quarta-feira, 4 de maio de 2022

Análise: Urlo - Grito no Escuro

Urlo - Grito no Escuro, de Gloria Ciaponni e Luca Conca - Escorpião Azul

Urlo - Grito no Escuro, de Gloria Ciaponni e Luca Conca - Escorpião Azul
Urlo - Grito no Escuro, de Gloria Ciaponni e Luca Conca

Urlo - Grito no Escuro foi recentemente lançado no Coimbra BD e assume-se como a segunda obra que a editora Escorpião Azul nos ofereceu durante este ano. Da autoria da dupla italiana formada por Gloria Ciaponni e Luca Conca, devo dizer que este livro foi uma agradável surpresa, tendo em conta que eu desconhecia por completo estes dois autores.

Urlo - Grito no Escuro é totalmente recomendado para os adeptos dos filmes de terror. Aliás, a própria experiência de leitura que a obra nos dá, muito nos remete para a cinematografia desse subgénero. 

Um homem conduz por uma estrada que atravessa uma densa floresta até que, parado no meio da estrada, encontra um indivíduo que lhe pede ajuda. Mas, rapidamente, os eventos mudam quando essa pessoa ameaça o condutor do carro com uma arma de fogo e, juntamente com um parceiro do crime, faz o protagonista da história refém. Levando-o até uma cabana no meio da floresta, os raptores do nosso protagonista torturam-no e ainda o oferecem como presa de uma vil e medonha criatura monstruosa que têm aprisionada nessa cabana. Depois, revelando um divertimento malicioso e sádico, os raptores deixam a sua vítima fugir enquanto soltam o monstro no seu encalce. E a partir daí desenrola-se uma stressante e extenuante fuga e perseguição. Haverá escapadela possível? Terão que ler o livro para o saber.

Urlo - Grito no Escuro, de Gloria Ciaponni e Luca Conca - Escorpião Azul
O exercício narrativo é mais do que simples, mas lá que nos deixa absortos na leitura, lá isso deixa. De uma forma algo angustiante e viciante, até. Este é um daqueles livros que se lêem de enfiada. Dificilmente um leitor fará pausas na sua leitura apesar do seu volume de páginas generoso (104).

Como um autêntico filme de terror, ambos os autores, quer a argumentista na gestão da narrativa, ao nível dos tempos e ritmos da mesma, quer o ilustrador Luca Conca, na forma como nos oferece uma arte tão nervosa, rabiscada, crua e assustadora, nos passam uma ideia de tensão e de nervosismo constante.

É uma maneira muito simples de contar uma história, onde quase não são utilizados balões de fala porque, essencialmente, toda a história se sedimenta nesta perseguição inexplicável, mas assustadora, do monstro em relação ao protagonista. No entanto, há que dizer que funciona muito bem no objetivo – mais do que bem alcançado – de passar urgência, medo e terror para o leitor.

É claro que, por outro lado, confesso que teria gostado que os autores fossem um pouco mais além no significado e profundidade que esta perseguição e este medo inerente possam representar. Fazer a ponte entre isso e algo mais. Mas, lá está, talvez seja o meu lado de megalómano ao nível do argumento a querer mais só porque sim. Porque, bem vistas as coisas, nem todas as obras têm que ter significados profundos. A razão de ser de um livro pode muito bem ser o de nos levar numa viagem assustadora. E, nesse ponto, Urlo cumpre perfeitamente os objetivos.

Urlo - Grito no Escuro, de Gloria Ciaponni e Luca Conca - Escorpião Azul
Quanto à questão da arte ilustrativa, Luca Conca oferece-nos desenhos de uma elegante, embora rude, beleza. Com um traço amplamente riscado, de um modo quase esquizofrénico, é no talento ilustrativo do autor que assenta a maior força deste álbum. Embora o livro tenha 11 páginas a cores, a grande maioria do mesmo é a preto e branco. As vinhetas a cores são sempre belos desenhos de paisagens e cenários verdejantes, que nos convidam a mergulhar no espaço onde decorre a ação. Mas são os desenhos a preto e branco que ainda me agarraram mais. 

Independente de gostarmos – ou não – de um estilo de ilustração, que acarreta sempre uma grande dose de subjetividade na escolha, acho que há uma coisa (bem mais) objetiva que é a adequação de um estilo de ilustração à história que se pretende passar. Nesse tema, Luca Conca também marca aqui pontos com a maneira como passa os sentimentos de horror que a personagem principal vive. E, claro, a própria reprodução da “besta” ou do “monstro” está soberba, passando o temor que seria pretendido. Trabalho impecável!

