Mostrar mensagens com a etiqueta José Ruy. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta José Ruy. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 3 de outubro de 2024

Análise: O Mistério dos Templários

O Mistério dos Templários, de José Ruy - Editora Polvo

O Mistério dos Templários, de José Ruy - Editora Polvo
O Mistério dos Templários, de José Ruy

Mesmo que José Ruy, um dos autores mais emblemáticos da banda desenhada nacional, nos tenha deixado há cerca de dois anos, a sua obra continua - e, estou certo, continuará - a ressoar na mente coletiva dos amantes portugueses da 9ª arte.

O Mistério dos Templários, que hoje vos trago, é a última obra que o autor terminou na íntegra. É verdade que A Passagem Impossível, publicada pela editora Ala dos Livros, foi a última obra em que José Ruy trabalhou antes do seu falecimento, mas este O Mistério dos Templários, publicado pela editora Polvo - que também já havia publicado postumamente Lendas Japonesas, foi o último trabalho integralmente finalizado pelo autor.

Lembro-me até, com alguma nostalgia, que cheguei a ver de perto José Ruy a trabalhar em algumas das pranchas deste álbum quando, a propósito do Prémio Carreira dos VINHETAS D'OURO atribuído ao autor, quando conversei com o mesmo, na sua casa.

O Mistério dos Templários, de José Ruy - Editora Polvo
Nessa longa conversa que tivemos, José Ruy contou-me que sempre foi muito fascinado pela Ordem dos Templários e por tudo o que a envolveu. Este era, pois, um projeto muito querido do autor e que foi encetado ao longo de vários anos, com José Ruy a recolher informação de diversas fontes sobre o tema e trabalhando no argumento.

E indo ao encontro daquilo a que José Ruy nos habituou, este O Mistério dos Templários assume um tom educativo, sendo rico em factos históricos e tentando traçar os vários momentos da Ordem dos Templários, desde a sua criação até à sua extinção, não esquecendo a referência de alguns dos momentos mais emblemáticos destes cavaleiros que eram monges e soldados ao mesmo tempo.

Em termos de desenho, José Ruy também mantém fidelidade ao seu estilo de ilustração e planificação clássicas que os admiradores do autor, certamente apreciarão. Lamento que algumas das vinhetas sejam demasiadamente povoadas de texto, embora também compreenda que esse sempre foi o modus operandi do autor, já que os seus argumentos - mesmo que também procurassem entreter - tinham como missão primordial o seu cariz educativo e informativo.

O Mistério dos Templários, de José Ruy - Editora Polvo
Também o processo de colorização das ilustrações, embora efetuado através de ferramentas digitais - que o autor, impressionantemente, ainda viria a dominar já na fase final da sua longa vida - assume um aspeto próximo da banda desenhada mais clássica. O que tem a valência de não criar nenhum rompimento com o trabalho clássico do autor mas que, quanto a mim, que sou de uma geração mais nova, me leva a crer que talvez as histórias adquirissem um aspeto mais moderno e comercial, se feitas a preto e branco. E a edição de A Passagem Impossível, já mencionada, leva-me a insistir ainda mais nesta questão. Em banda desenhada, o preto e branco nunca fica fora de moda, ao passo que a colorização, como obedece a uma corrente estilística, torna-a cativa, para o bem e para o mal, da faixa temporal dessa mesma corrente. E o mesmo até pode ser dito relativamente ao cinema.

Quanto à edição da editora Polvo, estamos perante um bom trabalho. O livro apresenta capa dura baça e bom papel brilhante no miolo. O trabalho de encadernação e impressão também é bem conseguido. Nota positiva, mais uma vez, para as bonitas guardas a preto e branco do livro.

Em suma, O Mistério dos Templários é um bom livro de José Ruy - bem ao seu género - que tem o apelo adicional de ser a última banda desenhada terminada pelo autor. Um livro especialmente obrigatório, portanto, para os adeptos da obra deste autor imprescindível da 9ª arte portuguesa.


NOTA FINAL (1/10):
7.0



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


-/-

O Mistério dos Templários, de José Ruy - Editora Polvo

Ficha técnica
O Mistério dos Templários
Autor: José Ruy
Editora: Polvo
Páginas: 48, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 217 x 306
Lançamento: Outubro de 2023


segunda-feira, 15 de julho de 2024

Banda Desenhada portuguesa faz história!!!


