Diário de Uma Quarentena em Risco saiu no final de 2021, durante a Comic Con, e conta-nos, em cartoon, a forma como o autor Nuno Saraiva viveu e experienciou o confinamento a que a pandemia de Covid 19 nos obrigou. Não sendo este um livro de banda desenhada, mas sim, em cartoon, merece, quanto a mim, uma breve análise.
Estes são, aliás, cartoons que o autor foi publicando nas redes sociais ao longo dos meses e que aparecem agora reunidos num livro publicado pela Pim! Edições.
O livro está dividido por meses, em que, no início de cada um desses meses, o autor sintetiza em texto, os principais acontecimentos que deram origem aos seus cartoons. O que também acentua o cariz documental de todo o livro.
Devo dizer que Nuno Saraiva é um autor inteligente, que sabe fabricar uma boa piada. Isso já seria bom, mas considero que o autor vai mais além. Porque consegue passar-nos, adicionalmente, um humor que faz pensar e, em última análise, que até pode ter uma reflexão final, híbrida, com a capacidade de colocar-se em oposição ao tom da mensagem inicial.
É por isso que, apresentando certos disparates que foram sido praticados pela classe política em geral, mas, também, pela população, face a esta nova realidade que foi viver em tempos de pandemia, Nuno Saraiva acaba por, não raras vezes, nos deixar com um sabor amargo na boca face à piada que acabámos de ler. É um humor que nos deixa uma certa ternura e tristeza, além de nos deixar bem dispostos. O que é fantástico e infinitamente mais profundo do que uma qualquer piada superficial.
E, claro, a sátira também está lá bem presente, com o autor a sublinhar, segundo as suas crenças e reflexões, a forma como os media, os políticos, o mundo do desporto e, basicamente, todos os portugueses (re)agiram perante a pandemia de covid-19 e perante tudo o que ela acarretou.
Em termos de desenho, aprecio bastante o estilo de Nuno Saraiva, com desenhos que comunicam inequivocamente o humor – e, muitas vezes, outros significados duplos – do autor, e destaco que, provavelmente a melhor característica das ilustrações de Nuno Saraiva é que as mesmas estão impregnadas de uma enorme Portugalidade. E isso, meus caros, não é nada comum e é algo que merece todos os louvores!
Quanto à edição da obra, parece-me que estamos perante uma masterclass de como não editar um livro. O livro, sendo em capa mole, com uma boa textura e cantos arredondados, de forma a imitar um caderno moleskine, até é bastante apelativo aos olhos. Inicialmente, pelo menos. Porque está bonito à vista e agradável ao toque. Mas isso só dura até que o abramos.
Com efeito, ao ter-se apostado numa lombada colada, em vez de cadernos cosidos, o resultado é que a quase totalidade dos cartoons, que ocupam duas páginas, fiquem entre-cortados, levando a que o leitor não possa apreciar os desenhos do autor como seria elementar.
Dito por outras palavras, ao contrário de um caderno moleskine "a sério", que é possível de abrir de par em par – e onde o autor, aliás, ilustrou os desenhos originais – este livro não permite ser aberto dessa forma, o que faz com que os desenhos fiquem sempre cortados. E incompletos.
É daquelas coisas que me fazem abanar tristemente a cabeça e pensar: “como é que isto pôde acontecer?”. Estão a ver aqueles memes da internet que mostram portões colocados a meio de um passeio, sem qualquer muro ou cerca à sua volta? Ou postes de eletricidade que são colocados a meio de uma estrada? Ou torneiras que são montadas para cima, em vez de escorrerem a água para baixo? É essa sensação que a edição deste livro me dá. Se a ideia é apreciarmos um desenho, como é possível que essa coisa básica não seja, sequer, assegurada pela edição escolhida para este livro?
Valia mais, ter colocado cada cartoon em formato vertical, numa só página, e não fazer este atentado ao bom senso. Ou então, editar a obra em cadernos cosidos que, creio, permitiram abrir o livro na totalidade, tal como num moleskine.
Se os cartoons são bastante bons, com humor acutilante e, por vezes, reflexões que nos fazem sorrir enquanto o coração chora, a má edição deste livro, que corta a metade as ilustrações, acaba, lamentavelmente por “assassinar” um livro de forma acutilante, retirando-lhe todo o potencial que o autor e a obra mereciam. Repito: uma masterclass de como não editar um livro.
NOTA FINAL (1/10):
5.0
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Diário de uma Quarentena em Risco
Autor: Nuno Saraiva
Editora: Pim! Edições
Páginas: 240, a cores
Encadernação: capa mole
Lançamento: Dezembro de 2021
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