sexta-feira, 1 de setembro de 2023

Análise: A Little Girl

A Little Girl, de André Caetan

A Little Girl, de André Caetan
A Little Girl, de André Caetano

Foi no ano 2021 que André Caetano lançou a sua primeira banda desenhada a solo, assumindo as funções de argumentista, para além das de ilustrador. E o resultado é um belo livro onde o autor dá azo à sua capacidade para criar belas e misteriosas ambiências visuais. Falo-vos de A Little Girl.

E aquilo que o autor nos propõe neste pequeno livro de 32 páginas, é uma representação livre e muda do clássico O Capuchinho Vermelho. Não há qualquer tipo de legendas ou falas neste livro. E embora a história do Capuchinho Vermelho seja uma das mais conhecidas e das que mais se mantêm presentes no imaginário infantil, André Caetano optou por não fazer uma adaptação literal da história clássica, mas, antes, pegar no tema central do conto infantil – incluindo a personagem da menina, o bosque misterioso, o caminho para casa e a presença de um temível lobo (ou será loba?) – e readaptá-lo de forma a criar uma história que bebe da sua própria inspiração.

A Little Girl, de André Caetan
A não utilização de texto permite que nos centremos única e exclusivamente nos desenhos que o autor nos dá. E que belos eles são! Neste registo a preto e branco puro, onde André Caetano faz bom uso do espaço negativo e das francas camadas de preto e sombra, é justo dizer que o trabalho do autor português é impressionante e carregado de beleza. Tenho gostado bastante das obras de André Caetano, mas neste A Little Girl, os seus desenhos pareceram-me especialmente inspirados. Para isso, também conta que Caetano tenha sabido escolher bem a história a ilustrar. Tal como, na música, quando se faz uma cover de uma canção, é necessário escolher bem e de acordo com as nossas valências enquanto músicos, também na banda desenhada, quando se escolhe adaptar um clássico da literatura, é crucial que se escolha bem. E André Caetano mostrou-se inteligente na sua escolha.

Com efeito, o tratamento das paisagens onde abundam luxuriantes florestas é o ponto alto na criação visual do autor nesta obra, mas o próprio tratamento das personagens, e do seu belo rol de expressões, ou o aterrorizante lobo, permitem afirmar que André Caetano é um dos principais talentos da banda desenhada nacional. É certo que, em termos de narrativa visual, nem sempre é claro e inequívoco para o leitor, aquilo que está a acontecer, mas, ainda assim, depois de uma segunda leitura, julgo ter percebido o que realmente acontece com a protagonista da história.

A Little Girl, de André Caetan
Talvez por esta incerteza na total compreensão da trama, julgo que talvez a história merecesse mais algumas páginas para melhor ser apreendida. Contudo, e assumindo que o intento do autor é mais uma nova abordagem a um breve texto clássico, também se compreende e aceita a opção de André Caetano. Se isto fosse cinema, este A Little Girl seria uma curiosa e bela curta metragem, portanto.

Quanto à planificação, o autor revela ter um belo domínio na forma como os tempos da narração são geridos, dotando a obra de uma bela dinâmica. Destaca-se o truque utilizado, com belo efeito, que coloca a protagonista a deambular, em vários momentos, pela mesma paisagem que nos é dada numa ilustração maior. Funciona muito bem e traz ritmo e dinâmica à leitura.

Em termos de edição, e especialmente tendo em conta que estamos perante uma edição de autor, o livro apresenta boa qualidade. Com capa mole baça e bom papel baço, o livro apresenta boa impressão e encadernação. Em termos de edição, e mesmo admitindo que estamos perante um livro curto em páginas, lamento que a lombada não tenha qualquer informação. Por mais fino que o livro seja, considero sempre que a presença do título da obra na lombada é obrigatória. Não apenas por uma questão de O.C.D. da minha parte, mas também porque, no meio de tantos livros que estão nas estantes de um amante de banda desenhada, a existência de um livro sem qualquer informação na lombada pode bem significar que esse livro possa ficar perdido e esquecido durante muitos anos nessas mesmas estantes. Mais do que uma opção estética, a lombada é uma opção técnica.

A Little Girl, de André Caetan
De resto, há que aplaudir que o livro venha acompanhado por um postal promocional e por uma folha A4 com o mapa que nos procura demonstrar os locais por onde a protagonista da história passa. Gostei ainda que o autor nos desse uma breve explicação para a existência da história e de como a criação da mesma surgiu do convite da Associação Cultural Casa da Esquina que, aliás, acaba por estar envolvida na edição da obra. É ainda disponibilizado um link para uma banda sonora considerada adequada para acompanhar esta leitura muda. Todas estas coisas demonstram bem o cuidado que André Caetano depositou nesta sua edição de autor. O que é muito louvável e acaba por aproximar o autor dos leitores.

Embora o livro seja mudo, o título, as informações técnicas e o texto explicativo de André Caetano estão na língua inglesa, o que indicia a tentativa do autor em exportar a sua criação.

Refira-se, por fim, que a capa deste livro é qualquer coisa de mágico e belo. Que capa maravilhosa!

Em suma, A Little Girl é apenas mais uma prova do enorme potencial de André Caetano que revela que, mesmo saindo um pouco para fora da sua zona de conforto em relação àquilo a que o autor nos habituou noutros trabalhos que editou, André volta a sair-se bem e dá-nos um belo livro que merece ser conhecido por mais gente e que nos volta a colocar no caminho da célebre Capuchinho Vermelho.


NOTA FINAL (1/10):
8.4



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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A Little Girl, de André Caetan

Ficha técnica
A Little Girl
Autor: André Caetano
Editora: Independente (Edição de Autor)
Páginas: 32, a preto e branco
Encadernação: Capa mole
Formato: 170 x 240 mm
Lançamento: Julho de 2021
Pode ser adquirido aqui

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