terça-feira, 29 de julho de 2025

TOP 10 - A Melhor BD lançada pela Ala dos Livros nos últimos 5 anos!


A propósito da comemoração dos 5 anos de existência do Vinheta 2020, trago-vos um especial que começa a partir de hoje e que procura celebrar e assinalar a melhor banda desenhada que cada uma das principais editoras portuguesas editou nos últimos 5 anos. Durante as próximas semanas tentarei, pois, oferecer-vos um artigo por editora.

Convém relembrar que este conceito de "melhor" é meramente pessoal e diz respeito aos livros que, quanto a mim, obviamente, são mais especiais ou me marcaram mais. Ou, naquela metáfora que já referi várias vezes, "se a minha estante de BD estivesse em chamas e eu só pudesse salvar 10 obras, seriam estas as que eu salvava".

Faço aqui uma pequena nota sobre o procedimento: considerei séries como um todo e obras one-shot. Tudo junto. Pode ser um bocado injusto para as obras autocontidas, reconheço, e até ponderei fazer um TOP exclusivamente para séries e outro para livros one-shot, mas depois achei que isso seria escolher demasiadas obras. Deixaria de ser um TOP 10 para ser um TOP 20. Até me facilitaria o processo, honestamente, mas acabaria por retirar destaque a este meu trabalho que procura ser de curadoria. Acabou por ser um exercício mais difícil, pois tive que deixar de fora obras que também adoro, mas acho que quem beneficia são os meus leitores que, deste modo, ficam com a BD que considero ser a crème de la crème de cada editora.

Em cinco anos de edição ininterrupta de banda desenhada, há naturalmente muitos títulos editados e, como devem calcular, a tarefa não foi fácil e vi-me forçado a excluir obras fantásticas, mas, lá está, há que fazer escolhas e estas são as minhas escolhas.

Hoje começo com uma editora cujo contributo para o lançamento de boa banda desenhada em Portugal é verdadeiramente inegável: a Ala dos Livros.

Esta editora tem um catálogo que considero de extrema qualidade. São (muito!) mais as obras que adoro da editora, do que aquelas de que não gosto. Não foi fácil, mas aqui está o meu TOP

Eis, mais abaixo, as minhas obras favoritas lançadas pela editora Ala dos Livros:



TOP 10 - A Melhor BD lançada pela Ala dos Livros entre 2020 e 2025



10. Shi
Autores: Zidrou e Homs
Lançamento: Setembro de 2024


Originalmente lançada em 2017, esta série, ainda em continuação, depressa conquistou uma grande aclamação pelo público e crítica. Coisa que, olhando para o trabalho fortemente inspirado de Zidrou e Homs, não surpreende. O primeiro ciclo de Shi é composto por quatro tomos, enquanto que o segundo e terceiro ciclos, são constituídos, cada um, por dois tomos. No total, a série está pensada para vir a ter oito tomos.

Se ainda não compraram este livro, não percam mais tempo, pois é seguro que ficarão bem servidos numa autêntica orgia visual onde Homs se assume como um dos melhores ilustradores em banda desenhada, e onde Zidrou se arrisca numa história complexa, intensa, impactante e que consegue transformar Shi num clássico instantâneo da banda desenhada franco-belga. Obrigatório!

Análise completa a esta obra, aqui



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9. O Fogo
Autor: David Rubín
Lançamento: Março de 2025



A obra apresenta-se como uma experiência visceral, em que cada página parece arder com uma energia incontrolável. A maneira como o autor trabalha a composição gráfica e a paleta cromática não só reforça a intensidade dramática da história, mas também convida o leitor a sentir, quase fisicamente, o peso das escolhas e das angústias das personagens. E a fantástica arte de Rubín, com o seu traço dinâmico e expressivo, é uma extensão direta da temática: a vida adulta como um incêndio que devora tudo à sua passagem.

