Das poucas coisas que podemos considerar como “certas na vida”, uma delas é que um novo livro de Ed Brubaker vai, com certeza, agradar a um admirador de histórias policiais em banda desenhada! É praticamente uma verdade consumada ainda antes de se ler um livro do autor! De facto, ainda está para vir o primeiro álbum da dupla formada pelos americanos Ed Brubaker e Sean Phillips, que não é um prazer para ler. É claro que alguns livros serão melhores do que outros, mas o selo de qualidade está lá sempre presente.
Amigo do Diabo é a segunda história da série Reckless, que nos mergulha na vida de Ethan Reckless. Já o tínhamos conhecido no primeiro volume, mas, neste segundo livro da série, a história é ainda mais marcante, pesada e bem costurada por parte de Brubaker.
Sinto que já me vou repetindo muito quando escrevo sobre este autor, mas há que dizer o que tem que ser dito: Ed Brubaker é bem capaz de ser o melhor escritor policial da banda desenhada. Não apenas de agora, mas de sempre. As suas histórias continuam a ser impactantes, profundas, sujas, deprimentes e um espelho para um mundo perdido em si mesmo, onde a esperança é um luxo que já não vale a pena almejar. Se as histórias são boas, a escrita continua a ser bem pensada, bem gerida, bem pesada (no tom) e bem construída.
Poderão dizer-me: “Ah, mas os livros do Ed Brubaker são todos um bocado parecidos entre si”. Responderei: “Sim” e “Não.”. De facto, se tivermos em conta outras obras como Criminal ou The Fade Out, Reckless poderá parecer “mais do mesmo”. Mas se a fórmula é tão boa, que me continuem a dar a mesma fórmula, direi eu! É verdade que a escrita é semelhante e o próprio estilo de história noir, onde habitam personagens desgastadas por uma sociedade que tudo desgasta, também é parecido. No entanto, a história não é sempre a mesma. Livro após livro, Brubaker apresenta-nos novos protagonistas.
Em Amigo do Diabo, continuamos a acompanhar Ethan Reckless, mas, as histórias de cada volume são independentes entre si. Não precisam, portanto, de ler o primeiro livro para ler este segundo volume da série. Embora, claro está, isso seja sempre aconselhável.
Ethan Reckless é, pois, alguém cuja profissão é resolver aquele tipo de problemas que interessa que sejam resolvidos sem envolver a polícia. Pode ser a cobrança de uma dívida, uma investigação privada ou ter que lidar com individualidades do submundo do crime. Um trabalho já de si pesado e que, pelo caminho, traz muitas inimizades ao protagonista. Estamos no ano de 1985 e, quando tudo parecia estar a correr bem a Ethan, eis que surge Linh, uma bela mulher com quem começa a viver uma relação que parece boa demais para ser verdade. Eventualmente, essa mulher, leva Ethan a investigar sobre a sua meia-irmã que desapareceu, tendo sido dada como desaparecida pelas autoridades. E, ao fazê-lo, Ethan desmascara uma grande conspiração que envolve grandes nomes do cinema americano.
Ora, este é o princípio para uma investigação que mostrará um lado mais negro de Hollywood, incidindo sobre os filmes snuff e sobre a presença de cultos e seitas que utilizavam atrizes para filmes amadores, cujo conteúdo consistia em práticas que envolviam profanações, sacrifícios e orgias que, muitas vezes, acabavam por conduzir atrizes à sua própria morte. Isto já para não falar de skinheads que também marcam presença nesta investigação de Ethan. O tema do livro acaba, portanto, por se tornar pesado.
Toda a história está brilhantemente construída por Brubaker e flui muito bem. Note-se que a própria forma como Ethan conhece Linh, parece perfeitamente aleatória e real. Gosto especialmente quando um autor começa por nos dar uma história que parece que nos vai conduzir a um lado, mas que, depois, nos leva para um outro lugar que não tínhamos previsto inicialmente.
Em termos de ilustrações, temos um trabalho de Sean Phillips que é igual a si mesmo. O seu traço mantém-se grosso e moderno, embora apresente um aura vintage no resultado final. Costumo dizer várias vezes que não considero os desenhos de Sean Phillips como algo estrondoso em termos de execução ou beleza. E isso mantém-se. Contudo, livro após livro, o autor vai-me convencendo, cada vez mais, de que é o autor perfeito para ilustrar as histórias de Brubaker, já que o seu estilo assenta que nem uma luva nas histórias arquitetadas por aquele. Até podemos não ser fãs das ilustrações de Sean Phillips, mas há que admitir que as mesmas funcionam perfeitamente bem. Também as cores, feitas pelo filho de Phillips, Jacob Phillips, são bastante bem executadas, apresentando tons mais vivos – quando comparados, por exemplo, com os de Criminal –, o que ajuda a localizar as histórias na Los Angeles dos anos oitenta. Funciona muito bem.
A edição da G. Floy Studio é bem conseguida. O livro tem capa dura baça e o papel do miolo é brilhante e de boa qualidade. A impressão e encadernação também são boas. No final do livro, há um posfácio escrito por Ed Brubaker que nos elucida sobre o porquê de o autor ter abordado certos temas neste livro.
Em suma, se o primeiro volume de Reckless já tinha sido bom, este segundo livro, intitulado Amigo do Diabo, eleva ainda mais a qualidade da série, não ficando nada atrás da fantástica série Criminal. Não há como negá-lo: sou um confesso admirador de Ed Brubaker e dos seus romances noir!
NOTA FINAL (1/10):
9.3
Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020
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Reckless #2 – Amigo do Diabo
Autores: Ed Brubaker e Sean Phillips
Editora: G. Floy Studio
Páginas: 144, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 18 x 27,5 cm
Lançamento: Fevereiro de 2023
Muito bom.
ResponderEliminarSem dúvida!
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