O Mestre José Ruy, figura incontornável da banda desenhada nacional, até pode ter falecido em 2022. Mas o seu legado, a sua relevância e a sua arte continuam a fazer história!

Foi no passado dia 11 de Julho que foi atribuída a José Ruy, a título póstumo, e pelas mãos do Presidente da República Portuguesa, Marcelo Rebelo de Sousa, a condecoração de Grande-Oficial da Ordem do Mérito!

Quem recebeu as insígnias foi a viúva de José Ruy, Maria Fernanda Pinto.




Este foi, portanto, um dia histórico, pois, segundo o que pude apurar junto do editor da Polvo, Rui Brito, nunca semelhante título honorífico tinha sido dado a alguma individualidade da banda desenhada nacional!




Ora, este acontecimento é, pois, um motivo de festa, de celebração e de vitória para a banda desenhada nacional que, a pouco e pouco, e com o esforço de todos, vai alcançando mais notoriedade em Portugal, mas também é, claro está, uma justa e honrosa homenagem a José Ruy, uma pessoa espantosa que tive a oportunidade de conhecer pessoalmente, e um artista com uma longevidade e dedicação que merece todas as vénias possíveis.




Estou muito contente com mais este passo que a banda desenhada nacional e José Ruy acabam de conquistar!


Jamais serás esquecido, José Ruy!




EDIT: O meu amigo e autor Daniel da Maia informou-me que José de Matos-Cruz já havia recebido, no passado dia 10 de Abril de 2024, o título de "Comendador da Ordem do Mérito", por parte de Marcelo Rebelo de Sousa. Mesmo assim, e conforme o site da Presidência, José de Matos-Cruz foi agraciado enquanto "historiador e investigador cinematográfico".

Sendo títulos diferentes, o importante a reter é que em poucos meses foram duas as individualidades a serem agraciadas com homenagens por parte da Presidência da República. O que é algo a louvar!

segunda-feira, 15 de janeiro de 2024

Análise: A Passagem Impossível

A Passagem Impossível, de José Ruy - Ala dos Livros

A Passagem Impossível, de José Ruy - Ala dos Livros
A Passagem Impossível, de José Ruy

Foi no final de 2023 que a Ala dos Livros lançou o seu último livro do ano, que foi (e será), também, o derradeiro livro de José Ruy, esse autor imprescindível da banda desenhada nacional, cuja vasta obra influenciou tantos e tantos leitores e autores de banda desenhada no nosso Portugal.

E posso dizer-vos que ler, saborear e sentir este A Passagem Impossível é algo profundamente emocional, pois torna-se claro que estamos perante uma última forma de imersão na obra do autor, uma última forma de homenagem, uma última forma de um adeus. Um daqueles adeus que não queremos fazer, pois sabemos que representa o fim de alguém que vai deixar saudades. Alguém de quem sentiremos a falta. Assim é este A Passagem Impossível, de José Ruy. E se os bons autores se tornam eternos devido às obras que nos deixam, não tenho dúvidas de que a obra de José Ruy superará o teste do tempo.

A Passagem Impossível, de José Ruy - Ala dos Livros
A Passagem Impossível
 é um livro de grande fôlego que andava a ser preparado por José Ruy no fim da sua vida. O autor tinha mais de 90 anos e ambicionava levar a cabo este grande projeto que procura relatar a viagem do navegador português David Melgueiro que, ainda no século XVII, e a bordo do navio Padre Eterno, ousou fazer a sua viagem não pelo sul, pelo Cabo da Boa Esperança, como seria expectável, mas pelo norte, pelo estreito de Anian que, mais tarde, haveria de ser conhecido como estreito de Bering. A partir daí, a viagem transformou-se num grande épico de aventura que levou os tripulantes do Padre Eterno a enfrentarem inúmeras privações.

Se o tema é mais do que pertinente – pois aborda um assunto que é pouco ou nada conhecido – a maneira como o autor arquitetou a trama, afigura-se muito bem executada, pois, ao contrário daquilo que muitas vezes acontece em obras de cariz mais didático (onde, convenhamos, até poderemos inserir muitas das obras de José Ruy), em que há uma procura mais clara e assertiva de narrar a história de forma mais factual e educativa, sem grande preocupação com a parte mais ficcional ou com o desenvolvimento de um enredo mais complexo, em A Passagem Impossível José Ruy parece ter imaginado uma história maior em termos de trama, de narrativa e de personagens.