Ao fechar o livro, fica a sensação de um incêndio que consumiu não apenas as páginas, mas também parte de nós. É impossível sair ileso desta leitura. Há um eco persistente das suas imagens e palavras, uma angústia que nos acompanha já depois de chegarmos à última página. Esta é uma dessas obras raras que, ao invés de simplesmente serem lidas, são sentidas na pele e na alma. Por tudo isso, O Fogo é um livro de uma potência rara. Não se trata apenas de uma história, mas de uma experiência emocional e estética que desafia o leitor a confrontar-se com a própria efemeridade da existência. Com uma força bruta e uma honestidade cortante, David Rubín oferece-nos uma obra que nos faz sentir mal – e que, justamente por isso, se torna inesquecível.

Análise completa a esta obra, aqui


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8. Menina Baudelaire
Autor: Yslaire
Lançamento: Fevereiro de 2023


Adotando liberdades criativas, Yslaire procura mostrar-nos o lado oculto da história de Baudelaire e quem era a sua Vénus Negra, uma mestiça que, à época, e tendo em conta o seu tom de pele, muito indignava as gentes que rodeavam o poeta Baudelaire.

Considerando-me um bom conhecedor da obra de Yslaire, que já observei cuidadosamente durante muitas horas da minha vida, devo dizer que há algo nas ilustrações do autor que o fazem sobressair dos demais. Há um charme, uma beleza, uma classe e uma sensibilidade nos seus desenhos que os tornam magníficos. Talvez não seja o autor perfeito para ilustrar uma banda desenhada de ação ou de aventura, mas, quando estamos perante uma história infinitamente romântica, com laivos de uma sensualidade de outrora com que, nos dias de hoje ousamos apenas sonhar, Yslaire é imbatível. Na minha humilde opinião, é o melhor autor para este tipo de histórias. Ora, este Menina Baudelaire, sendo uma história de época e carregada de amor e paixão, encaixa que nem uma luva nos interesses e vocação primordial do autor.

Análise completa a esta obra, aqui


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7. A Estrada
Autor: Manu Larcenet
Lançamento: Março de 2024



Se é otimismo aquilo que procuram num livro, seguramente não o encontrarão em A Estrada. Escolham outro caminho, escolham outra Estrada. Neste universo desolado, com cinzas a cobrir toda a superfície, com a humanidade em colapso e com um planeta que deixou de funcionar do modo que conhecemos, apenas há algo a fazer para os que ainda persistem: a luta pela sobrevivência. Para aqueles que estão dispostos a mergulhar na plena escuridão, A Estrada oferece uma experiência literária profundamente impactante e memorável. Aqui, tudo é feito com precisão, com emoção e com uma beleza pérfida que muito raramente encontramos em banda desenhada. Eis uma adaptação de uma obra poderosa profundamente sombria e visceral que explora temas como sobrevivência, desespero e o vínculo entre um pai e um filho num mundo pós apocalíptico, enquanto examina, ao mesmo tempo, o que significa ser humano num mundo de adversidade extrema. 
Podem colocar o livro no vosso carrinho de compras virtual ou, se estiverem numa loja física enquanto leem esta análise, levá-lo convosco para a caixa de pagamento: este é mesmo OBRIGATÓRIO!

Análise completa a esta obra, aqui.


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6. Undertaker
Autores: Xavier Dorison, Ralph Meyer e Caroline Delabie
Lançamento do último álbum: Abril de 2024



Undertaker é uma das minhas séries preferidas de banda desenhada. Sendo um western, com uma história ambientada no tempo dos cowboys, consegue o feito de ser igualmente uma história muito atual, com temas do nosso mundo contemporâneo. Se a mistela pode parecer forçada, deixem-me garantir-vos que todos estes temas são introduzidos de forma muito orgânica e escorreita na série. Nunca temos a ideia de que estamos a ser profetizados para o que quer que seja. Simplesmente, colocando temas que nos são próximos, a série cria com mais facilidade empatia nos seus leitores. No fundo, é um exercício de perspicácia por parte dos autores.

Undertaker faz-me lembrar aquelas superbandas de rock que são constituídas por músicos de excelência em todas as vertentes. Na bateria, no baixo, nas guitarras, nos teclados, nas vozes. O argumento e as personagens de Dorison são magníficos, o desenho de Meyer é virtuoso comercial e artístico - tudo ao mesmo tempo! - e as cores de Caroline Delabie são um deleite para a vista. A série mantém-se, portanto, em forma e o volume até é capaz de ser o melhor de todos. Não deixem de comprar!

