Chu é uma das primeiras apostas da G. Floy Studio para este ano de 2023. Trata-se de uma série que resulta de um spin-off da série original Tony Chu, cujos 12 volumes foram integralmente publicados por cá – também pela G. Floy Studio.
Estava com especial expetativa para ler este livro pois Tony Chu é uma das séries da G. Floy Studio de que eu gosto mais. Toda aquela história, aparentemente sem pés e sem cabeça, mas que, na verdade, nos deixa a chorar por mais, enquanto nos rimos à socapa perante as mirabolantes peripécias com que somos confrontados, conquistou-me totalmente. É, aliás, uma série que recomendo sem reservas.
Até porque, se o argumentista John Layman conseguiu pensar numa série verdadeiramente divertida, cheia de loucura e boas ideias ao nível do enredo, também o seu ilustrador, Rob Guillory nos dá um belíssimo trabalho que encaixa que nem uma luva na história sui generis de Tony Chu.
Nesse sentido, e para uma melhor compreensão deste universo de personagens que têm "super-poderes associados à comida", ou ao ato de comer, até recomendo uma (re)leitura da análise que fiz à série completa de Tony Chu.
Desta vez, e como já referi, temos o primeiro e único spin-off dedicado a este universo. Mas há algumas alterações em relação àquilo que já conhecíamos. Em primeiro lugar, trata-se de uma minissérie, composta por 10 números - e dividida em duas histórias - que esta edição publica de forma integral. Ou seja, este novo livro auto-conclusivo de Chu tem duas histórias e pode ser lido de forma independente em relação à série-mãe. A nível dos criadores também houve uma alteração. O argumentista, John Layman, é o mesmo, mas desta vez faz-se acompanhar por um novo ilustrador: Dan Boultwood.
Finalmente, a terceira grande mudança é que desta vez não acompanhamos as vivências de Tony Chu, mas sim da sua irmã, Saffron Chu. Tony Chu aparece na primeira história deste livro, sim, mas não é ele que protagoniza Chu.
Como não podia deixar de ser, Saffron também tem poderes especiais que resultam do ato de comer. Enquanto que Tony Chu, sendo um "cibopata", é capaz de adquirir impressões psíquicas daquilo que come, Saffron é capaz de descobrir os segredos das pessoas que quem come. Desde que, ela e a outra pessoa estejam a comer ao lado um do outro e a mesma comida. Chama-se a isto ser-se "cibocomparte". Enfim, dito assim, pode parecer estranho – e é – mas deixem-me dizer-vos que estes poderes são causa e efeito no facto destas histórias serem divertidíssimas.
Saffron também é totalmente diferente de Tony devido ao lado da justiça em que se encontra. Se Tony Chu é polícia, Saffron é uma criminosa. E isso faz com que, na primeira história, denominada Entrada, as duas personagens entrem em rota de colisão. Saffron faz escolhas erradas, rodeia-se de más companhias e acaba sempre do lado dos vilões. Na primeira história, a narrativa é mais em tom policial clássico. Os caminhos dos crimes de Saffron levam-na ao encontro de Tony Chu e algum deles terá que sair vitorioso.
Na segunda história, intitulada Mau Vinho, temos uma narrativa totalmente centrada em Saffron - sem que nenhum dos membros da sua família participe no enredo - que nos leva a uma viagem no tempo à França do séc. XIX. Funciona bem e tem qualidades interessantes ao nível da narrativa, mas pareceu-me que a resolução da história poderia ter sido melhor.