A Passagem Impossível, de José Ruy - Ala dos Livros
Talvez por isso, este seja dos maiores livros do autor em termos de dimensão, com mais de 100 páginas para uma só história. Sente-se a tentativa de almejar a sua obra-prima, por parte de José Ruy, tal como também se sente que o autor não teve problemas em imaginar uma história que tivesse a dimensão suficiente para melhor desenvolver a trama e personagens.

Além disso, também fica claro que José Ruy sabia muito bem como queria começar e como queria terminar este livro. E será mesmo por esse motivo que o autor optou por deixar as primeiras e as últimas pranchas da obra com os desenhos finalizados e passados a tinta da china. Apenas faltando dar a cor. No resto da obra, o autor só teve tempo para deixar a história em storyboard. Em esboço. E, claro, se isto pode levar alguns a acharem que A Passagem Impossível é um livro inacabado, isso não é, pelo menos quanto a mim, verdade. Sim, é óbvio que não seria desta forma que o Mestre José Ruy teria imaginado a sua obra. Não seria comercializada ainda em formato de storyboard e, provavelmente, não seria a preto e branco, mas a cores. No entanto, há que ter em conta que o livro apresenta-nos uma história com princípio, meio e fim. Bem pensada e bem arquitetada. Que pode (e deve) ser lida como livro terminado. E sem que pareça ter sido feito à pressa.

A Passagem Impossível, de José Ruy - Ala dos Livros
E como só foi possível ter a grande maioria da obra em storyboard, isto é, em esboços, a editora Ala dos Livros teve a coragem, a perseverança e o carinho de editar, ainda assim, este A Passagem Impossível. Era a única forma de o fazer e posso dizer que tudo está feito com um requinte, com um respeito e com um cuidado que merece todos os meus louvores. Se dúvidas pudessem existir em relação ao amor que os editores da Ala dos Livros sentem não só pela banda desenhada, enquanto arte, como, também, pelos próprios autores do género, este A Passagem Impossível é a real prova desse amor, desse respeito, dessa devoção.

E o que eu ainda acho mais fantástico neste A Passagem Impossível é o cariz didático que, de forma involuntária e não forçada, a obra acaba por adquirir. É que ler este livro também serve como forma de mergulhar no processo criativo e de trabalho do autor. A maneira como pensava e planificava a obra, a forma como desenhava os impressionantes e detalhados esboços, no storyboard, e o modo como depois aplicava a cor, através da tinta da china, em cima desses esboços. Acho verdadeiramente fantástico que este A Passagem Impossível nos mostre tudo isto. O livro funciona, pois, como uma viagem aos bastidores da criação de José Ruy. E, sendo o autor relevante que foi – e continuará a ser – quão fantástico isso é! Digo até mais: considero que este é o livro certo para aqueles que não apreciam especialmente a obra de José Ruy. Estou certo que, se derem uma oportunidade a este livro, poderão apreciar de uma outra forma, quiçá mais apetecível, o trabalho de José Ruy. E já nem vou falar naqueles que já são fãs da obra do autor: para esses, este livro é absolutamente obrigatório e merece lugar de honra na sua coleção.

A Passagem Impossível, de José Ruy - Ala dos Livros
Falando do objeto-livro com que a Ala dos Livros nos brinda, temos um livro em capa dura, com uma belíssima textura aveludada, e com pormenores a verniz. Bom papel, boa encadernação e boa impressão. A própria capa está muito bem pensada. Especialmente, se tivermos em conta que foi conjecturada a partir de um desenho em esboço. É verdade que na minha coleção pessoal de BD não tenho todos os livros de José Ruy, mas posso dizer que, ainda assim, tenho um número bem grande de livros do autor e nenhum deles chega perto, sequer, deste A Passagem Impossível em termos de qualidade de edição.