Análise completa aos vários álbuns da série, aqui.


Álbuns da série Undertaker já publicados pela Ala dos Livros.


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5. Trilogia de Nova Iorque
Autor: Mikaël
Lançamento do último álbum: Outubro de 2024



Esta é uma daquelas séries que faz tudo bem: tem um bom argumento, tem um bom enredo, é educativa, tem boas personagens de quem guardamos memória já depois de finalizada a leitura dos livros, tem ilustrações magníficas, cores belas e um igualmente belo trabalho de edição. Que mais podemos pedir?

Giant, Bootblack e Harlem - que embora podendo ser lidos enquanto álbuns independentes pertencem a uma mesma trilogia temática - são daquelas bandas desenhadas que me deixam de "barriga cheia" por fazerem tanta coisa bem. 

Estes livros de Mikaël até podem não ser, por motivos que serão apenas pessoais e subjetivos, "livros de uma vida", mas que são livros brilhantemente executados já será algo mais objetivo e claro de afirmar. Não deixem de ler!

Análise completa aos vários álbuns da série, aqui.


Álbuns da Trilogia de Nova Iorque, série integralmente publicada pela Ala dos Livros.


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4. O Meu Irmão
Autor: JeanLouis Tripp
Lançamento: Maio de 2025


Há um conjunto de momentos na perda de alguém próximo que são de uma força enorme, devastadora e angustiante, e que não mais nos largam ao longo da nossa vida. E depois, já mesmo quando passaram muitos anos desde essa morte, ainda conseguimos vivenciar todos os momentos que compuseram esse trágico acontecimento, tal como se apenas tivessem passado dois ou três dias: a forma como soubemos que alguém estava à beira da morte, a forma como soubemos que esse alguém tinha mesmo morrido, o que sentimos na altura, quem estava lá a partilhar esse momento connosco, o funeral, as mensagens, as flores, os dias seguintes. Tudo aquilo que compõe, portanto, aquele momento em que o “tapete” nos é tirado e acabamos por ter uma enorme queda emocional. Que se arrasta por meses. Por anos.

O Meu Irmão é um dos livros do ano, uma obra obrigatória a conhecer, que nos amargura por dentro, que nos faz sentir raiva e que persiste na nossa memória ao longo de uma vida. Estamos perante um livro obrigatório, que todos deveriam ler, que nos toca no âmago do nosso ser e que é exemplo claro do quão profunda, bela e enriquecedora pode ser uma obra de banda desenhada.

Se este livro ainda não foi comprado por aquele que me lê neste texto, o meu conselho é simples e taxativo: faça um favor a si mesmo e acrescente este livro à sua estante.

Análise completa aos vários álbuns da série, aqui.



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3. O Relatório de Brodeck
Autor: Manu Larcenet
Lançamento: Outubro de 2021


Este é um dos melhores livros de banda desenhada alguma vez feitos. Uma ode ao género e a prova (com)provada que aqueles que ainda consideram a banda desenhada como uma “coisa de miúdos”, pura e simplesmente, não sabem do que falam. A esses, bastaria colocar-lhes este livro em cima do colo e pedir-lhes para o lê-lo. Estou certo que só por teimosia, manteriam a sua opinião de que a banda desenhada é uma arte menor. Não o é e este O Relatório de Brodeck é apenas mais uma prova do quão profunda, inspirada, maravilhosa e impactante pode ser uma obra de banda desenhada. Tal como uma música, tal como um filme, tal como uma pintura, tal como um romance literário.

O Relatório de Brodeck é muito mais do que uma simples história. Muito mais do que um conjunto de boas ilustrações. Magistral na ilustração, no argumento e na narrativa. Negro, pesado, sombrio, frio, assustador e que nos deixa a alma em pedaços. A paisagem é repleta do branco da neve, mas este livro é dos mais negros que alguma vez podemos ler. Uma obra de arte. E, tudo isso somado, faz com que seja, sem grande problema, um dos melhores livros de banda desenhada de sempre. Perfeito naquilo que procura ser!

Análise completa aos vários álbuns da série, aqui.



