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sexta-feira, 14 de outubro de 2022

Análise: Palestina - Edição Especial

Palestina - Edição Especial, de Joe Sacco - Tigre de Papel

Palestina - Edição Especial, de Joe Sacco - Tigre de Papel
Palestina - Edição Especial, de Joe Sacco

A editora Tigre de Papel que, tanto quanto sei, não tem experiência na edição de banda desenhada, publicou recentemente uma das obras mais incontornáveis do célebre Joe Sacco, que dá pelo nome de Palestina!

Esta foi uma ótima surpresa a vários níveis. Em primeiro lugar, porque é sempre positivo vermos que a banda desenhada vai conquistando, gradualmente, mais espaço nas livrarias e nos catálogos das editoras, com um maior número de obras lançadas por cá. Em segundo lugar, é bom que a Tigre de Papel seja mais uma das editoras portuguesas a perceber isso e que tenha apostado em bd. Em terceiro lugar, é muito positivo ver que ficamos com mais uma obra de Joe Sacco disponível.

Depois de, em 2019, a Levoir ter editado Gorazde: Zona Protegida, na sua coleção de Novelas Gráficas, devo dizer que fiquei fã do estilo de narrativa de Joe Sacco. Tão real e tão vívido e, ao mesmo tempo, com tão belas ilustrações num traço muito próprio do autor e que se assume como “reportagem de guerra em bd”. De facto, é isso que aqui temos.

E, voltando a Gorazde: Zona Protegida, devo confessar que quando em 2019 li essa obra pela primeira vez, fiquei maravilhado com o belo trabalho de Joe Sacco. Como é óbvio, já conhecia de reputação o trabalho do autor, mas nunca tinha perdido mais tempo com a sua obra do aqueles momentos em que  folheei em loja alguns dos seus livros. Não tinha lido nenhum na íntegra. E, talvez também por isso, fiquei verdadeiramente admirado com a qualidade de Gorazde: Zona Protegida. Este tipo de reportagem de guerra em banda desenhada, baseada nos testemunhos que Joe Sacco recolheu em pleno conflito militar, impressionou-se pela aspereza, transparência, força emocional e, claro, também na vertente visual, já que o traço do autor é muito personalizado.

Assim, partindo para a leitura deste Palestina que já havia sido editado em Portugal há uns anos, em dois volumes, que estavam totalmente esgotados, posso dizer que, mais uma vez, fiquei encantado com o trabalho de Joe Sacco!

Palestina - Edição Especial, de Joe Sacco - Tigre de Papel
Este é um daqueles livros que importa mais pelo que trata – e como trata – do que propriamente pela forma visual com que o faz. E dizer isto não é dizer que este não é um livro visualmente apelativo. Porque o é. E muito! Mas, quanto a isso, já lá irei. Como estava a referir, o ponto mais relevante da obra de Sacco é o tipo e o teor do conteúdo que nos é dado. Talvez por isso, este livro possa muito bem ser lido por alguém que não lê banda desenhada. Na realidade, funciona mais como um documento obrigatório e legítimo para aqueles que queiram mergulhar no conflito Israel/Palestina que, lamentavelmente, continua tão ativo e atual, muito embora o lançamento original da obra date de 1993! E Palestina assume ainda especial preponderância pelo simples facto de Joe Sacco ter optado por dar voz ao lado palestiniano. Coisa que os meios de comunicação ocidentais pouco ou nada fizeram. Ou têm feito.

E mesmo assumindo este lado e esta "voz", Joe Sacco não parece albergar um tom (diretamente) crítico ou paternalista. Ao invés, parece optar por servir-se de si mesmo, e da sua obra, enquanto fio condutor, enquanto testemunha do lado dos habitantes palestinianos que sempre foram silenciados. Portanto, o discurso não traz grandes reflexões ou, sequer, resoluções, mas sim é um punhado de inúmeros testemunhos reais de palestinianos que foram massacrados, física e emocionalmente, pela ocupação israelita.

