estas identidades não como adereços, mas como peças fundamentais da narrativa e do comentário social para cada uma das épocas. O puritanismo e a corrupção policial do século XIX; o fascismo e o encobrimento no pós-guerra; a radicalização religiosa e a xenofobia na contemporaneidade; e a alienação extrema num futuro controlado e desumanizado — todos estes elementos mostram como certos fantasmas persistem em diferentes roupagens ao longo da história.

Corpos, de Si Spencer, Dean Ormston, Phil Winslade, Meghan Hetrick, Tula Lotay e Lee Loughridge - Devir - DC Comics
Confesso que, à medida que a trama foi avançando, me pareceram algo rebuscadas certas opções de enredo por parte do argumentista, fazendo com que a "cola" que une todas as histórias, bem como o mistério a envolver o(s) corpo(s) encontrado(s), se apresentassem um pouco periclitantes e forçados. A parte futurística, aquela que se passa em 2050, também não ajudou para essa minha sensação menos positiva, já que esta componente da história me pareceu mais uma divagação narrativa do que algo com mais substância. 

Mesmo assim, gostei da megalomania dos intentos narrativos desta obra que, no final, nos dá uma conclusão aberta e simbólica, oferecendo uma certa resolução factual do mistério do corpo, é certo, mas apostando mais no impacto filosófico do que numa resposta concreta. A ideia de que o tempo é maleável, e que as ações humanas reverberam para além da sua época, torna-se, pelo menos quanto a mim, o verdadeiro clímax temático da obra.

Naturalmente, as ilustrações desempenham aqui um papel fundamental na diferenciação temporal. Cada ilustrador imprime uma identidade visual única à sua secção, indo ao encontro do ambiente social e emocional do respetivo arco. O contraste entre os tons sépia do século XIX e a paleta vibrante e sintética do futuro cria um dinamismo visual que sublinha a ambição (também) estética da obra. A ilustração de Corpos não é, pois, meramente ilustrativa, mas parte integrante da construção do significado.

Corpos, de Si Spencer, Dean Ormston, Phil Winslade, Meghan Hetrick, Tula Lotay e Lee Loughridge - Devir - DC Comics
Todos os ilustradores fizeram um trabalho notável, com a minha preferência a recair nas ilustrações de Dean Ormston, para a época vitoriana de 1890. Já as ilustrações futuristas, referentes ao ano de 2050, da autoria de Tula Lotay, foram as que menos me agradaram. Mas reconheço que todos os ilustradores dão um bom contributo para o todo.

O trabalho de cores de Lee Loughridge também merece comentário, por ser tão bem conseguido na diferenciação das diferentes épocas e por atribuir um charme cromático especial a cada uma dessas distintas linhas temporais.

A edição da Devir é em capa dura baça, com bom papel brilhante no interior do livro e uma impressão e encadernção de boa qualidade. No final, enquanto conteúdo extra, encontramos cinco páginas com esboços de cada um dos autores.

Em suma, Corpos é uma banda desenhada diferenciada e ambiciosa que desafia o leitor a ver o tempo, a identidade e a justiça sob novas perspetivas. Com uma estrutura complexa, visualmente rica e ideologicamente densa, a obra de Si Spencer é um exemplo notável de como a banda desenhada pode explorar questões profundas sem sacrificar o entretenimento. É, simultaneamente, um mistério policial, uma crítica social e uma meditação existencial — e nesse equilíbrio reside a força deste Corpos.


