Uma das mais recentes apostas da editora Distrito Manga foi este Joy, de Etsuko, que reúne, num só volume, duas histórias, Joy e Joy Second, respetivamente, que, juntas, se transformam numa história mais completa e auto-contida.
A narrativa centra-se em Okazaki Go, um mangaka especializado em shojo, e no seu assistente Yusuke, cuja presença é essencial no plano profissional do protagonista. Entretanto, Go é convidado a fazer um novo mangá gay (estilo BL, "Boys Love") e, coincidência das coincidências, é nesse mesmo dia que descobre que o seu assistente é homossexual. Ora, isto faz girar o motor narrativo principal, pois, a partir deste momento, Go decide fingir ter sentimentos platónicos por Yusuke para tentar estimular a sua imaginação a criar uma série de mangá gay. O que acabará por fazê-lo embarcar, de forma meio inconsciente, num processo de descoberta pessoal e afetiva.
Vou-vos ser sincero: a ideia é rebuscada, claro. E nota-se logo que não há aqui uma grande maturidade na forma como Etsuko trabalha a personagem principal, pois entre a sua pseudo-heterossexualidade inicial até ao momento em que se apaixona por Yusuke, a sua conduta parece demasiadamente homogénea, como se nada tivesse mesmo mudado em si. E, convenhamos, acredito que uma mudança na orientação sexual e alguém não seja algo que se faça de ânimo tão leve ou que essa mudança na vida não cause alterações na maneira de estar e viver desse alguém. E em nada disso, esses temas mais maduros, este Joy toca. Bem sei que este é um livro para um público jovem e que, criativamente falando, se tenha tentado uma abordagem leve do tema, mas talvez mesmo por essa razão, de se destinar mais a jovens, que poderiam, quiçá, procurar um apoio para a sua própria orientação sexual através deste livro, é que considero que se perdeu a oportunidade de se ser mais profundo.
Além de que a narrativa até se revela algo estereotipada, sobretudo no modo como as personagens nos vão sendo apresentadas, pois tanto Go como Yusuke parecem inicialmente prisioneiros de arquétipos bastante reconhecíveis. Embora isso torne a leitura leve e acessível, ao jeito de um sucedâneo japonês de Heartstopper - também limita o potencial emocional da obra.
Claro que o facto de não haver dramatizações excessivas nem moralizações, através de um tom quase quotidiano, também contribui, por outro lado, para um retrato mais humano e acessível da temática LGBTQ+, tornando o livro acessível para um público juvenil. Mesmo assim, para leitores mais adultos, a obra parecerá demasiado superficial.
No entanto, também devo reconhecer que, na segunda parte do livro, Joy Second, a obra ganha alguma profundidade, mergulhando em temas mais interessantes, como a tensão entre a dificuldade em expressar emoções verdadeiras e a forma como o amor pode emergir da convivência quotidiana. 
Além disso, a mudança comportamental entre o protagonista e Hibiki - uma personagem secundária que na primeira parte do livro era muito expectável, mas que ganha, em Joy Second, uma dimensão muito interessante - oferece à obra um equilíbrio mais apurado entre humor, ternura e introspeção, ficando esta mais cativante e menos previsível. Acho que o livro começa mal, mas sobe alguns furos em termos qualitativos graças à segunda parte da obra.
A nível gráfico, o traço de Etsuko é elegante e expressivo, com uma linha limpa que combina bem com o tom emocional da história. As expressões faciais são trabalhadas com sensibilidade, captando bem as subtilezas das várias emoções experienciadas pelas personagens. Não é um trabalho que, do ponto de vista visual, seja brilhante ou carregado de singularidade, mas é totalmente eficiente naquilo que se propõe ser.
Em termos de edição, o livro apresenta capa mole brilhante, sem badanas, e bom papel, boa impressão e boa encadernação.
Considero que esta aposta de lançar o mangá num único volume auto-contido é especialmente interessante no panorama editorial português, uma vez que pode funcionar como uma porta de entrada mais acessível para leitores que ainda não estão familiarizados com o universo do mangá. Não é caso único, bem sei, mas ainda é caso raro.
No conjunto, Joy é uma leitura leve, fluida e emocionalmente honesta, que não pretende revolucionar o género, mas sim oferecer um retrato sensível de dois jovens artistas a descobrirem-se a si mesmos e um ao outro. A sua maior virtude está na sinceridade e no tom equilibrado entre comédia e ternura. É um mangá que se lê bem e que deixa uma sensação de conforto, ainda que superficial. 
Em suma, Joy, ainda que uma obra simples, cumpre bem o seu papel como história de amor e descoberta pessoal. Não terá a profundidade emocional que eu esperava, mas talvez isso se deva ao simples facto de ser um trabalho que procura chegar a um público mais jovem.
NOTA FINAL (1/10):
6.8
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Joy (Edição Completa)
Autora: Etsuko
Editora: Distrito Manga
Páginas: 432, a preto e branco
Encadernação: Capa mole
Formato: 126 x 188 mm
Lançamento: Setembro de 2025






 
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