quinta-feira, 6 de março de 2025

Análise: Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer

Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer, de Julian Voloj e Wagner Willian - Levoir e jornal Público

Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer, de Julian Voloj e Wagner Willian - Levoir e jornal Público
Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer, de Julian Voloj e Wagner Willian

Dentro das obras que constavam no cardápio da última Coleção de Novelas Gráficas que a Levoir lançou com o jornal Público, este Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer, da autoria de Julian Voloj e Wagner Willian, despertou-me especial interesse por assinalar a vida de Bobby Fischer, um dos mais conhecidos jogadores de xadrez de sempre. Confesso que conhecia Fischer apenas pela sua reputação de "génio do xadrez" e não tanto pela sua vida pessoal e, portanto, estava especialmente interessado em mergulhar nesta leitura.

Finda a mesma, devo dizer que estamos perante um bom livro que, com maior aprumo nas ilustrações, poderia almejar outros voos.

Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer, de Julian Voloj e Wagner Willian - Levoir e jornal Público
A trajetória de Bobby Fischer é especialmente fascinante por dois motivos: pelo seu talento inigualável no xadrez, claro, mas também pela complexidade da sua personalidade. E o argumentista Voloj consegue explanar isso bem, numa história que explora a ascensão meteórica e o declínio do lendário jogador de xadrez, oferecendo um retrato profundo e instigante acerca da sua vida e das forças que o moviam. A obra destaca, portanto, não apenas as conquistas de Fischer, mas também as suas contradições, as suas paranoias e o seu isolamento, proporcionando uma visão completa da sua trajetória.

E uma das coisas que mais me agrada neste livro é a forma como o argumentista estrutura a narrativa, utilizando o próprio jogo de xadrez como metáfora para os momentos-chave da vida de Fischer. Os paralelos entre as peças do tabuleiro e os acontecimentos cruciais da história do protagonista são engenhosamente traçados, conferindo à obra um carácter simbólico que enriquece a experiência do leitor. Além de que toda esta analogia deixa presente a ideia de que Fischer via a sua existência como uma partida de xadrez, onde cada decisão poderia significar vitória ou derrota.

Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer, de Julian Voloj e Wagner Willian - Levoir e jornal Público
A história começa por nos apresentar Bobby ainda em criança, que tinha um particular fascínio pelo xadrez. Fascínio esse que a sua mãe foi apoiando, juntamente com Carmine Nigro, o Presidente do Clube de Xadrez de Brooklyn, até à ascensão de Fischer ao topo do mundo do xadrez. 

O livro também dá especial destaque ao célebre confronto contra o russo Boris Spassky, em 1972, que transcendeu o desporto e que se tornou num assunto político da Guerra Fria, em que os Estados Unidos e a União Soviética pareciam competir em qualquer que fosse o assunto. Fischer tornou-se, então, uma peça central no tabuleiro geopolítico da época, sendo instrumentalizado tanto pelos Estados Unidos como pela União Soviética. Essa dimensão política da obra adiciona camadas de complexidade à narrativa, mostrando que a genialidade de Fischer vinha acompanhada por uma pressão constante. De todos os lados!

E talvez tudo isso somado, e não só, tenha levado ao declínio de Fischer que se tornou recluso de si mesmo, solitário e paranoico. Sofrendo de doença mental, e numa fase mais avançada da sua vida, Bobby acabou por se tornar polémico com declarações antissemitas e antiamericanas, especialmente após os atentados do 11 de Setembro de 2001, quando celebrou os ataques. E isso fez com que o mesmo ficasse ainda mais isolado, com a imagem pública completamente deteriorada, levando-o a viver exilado até obter cidadania islandesa em 2005. Tal como no xadrez, Fischer teve dificuldades em aceitar a derrota na sua vida e lidar com as consequências das suas escolhas. 

Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer, de Julian Voloj e Wagner Willian - Levoir e jornal Público
O livro também acerta ao evitar uma visão maniqueísta do protagonista. Fischer não é tratado nem como um herói, nem como um vilão, mas sim como uma figura trágica, presa entre a sua genialidade e os seus demónios internos e problemas mentais. Essa abordagem acaba por humanizar a personagem, permitindo que o leitor compreenda as suas motivações e conflitos sem que a sua grandiosidade no xadrez seja ofuscada.

Se a narrativa é um dos pontos altos da obra, a arte de Wagner Willian, embora eficiente nos seus rudimentos, poderia ser mais refinada. Fica claro que os desenhos de Willian são interessantes e que cumprem o seu propósito, mas parecem simplificados em demasia. Não "estragam", mas também não trazem pontos adicionais à obra. E tendo em conta que estamos perante uma história que é rica em simbolismos e detalhes, fica claro que uma abordagem ilustrativa mais detalhada poderia ter potencializado ainda mais o impacto da obra.

Apesar dessas limitações visuais, o uso do preto e do branco na ilustração é uma escolha acertada, pois além de reforçar o título e o próprio universo do xadrez, a ausência de cores ajuda a criar uma atmosfera sombria e introspectiva, alinhada ao tom da história. 

À semelhança do que acontece nos outros livros da Coleção de Novelas Gráficas da Levoir, a edição do livro é em capa dura baça, com bom papel baço no interior e uma boa encadernação. 

No conjunto, Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer é uma leitura envolvente e instigante, que captura com maestria os altos e baixos da vida de um dos maiores jogadores de xadrez da história. A analogia entre o xadrez e a sua trajetória de vida é um dos maiores trunfos da obra e embora o desenho pudesse ser mais refinado, a força da narrativa compensa essa limitação, garantindo uma experiência marcante para quem se interessa por Fischer e pelo fascinante universo do xadrez.


NOTA FINAL (1/10):
8.2



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer, de Julian Voloj e Wagner Willian - Levoir e jornal Público

Ficha técnica
Preto e Branco: Ascensão e Queda de Bobby Fischer
Autores: Julian Voloj e Wagner Willian
Editora: Levoir
Páginas: 184, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Formato: 177 x 249 mm
Lançamento: Outubro de 2024

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