NOTA FINAL (1/10):
8.2




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Corpos, de Si Spencer, Dean Ormston, Phil Winslade, Meghan Hetrick, Tula Lotay e Lee Loughridge - Devir - DC Comics

Ficha técnica
Corpos
Autores: Si Spencer, Dean Ormston, Phil Winslade, Meghan Hetrick, Tula Lotay e Lee Loughridge
Editora: Devir
Páginas: 208, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 18 x 27,5 cm
Lançamento: Abril de 2025

quinta-feira, 7 de setembro de 2023

Análise: Joker - Sorriso Mortal

Joker - Sorriso Mortal, de Jeff Lemire e Andrea Sorrentino - Levoir (DC Black Label)

Joker - Sorriso Mortal, de Jeff Lemire e Andrea Sorrentino - Levoir (DC Black Label)
Joker - Sorriso Mortal, de Jeff Lemire e Andrea Sorrentino

Embora a Levoir mantenha os direitos de publicação de material DC para Portugal, a verdade é que a editora tem andado arredada do lançamento de comics americanos por cá. A única exceção dos últimos três anos, foi mesmo este Joker – Sorriso Mortal, da autoria de Jeff Lemire e de Andrea Sorrentino.

É lamentável que a editora não esteja ativa nesta frente, mas posso dizer-vos que, pelo menos, está nos planos da mesma reverter esta situação, lançando mais material da DC Comics num futuro próximo. O que será o desejo de muita gente. Incluindo da minha pessoa.

Enquanto isso não acontece, focamo-nos neste Joker - Sorriso Mortal que, mesmo tendo uma história que pode parecer tudo menos original, consegue ser uma leitura consistente, que impacta o leitor, e que é especialmente recomendada para os adeptos do maquiavélico Joker (e respetivo universo Batman), bem como para todos os que apreciam um bom terror psicológico.

Joker - Sorriso Mortal, de Jeff Lemire e Andrea Sorrentino - Levoir (DC Black Label)
A história criada por Jeff Lemire, que foi originalmente lançada em três números que esta edição da Levoir reúne, assenta na personagem de Ben Arnell, um psiquiatra que está determinado a descortinar e a estudar aquilo que se passa na cabeça de Joker. O psiquiatra procura saber porque é que Joker tem as atitudes que tem e como funciona a sua cabeça. Todavia, e invariavelmente, será Joker a domar a mente de Ben Arnell, em vez do processo contrário. Onde é que já vimos isto? Bem, toda a história de Harley Quinn, que está bem explanada em Harleen, igualmente publicada pela Levoir, parece demasiado semelhante a este Joker – Sorriso Mortal. O que pode dar uma ideia de dejá vu àqueles que leiam este Sorriso Mortal e que já conheçam a história de Harley Quinn. Aliás, tendo em conta as opiniões que recolhi de pessoas próximas, o grande problema deste livro para muita gente parece ser exatamente esse: que é pouco original e que a história parece já ter sido lida anteriormente.

Se me vejo forçado a concordar com isto, também posso afirmar que Sorriso Mortal é um belo livro, que nos entretém e onde Jeff Lemire consegue captar bem a essência demoníaca, psicopata e maquiavélica da personagem de Joker. E, só por isso, já vale bem a leitura.

Joker - Sorriso Mortal, de Jeff Lemire e Andrea Sorrentino - Levoir (DC Black Label)
O psiquiatra Ben Arnell é avisado por várias pessoas próximas para que tenha cuidado com Joker, mas Ben está obstinado e considera que, estando Joker em instalações de alta segurança, não poderá fazer-lhe mal. Mas há muitas formas de fazer o mal, se alguém for criativo e manipulador como só Joker sabe ser…

Mais não digo, para não estragar nenhuma surpresa aos que forem ler a obra. Embora tenhamos que admitir que a história não seja propriamente surpreendente. Mesmo assim, e não o sendo, consegue entreter e relembrar-nos porque é que Joker é, possivelmente, o vilão mais maléfico e mais bem trabalhado de sempre. Pelo menos para os meus gostos, não há vilão algum que chegue sequer aos seus calcanhares. É sempre bom termos um livro que se concentra em Joker. Batman também marca presença, mas só o faz lá mais para o final do livro, pois não é na sua personagem que esta obra se concentra. Ou será?

