sexta-feira, 2 de julho de 2021

Análise: Alix Senator #1 - Águias de Sangue



Alix Senator #1 - Águias de Sangue, de Valérie Mangin e Thierry Démarez

Provavelmente vou chocar (alguns) leitores do Vinheta 2020 com esta afirmação, mas cá vai: sempre achei o personagem Alix demasiado sem sal, com pouca personalidade e teve zero influência no meu gosto pela banda desenhada. Parecia-me – e ainda me parece – uma personagem demasiado infantil para adultos e, ao mesmo tempo, demasiado "chato" para crianças. Quer quando eu era criança, quer como adulto, essa sempre foi a minha opinião. Naturalmente, é uma questão de gosto e, por esse motivo, vale a importância que lhe quisermos dar.

Mas dizendo isto, é lógico que (também) aplaudo e respeito o legado de Jacques Martin, que criou esta personagem icónica da banda desenhada há tantas décadas atrás (em 1948!) quando a maneira de pensar, imaginar, criar e produzir a banda desenhada era tão diferente dos dias de hoje. E, tendo isso em conta, quer Alix, quer Jacques Martin, merecem a minha admiração.


Esta série Alix Senator é uma reinvenção do protagonista de série clássica, levada a cabo pelos autores Valérie Mangin e Thierry Démarez, e que nos coloca perante um Alix adulto em idade e com uma vida política ativa enquanto senador. É, a meu ver, muito mais bem conseguida do que a série original. Levando-nos para uma leitura mais adulta, que me fez relembrar algumas séries como As Águias de Roma, de Enrico Marini, ou Murena, de Jean Dufaux e Delaby, diria que este Alix Senator é bem mais aliciante do que o Alix imberbe de Jacques Martin.

A história que temos em mãos neste Alix Senator #1 - Águias de Sangue, leva-nos para um tempo posterior ao das aventuras da série clássica de Alix, em que o protagonista é agora adulto, tem um filho chamado Titus e desempenha as funções de senador em Roma. Quando a paz parece finalmente reinar no Império, Agripa, genro do imperador Augusto, é morto de forma violenta por uma águia. E geram-se então várias dúvidas: terá sido um ataque político, com o intuito de atingir uma pessoa próxima de Augusto, ou terá sido uma maldição divina? E, a partir deste ponto, temos uma história em que Alix representa o papel de investigador, de forma a descobrir quem foi o responsável por este crime hediondo. Para tal, tem a ajuda do seu filho Tito e de Khephren, o seu amigo.


Se a premissa base da obra, em termos de história, aparenta ser interessante, devo dizer que a achei um bocado “morna” demais e não me senti muito investido na trama. Talvez porque, em termos de argumento, Valérie Mangin não consegue passar uma sensação de urgência ou de um enredo cheio de camadas, construídas em cima de si mesmas, para desvendarmos aos poucos. A própria investigação de Alix não tem aqueles momentos de tensão clássicos que fazem com que fiquemos absortos na história que temos em mãos. Acontecem vários eventos ao longo da obra que são interessantes, reconheço, mas que não são tão marcantes assim, como deveriam ser. Nunca me senti muito imerso na história. Acompanha-se bem mas parece que falta algo, seja no ritmo, seja nos diálogos, ou seja na dinâmica da própria narrativa, que acaba por saber a pouco. A história procura ser um thriller, mas não é assim tão thrilling, estão a ver? É bom, mas não é fantástico.

A arte de Thierry Démarez é servida por um traço realista que, diferindo um pouco do traço em linha clara da série original criada por Jacques Martin, acaba por funcionar bastante bem ao longo da história. Com um estilo que aparenta ser clássico na conceção – embora também se sirva de algumas ferramentas modernas digitais - também aqui fui remetido para Murena, de Delaby. Os cenários são muito bem representados e com um cuidado aprumado em relação ao nível de detalhe dos desenhos. Também em termos de personagens, gostei bastante das ilustrações do autor, com caras realistas e com expressões verossímeis na maior parte das vezes. Também é verdade que, em alguns casos. se sentem as personagens e seus demais gestos algo estáticos. Mas não é algo que, a meu ver, seja muito limitador da qualidade do desenho que, genericamente falando, é o que de melhor este Alix Senator tem para oferecer.


Quanto à edição da Gradiva, estamos perante um bom trabalho. Capa dura brilhante, bom papel, boa impressão e boa encadernação. Nada a objetar.

É certo que, tendo em conta que a série foi lançada em 2012 e já conta com 11 tomos, penso que seria mais aliciante se a editora tivesse lançado álbuns duplos - como, aliás, várias outras editoras nacionais têm feito nos últimos anos - permitindo que os leitores portugueses possam colecionar a série num período de tempo mais rápido, não ficando, dessa forma, a edição portuguesa tão atrasada em relação ao restante mercado europeu. Mas, seja como for, isto é apenas uma nota pessoal e, por ventura, uma sugestão para outras apostas vindouras da editora e há que reconhecer que é uma boa notícia que a Gradiva tenha apostado neste Alix Senator. Parece-me uma boa aposta.

Em suma, não sendo uma obra magnífica, é um trabalho muito competente e muito recomendável a todos os amantes de banda desenhada histórica e, em especial, se admirarem o período do império romano em concreto. Traz-nos também uma narrativa muito mais madura e cativante do que aquela que a clássica série de Jacques Martin trazia. E, por esse motivo, é uma lufada de ar fresco. Penso que os antigos fãs da série não ficarão desapontados com este Alix Senator e creio até que a série tem capacidade para conquistar leitores que até não eram grandes fãs da série original. Eu serei apenas mais um exemplo disso mesmo.


NOTA FINAL (1/10):
8.3



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Ficha técnica
Alix Senator #1 - Águias de Sangue
Autores: Valérie Mangin e Thierry Démarez
Editora: Gradiva
Páginas: 56, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Junho de 2021

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