A dupla portuguesa constituída por Rafael Marques no argumento e Katiurna nas ilustrações trouxe-nos recentemente a sua primeira aventura na edição de banda desenhada em formato físico. Bem, na verdade, a série Holy até se estreou no formato digital e, nesta altura, até já conta com 5 números completos, que consitutuem o primeiro volume da série. Mas, para que o interesse do público pudesse ser avaliado pela dupla portuguesa, decidiram que o primeiro número Faith is For the Wicked fosse lançado em formato físico, numa edição de autor.
Holy conta-nos a história da empresa "Eden", cujo serviço que presta aos seus clientes é fornecer anjos da guarda. Estes anjos atuam como guarda-costas, prestando os mais variados tipos de serviços. A ideia da sua génese resultou das melhores intenções mas, pelo caminho, parece que o conceito inicial da empresa se perdeu. Com efeito, e como vivemos num mundo capitalista, esta empresa também se rege pelo lucro e, portanto, vai aceitando trabalhos de indivíduos corruptos e mafiosos que simplesmente têm meios para pagar pelos serviços da "Eden Enterprises". E, eventualmente, Cartwright, o protagonista, que é um dos anjos da guarda, começa a cansar-se deste tipo de actividade, questionando os meios praticados a troco de dinheiro. Uma premissa interessante e atual.
E nas meras 26 páginas que compõem este primeiro número, Rafael Marques tem o condão de nos manter agarrados à trama. A história arranca com bastante violência, dando-nos a conhecer Cartwright – e o seu modo de actuação profissional; depois, conhecemos a agente Ríos que acaba de ser despedida da agência; somos confrontados com as dúvidas existenciais de Cartwright enquanto este se confessa a um padre; e, no final, temos a fantástica cena que encerra esta história e que coloca o protagonista à prova, quando confrontado com uma situação angustiante a que assiste, enquanto presta os seus serviços.
Há muitas boas ideias aqui. É difícil perceber para onde irá a história depois deste primeiro número mas diria que Holy traz consigo um bom cartão de visita. Mesmo que algumas personagens sejam um pouco clichet, acho que Rafael Marques consegue desenvolvê-las bastante bem. Especialmente, se tivermos em conta que o faz em tão reduzido número de páginas. Há outra coisa que também apreciei bastante. O ritmo da história, claramente influenciado pelos comics americanos. É rápido, “sem espinhas”, mas consegue trazer consigo breves momentos de reflexão que são bem utilizados para dar profundidade emocional às personagens. Sem ser demasido profundo mas sem ser demasiado superficial. A medida certa para a história que temos em mãos.
Relativamente à arte de Katiurna, parece-me que ainda anda à procura do seu signature style e que, por isso, tenta muitas coisas nas várias páginas que nos apresenta. Em especial, em termos de planificação das pranchas. Há pranchas para todos os gostos. Quanto ao seu traço, este é bastante moderno e simplista, apresentando uma arte final bastante (demasiado?) digital. Estou certo que se houvesse mais pormenores, a arte de Holy sairia beneficiada mas a verdade é que também consegue ser eficiente, passando-nos as histórias sem equívocos. Não é magnífica mas funciona.
A concepção das personagens está bem conseguida, com as mesmas a conseguirem ter um estilo personalizado, em que os penteados algo excêntricos das mesmas são um bom truque para contribuir para esse estilo próprio. É nos cenários que o trabalho me parece mais pobre e nu, com poucos elementos a aparecer. A capa deste primeiro número também está bem conseguida.
A banda desenhada está a ser lançada em inglês. Compreendo claramente a opção pelo lançamento em inglês no formato de webcomic. No entanto, julgo que para o lançamento físico, talvez fizesse mais sentido que o mesmo tivesse sido feito em português. Claro que digo isto sem saber os objetivos estratégicos da dupla. Talvez até estejam a fazer muitos envios para fora do país. Se assim for, compreende-se. Mas, se a grande maioria dos leitores que estão a receber o comic se encontra em Portugal, penso que a língua deveria ter sido o português. Sendo um lançamento independente é lógico que o intuito é, tal como um cd de demos de uma banda, fazer passar a palavra e chegar ao maior número de pessoas. Quero com isto dizer que a qualidade da edição, obviamente, não obedece aos padrões de qualidade de um lançamento profissional. Mas, lá está, também não seria esse o objctivo. E, assim sendo, acho que cumpre bem com o objetivo.
Em conclusão, é uma série bastante interessante, que apresenta boas ideias. Os autores anunciaram que caso se verificasse a existência de interesse por parte dos leitores, a série continuaria a ser editada em formato físico. Da parte do Vinheta 2020, o interesse é pleno. Venham de lá mais números em formato físico!
NOTA FINAL (1/10):
6.9
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Holy #1 - Faith is For the Wicked
Autores: Rafael Marques e Katiurna
Editora: RKComics
Idioma: Inglês
Páginas: 26, a preto e branco
Encadernação: Capa mole
Lançamento: Novembro de 2020
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