A Kingpin Books editou, há cerca de um mês, o novo livro de Osvaldo Medina, intitulado Kong The King 2. Poderemos dizer que este livro continua a história do álbum anterior, embora seja verdade que ambos os livros funcionam bem sozinhos, podendo até este segundo livro ser lido de forma isolada e, ainda assim, ser bem compreendido pelo leitor.
Este era um dos livros nacionais mais por mim esperados em 2022, por vários motivos: por um lado, sou um grande, grande admirador do autor Osvaldo Medina. Considero-o extremamente talentoso e tenho admirado muito o seu trabalho ao longo dos anos. Por outro lado, considerei – e ainda considero - Kong The King 1 como um dos melhores livros de banda desenhada portuguesa… de sempre!
Por esse motivo, e até para que os leitores deste texto possam aprofundar a minha opinião acerca desse primeiro volume da obra, convido-vos a visitarem a análise que lhe fiz.
A primeira questão que pode surgir a quem lê o presente texto é: depois de todo este tempo, Kong the King 2 fica ao nível do primeiro Kong the King? A resposta é SIM. Se gostaram do primeiro livro, é ponto assente que gostarão do segundo. Talvez apenas pelo facto desta segunda história não nos trazer o fator surpresa – porque já tínhamos conhecido o primeiro álbum – ou por não ter, quanto a mim, um final tão bem tecido como o do primeiro livro, fique um "furinho" abaixo. Mas é apenas isso: “um furinho”. Porque a obra continua a ser maravilhosa e a fazer com que nos apeteça voltar à primeira página, logo depois de chegarmos à última.
Depois de tudo o que Kong, o jovem nativo, havia superado no álbum anterior, ele vê-se novamente na calmaria da sua vida na ilha, junto dos seus. Mas, mais uma vez, as forças do mundo urbano parecem reclamá-lo para que possa ser o objeto de admiração e espanto dos humanos e, por conseguinte, gere lucro a quem de Kong for dono. Afinal de contas, este é um conto sobre a ganância humana, que não olha a meios para atingir os seus fins.
Sendo uma história relativamente simples, parecem-me claras as críticas apontadas pelo autor ao universo capitalista que nos controla e regula. Afinal de contas, valerá tudo em detrimento do dinheiro e da fama? Para o entretenimento de alguns – aqueles que têm dinheiro para despender por esse mesmo entretenimento – vale criar tudo?
Em alturas em que assistimos ao começo de um campeonato do mundo de futebol no Qatar, onde direitos humanos básicos não são respeitados, diria que este Kong the King 2 não poderia ter uma mensagem mais atual e pertinente. Mensagem essa que não se esgota com os temas desportivos, mas com tudo, sem exceção, o que pressupõe entretenimento de massas. O apelidado de “showbiz”, portanto.
Kong the King 2 dá-nos uma bela história, carregada de tristeza e o pior da condição humana sem, no entanto, abdicar de nos oferecer belos exemplos de humanismo e de sacrifício pelo outro.
A história é-nos contada, uma vez mais, a preto e branco e de forma muda. Não há balões de texto neste livro. É verdade que já vão sendo muitos os livros de "banda desenhada muda" lançados. Até mesmo em Portugal, já se contam alguns. Isso é algo que acho positivo, pois até permite que se explorem outras valências no género. Porém, há algo que Osvaldo Medina faz nas suas histórias mudas que eu não vejo a ser feito por outros autores: é que o autor nos dá uma história que, à partida, tudo levaria a crer que seria uma história com diálogos. Por outras palavras, enquanto que noutros livros de banda desenhada muda, há uma tendência para uma história mais do foro onírico ou contemplativo – coisa que se compreende, até – Osvaldo Medina aposta em algo mais difícil de representar em termos mudos, diria eu: dá-nos uma história mais clássica e terra-a-terra, com vários elementos de ação. Fica, pois, a parecer que, tal como uns Depeche Mode no seu clássico “Enjoy the Silence”, o autor procura oferecer-nos uma bela ode ao silêncio. Ou, pelo menos, à capacidade de bem contar uma história em banda desenhada sem o recurso de texto. Feito desta forma, e para este tipo de narrativa, asseguro-vos que não é uma tarefa ao alcance de muitos autores.
Sobre o desenho de Osvaldo, deixem-me dizer-vos que, uma vez mais, o autor se revela no pleno das suas capacidades. Todos os desenhos, com um traço bastante “cartoonizado” e rápido, mas não isento de deliciosos detalhes, nos contam de forma exímia a história.
Este não é um preto e branco “puro”, uma vez que Osvaldo Medina faz um uso muito belo dos cinzas, que ajudam as ilustrações a terem mais camadas de detalhe, especialmente nos efeitos de luz, e, ao mesmo tempo, oferecem mais profundidade aos desenhos. Desenhos esses que estão maravilhosos. São vários os exemplos onde o autor se revela extremamente inspirado, mas, especialmente na ilustração dupla das páginas 42 e 43 (que, se emoldurada, daria um belíssimo quadro), estamos perante algo verdadeiramente grandioso.
Quanto à edição, tenho que dizer que, mais uma vez, a Kingpin, pelas mãos do seu editor Mário Freitas, volta a dar-nos um trabalho de primeira linha. O livro apresenta capa dura baça, com detalhes a verniz, e um bom papel baço. Tem igualmente uma boa impressão e uma boa encadernação. Nenhuma das duas capas deste livro estão tão belas como a capa do primeiro livro mas Ttnho que dar nota – pela sua importância - do belo grafismo que este livro também tem. Até a própria página de créditos da obra se torna apelativa, com um aspeto que nos remete para as fichas técnicas de filmes.
Há, ainda, um detalhe nesta edição que merece todos os louvores: a forma inteligente, apelativa e bem conseguida como as primeiras páginas de guarda do livro foram usadas. Reunindo mais de 30 vinhetas do primeiro livro, estas duas páginas de guarda têm a proeza de, para além de ficarem visualmente muito belas, conseguirem fazer um resumo – ou uma síntese, vá – do primeiro livro. Algo semelhante a um “previously on Kong the King”. Adorei a ideia e acho que funcionou muito bem. Um detalhe de edição que é tão mais do que um mero detalhe.
Nota ainda para a existência de uma edição especial, limitada a 100 exemplares, que tem uma sobrecapa (com um design de capa ligeiramente diferente) e um print numerado do autor, enquanto extra. Coisas que fazem esta edição mais apelativa do que a edição normal.
Por isto tudo, mas também pela bonita história e pela beleza dos desenhos, num preto e branco que casa extremamente bem com a temática narrativa, mas também com o estilo de ilustração do autor, Kong The King 2 é um álbum maravilhoso que não se coíbe de nos surpreender. Se este livro não vender bem, a culpa não é da história, que é boa, ou das ilustrações, que são magníficas, ou mesmo da edição, que é excelente. A culpa é dos leitores, sinceramente. É que se nós, enquanto leitores, não abraçamos obras deste gabarito, estamos nós mesmos a desaproveitar algo português que é tão bem feito e que merece sucesso generalizado.
NOTA FINAL (1/10):
9.1
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Kong The King 2
Autor: Osvaldo Medina
Editora: Kingpin Books
Páginas: 152, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Formato: 19,50 x 27 cm
Lançamento: Outubro de 2022
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