Curiosamente, e embora, como já referi, tenha havido uma alteração ao nível da dupla criativa responsável por esta BD, não é o estreante na série Dan Boultwood que me desapontou, mas sim - imagine-se! - o próprio John Layman. Bem, falar em “desapontamento” talvez seja exagerado da minha parte. A história mantém-se divertida e com um ritmo narrativo bastante rápido. Ou seja, vai ao encontro do que Tony Chu já nos havia dado. Todavia, na parte de "ser divertida", pareceu-me que o humor destas duas histórias, tendo bons momentos, claro, fica bastante aquém do humor louco, sem regras e estonteante do humor da série original. Se Tony Chu faz rir à gargalhada, Chu faz sorrir, vá. É divertido, mas mais consciente de si mesmo (o que em humor, geralmente, é uma má ideia). Não diria, pois, que Layman apareça desinspirado porque, afinal de contas, este livro funciona bastante bem e deverá agradar aos muitos fãs da série original, mas é inegável que a inspiração do autor não está tão em altas. Quer ao nível do argumento quer, especialmente, ao nível do humor.
Quanto ao novo ilustrador Dan Boultwood, devo dizer que me conseguiu impressionar com a sua belíssima arte. Ainda por cima, há que ter em conta, que o legado deixado por Guillory tinha bastante relevância. Boultwood consegue o feito de conseguir estar em linha com o universo visual criado por Guillory, mas, ao mesmo tempo, acrescentar a sua personalidade visual. Dito por outras palavras, Chu é fiel a Tony Chu sem ser uma cópia barata e conseguindo ter ideias próprias.
O traço de Dan Boultwood é extremamente dinâmico, moderno e com um elevado sentido de cartoon. De facto, por vezes até lembra alguns dos desenhos-animados mais modernos e bem conseguidos que se podem encontrar em canais como o Cartoon Network ou o Nickelodeon. Excelente nas expressões, nas poses estilizadas das personagens e nas fantásticas cenas de ação, nas planificações arrojadas e nas belíssimas cores, o autor revela estar bem à altura de Rob Guillory. Talvez só na questão dos desenhos com cariz mais humorístico, Boultwood fique um pouco abaixo do seu antecessor. Mas, mais uma vez, também há que lembrar que o próprio argumento de Layman não é tão hilariante neste Chu, portanto é natural que os desenhos também não sejam tão caricatos.
E merece ainda nota o facto de, na segunda história, o autor alterar um pouco a sua maneira de desenhar, oferecendo-nos uma proposta visual ainda mais audaz do que na primeira história onde, expetavelmente, talvez o autor tenha tentado aproximar o seu desenho ao de Guillory. Na segunda história, os desenhos são ainda mais “cartoonescos”, com cores mais suaves e detalhes (ainda) mais estilizados, que remetem para uma ilustração mais juvenil. Sem que isso belisque em nada a sua criatividade e bela execução. Chu é um livro magnífico ao nível da ilustração e Layman encontrou em Boultwood um sucessor completamente à altura de Guillory.
A edição da G. Floy Studio está bastante bem conseguida como, aliás, já é natural em outros trabalhos da editora. A capa é dura e baça, o papel é brilhante e de boa qualidade e a encadernação e impressão estão bem conseguidas, também. Mesmo ao nível do grafismo, o livro é bem executado. Nota ainda, muito positiva, para o generoso dossier de extras, com 20 páginas, que conta com ilustrações para capas alternativas, esboços das personagens e ainda algumas páginas que nos demonstram o processo de criação desta BD, desde as páginas do guião, passando pelos primeiros storyboards e culminando nas artes finais.
Em conclusão, mesmo sendo verdade que Chu fica uns furos abaixo da fantástica série Tony Chu, continua a ser uma proposta demais apetecível! Com efeito, não é por este Chu não ser competente que a série principal Tony Chu consegue ser melhor. Nada disso! Simplesmente, diria, o valor de referência deixado pela série principal era difícil de alcançar. Divertida, mas menos hilariante, esta nova história consegue entreter-nos com um sorriso quase constante, enquanto apreciamos um fantástico trabalho, ao nível de ilustração, por parte de Dan Boultwood. Recomendado!
NOTA FINAL (1/10):
8.7
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Chu
Autores: John Layman e Dan Boultwood
Editora: G. Floy Studio
Páginas: 256, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 177 x 268 mm
Lançamento: Fevereiro de 2023
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