Para chegar a todos estes testemunhos Joe Sacco teve que realizar mais de cem entrevistas, quer com palestinianos, quer com israelitas, ao longo dos largos meses em que esteve na Cisjordânia e na Faixa da Gaza, durante os anos noventa. Tudo isto para fazer um álbum de banda desenhada, é mais que meritório, não?

Mas se aquilo que nos é dado, em termos de informações, neste Palestina é de uma riqueza invulgar num livro de banda desenhada, o trabalho de ilustração de Sacco também é muito rico e original em termos visuais.

Com um traço altamente caricatural, o autor consegue criar um estilo muito próprio na forma como retrata os rostos humanos, que enche a sua obra de uma personalidade muito demarcada e difícil de copiar. Os ambientes apresentam meticulosos detalhes que nos fazem perceber o quão perfecionista o autor é nos seus desenhos.

Palestina - Edição Especial, de Joe Sacco - Tigre de Papel
A planificação é extremamente dinâmica com pranchas e vinhetas de todos os tamanhos e feitios. Por vezes, o grafismo da obra até pode parecer algo caótico, com tanta informação textual e desenhos sobrepostos entre si, mas creio que isso tudo faz parte do tal estilo próprio do autor. Quanto a mim, considero que funciona muitíssimo bem para aquilo que o autor nos quer passar. Não imagino este tipo de relato contado visualmente de uma outra forma.

Quanto à edição da Tigre de Papel, há coisas a louvar e outras a lamentar. Começando pelas primeiras, gostei do formato maior e da quantidade enorme de extras que são reunidos no final do livro, com mais de 20 páginas. Há espaço para reflexões de Joe Sacco, fotografias que deram origem a vinhetas, feitura de capas, pranchas excluídas e muito mais. A opção por capa dura também me parece uma boa escolha e que dignifica a obra.

Como pontos menos positivos nesta edição, tenho que dizer que o papel escolhido, baço, me pareceu demasiado fino e que deixa ver os desenhos do verso da página. Também a capa merecia um melhor tratamento final. Em termos de legendagem também me parece que houve alguns problemas devido às fonts escolhidas que se afastam muito dos tipos de letra usados na obra original. E, tendo em conta que estamos perante um autor onde os tipos de letra utilizados importam quase tanto como as ilustrações, é algo a lamentar. Todavia, estas fraquezas não beliscam em nada a relevância da obra e a obrigatoriedade da leitura da mesma.

Com efeito, e em suma, este livro recebe o selo de obrigatório. Quer para os interessados na política atual, quer para os interessados numa banda desenhada que ousa romper alguns dos seus próprios limites. Se calhar até ia mais longe e diria que o livro acaba por ser obrigatório para todas as pessoas com um mínimo de interesse por aquilo que se passa à nossa volta. Palestina é uma obra-prima. Não percam a oportunidade de a ler.


NOTA FINAL (1/10):
9.5



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Palestina - Edição Especial, de Joe Sacco - Tigre de Papel

Ficha técnica
Palestina - Edição Especial
Autor: Joe Sacco
Editora: Tigre de Papel
Páginas: 300, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Agosto de 2022

segunda-feira, 19 de setembro de 2022

Joe Sacco volta a ser publicado em Portugal!



Já se encontra disponível há alguns dias a edição especial - e integral - da aclamadíssima obra Palestina, de Joe Sacco!

Depois de, em 2019, a Levoir ter editado Gorazde: Zona Protegida, na sua coleção de Novelas Gráficas, devo dizer que fiquei fã do estilo de narrativa de Joe Sacco. Tão real e tão vívido e, ao mesmo tempo, com tão belas ilustrações num traço muito próprio do autor.

Como tal, é com grande prazer que vos informo deste livro que é lançado por cá, numa edição especial, pela editora Tigre de Papel!

Uma aposta magnífica, que merece todos os louvores possíveis.

Brevemente haverá também uma análise à obra aqui no Vinheta 2020. Por agora, deixo-vos com algumas imagens promocionais e com a sinopse da obra.

