A ASA acaba de publicar o quarto e último volume da série Spirou - A Esperança Nunca Morre…, de Émile Bravo, e que bom que foi poder mergulhar nesta história original e iniciática de Spirou e Fantásio, que coloca estas personagens a que nos fomos habituando num sem número de aventuras que acompanharam a nossa juventude, naquele que será o mais impactante momento das suas vidas: a Segunda Guerra Mundial, com toda a crise de valores e humanidade que a mesma levantou e a consequente invasão da Bélgica pelas tropas nazis.
Neste quarto volume, que termina a história - sendo o mais curto dos álbuns, com apenas 45 páginas - a narrativa de todo o arco – incluindo até o próprio Diário de Um Ingénuo - é fechada, deixando ficar no ar a ideia de que o propósito deste quarto volume foi mesmo essa, a de resolver a história e os desígnios que a sorte(?) deixou para cada uma das personagens com que Spirou se foi cruzando ao longo desta densa e marcante aventura imaginada por Émile Bravo.
Conforme já escrevi a propósito dos livros um, dois e três, Bravo tece uma trama complexa, repleta de intriga, suspense e momentos de intensa emoção. A profundidade psicológica dos personagens é explorada de maneira convincente, adicionando camadas de complexidade à história.
Esta é uma série de qualidade superior, que nos faz rir, chorar e, acima de tudo, refletir sobre aquilo que, há não tanto tempo assim, era a realidade político-social na Europa “supostamente” desenvolvida, bem como aquilo que, nos dias de hoje, e com o devido distanciamento, poderemos desejar e/ou temer para o nosso presente e futuro. É pois, um livro sério, maduro, que nos faz engolir em seco inúmeras vezes.
É, igualmente, uma obra com belos desenhos, que nos remetem para a escola de Hergé, que mesmo podendo parecer ser ilustrações orientadas para um público mais infanto-juvenil, quando olhadas através do ponto de vista do conjunto do argumento e dos desenhos, acabam por trazer uma reflexão profundamente madura e, portanto, mais alcançável por mentes mais adultas.
Não posso deixar de lamentar por ter que dizer adeus a estas personagens, pelas quais fomos construindo um laço. E talvez seja mesmo por isso que, de alguma forma, este quarto e último volume da série saiba a pouco. Não sei se será por ser um livro muito curto, mas é verdade que quando fechado o mesmo, nos apetece voltar à primeira página do primeiro volume ou, com mais rigor, à primeira página de Diário de Um Ingénuo, onde começou a ser construída a visão de Bravo para esta personagem tão emblemática da banda desenhada mundial como é Spirou.
Não obstante, se o final é belo, a minha única queixa é que me parece algo apressado a certo nível. Talvez certas decisões narrativas precisassem de mais algumas páginas/vinhetas para melhor ficarem resolvidas.
A edição mantém-se fiel aos outros livros da coleção: apresenta capa dura braça, bom papel brilhante e um bom trabalho ao nível da edição e da impressão. Não costumo falar muito do preço dos livros, mas desta vez parece-me que a editora poderia ter baixado ligeiramente (nem que fosse 1 ou 2 €) o preço do livro. Apenas e só porque se trata de um livro com quase um terço das páginas do volume 3 que, curiosamente, também apresenta o mesmo preço de 19,99€. Por outro lado, e olhando para o “copo meio cheio” também é verdade que, dessa vez, em que o livro tinha 114 páginas a cores e em capa dura, talvez o preço fosse mais barato do que o expectável. Ambas as interpretações serão válidas. De qualquer maneira, deixo a minha nota.
Seja como for, tenho que aplaudir a decisão da ASA em lançar esta série que, pela sua qualidade e pertinência, merecia (há muito!) ter uma versão em português. Faço até votos para que a editora se mantenha neste caminho de aposta em banda desenhada de qualidade inequívoca. Com sinceridade, e passados alguns anos de inconcebível letargia editorial no que à banda desenhada diz respeito, parece-me legítimo afirmar que a ASA vive dos melhores momentos da última década em termos de qualidade de BD editada. Que assim se mantenha!
Em suma, e voltando a este A Esperança Nunca Morre…, está é uma série absolutamente imprescindível. O que distingue esta obra de todos os outros livros de Spirou – e até mesmo da quase totalidade das séries clássicas de BD franco-belga - é a abordagem adulta, sombria e de reflexão que emana da obra. Porque em vez de se concentrar nas aventuras leves e cómicas características de Spirou, Bravo mergulha nas profundezas de um dos mais relevantes conflitos bélicos na história da humanidade, explorando as consequências emocionais e morais da guerra. Muito bom!
NOTA FINAL (1/10):
9.6
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Spirou - A Esperança Nunca Morre... Quarta Parte
Autor: Émile Bravo
Editora: ASA
Páginas: 48, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 240 x 319 mm
Lançamento: Abril de 2024
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