Foi no passado mês de Abril que a editora Ala dos Livros publicou COBRA – Operação Conacri – Tomo 1. Ora, antes que surjam dúvidas, deixem-me dissipá-las: Operação Conacri é uma história que se divide por dois livros. Este, que acaba de ser editado, é a primeira parte dessa história. A série, na sua totalidade, está pensada para ter três histórias, mas a segunda história, esta de que vos falo, é a única que deverá ter dois tomos.
Passada quase uma década depois dos acontecimentos vividos em Operação Goa, Operação Conacri coloca-nos na Guiné, em plena Guerra Colonial. As forças especiais do grupo CoBrA - cujo nome, para passar despercebido, significa “Comissão Contra a Brutalidade Animal” – voltam a entrar em ação quando o líder deste grupo, Jorge Jardim, observando a escalada de violência que se faz sentir na Guiné, coloca os seus serviços à disposição do Estado português. O General Spínola acaba de apresentar a sua visão “Por Uma Guiné Melhor” que, não correspondendo a todos os seus objetivos, abre espaço para a atuação do grupo CoBrA, que procurará eliminar os movimentos rebeldes pela independência que estão cada vez mais fortes. E que denotam uma falta de diplomacia militar, a que o conjunto CoBrA saberá dar uma resposta ajustada.
Marco Calhorda esforça-se em dar-nos um enredo que poderia ter sido retirado de um daqueles filmes de ação de cariz bélico. A própria construção das cenas de ação, remetem o leitor para o cinema. O que é, assinale-se, positivo. Nesse cômputo, até acho que, do livro anterior para este, Marco Calhorda consegue superar-se. Se, em Operação Goa, me pareceu que certas cenas não tinham o encadeamento mais adequado entre si, neste primeiro tomo de Operação Conacri, as diferentes peças do jogo narrativo parecem mais bem encaixadas umas nas outras.
Mesmo assim, é verdade que, por vezes, o leitor se pode sentir um pouco à deriva. São muitas as personagens a circular perante os olhos do leitor e, ocasionalmente, pode tornar-se um pouco confuso acompanhar de forma confiante tudo o que está a acontecer. Marco Calhorda faz-se valer de legendas apenas para situar no tempo ou no espaço os eventos e parece-me que, se o autor tem usado essas legendas para uma voz off que contasse a história e unisse melhor tudo o que se passa, a história ainda seria melhor. Mesmo assim, repito que este ponto foi melhorado face ao livro anterior.
E para que, em termos de argumento, este CoBrA funcione melhor do que o primeiro, também conta o facto de a história ter sido dividida por dois tomos. É verdade que todos nós, leitores, gostamos de resolver as histórias tão depressa quanto possível. Não obstante, a decisão de dividir a história em dois tomos permite que a mesma respire melhor, que as personagens e as situações sejam melhor explanadas pelo autor, sem que haja um excesso forçado de elementos e eventos num só livro. E é por isso, reitero pela terceira vez, que a história acaba por ficar mais coesa neste livro.
O que também mudou face a Operação Goa, foi o ilustrador da história. O português Daniel Maia deu lugar ao sérvio Zoran Jovicic. Se esta troca poderia parecer, em nome da continuidade e da identidade visual, arriscada, devo dizer que não foi uma mudança visual tão brusca assim. Arrisco mesmo dizer que quem gostou das ilustrações do primeiro álbum, também deverá gostar das ilustrações de Jovicic.
É claro que os estilos de Maia e de Jovicic são diferentes, mas não são diferentes como a “noite e o dia”. É verdade que, na minha opinião, o autor sérvio fica algo aquém do autor português em termos do dinamismo da planificação da história ou em termos do nível de detalhe depositado em cada uma das ilustrações. Daniel Maia consegue ser mais do meu agrado nesse cômputo. Mesmo assim, as ilustrações de Jovicic também são bastante meritórias, apresentando um belo traço fino e uma excelente utilização da luz e das sombras neste preto e branco puro.
O desenho dos cenários, dos veículos e das personagens é muito belo também. Lamentei apenas que numa vinheta ou noutra se encontrassem alguns desenhos que pareceram feitos mais à pressa do que o adequado, ou que certos traços nas faces das personagens se apresentassem mais grossos do que noutras vinhetas. A personagem Jorge Jardim também foi demasiado alterada em termos visuais, quanto a mim. Compreendo que, em termos cronológicos, passaram vários anos entre Operação Goa e Operação Conacri, mas, ainda assim, julgo que teria sido benéfico se a personagem tivesse ficado mais semelhante a Operação Goa, mesmo sendo mais velha.
Mas isto são detalhes. Na componente global das ilustrações, a verdade é que fiquei bastante agradado com este livro.
E, portanto, parece-me sensato realçar que Jovicic correspondeu às (elevadas) expectativas, tendo assegurado a beleza do desenho na série que Daniel Maia já nos havia dado em Operação Goa.
Em termos de edição, este livro é bastante original e, também nesta vertente, está em harmonia com a edição de Operação Goa. Apresenta sobrecapa, com badanas, em papel brilhante, e tem depois uma capa em tecido que nos remete para o aspeto de documentos militares de guerra. Funciona muito bem e é muito atraente e original, a meu ver. Já depois de aberto o livro, as suas próprias guardas me lembram um álbum que o meu pai - que por acaso esteve na Guiné no exato período que aqui é retratado - trouxe da Guiné. De resto, no miolo o papel é brilhante e de boa qualidade. A impressão e a encadernação são boas, também. No começo há um prefácio de Marco Calhorda e, no final, uma página com testemunhos reais e mais outras duas com estudos de personagem e de capa. Há ainda um esboço de página para o tomo 2, feita por Osvaldo Medina, que deixa no ar a possibilidade de vir a ser este o autor português a ilustrar um dos álbuns futuros de CoBrA que, relembro, serão mais dois; o tomo 2 deste Operação Conacri e um quarto e último volume autocontido de CoBrA. Falando ainda na edição, é concedida uma página para apresentação das personagens que acaba por ser muito útil para situar o leitor. É uma belíssima edição da Ala dos Livros e merece os meus louvores.
Concluindo, a primeira parte deste CoBrA - Operação Conacri volta a trazer-nos um bom livro de ficção, ambientado nos eventos históricos da Guerra Colonial portuguesa, revelando um Marco Calhorda mais à vontade na sua escrita e narrativa, por um lado, e apresentando Jovicic ao público português, que consegue fazer um belo trabalho em termos de ilustração, por outro. Ficam lançadas as bases para um segundo tomo que, espero eu, não demore muito tempo a chegar-nos.
NOTA FINAL (1/10):
8.9
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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CoBrA - Operação Conacri – Tomo 1
Autores: Marco Calhorda e Zoran Jovicic
Editora: Ala dos Livros
Páginas: 80, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Formato: 210 x 270 mm
Lançamento: Abril de 2024
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