Palestina - Edição Especial, de Joe Sacco

Com o papel que o Médio Oriente tem na política mundial contemporânea, a Palestina de Sacco nunca foi tão relevante. 

Resultado de largos meses de investigação e de uma longa visita à Cisjordânia e à Faixa de Gaza no início dos anos 1990 (onde realizou mais de cem entrevistas com palestinianos e israelitas), Palestina foi o primeiro grande trabalho em BD de não-ficção política e histórica de Sacco, cujo nome se tornou sinónimo desse formato gráfico do Novo Jornalismo. 

A reportagem perspicaz de Sacco é feita nas linhas de frente, onde populações são atingidas por tiros e gás lacrimogéneo, soldados espancam civis e estradas são bloqueadas. Sacco entrevistou prisioneiros, refugiados, manifestantes, crianças feridas, agricultores que perderam as suas terras e famílias dilaceradas pelo conflito.

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Ficha técnica
Palestina - Edição Especial
Autor: Joe Sacco
Editora: Tigre de Papel
Páginas: 300, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
PVP: 25,95€

sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

Top 10 de leituras de BD em 2019


Top10 de leituras de BD em 2019

O meu Top 10 de leituras de BD em 2019

Agora que ainda estamos no primeiro mês de 2020 é altura de olharmos para trás, para o ano anterior, e verificarmos como foi um excelente ano para a Banda Desenhada em Portugal. E isso deve-se às Editoras – que são, cada vez, mais e melhores – e aos leitores. Se os leitores não comprarem livros, os esforços das Editoras caem em saco roto.
Abaixo, deixo-vos o meu top 10 de leituras que fiz em 2019. Naturalmente, não consegui ler todos os livros que queria. Já chegámos a uma fase em que me é impossível comprar todos os livros que gostaria de ler. O que não deixa de ser uma coisa boa. Significa que a oferta é vasta e tem qualidade. Não será de estranhar que no meu Top 10 de leituras que farei em 2020 possam existir livros que foram lançados em 2019. E é por isso que no meu top 10 de leituras de 2019 há um livro que ainda foi lançado em 2018.
Antes de avançar para o top gostaria de fazer algumas menções honrosas que, a meu ver, tanto contribuíram para fazer do ano 2019, um excelente ano para o lançamento de banda desenhada em Portugal.



Menção Honrosa #1 - Novelas Gráficas da Levoir/Público
A Coleção Novelas Gráficas da Levoir/Público continua, ao fim de 5 anos, a ser o grande momento editorial anual em Portugal. Isto de levar obras de qualidade à generalidade dos interessados e com um preço mais que acessível, chega-me a parecer serviço público! Espero que durante os próximos anos continue a disponibilizar obras de qualidade sem alterar o preço. Sou fã da iniciativa e enquanto leitor de BD, fico agradecido por esta coleção já me ter dado a ler, obras que desejava ler em português ou outras, que embora sejam excelentes trabalhos, eu nem os conhecesse se não fosse esta coleção. Este ano não foi exceção. Embora os livros “clássicos” escolhidos não tenham sido muito do meu agrado – refiro-me a Febre de Urbicanda, de Peeters e Schuiten, a Flex Mentallo: Herói do Mistério, de Grant Morrison e Frank Quitely ou a Como uma luva de veludo moldada em ferro, de Daniel Clowes – as restantes obras agradaram-me muito. De forma global, este até foi dos anos onde a qualidade global mais me pareceu equilibrada. Gostos aparte, a qualidade e importância da coleção mantém-se. Se, por acaso, num dia sombrio da banda desenhada em Portugal, esta coleção deixar de ser lançada, abrir-se-á um enorme buraco na bd no nosso país.