Urlo - Grito no Escuro, de Gloria Ciaponni e Luca Conca - Escorpião Azul
Poderão existir algumas vinhetas que aparentam não ter recebido um cuidado tão aprimorado por parte do autor, mas, como o estilo do mesmo, quer seja mais ou menos detalhado, é muito rabiscado e sujo, acaba por ser uma fraqueza que não se sente por aí além e, mais importante ainda, que não estraga a fluidez da obra.

A edição da Escorpião Azul tem capa mole, papel de qualidade decente e uma boa encadernação. Considero que a capa não funciona tão bem como funcionaria, por exemplo, a imagem que é utilizada na contracapa do livro. Percebo que se pretenda fazer uma capa que não mostra praticamente nada, mas, mesmo assim, acho que a ilustração da capa leva isso demasiadamente à letra. Notas positivas para o prefácio de Gloria Ciaponni, que dá informações relevantes sobre a criação da obra, e para a bonita ilustração inédita que Luca Conca fez para esta edição portuguesa.

Em conclusão, Urlo – Grito no Escuro é uma autêntica homenagem ao cinema de terror e funciona muito bem, na forma como explora o medo, a urgência e a fuga pela sobrevivência, bem como o sadismo e maldade humana são infintios. Um excelente exercício narrativo que se recomenda.


NOTA FINAL (1/10):
8.0


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Urlo - Grito no Escuro, de Gloria Ciaponni e Luca Conca - Escorpião Azul

Ficha técnica
Urlo, Grito no Escuro
Autores: Gloria Ciaponni e Luca Conca
Editora: Escorpião Azul
Páginas: 104, a cores e a preto e branco
Encadernação: Capa mole
Lançamento: Março de 2022

8 comentários:

  1. Boa tarde Hugo posso sugerir-lhe que inclua na ficha técnica as dimensões e tipo de papel utilizado na obra? Desde já agradeço-lhe.

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    1. É uma boa sugestão. Quanto às dimensões do livro, acho isso bem mais fácil porque normalmente é uma informação que as editoras disponibilizam. Já quanto ao tipo de papel, tenho mais reservas em fazê-lo com o receio de poder utilizar um termo incorrecto. É claro que nós, leitores "batidos", sabemos o que é um papel de boa ou má gramagem assim que lhe tocamos. Mas já quanto aos termos técnicos, creio não ter as nomenclaturas corretas.

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    2. Bom dia Hugo, deixo-lhe umas pistas (são todos papéis comuns):
      - Papel couché mate ou fosco (sem brilho)
      - Papel couché brilhante
      - Papel offset branco ou IOR
      - Papel offset especial (marfim, beije, com textura, etc...)

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    3. Obrigado pelas informações. Mas, lá está, eu normalmente chamo ao papel couché mate ou fosco... "papel baço". Em texto corrido ainda vai... agora nas informações técnicas, não sou tão preciso.

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  2. Quanto a esta obra, confesso que não a li e não estou familiarizado com os autores mas as imagens já me tinham chamado á atenção. Pergunto-me porque é que a Escorpião Azul não respeitou a diagramação e o design original da obra? Queiramos ou não a capa vende e esta, francamente não cumpre essa função. Falando ainda de autores italianos com peso e reconhecimento mundial onde estão Gipi, Igort, Manuele Fior, Liberatore, Andrea Pazienza, Mattioli, Sergio Ponchionne, etc etc...?

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    1. Eu creio que esta edição da Escorpião Azul se baseia numa reedição recente da obra, visto que a mesma foi aumentada e revista há uns tempos, creio. Estou a falar "de cabeça" mas acho que foi assim. Sim, concordo que seria bom que tivéssemos cá lançados, (mais) autores italianos de renome, como aqueles que refere.

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    2. Boas Hugo, tanto quanto consegui apurar, tanto no site da editora original (SaldaPress) como na Amazon.it, a imagem de capa mais recente (Novembro de 2021) não é a apresentada pela Escorpião Azul. Ainda em relação a outros autores italianos, a Escorpião Azul, aparentemente irá lançar outra obra ainda este mês "Cicatriz" de Renato Chiocca e Andrea Ferraris. Esta obra vem daquela editora que, pessoalmente, considero a melhor de Itália - a Oblomov Edizione, onde vários dos autores que citei publicam regularmente). Gostaria de acreditar que isto seja um prenúncio de outras (e melhores) obras a editar. Dou o benefício da dúvida...

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    3. Sim, o "Cicatriz" está para breve. Recentemente a Escorpião editou também o "Churubusco", do mesmo autor. Há muitas coisas boas com origem italiana, sim. :)

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