Jeff Lemire brilha ao saber criar uma atmosfera intensamente psicológica, que explora as mentes das personagens de maneiras perturbadoras e sombrias. De formas que, por vezes, podem surpreender o leitor. O enfoque é, pois, nas complexidades da insanidade e da influência da personagem de Joker sobre aqueles que o estudam e/ou rodeiam.

Joker - Sorriso Mortal, de Jeff Lemire e Andrea Sorrentino - Levoir (DC Black Label)
Quanto às ilustrações, aqueles que já conhecem bem o trabalho de Andrea Sorrentino em Gideon Falls ou Primordial (obras publicadas por cá pela G. Floy Studio e igualmente escritas por Jeff Lemire), encontrarão certamente muitos pontos de contacto neste livro dedicado a Joker. O estilo de ilustração, com as personagens a apresentar uma fisionomia realista, que parece feita através do efeito de Photoshop threshold, está novamente presente nas ilustrações de Sorrentino e, portanto, bem em linha com o trabalho apresentado pelo autor nas obras que já mencionei. Admito que podem ser ilustrações um pouco estáticas, mas, no entanto, têm o dom de encaixar bem no tom sombrio e instável da história. De facto, a sua arte complementa perfeitamente a narrativa sombria, ajudando a criar uma atmosfera inquietante que envolve o leitor na história.

A planificação típica de Sorrentino, onde há espaço para muitas colagens de vinhetas muito pequenas em dimensão, ou onde as palavras – neste caso, as gargalhadas enlouquecidas de Joker – se fundem numa bela simbiose com as vinhetas, conseguindo um aspeto gráfico deveras interessante, também está bem patente nesta obra. O autor é, aliás, muito forte nessa valência e neste livro parece especialmente inspirado, conseguindo surpreender o leitor com as ferramentas gráficas narrativas de que dispõe.

Joker - Sorriso Mortal, de Jeff Lemire e Andrea Sorrentino - Levoir (DC Black Label)
Visualmente, o facto de a obra contar com a história ilustrada do Sr. Sorrisos também permite que o livro tenha uma diversidade interessante, que acaba por contribuir para a boa experiência visual que é esta obra.

Nota ainda para a ilustração da capa, que está verdadeiramente espetacular e que revela bem o nível de insanidade, que chega a incomodar o leitor, da personagem de Joker.

Em termos de edição, o livro apresenta capa dura, com bom papel brilhante e um bom trabalho ao nível da encadernação e da impressão. Inclui também quatro capas que foram usadas nos três números que compõem a mini-série que é reunida neste volume integral. Infelizmente, a lombada do livro tem uma gralha no próprio título da obra. Em vez de se ler: “Joker – Sorriso Mortal”, lê-se “Joker – Sorriso Motal”. Para corrigir o erro, a edição vem acompanhada por uma sobrecapa com o título correto. São erros que acontecem e que são chatos. Neste caso concreto, acho que a Levoir esteve bem ao fazer uma sobrecapa de forma a colmatar o próprio erro.

Em resumo, Joker – Sorriso Mortal não é uma história de super-heróis, mas antes uma exploração profunda da natureza humana e da loucura, que levanta questões sobre o que leva alguém a tornar-se num vilão e como a mente humana pode – e consegue - ser quebrada. Não sendo, de todo, original, a obra consegue criar um ambiente pesado, perturbador e inquietante que nos acompanha da primeira à última página. Uma boa dose de terror psicológico é, pois, aquilo que Lemire e Sorrentino nos oferecem neste livro.


NOTA FINAL (1/10):
7.8



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Joker - Sorriso Mortal, de Jeff Lemire e Andrea Sorrentino - Levoir (DC Black Label)

Ficha técnica
Joker - Sorriso Mortal
Autores: Jeff Lemire e Andrea Sorrentino
Editora: Levoir
Páginas: 156, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Outubro de 2022

quinta-feira, 4 de junho de 2020

Lançamento: Batman - Asilo Arkham



No passado sábado, a Levoir (re)editou Batman - Asilo Arkham, que já havia saído em Portugal, na Coleção 75 anos do Batman. Esta nova edição apresenta 33 páginas de extras.