Menção Honrosa #2 - Batman é tratado como “realeza” em Portugal
A Levoir está também de parabéns pela Coleção Batman 80 anos. Embora possamos argumentar que algumas escolhas para esta coleção de 10 livros tenham sido algo questionáveis, a verdade é que considero um exemplo bom de ver, a forma como a Levoir tem tratado este Herói, com lançamentos constantes, cobrindo de forma exemplar quer obras que estavam em falta no catálogo em português, quer aquelas que são mais recentes. A somar a esta coleção ainda lançou outros livros importantes como Batman Maldito, de Brian Azzarello e Lee Bermejo; a edição integral do Regresso do Cavaleiro das Trevas, de Frank Miller; Batman Ano Um de Frank Miller; ou o fantástico (e obrigatório) Batman Cavaleiro Branco, de Sean Murphy.


Menção Honrosa #3 - As Séries de BD deixaram “de ficar a meio”
Lembram-se daquela situação deprimente em que os leitores de bd em Portugal viam aparecer no mercado várias coleções de BD que acabavam por ser canceladas passados um ou poucos mais números, deixando a coleção a meio? Os exemplos que aqui poderia nomear são tantos que nem vou perder tempo com isso – vou apenas referir o término da excelente série Y – O Último Homem, por parte da Levoir. E de resto, acho que todos os leitores deverão estar gratos às Editoras por estas estarem a criar uma relação de confiança com aqueles. Se há uns anos, o leitor tinha receio de investir o seu dinheiro numa nova coleção porque havia a forte possibilidade da mesma ficar a meio, hoje em dia, essa tendência parece ter terminado. Claro que me poderão dizer: “Ah, as séries ficavam a meio porque os leitores não compravam os livros”. Mas, a isso, poderemos contra-argumentar: “os leitores não compravam os livros porque temiam que as séries não fossem completadas pelas editoras”. Enfim, é um ciclo vicioso e felizmente, as editoras portuguesas parecem estar a compreender melhor os consumidores e por isso, cometem riscos mais calculados, com tiragens menores. A adesão a uma nova série ou herói de bd será sempre carregada de incertezas mas, não obstante, as editoras parecem estar cada vez mais cientes daquilo que os leitores pretendem.


Menção Honrosa #4 - Editoras Portuguesas – Cada vez mais, cada vez melhores.
Uma menção honrosa tem que ir para as editoras em geral. A Levoir já foi referida mas creio que – sem desprimor daquelas a que não farei referência, há outras 4 editoras que merecem destaque:

1) A Ala dos Livros e a força com que entrou no mercado português durante 2019. Se o seu início em 2018, com o lançamento único de Beowulf, de Santiago Garcia e David Rubin, foi algo tímido, o ano passado foi profícuo em lançamentos, com obras de qualidade superior tais como Undertaker, de Dorison e Meyer; Eu, Louco, de Antonio Altarriba e Keko; A Morte Viva, de Olivier Vatine e Alberto Varandas; Os Escorpiões do Deserto – Obra Completa, de Hugo Pratt; ou Comanche - Obra Completa, de Greg e Hermann, cujos primeiros dois volumes já foram lançados.

2) A G.Floy continua a ser uma referência em Portugal. À semelhança do trabalho feito pela Levoir, custa-me imaginar a Banda Desenhada sem a presença desta excelente editora. Não consumo tudo aquilo que a Editora publica - não teria dinheiro para comprar todos os livros interessantes, mas tenho muito respeito pela forma como a Editora tem apostado em algumas obras.

3) A Gradiva foi talvez a grande surpresa do ano, com lançamentos tão regulares e pertinentes. Diria que encontrou uma franja de mercado, com as suas excelentes coleções "Descobridores", "Sabedoria dos Mitos" ou "Eles fizeram História".

4) Finalmente, a Arte de Autor também merece o meu destaque pois, desde que apareceu, tanto tem brindado os leitores portugueses com livros de qualidade superior. Sou fã do seu trabalho.

Então, feitas as menções honrosas que achei relevante fazer, e sem mais demoras, este é o meu Top10 dos livros que mais prazer me deram ler em 2019. Foi um ano tão bom, que certamente poderia colocar neste Top mais uns 10 ou 15 livros para além dos que se seguem.