segunda-feira, 8 de julho de 2024

Análise: Last Call #1

Last Call #1, de Gonçalo Fernandes - Gorila Sentado


Last Call #1, de Gonçalo Fernandes - Gorila Sentado
Last Call #1, de Gonçalo Fernandes

Abrindo este texto meio de rajada, posso afirmar de forma convicta e sem grande medo de dizer um disparate, o seguinte: Gonçalo Fernandes pode ser a nova melhor "coisa" que a banda desenhada portuguesa nos oferece em 2024!

Este jovem português de quem pouca gente sabia alguma coisa até há umas semanas, é o autor de Last Call, uma série, ou uma revista, lançada pela Gorila Sentado - a editora de Daniel da Silva Lopes - há umas semanas, no Maia BD

Seguindo o modelo da editora independente, Last Call é uma banda desenhada lançada em forma de revista e reúne duas histórias, ou melhor, dois teasers, dois capítulos de duas histórias diferentes. A primeira, chama-se Triple Threat Terror e mergulha-nos no universo do wrestling, a luta livre americana, em que, após um emblemático combate, um dos lutadores aparece assassinado. Jack Rogers, outro praticante de wrestling dá de caras com o cadáver e acaba por ser constituído arguido, como suspeito principal, pela polícia. Embora a história nos leve depois para uma parte inicial(?) do interrogatório, a interrupção do relato, que nos estava a deixar tão bem entretidos, surge rapidamente, deixando muitas perguntas por  responder. Apreciei particularmente o estilo policial de investigação desta história, que me remeteu para um bom filme à americana.

Last Call #1, de Gonçalo Fernandes - Gorila Sentado
Mas Land of The Free, uma história bem diferente, também me deixou bem impressionado. Neste caso, acompanhamos uma veloz perseguição automóvel, também próxima de um filme americano. Rat é o perseguido e, com uma manobra arriscada, consegue escapar daqueles que vão no seu encalço, levando consigo uma mala que, aparentemente, tem um mapa que toda a gente procura. Não se sabe muito bem que tipo de tesouro esse mapa assinala - ou se é, efetivamente um tesouro - mas é claro que estamos perante alguma coisa que muitos parecem procurar. E Duke e Ray partem então à descoberta desse algo que o mapa aponta. Mais uma vez, chegamos à vinheta com a inscrição “to be continued” e ficamos na incerteza. E a chorar por mais!

Daquilo que pude ouvir na interessante apresentação que ocorreu sobre esta e outras obras da Gorila Sentado no Maia BD, verifiquei que cada uma destas duas histórias deverá ser fechada no próximo número de Last Call. Quanto a mim, parece-me que, acima de tudo, este primeiro número serve como apresentação de Gonçalo Fernandes. E que ótimo business card temos aqui! As histórias parecerem arquitetadas com personagens bem esculpidas, com motivações que são bem doseadas pelo autor e a própria narrativa, bem como a construção de diálogos espirituosos, é bastante impressionante. Estas podem ser as primeiras histórias do autor a verem a luz do dia, mas a verdade é que Gonçalo Fernandes parece bem experiente na criação de histórias!

Se as mesmas são interessantes, os desenhos de Gonçalo Fernandes também me deixaram muito bem impressionado! O seu traço a preto e branco semi-realista é rápido, nervoso e confiante, fazendo-nos crer que o autor não é o estreante que, na verdade, é. A planificação é dinâmica e cinematográfica e o tratamento das expressões faciais é bastante bem feito. Por vezes, especialmente na primeira história, senti alguma dificuldade em diferenciar as personagens - dado que existem vários pugilistas a terem cabelo comprido e, portanto, a serem bastante semelhantes entre si. Além disso, algumas fisionomias das personagens e sua linguagem corporal afastam-se, por vezes, da perfeição. No entanto, e sublinhando que o estilo do autor também é bastante livre e fluído, isto não chega a ser um problema. É mais um "feitio" do que um "defeito".

Last Call #1, de Gonçalo Fernandes - Gorila Sentado
Se há livros que me deixaram em “pulgas” para continuar as histórias que ficaram a meio, Last Call #1 é um deles.

A edição deste trabalho é em formato de revista, tal como é In The Dust of Our Planet ou Sweet Wind, obras da mesma editora. Parece-me um formato bastante original nos tempos atuais, que nos remete para o prazer - algo já longínquo e nostálgico -que era ler banda desenhada em revistas com histórias em continuação de número para número. É um sentimento rejuvenescido e agradável. Nota ainda, positiva, para o facto desta revista ter saído com duas capas diferentes, o que aumenta o cariz colecionável da proposta editorial.

Como ponto menos positivo - e tal como já afirmei na minha análise a In The Dust of Our Planet  - admito que preferia que esta revista fosse lançada em português. Reconheço que, hoje em dia, quase toda a gente fala e lê inglês sem grandes dificuldades e, além disso, esta opção por lançar as obras em inglês permite a possibilidade de exportação. Todavia, trata-se, estou certo, de uma publicação que será lida na sua grande maioria por portugueses e, por isso, na minha opinião, faria mais sentido que a obra fosse lançada em português. Mas, claro, é uma decisão da editora.

Em suma, fiquei muito feliz e animado por ler e conhecer o trabalho de Gonçalo Fernandes neste Last Call! Se há coisas que nós, adeptos de banda desenhada, gostamos de encontrar, é um novo talento nacional para o género. Gonçalo Fernandes é esse talento em bruto - embora já com bastante refinamento - que me ajuda a insistir nessa afirmação que tantas vezes digo de forma vaidosa: Portugal tem muitos autores talentosos! Gonçalo Fernandes, mesmo sendo “novato”, é uma promessa confirmada. Precisamos de (mais) livros deste autor!


NOTA FINAL (1/10):
8.5



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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Last Call #1, de Gonçalo Fernandes - Gorila Sentado

Ficha técnica

Last Call #1
Autor: Gonçalo Fernandes
Editora: Gorila Sentado
Páginas: 32, a preto e branco
Encadernação: Formato revista, com agrafos.
Lançamento: Maio de 2024

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