segunda-feira, 20 de julho de 2020

Análise: Operação Overlord Vol: 1 - Sainte-Mère-Église



Operação Overlord Vol: 1 - Sainte-Mère-Église, de Michaël Le Galli e Bruno Falba

As Edições ASA já tinham anunciado, em primeira mão e de surpresa, na entrevista dada ao Vinheta 2020, na rubrica “À Conversa Com:” que iriam lançar, em parceria com o Jornal Público, a Coleção Operação Overlord, dividida por 6 volumes. O primeiro desses volumes saiu na passada quinta-feira.

Esta coleção passa-se no cenário da Segunda Guerra Mundial e acompanha alguns dos acontecimentos que marcaram aquela que foi a maior operação de forças pára-quedistas da história da humanidade. Faz-me lembrar a muito recomendável série Airborne 44, da mesma editora e lançada igualmente com o jornal Público, em 2017, e cujos acontecimentos também se passam durante a Segunda Guerra Mundial. Claro que haverão algumas diferenças entre ambas as séries e mesmo considerando que Airborne 44 supera Operação Overlord em qualidade, esta última também é uma aposta interessante. Especialmente para os fãs do género. Relembre-se que Airborne 44 receberá ainda em 2020 dois novos títulos conforme anunciado pela editora.

Neste primeiro volume de Operação Overlord, somos transportados até 4 de Junho de 1944, altura em que se faziam os últimos ajustes para que as forças americanas e inglesas desembarcassem na Normandia para libertar França, que havia sido ocupada pelo exército alemão. O sucesso desta operação poderia invalidar de vez as aspirações dos alemães. O livro dá-nos uma breve contextualização história para, logo de seguida, nos colocar no cerne da ação. Os soldados que acompanhamos pertencem à 82ª Companhia e a sua missão é garantir a segurança das estradas, pontes e zonas de aterragem na costa da península de Contentin. Desta forma, o seu primeiro grande objetivo é a tomada de assalto da cidade de Sainte-Mère-Église, que dá nome a este primeiro volume. Depois de assegurada a cidade, estes soldados terão que manter posse da mesma, até que cheguem os reforços que desembarcarão em Utah Beach. Vamos acompanhando a história através de cinco soldados, de origens diferentes, que vieram parar a esta guerra de forma muito distinta entre si, também.

Nesta análise ao primeiro volume não pretendo ser nem demasiado positivo, nem demasiado negativo porque, afinal de contas, com este livro apenas está lido um sexto de toda a coleção. Não obstante, há já sinais que me permitem emitir uma opinião.

Em primeiro lugar, parece-me que a premissa de explorar as origens de diferentes soldados, não sendo algo verdadeiramente original, é uma boa ideia. Porque, por um lado, permite que o livro não seja só na e sobre a guerra, dando-nos cenários e situações diferentes quando são retratados eventos específicos na vida dos cinco soldados, através de flashbacks. Por outro lado, parece-me que isto está feito de uma forma tão redutora e pouco explorada que pode ser uma oportunidade perdida. Sublinho que é possível que à medida que vá lendo os seguintes volumes ainda possa mudar de opinião. Mas, pelo menos neste primeiro volume, cada um dos cinco soldados tem apenas direito a uma página para que possa ser contextualizado. E isso sabe a pouco. Pelo menos neste primeiro tomo. Penso que talvez tivesse sido uma melhor opção se a narrativa se centrasse num ou dois personagens apenas, que fossem desenvolvidos com mais detalhe e precisão. Assim, como está, fica um pouco superficial, não deixando o leitor envolver-se com as personagens como devia ser.

Em termos narrativos, o autor Michaël Le Galli constrói aqui uma daquelas bandas desenhadas que nos tenta dar um relato histórico, informando os leitores, mas tentando ser, também, um meio de entretenimento. E é aí que as histórias ficcionais - dentro da história verídica - e juntamente com as cenas de ação que um conflito armado pressupõe, funcionam muito bem. Creio até que é sempre uma boa ideia fazer isto quando se está a retratar um período da história pois torna os factos reais mais apetecíveis e fáceis de seguir para os leitores. Não me querendo repetir, só é pena que essas histórias ficcionais sejam em tão grande número e tão parcamente exploradas.

Em termos de arte, este é um livro que, à partida, pode enganar um pouco. É que, na verdade, e se folhearmos rapidamente, é fácil ficarmos seduzidos pela arte dos desenhos e das cores. No entanto, uma análise mais pormenorizada às ilustrações deste livro, permite-nos ver que, por vezes, a arte parece feita algo à pressa, delegando para o processo de arte final e cores, a função de “salvar” o desenho. Este é um daqueles livros cujo esquisso, há-de ser muito diferente do resultado final. As cores, sendo digitalizadas, conseguem dar à obra, um estilo quase americano, de comic book. Por vezes, o resultado é interessante, mas noutros casos, nem por isso. Existem alguns detalhes e vinhetas muito impressionantes neste livro. Mas, por exemplo, as expressões faciais das personagens poderiam ser mais detalhadas. No fundo, há algum desequilíbrio quando olhamos para o todo. Uma coisa de que não gostei e que, admito, me causa uma certa irritação são as vinhetas em que as personagens aparecem delineadas por uma linha branca para que sejam percetíveis em relação ao fundo preto. Se isso até pode funcionar bem em livros de super-heróis, julgo que numa banda desenhada franco-belga, e ainda por cima histórica, isso demonstra alguma falta de zelo, tirando alguma credibilidade ao produto final.

Mas se isto pode até ser um mero detalhe, há, no entanto, algo neste Operação Overlord Vol: 1 -  Sainte-Mère-Église que tem uma importância capital e, infelizmente, no sentido negativo. É que as personagens têm um aspeto físico muito semelhante entre si, o que torna difícil para o leitor, a tarefa de perceber quem é quem. Uma das coisas que deveria ter sido feita era uma maior distinção na concepção das personagens. E ainda que dos cinco soldados, um deles seja ruivo e outros dois tenham origens indígenas e afro-americanas, acho que a componente ilustrativa, neste caso Davide Fabri, deveria ter feito mais e melhor para que a distinção entre personagens fosse mais óbvia e, por conseguinte, a leitura da história fosse mais fluída. Diria que este é possivelmente o ponto menos positivo de todo o livro.

Creio, no entanto, que a planificação de Davide Dabri é uma mais-valia devido a toda a dinâmica que oferece à obra: temos vinhetas de todo o tipo e tamanho. Algumas ocupam uma página inteira. Outras, bem pequenas, são sobrepostas em vinhetas maiores. Isto se fosse mal feito, poderia ser uma confusão desmedida mas, como é bem feito, dá um toque de modernidade, sem descurar a legibilidade da história. Muito interessante e agradável de ler. 

É uma banda desenhada competente, muito recomendável para fãs do género de banda desenhada histórica - e de guerra. Apresenta vários ingredientes que poderão ser apelativos para um grande número de leitores. Com uma história mais (bem) focada (e em menos personagens), bem como, uma arte com mais cuidado nos pequenos detalhes, poderia ser algo verdadeiramente inesquecível.


NOTA FINAL (1/10):
7.8


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020

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Ficha técnica
Operação Overlord Vol: 1 -  Sainte-Mère-Église
Autores: Michaël Le Galli e Davide Fabbri
Editora: ASA
Páginas: 48, a cores 
Encadernação: capa dura
Lançamento: Julho de 2020

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