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2. O Burlão nas Índias
Autores: Alain Ayroles e Juanjo Guarnido
Lançamento: Março de 2021


O Burlão nas Índias não é apenas um livro perfeito. É um livro que tem que fazer história. Já nem eu nem aqueles que me lêem no Vinheta 2020 estarão neste mundo e esta obra continuará a ser um marco para a banda desenhada. Daqui a 10, 50, 100 anos. É esta a marca da universalidade que traz consigo este O Burlão nas Índias. Da mesma forma que Dom Quixote de La Mancha, de Cervantes é uma obra ímpar e universal, O Burlão nas Índias também o é. 

Guarnido dá show em cada vinheta, oferecendo-nos uma autêntica masterclass, um verdadeiro banquete daquilo que a ilustração em banda desenhada (também) pode ser. E Ayroles é igualmente genial, audaz e inteligente ao construir um argumento tão bem articulado, tão bem doseado, tão bem conseguido.

Sabem o que me está a apetecer fazer depois de ter escrito este texto? Reler esta obra-prima da banda desenhada outra vez! 

Se esta banda desenhada não esgotar, algo está errado com os leitores portugueses de (boa) banda desenhada.

Análise completa aos vários álbuns da série, aqui.



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1. Blacksad
Autores: Juan Díaz Canales e Juanjo Guarnido
Lançamento do último álbum: Abril de 2025


Extraída da mente e engenho dos autores espanhóis Juan Díaz Canales e Juanjo Guarnido, este noir com um carismático protagonista, uma divertida personagem sidekick, mulheres sensuais e tantas outras personagens marcantes, oferece-nos histórias que, mais do que entretenimento puro, nos marcam já depois de finda a leitura. Não é que sejam histórias que reinventam a roda - nem sequer o tentam fazer, diga-se -, mas são histórias bem arquitetadas, bem esculpidas e muito bem escritas. E isto, claro, junta-se ao brilhante, quiçá perfeito, trabalho de ilustração de Juanjo Guarnido, que nos oferece um mundo realista onde as personagens nos são apresentadas de forma antropomorfizada, ou seja, tendo faces de animais, embora mantendo corpos humanos. E tudo isto é colorido com um meticuloso e inspirado trabalho de aguarela. Enfim, se não é uma série perfeita, não sei que outra o poderá ser.

Para mim, enquanto leitor de banda desenhada, existe a vida antes de Blacksad e existe a vida depois de Blacksad.

Blacksad obriga-me a revisitar a minha adolescência e a perceber como um livro pode mudar uma vida. Por esse motivo, antes de dizer se a série é boa ou não (e é magnífica!); antes de dizer se a personagem de Blacksad é marcante ou não (e, depois de a conhecermos, não mais a esquecemos!); antes de dizer se o argumento de Díaz Canales é bom ou não (e é uma história muito bem trabalhada); antes de dizer se este universo antropomórfico funciona bem ou não (e é, para mim, o universo deste tipo que melhor funciona!) … tenho que dizer algo ainda mais marcante: por todas as razões que já apontei, esta série mudou a minha vida. Provavelmente nem existiria Vinheta 2020 se não fosse Blacksad! Figura entre as duas melhores séries de banda desenhada da minha vida. Obrigatório para todos!


Álbuns da série Blacksad já publicados pela Ala dos Livros.



6 comentários:

  1. Se Blacksad é uma (e tb gosto muito) então seria interessante esclarecer qual é a outra (série de BD)... 😉

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    1. A outra série é "Armazém Central". Falo disso no artigo de hoje dedicado à melhor BD editada pela Arte de Autor.

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  2. Gostei do Burlão mas considero um pouco overated (por exemplo, IMHO está claramente abaixo de O meu Irmão)

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    1. É uma opinião completamente válida, caro Carlos.

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  3. Vai ser feito para todas as editoras nacionais? Qual foi o critério de escolha? Dlim dlim dlim…

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    1. Conforme referido no primeiríssimo parágrafo deste artigo "a propósito da comemoração dos 5 anos de existência do Vinheta 2020, trago-vos um especial que começa a partir de hoje e que procura celebrar e assinalar a melhor banda desenhada que cada uma das principais editoras portuguesas editou nos últimos 5 anos". Dlom dlom dlom...

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