Fiquem com a nota de imprensa e imagens promocionais:

Batman - Asilo Arkham, de Grant Morrison e Dave McKean
Em 1989, Grant Morrison e Dave McKean criaram uma das obras mais importantes da história da banda desenhada, Asilo Arkham. Com o selo DC Black Label, esta edição de coleccionador, capa dura e 33 páginas de extras, sai em banca a 30 de Maio pela mão da editora Levoir.

Tudo começa quando Batman é chamado para conter um tumulto no local, liderado por Joker que sequestrou diversos médicos que trabalham na instituição, como a terapeuta Dra. Ruth Adams – que fazia tratamentos pouco ortodoxos lá dentro – e o administrador Dr. Charles Cavendish.

Joker começa por fazer um grande jogo com o Cavaleiro das Trevas, que se vê obrigado a enfrentar vilões como Duas-Caras, Chapeleiro Louco, Crocodilo, Cara de Barro, Espantalho e muitos outros. Por fim, o Detetive descobre que o Dr. Cavendish está por trás de tudo, mas também como ele está influenciado pelo diário deixado pelo fundador da instituição, Amadeus Arkham. Assim, ficamos a conhecer os traumas da vida de Amadeus que, de alguma forma na visão do médico, estão ligados ao Batman.

Os revoltosos têm apenas uma condição para libertar o pessoal médico: uma troca, todos os reféns, pelo Batman, a única maneira de libertar as vítimas do motim e garantir que ninguém morra é o Batman juntar-se aos seus inimigos mais loucos dentro do Asilo.

A forma como Grant Morrison escreveu esta história, a narrou e apresentou ao leitor no "estilo" de horror e suspense, passando-lhe a tensão a cada página virada, e como a pintura de Dave McKean, um ilustrador que conseguiu mostrar a loucura do Joker tão graficamente, que só o rosto aterroriza. McKean introduz o leitor no clima de terror e insanidade do conto. Sem sombra de dúvida que é uma obra prima da banda desenhada, e de alto valor pois apresenta um tema que é pouco abordado na sociedade actual e contemporânea: a insanidade.

Este impactante conto de horror psicológico protagonizado por Batman (embora este apareça sempre como uma figura negra e misteriosa que o leitor nunca chega a ver bem, porque na verdade McKean não gosta  de desenhar o Batman) e praticamente todos os reclusos do Asilo Arkham é uma leitura obrigatória para qualquer fã da nona arte!

Ficha Técnica
Batman - Asilo Arkham
Autores: Grant Morrison e Dave McKean
Editora: Levoir
Páginas: 160, a cores
Encadernação: Capa dura
PVP: 22,90€

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

Análise: Harleen



Análise: Harleen, de Stjepan Šejić

Harleen conta-nos a história de Harley Quinn e como nasce o seu romance com Joker, o maior vilão de todos os tempos. Desde a altura em que termina os seus estudos de psiquiatria, Harleen Quintzel – o seu verdadeiro nome – começa por ter as melhores intenções na cura dos criminosos residentes no Asilo de Arkham. Eventualmente, a sua ligação com Joker, seu paciente, vai transtorná-la de forma violenta e irrevogável, levando-a a apaixonar-se perdidamente por ele.

Este livro tem uma abordagem séria e adulta. Não esperem cenas de ação ou grandes lutas, tal como costumam acontecer comummente em livros de comics. Aqui os dilemas, as dificuldades e obstáculos pelas quais a protagonista tem de passar, são do foro psicológico. E haverá maior enormidade para ultrapassar do que as dúvidas internas, os receios profundos, ou a necessidade de uma paixão que tem tudo para nos levar à perdição? A barreira entre o bem e o mal, que este livro nos dá, é ténue o que acaba por nos remeter para a realidade que nos rodeia e para os próprios receios e questões que nos habitam a nós, leitores. Harley Quinn não é uma vilã. É uma vítima. Provavelmente a maior vítima que Joker alguma vez fez. E no final da história, não sabemos se havemos de nos insurgir contra Harley ou se devemos lamentar as suas fraquezas de carácter. 

