Análise: Edgar P. Jacobs - O Sonhador de Apocalipses

Edgar P. Jacobs - O Sonhador de Apocalipses, de François Rivière e Philippe Wurm

A Arte de Autor já tinha lançado, em 2017, A Marca Jacobs, uma banda desenhada que funcionava como biografia do autor incontornável da banda desenhada franco-belga, Edgar P. Jacobs, célebre pela sua série de sucesso Blake e Mortimer. Agora, há pouco mais de um mês, a Arte de Autor volta a dar-nos uma biografia da vida do autor belga. Desta vez, é Edgar P. Jacobs - O Sonhador de Apocalipses, da autoria dos autores François Rivière e Philippe Wurm.

Se a capa do álbum lançado primeiramente é verdadeiramente magnífica, e bem melhor do que a deste segundo álbum, a verdade é que, em termos dos desenhos no interior do livro, a própria banda desenhada, vá, este Edgar P. Jacobs - O Sonhador de Apocalipses é muito superior a A Marca Jacobs.

E comecemos já por aí, portanto. É que, assumindo que o objetivo de uma obra deste cômputo é sempre – embora não apenas – homenagear o autor, então acho que se pode dizer que o ilustrador Philippe Wurm faz aqui um belíssimo trabalho na ilustração.

Isto porque os desenhos são uma autêntica jóia para os admiradores de Jacobs e do seu legado visual, assente na linha clara. De facto, até podemos dizer que este O Sonhador de Apocalipses bem podia ter sido feito pelo próprio Jacobs, tal não são fiéis os desenhos que aqui nos são dados! Quer em termos do desenho das personagens, dos ambientes, das expressões faciais, da linguagem corporal, da planificação, da harmonia visual, e, até das belas cores – que nos são dadas por Benoît Bekaert –, este livro é um autêntico deleite visual para todos aqueles que apreciam a obra de Jacobs.

Quanto à história que nos é dada, não estamos tanto perante uma história “do princípio ao fim”, como é, geralmente, apanágio das biografias, mas sim por um leve desfile de alguns momentos-chave na vida do autor e que nos são dados de forma algo independente entre si. Na verdade, são nove os capítulos que compõem este livro. Todos eles nos relatam uma faceta de Jacobs que é interessante, claro, mas que me pareceu algo dispersa e com pouca ligação aos restantes capítulos. Dito por outras palavras, penso que teria sido mais benéfico para o livro, se a história não nos fosse dada de um modo tão parcelado. Não obstante, isto também não é propriamente algo mau ou desagradável. Apenas não permite, quanto a mim, uma imersão tão grande na história e na vida de Jacobs.

As tais facetas que nos são dadas mostram-nos, por exemplo, um Jacobs, ainda jovem, que, sendo apreciador de arte antiga, gosta de visitar o Museu do Cinquantenaire às escondidas, quando o mesmo já está fechado; ou mostram-nos, também, um jovem com um talento e uma paixão desmedida pela ópera. Na verdade, o grande sonho de Jacobs parecia ser o de tornar-se cantor de ópera. O desenho e a banda desenhada parecem mais ter aparecido na sua vida de um modo mais casual. Com efeito, o próprio autor considerava a ilustração como uma forma de sustento e não como uma verdadeira vocação.

No entanto, com a Segunda Guerra Mundial no horizonte, Jacobs passou a dedicar-se mais à produção gráfica. E é nesses anos que começa a trabalhar com Hergé, de quem é assistente no desenvolvimento de Tintin. Esta relação, embora proveitosa para ambos os autores, era algo tumultuosa, nem sempre sendo positiva para o lado de Jacobs e, por esse motivo, é-nos dada uma visão menos romântica e positiva de Hergé enquanto pessoa/parceiro.

É depois disto que Jacobs começa a trabalhar na série Blake e Mortimer. E também a sua vida amorosa, bem como a importância do seu cão, Blackie, nos é oferecida neste O Sonhador de Apocalipses, onde até há espaço para o aparecimento de outros célebres autores incontornáveis da banda desenhada belga, como André Franquin ou Jacques Martin. Finalmente, ficamos também a conhecer a passagem de uma vida na cidade de Bruxelas para uma paisagem mais campestre em Bois des Pauvres.

O argumento é assinado por François Rivière, ensaísta e romancista que conversou longamente com Jacobs ainda em vida, e que aqui aproveita para contar alguns eventos que o próprio autor lhe confidenciou.

Por conseguinte, e talvez pela objetividade e, ao mesmo tempo, veracidade das situações retratadas me tenha parecido que, por vezes, os eventos são demasiado mundanos. Numa vida tão relevante para a bd como a de Jacobs talvez até possa ser bom conhecer a vida amorosa do autor ou do seu gosto pelo seu cão mas diria que talvez não seja isso o mais relevante para o público do autor. Diria, pois, que tudo isso é demasiadamente normal e quotidiano pois são relacionamentos que não trazem consigo nenhum drama ou vivacidade ao relato.

A edição da Arte de Autor, como não podia deixar de ser, é muito elegante e apresenta ótima qualidade de impressão, encadernação e de materiais. A capa é dura, com textura aveludada e com pormenores a verniz, e o papel couché tem excelente qualidade. O livro traz um prefácio de Ever Meulen, uma nota conclusiva de François Rivière e três páginas onde nos são dadas breves notas introdutórias sobre as personagens relevantes com que Jacobs privou e que aparecem no livro.

Em suma, este é um livro verdadeiramente obrigatório para os fãs de Jacobs ou da série Blake e Mortimer. Apresenta ilustrações que bem podiam ter sido feitas por Jacobs, dado que são tão fiéis ao estilo em linha clara, com cores suaves, do autor original. O argumento, sendo um pouco compartimentado em demasia para o meu gosto, é, ainda assim, bem-sucedido em nos dar alguns vislumbres da vida deste autor incontornável da banda desenhada mundial.

NOTA FINAL (1/10):

7.0

Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020

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Ficha técnica

Edgar P. Jacobs - O Sonhador de Apocalipses

Autores: François Rivière e Philippe Wurm

Editora: Arte de Autor

Páginas: 144, a cores

Encadernação: Capa dura

Formato: 235 x 310 mm

Lançamento: Julho de 2022