A edição inclui ainda um prefácio de Guilherme d' Oliveira Martins e um posfácio assinado por Maria Fernanda Pinto e Teresa Pinto, respetivamente, a esposa e filha de José Ruy. Estes dois textos permitem-nos perceber ainda melhor como a obra vinha sendo preparada pelo autor. Há ainda nove páginas com esboços das personagens e uma página tripla desdobrável que nos mostra a forma como o autor fez a planificação para esta história. Um verdadeiro mimo! E não ficamos por aqui, pois até as próprias guardas do livro são muito bonitas, aproveitando, no primeiro caso, um esboço do interior da nau Padre Eterno e, nas segundas guardas, envergando um conjunto de notas e esboços cartográficos da viagem e locais visitados nesta longa epopeia. Num número mais restrito e limitado, o livro faz-se ainda acompanhar de um print com um dos esboços do autor para esta obra. Que mais poderíamos pedir de uma edição?

Finalizando, penso ser justo afirmar-se que este A Passagem Impossível funciona como um adeus que deixa saudades de um dos maiores autores portugueses de banda desenhada. E a edição da Ala dos Livros, por tudo o que representa e pela forma como é lançada, resulta não só como a melhor edição de banda desenhada do ano, como uma das edições portuguesas de valor mais inestimável das últimas décadas. Um livro imprescindível!


NOTA FINAL (1/10):
9.0

Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020

-/-

A Passagem Impossível, de José Ruy - Ala dos Livros
Ficha técnica
A Passagem Impossível ou O relato da extraordinária viagem do navegador português David Melgueiro, que no século XVII, a comando de uma embarcação holandesa e tal como testemunhou o Seigneur de la Madelène ao Conde de Pontchartrain, rumou a Norte e realizou a travessia pela Passagem do Nordeste
Autor: José Ruy
Editora: Ala dos Livros
Páginas: 128, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Formato: 235 x 310 mm
Lançamento: Novembro de 2023

quinta-feira, 7 de dezembro de 2023

Ala dos Livros edita o último livro de José Ruy!



Esta fantástica notícia já tinha sido avançada no Amadora BD mas, durante este mês de Dezembro, torna-se realidade!

A Ala dos Livros acaba de lançar aquele que é o último livro feito por José Ruy, um dos nomes mais incontornáveis da banda desenhada portuguesa!

Falo de A Passagem Impossível. Álbum este que o autor deixou inacabado mas que, ainda assim, a Ala dos Livros opta por publicar prestando assim, diria eu, a justa homenagem ao autor.

Estou muito, muito curioso com este livro até porque, como sempre defendi, apesar de José Ruy também ser elegante nas suas cores, sempre achei que o seu registo de desenho era mais adequado ao preto e branco.

E, além disso, estamos perante um álbum com mais de 100 páginas, o que revela o quão especial e grandioso era o projeto para o autor.

Mais abaixo, deixo-vos com a sinopse da obra e com algumas imagens promocionais.


A Passagem Impossível, de José Ruy

No século XVII, no auge do comércio de sedas e de especiarias, grandes embarcações, das mais variadas nacionalidades e bandeiras, franqueiam o Índico e o Atlântico. Estes oceanos, infestados de piratas, tornam cada vez mais insegura a travessia pelo Sul, pelo cabo da Boa Esperança.

Março de 1660. - Uma embarcação de nome Padre Eterno, comandada pelo capitão português David Melgueiro, zarpa de Tanegashima, no Japão, e ruma a Norte. Evitando a rota do Sul e efetuando a passagem do Oceano Pacífico pelo estreito de Anian, a Padre Eterno embrenha-se no Ártico, chegando ao seu destino cerca de dois anos depois.


É este grande feito que serve de mote à derradeira obra que o Mestre José Ruy nos legou.

“A Passagem Impossível”, que a Ala dos Livros edita um ano após a sua morte, e que o mestre deixou “inacabada”, é a sua última obra.

-/-

Ficha técnica
A Passagem Impossível ou O relato da extraordinária viagem do navegador português David Melgueiro, que no século XVII, a comando de uma embarcação holandesa e tal como testemunhou o Seigneur de la Madelène ao Conde de Pontchartrain, rumou a Norte e realizou a travessia pela Passagem do Nordeste

Autor: José Ruy
Editora: Ala dos Livros
Páginas: 128, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Formato: 235 x 310 mm
PVP: 25,90€

segunda-feira, 18 de setembro de 2023

Análise: Lendas Japonesas

Lendas Japonesas, de José Ruy - Editora Polvo

Lendas Japonesas, de José Ruy - Editora Polvo
Lendas Japonesas, de José Ruy

Pegar neste álbum póstumo de José Ruy, autor essencial da banda desenhada portuguesa, com quem tive a oportunidade e o privilégio de ter uma longa conversa, a propósito da atribuição do Prémio Carreira dos Prémios VINHETAS D’OURO 2021, alguns meses antes do seu falecimento, foi uma experiência bastante emotiva e que, naturalmente, me remeteu para essa bela tarde que passámos juntos.

