quarta-feira, 5 de março de 2025

Análise: Corto Maltese - A Linha da Vida

Corto Maltese - A Linha da Vida, de Juan Díaz Canales e Rúben Pellejero - Arte de Autor

Corto Maltese - A Linha da Vida, de Juan Díaz Canales e Rúben Pellejero - Arte de Autor
Corto Maltese - A Linha da Vida, de Juan Díaz Canales e Rúben Pellejero

O mais recente álbum da muito celebrada série Corto Maltese - originalmente criada por Hugo Pratt - intitula-se A Linha da Vida e em Portugal foi lançado pela editora Arte de Autor, no final de 2024.

Ao contrário da versão dos autores Bastien Vivès e Martin Quenehen, que modernizou a série nos temas e nos desenhos - em álbuns como A Rainha da Babilónia ou Oceano Negro -esta incursão de Juan Díaz Canales e Rúben Pellejero tem tido uma abordagem clássica e canónica de Corto Maltese num total de cinco álbuns que passo a elencar: Sob o Sol da Meia Noite, Equatória, Dia de Tarowean, Nocturno Berlinense e este A Linha da Vida.

Corto Maltese - A Linha da Vida, de Juan Díaz Canales e Rúben Pellejero - Arte de Autor
Desta vez, estamos no final dos anos 1920, e Corto Maltese encontra-se no México para uma nova missão para Boca Dourada, que o incumbiu de negociar uma remessa de antiguidades com um arqueólogo a quem faltam escrúpulos e ética de negócio. Tudo parecia simples, mas só até ao momento em que o famoso marinheiro se vê forçado a ter que transportar um carregamento de armas para os Christeros, um grupo de rebeldes católicos que trava uma luta contra as leis anticlericais do governo republicano. Estão, então, lançados os dados para mais uma série de eventos que transportam o leitor para um clássico mundo de aventuras.

O livro mantém a tradição das narrativas de Corto Maltese, misturando exotismo, aventura e uma boa dose de reflexão existencial, e levando o protagonista a uma viagem repleta de intriga e enigmas históricos. 

Um dos elementos mais notáveis deste A Linha da Vida é o respeito pelo estilo original dos desenhos de Hugo Pratt. Não é uma surpresa, pois já assim tinha acontecido nos álbuns anteriores desta dupla de criativos. O ilustrador Pellejero assume, pois, um traço que dialoga de forma notável com o de Pratt, captando a expressividade e a melancolia de Corto Maltese sem cair numa simples imitação. Em certos momentos, a recriação gráfica de Pellejero chega mesmo a superar a original, com um jogo de sombras e composições de página que enriquecem a atmosfera e tornam a leitura visualmente estimulante e, por ventura, mais contemporânea.

Corto Maltese - A Linha da Vida, de Juan Díaz Canales e Rúben Pellejero - Arte de Autor

No entanto, a nível narrativo, nota-se que a fluidez da história nem sempre é tão bem conseguida. Existem momentos em que a transição entre cenas parece abrupta, dando a sensação de que certos elos narrativos foram subaproveitados ou mesmo deixados de lado. Esse aspeto pode comprometer o envolvimento do leitor, que, por vezes, precisa de um esforço adicional para conectar os diferentes acontecimentos e compreender plenamente as motivações das personagens. 

A história começa muito bem, mas parece que, ao longo da leitura, perde algum do seu fulgor e potencial inicial. Dos álbuns lançados até agora pela dupla Canales/Pellejero, o meu preferido continua a ser o anterior Nocturno Berlinense.

A construção dos diálogos mantém-se, porém, fiel ao espírito de Pratt, com um tom irónico e filosófico que caracteriza Corto Maltese e onde Canales é especialmente bem sucedido. 

Corto Maltese - A Linha da Vida, de Juan Díaz Canales e Rúben Pellejero - Arte de Autor
Outro aspeto interessante é a forma como o álbum equilibra ação e contemplação. Tal como nas histórias de Pratt, A Linha da Vida não se limita a ser um simples relato de aventuras, mas incorpora momentos de pausa e reflexão que reforçam a complexidade da personagem e a sua visão desencantada do mundo. Esse respeito pela tradição de Corto Maltese faz com que A Linha da Vida se encaixe harmoniosamente na continuidade da série, sem destoar do espírito original. Nota ainda, positiva, para o aparecimento de dois velhos conhecidos de Corto nesta história: Rasputine, que se assume como parceiro do protagonista, e Banshee O'Dannan, a revolucionária irlandesa.

A edição da Arte de Autor apresenta-se em consonância com os outros livros desta mesma coleção que a editora tem vindo a publicar. O livro tem capa dura brilhante, bom papel brilhante no interior e apresenta um bom trabalho quer na impressão, quer na encadernação.

Em suma, Corto Maltese – A Linha da Vida é um álbum visualmente belo que presta uma homenagem competente ao legado de Hugo Pratt. Embora a narrativa apresente alguns saltos menos fluídos e certas passagens não sejam tão bem desenvolvidas, a essência de Corto Maltese permanece intacta, e a arte de Pellejero consegue, em momentos, não apenas evocar, mas até superar o traço do Mestre original. 


NOTA FINAL (1/10):
8.3



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Corto Maltese - A Linha da Vida, de Juan Díaz Canales e Rúben Pellejero - Arte de Autor

Ficha técnica
Corto Maltese - A Linha da Vida
Autores: Juan Díaz Canales e Rúben Pellejero
Editora: Arte de Autor
Páginas: 80, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Novembro de 2024

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