Várias personagens como Batman, a Hera Venenosa, Waylon Jones (o Crocodilo), Bane e outros fazem a sua aparição neste Harleen, mas não são o centro da ação. Esta é a história de Harley e, felizmente, Šejić  soube focar-se verdadeiramente na personagem, utilizando as outras personagens do universo de Batman de forma perspicaz, sem parecer algo forçado. Tanto é, que até mesmo Joker acaba por ser menos importante do que Harley, embora, naturalmente, seja crucial para o desenvolvimento da história da protagonista. E também Harvey Dent, o Duas-Faces, acaba por ter bastante importância na trama da história, tendo sido muito bem introduzido na narrativa, por Šejić. 

Em termos de arte visual, o trabalho de Stjepan Šejić é extraordinário, também. A sua capacidade de retratar o ambiente de Gotham ou as expressões faciais das personagens, é verdadeiramente impressionante. Certas pranchas são verdadeiras obras de arte, quer no desenho, quer na cor.

Na criação visual de Harley Quinn e na sua degradação gradual, o autor mostra mestria e um estudo cuidado e atento. Afinal de contas, Harley é apenas uma mulher bonita mas, acima de tudo, normal. E é por isso que acaba por ser uma personagem com que nos identificamos naturalmente. A concepção das outras personagens está também muito bem conseguida. A dinâmica de planificação do livro também está impecável, nunca se tornando maçadora para o leitor. Em suma, estamos muito perto da perfeição.

Para mim este magnífico livro peca apenas numa coisa. Trata-se de um gosto pessoal e portanto, é claramente subjetivo mas é algo de sobeja importância para mim. A maneira como Joker é desenhado por Stjepan Šejić, simplesmente fica um pouco aquém daquilo que eu esperaria. A abordagem baseia-se numa representação talvez menos comic e mais humanizada. Mas, para mim, Joker é-nos visualmente apresentado como sendo demasiado normal, demasiado humano, com um look demasiado emocore, para o meu gosto. Não é uma personagem que olhando para ela, tenha aquele aspeto creepy, de louco inveterado, a que já nos habituámos. Posso admitir que, certamente, foi uma intenção clara de Stjepan Šejić que queria dar uma aura mais humana  - e talvez mais jovial - à personagem. Mas simplesmente não funciona. Ou melhor: não funciona tão bem como poderia ter funcionado. Não é que esteja mal desenhado, mas as opções estéticas que o autor tomou para a desenhar, simplesmente saíram ao lado. Joker parece-me demasiado bem parecido, demasiado charmoso, demasiado musculado e com um estilo muito poser, em detrimento daquela personagem escanzelada, com uma postura toda arqueada e com a expressão de loucura tão presente, quer nos seus olhos, quer no seu sorriso malévolo. 

Gerard Way, vocalista dos My
Chemical Romance e criador da
série Umbrella Academy
Este Joker poser, parece-me um homem normalíssimo, de cabelos compridos e uma boca ligeiramente grande, que se limitou a pintar o cabelo de verde. Fez-me pensar mais num vocalista de rock emocore, como por exemplo, Gerard Way - vocalista da banda My Chemical Romance e, curiosamente, também ligado ao universo da banda desenhada, através da sua criação The Umbrella Academy – do que no príncipe palhaço do crime. Exceptuando a magnífica ilustração da segunda capa onde é, possivelmente, a única vez em que Šejić conseguiu captar a essência da personagem, parece-me que Joker acaba por parecer charmoso, algo vazio e insonso. Não chega para destruir ou invalidar esta excelente obra – não, longe disso! – mas é algo de alguma importância. Aceita-se por isso que tenha sido a opção mais humanizante que Šejić queria dar à personagem.