Na verdade, quando visitei José Ruy na sua residência onde, já depois dos noventa anos de idade, se mantinha extremamente ativo, trabalhando diariamente nas suas bandas desenhadas, fiquei boquiaberto com o amor que o autor demonstrava perante a 9ª Arte. E pela forma como se mantinha dinâmico, tentando modernizar o seu estilo e adaptando-se às técnicas mais atuais. Contou-me como passou a utilizar o photoshop na sua arte ou como passou a habituar-se à utilização de uma mesa de desenho digital. Eu estava maravilhado! E foi com gosto que, naquele momento, até o vi a colorir algumas páginas deste Lendas Japonesas que a editora Polvo lançou há uns meses.

Lendas Japonesas, de José Ruy - Editora Polvo
Como qualquer leitor português de banda desenhada, já vários álbuns do José Ruy passaram por mim. Mesmo assim, acho que sou sincero quando vos digo que Lendas Japonesas pode muito bem ser o culminar, com chave de ouro, de uma vida dedicada à banda desenhada que se explanou por mais de 50 álbuns de banda desenhada. Embora não devamos esquecer, que antes de falecer, José Ruy também trabalhava num segundo álbum, sobre os Templários, que a Polvo pode vir a editar no futuro.

Lendas Japonesas é composto por um conjunto de onze histórias curtas, que se baseiam em algumas das histórias populares da cultura japonesa, e que apareceram referenciadas na obra de Wenceslau de Moraes, autor de vários livros sobre assuntos ligados ao Oriente, em especial ao Japão, onde viveu por cerca de três décadas. Cada uma destas pequenas histórias conta-nos uma parábola, sempre com uma mensagem moral, mergulhando-nos no universo e ambiente oriental do Japão. Mas, lá está, se são histórias ambientadas na cultura japonesa, as suas conclusões e mensagens são universais a qualquer cultura.

Lendas Japonesas, de José Ruy - Editora Polvo
Algumas destas curtas histórias têm mais humor do que outras, umas têm mensagens mais rebuscadas, e outras até apresentam um certo grau de violência. De forma global, são histórias simples, mas carregadas de boas mensagens, que se leem muito bem. O texto utilizado será, por vezes, algo arcaico e ancestral, o que nos remete para a banda desenhada de estilo mais clássico a que o autor nos foi habituando ao longo de uma carreira de muitas décadas.

Salta à vista a forma airosa e, até mesmo, poética como José Ruy narra as histórias, passando um misto de sensações para o leitor e mergulhando-o no universo cultural japonês.

Em termos de ilustrações, temos um José Ruy que se revela em boa forma, oferecendo-nos desenhos que conseguem ter aquela aura do país do sol nascente. Transportar-nos para lá. De resto, os desenhos apresentam o estilo do José Ruy a que já todos nos habituámos e, mesmo sendo verdade que haja um enorme espaço temporal entre algumas das histórias que compõem este Lendas Japonesas – relembro que a conceção da obra durou qualquer coisa como 70 anos! –, esta antologia consegue reunir homogeneidade e harmonia entre todas as histórias que nos oferece. Outra coisa interessante é que, como as histórias frequentemente passam para o cômputo da fantasia, há espaço para que o autor nos apresente algumas figuras mitológicas cativantes do ponto de vista visual, como uma serpente de oito cabeça, duas rãs falantes e outros monstros.

Lendas Japonesas, de José Ruy - Editora Polvo
A planificação também se apresenta bem ao jeito daquilo a que o autor nos habituou noutros livros: em vez de cada página ser composta por três ou quatro tiras de vinhetas, como é mais frequente em banda desenhada, normalmente é construída por duas tiras, apenas. Isto faz com que encontremos mais vinhetas ao alto, estilo portrait, do que no formato horizontal, estilo landscape. Mesmo assim, José Ruy não repete sempre a mesma fórmula e, ao longo do livro, somos surpreendidos várias vezes na vertente da planificação.

