Feyman é uma das propostas de banda desenhada mais recentes da editora Gradiva. A obra foi lançada durante o passado mês de Julho e, como o próprio nome assim sugere, estamos perante uma biografia de Richard Feynman, uma das mentes mais brilhantes do século XX, que chegou mesmo a ser laureado com o Prémio Nobel.
A obra é assinada pelos autores americanos Jim Ottaviani e Leland Myrick e procura dar-nos uma visão sobre a vida de uma das grandes personalidades dos últimos 100 anos. Afinal de contas, para além do Prémio Nobel, Richard Feynman trabalhou no Projeto Manhattan, contribuindo para a criação da bomba atómica, fez várias descobertas em relação às causas do desastre do vaivém Challenger e ainda apresentou ao mundo importantes inovações no domínio da eletrodinâmica quântica.
Para além disso, Feynman era uma daquelas mentes inquietas e sempre ocupadas em descobrir o porquê de certas coisas. Talvez por isso, para além da sua brilhante carreira científico-académica, também se tornou músico e arrombador de cofres. E arrombava-os apenas pelo prazer que lhe dava o desafio de contornar as dificuldades em abrir um cofre. Ah, e também era um bon vivant e um claro contador de histórias. É difícil ser-se mais interessante do que Feynman, não?
A narrativa arquitetada por Jim Ottaviani acompanha a vida de Feynman, desde a sua infância, até à sua carreira académica e à sua contribuição para o Projeto Manhattan, durante a Segunda Guerra Mundial. Ao longo do caminho, os leitores são apresentados às teorias e ideias revolucionárias de Feynman, incluindo a sua abordagem inovadora para a mecânica quântica, que lhe rendeu o Prémio Nobel de Física em 1965.
Um dos aspetos mais notáveis neste livro é a maneira como o mesmo aborda não apenas os triunfos de Feynman, mas também as suas lutas, incapacidades e desafios pessoais. O que nos revela uma personalidade mais humana. A sua dedicação à pesquisa, a sua paixão pela música e luta contra a doença da sua esposa são elementos cruciais da narrativa que contribuem para a profundidade da personagem e para a empatia que os leitores sentem por ela. Acaba por não ser “apenas” uma biografia científica, mas também uma celebração do espírito inquisitivo e da paixão pela exploração intelectual. Richard Feynman é apresentado como um exemplo inspirador de como a curiosidade e a determinação podem levar a descobertas significativas e impactantes no campo da física.
Além disso, a obra também explora as complexidades éticas do trabalho de Feynman no Projeto Manhattan, levantando questões importantes sobre o uso da ciência em contextos militares e os dilemas morais que os cientistas podem enfrentar. Embora o faça de um modo algo leve e superficial.
Todavia, por oposição, onde o livro mais peca, quanto a mim, é que passa muito tempo a falar de forma muito superficial sobre algumas das teorias de Feynman, misturando esses momentos com alguns acontecimentos da vida pessoal do protagonista e, depois, na parte final do livro, contraria-se a si mesmo na abordagem, presenteando os leitores com uma enorme e complexa explicação da teoria que valeu o Prémio Nobel a Feynman. Acaba por ser incoerente.
Na maior parte das vezes, os autores nem tentam descrever ou explicar as ideias de Feynman. Apenas as referem. Mas, lá mais para o final do livro, é que nos é dada uma explicação mais desenvolvida do pensamento do cientista. O que faz parecer que foi alguém que leu o livro e disse aos autores: “vocês mencionaram tudo, mas não explicaram verdadeiramente nada. É melhor que revejam isso na parte final do livro”. Portanto, das duas, uma: ou o livro explicava melhor os pensamentos e objetos de estudo que Richard Feynman foi tendo ao longo da sua vida, de forma orgânica, ou, então, não se preocupava em explicar, depois, de forma tão pormenorizada, a parte final do livro. Fica no meio caminho entre ser um trabalho mais biográfico, e ser um trabalho mais científico.
Os desenhos da autoria de Leland Myrick apresentam um traço simples e meio “tosco”, por vezes algo linear demais, mas que tem a valência de ser eficaz na história que nos é dada. Não encanta, mas funciona bem, portanto. Talvez por essa simplicidade no desenho – que atribui poucas características gráficas a cada uma das personagens – por vezes torna-se difícil distinguir algumas personagens.
Na parte em que os autores optaram por explicar as ideias de Feynman que lhe permitiram chegar à teoria que lhe valeu o Prémio Nobel – a tal parte final do livro – o trabalho de Leland Myrick funciona muito bem. Especialmente se tivermos em conta a complexidade dos temas que aqui nos são apresentados. Era difícil fazer melhor.
A edição da Gradiva é em capa mole baça, com badanas, e o miolo apresenta bom papel brilhante. De resto, a encadernação e a impressão são boas. No final, na extensa bibliografia de 11 páginas do livro, há alguns esboços de várias personagens que adornam estas páginas.
Em suma, Feynman é um livro que, embora tenha alguns problemas que o afastam de ser uma obra mais marcante, tem, no entanto, o louvor de nos dar a conhecer o lado mais humano de uma das mentes mais brilhantes, criativas e dinâmicas que habitou o nosso planeta.
NOTA FINAL (1/10):
7.0
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Feynman
Autores: Jim Ottaviani e Leland Myrick
Editora: Gradiva
Páginas: 272, a cores
Encadernação: Capa mole
Formato: 15,20 x 21,50 cm
Lançamento: Julho de 2023
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