Acima de tudo, Harleen é um livro espectacular que merece figurar nas boas bibliotecas de banda desenhada. A Levoir está, portanto, de parabéns por ter apostado nesta obra de tão grande qualidade. Não concordo com a forma como o fez como, aliás, já deixei claro aquando o anúncio de lançamento da obra. Mas sobre isso já opinei nesse post e não considero necessário fazê-lo novamente.

Se a arte de Šejić representava, por si só, uma garantia de qualidade ao nível da arte é, no entanto, na escrita da história que o autor mais me surpreendeu. Harleen é uma narrativa bem conseguida, adulta, com tempo suficiente (leia-se páginas) para nos agarrar, sem se tornar aborrecida. Obviamente que qualquer leitor já sabe qual é o fim que espera à personagem. Mas isso não invalida que saibamos o “como” e é a isso que Šejić tão bem se agarrou.

Não é preciso gostar de super-heróis, do Batman, ou de comics para apreciar este magnífico livro. Basta apreciar uma boa banda desenhada. É a melhor história que já li sobre Harley Quinn e, também, uma das melhores que já li do universo DC. Obrigatório e candidato a um dos livros do ano.



NOTA FINAL (1/10):
9.2


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Ficha Técnica
Harleen, Volumes 1 e 2
Autor: Stjepan Šejić
Editora: Levoir
Páginas: 112 (cada livro), a cores
Encadernação: Capa dura

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Lançamento: Harleen, Volume 2



Já está disponível em bancas e em loja, desde dia 21 de Fevereiro, o Volume 2 de Harleen, que encerra a história de Stjepan Šejić e que é publicado pela Levoir.

Sobre a divisão desta história que é composta por 3 números e que é dividida pela editora potuguesa em dois volumes, já opinei na altura do lançamento do volume 1.

Este volume está a ser lido e deverá receber uma análise no Vinheta 2020 ainda durante esta semana.

Por agora, fiquem com nota de imprensa e páginas partilhadas pela Levoir:

A Levoir apresenta o  segundo volume de Harleen, em banca a 21 de Fevereiro.

O primeiro encontro de Harleen Quintzel, a jovem psiquiatra, com o Príncipe Palhaço do Crime não foi nos corredores do Asilo Arkahm onde trabalha, mas sim nas ruas de Gotham, onde Joker lhe apontou uma arma á cabeça, decidindo logo de seguida deixá-la ir. Harleen torna-se assim, um dos poucos cidadãos da cidade a sobreviver a um confronto com o maior psicopata de Gotham. Este momento passa a assombrar a jovem que, vive apavorada com aquele sorriso.

Nesta segunda edição, Šejić apresenta uma visão humana e mais atraente da personagem – ela é uma médica bem-intencionada, mas que não está ainda preparada para enfrentar uma das mentes mais perversas de Gotham.

Harleen tem grandes falhas de cáracter. O mais flagrante deles é a sua tendência para comportamentos autodestrutivos. No Harleen 1, manifestam-se numa série de relacionamentos tóxicos com homens mais velhos. Em Harleen 2 ela precisa de álcool para dormir e para trabalhar.

Joker sabe tudo da vida da médica, manipulando um dos seguranças, consegue que ele lhe passe informações do arquivo para o seu telefone. Usando as suas artes de manipulação após algumas sessões consegue fazer com que Harleen se apaixone por ele. Ele alimenta-lhe o ego física e profissionalmente, levando-a a baixar a guarda nas “entrevistas”. Ela é a única médica em quem Joker confia o suficiente para lhe contar os seus segredos e ideias, conseguindo que ela morda a isca que ele tão sabiamente lhe estende.

Morre Harleen, nasce Harley Quinn.

Ficha Técnica
Harleen, Volume 2
Autor: Stjepan Šejić
Editora: Levoir
Páginas: 112, a cores
Encadernação: Capa dura
PVP: 15,90€

quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Lançamento: Harleen, Volume 1



Amanhã chegará às livrarias e bancas o primeiro de dois volumes que compõem Harleen, de Stjepan Šejić. Trata-se de uma história composta por 3 números que a Levoir se prepara para publicar não em um, não em três mas em dois livros(!).

Para publicar esta obra, a Editora teria 4 hipóteses:
Hipótese 1 - Editar a série num único livro;
Hipótese 2 - Editar a série em três livros;
Hipótese 3 - Editar a série em dois livros, colocando os dois primeiros números no volume 1 e o terceiro número no volume 2;
Hipótese 4 - Desprezar totalmente a narrativa natural da história e dividir o segundo número entre o livro 1 e 2.

E, na verdade, foi a hipótese 4 que a Levoir escolheu. A meu ver, as hipóteses 1 e 2 seriam muito mais lógicas e respeitosas, não só para com os leitores portugueses como, também, para com a DC e para com o próprio autor. Percebo que há aqui uma lógica de lucro por parte da empresa, mas acho que haveriam melhores opções a tomar.

Quanto à obra em si, aplaudo a escolha e esta é uma história que quero muito conhecer.

Fiquem com nota de imprensa e páginas partilhadas pela Levoir.


Harleen é um novo título com o selo da DC Black Label. Escrita e ilustrada pelo aclamado Stjepan Šejić, autor de Aquaman e Esquadrão Suicida, apresenta a Drª Harley Quinn como uma jovem brilhante psiquiatra, cuja teoria revolucionária pode encerrar a cura para a loucura que assola Gotham City.

Harley Quinn foi criada por Paul Dini e Bruce Timm para a DC Comics em 1993, na história Batman: The Animated Series, onde esta personagem nasceu, e cuja história – e aspecto – são contados no volume Amor Louco, já editado pela Levoir. A jovem era então uma estrela da ginástica que conseguiu uma bolsa na Universidade de Gotham e tinha como ambição “ser uma psicóloga famosa”.

A Harleen de Stjepan Šejić mostra a jovem Harley Quintzel como sendo uma estudante brilhante por mérito próprio, que seguiu a carreira “porque gostava de ouvir os problemas dos amigos”.

Através dos seus estudos com os criminosos e sociopatas, no Asilo de Arkahm onde trabalha, ela vai mergulhar nas mentes perturbadas dos mais letais pacientes internados no Asilo e iniciar uma viagem que a vai levar ao mais profundo do seu ser, e das suas obsessões!

Harleen é uma pessoa imperfeita que começa a trabalhar fazendo o bem até que se apaixona pelo Joker, um perigoso doente psiquiátrico, instável, que se encontra internado em Arkham. O Sr. J, o seu “pudinzinho” é um manipulador que tanto corresponde aos afectos de Harley, como a repudia e trata com desdém, ele não sabe amar, ele usa as pessoas  para conseguir o que quer e depois despreza-as porque já não lhe são úteis e ele não está disposto a manter qualquer tipo de relacionamento. Harley Quinn torna-se então  a sua maior carta na manga, alguém que ele pode usar a qualquer momento, jogar fora, e usar de novo, porque ela vai sempre voltar para ele devido ao seu amor, extremamente cego (por acreditar que ele também a ama), o que a impossibilita de ver a verdade.

Esta é uma narrativa de corrupção, de desespero e de amor, que apresenta uma personagem que não nasceu no mundo do crime, mas que é atraída para ele.

A Levoir edita em 2 volumes este livro com datas de saída a 14 e 21 de Fevereiro.


Ficha Técnica
Harleen, Volume 1
Autor: Stjepan Šejić
Editora: Levoir
Páginas: 112, a cores
Encadernação: Capa dura
PVP: 15,90€