Quanto às cores, devo dizer que, encaixando bem no estilo e características da obra, as mesmas apresentam aquele estilo clássico a que associamos à obra do autor. Mesmo assim, estou convencido de que um álbum a preto e branco de José Ruy, poderia funcionar igualmente bem. Se calhar, até melhor.

A edição da Polvo está um autêntico mimo: não só a editora teve a capacidade e engenho de conseguir entusiasmar José Ruy de forma a que ele acabasse esta enorme empreitada com várias décadas de preparação, como, já depois do falecimento do autor, conseguiu reunir todas essas histórias numa excelente edição que tem capa dura baça, bom papel brilhante, boa encadernação e boa impressão. 

O livro reúne ainda um texto de José Ruy que nos explica todas as atribulações com que se deparou na feitura destas Lendas Japonesas e onde nos são mostradas algumas das primeiras pranchas que foram publicadas em 1950 na revista O Papagaio. É-nos dado ainda outro texto sobre um outro projeto do autor – que não chegou a ver a luz do dia – que era o livro Uma Espingarda Portuguesa no Japão. Depois, já no final do livro, para além das notas biográficas de José Ruy e de Wenceslau de Moraes, temos ainda uma pequena história, numa prancha, que procura ser a biografia de Wenceslau de Moraes, assinada por José Ruy. Nota ainda para as lindíssimas guardas do livro que o embelezam e que, quanto a mim, deveriam ser comercializadas em poster. São belíssimas! Em suma, esta é uma das edições do ano e acho que a editora Polvo está de parabéns pelo seu excelente e valioso trabalho nesta obra.

Em jeito de conclusão, Lendas Japonesas é dos livros mais equilibrados e bem conseguidos que tive a oportunidade de ler de José Ruy, um dos autores mais relevantes da banda desenhada portuguesa, que nos deixou, lamentavelmente, no ano passado. E, também por isso, é um livro que se assume como uma ótima forma de celebrar a vida e obra do Mestre José Ruy!


NOTA FINAL (1/10):
7.0



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


-/-

Lendas Japonesas, de José Ruy - Editora Polvo

Ficha técnica
Lendas Japonesas
Autor: José Ruy
Basedado na obra de Wenceslau de Moraes
Editora: Polvo
Páginas: 64, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Julho de 2023

segunda-feira, 3 de julho de 2023

Polvo edita álbum póstumo de José Ruy!







A Polvo edita, a título póstumo, o livro Lendas Japonesas, de José Ruy!

Este livro já havia sido lançado e apresentado em Junho, no Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja, mas só chegará às livrarias a partir do mês de Julho.

É um lançamento que tem a particularidade de editar um livro que ocupou os últimos tempos da vida do autor que, lamentavalemente, nos deixou em 2022. Também por esse motivo, é uma ótima forma de celebrar a vida e obra de José Ruy!

Mais abaixo, deixo-vos com a sinopse da obra e com algumas imagens promocionais.

Lendas Japonesas, de José Ruy

José Ruy é um dos mais reconhecidos e importantes autores da banda desenhada portuguesa, com vastíssima obra produzida.

Estas suas Lendas Japonesas baseiam-se em diversas lendas dispersas pela obra de Wenceslau de Moraes, autor de vários livros sobre assuntos ligados ao Oriente, em especial o Japão, onde viveu por 33 anos. A elas José Ruy dedicou especial carinho e atenção desde a sua criação, em 1949, para as páginas d’O Papagaio .

Tal como Moraes, José Ruy é um excelente narrador. Os seus dotes naturais contam com vivacidade, ternura, poesia e também um certo dramatismo, onze deliciosas lendas tradicionais nipónicas, realçando temas como a alma japonesa, o budismo, o amor, a arquitectura religiosa, alguns coloridos exotismos ou a fantástica paisagem do país.

Em cada lenda deste livro há sempre uma chamada de atenção, uma perspicácia ou um erro humano posto a descoberto, mas há também aquelas emoções vulgares de que a vida normalmente se alimenta.

-/-

Ficha técnica
Lendas Japonesas
Autor: José Ruy
Basedado na obra de Wenceslau de Moraes
Editora: Polvo
Páginas: 64, a cores
Encadernação: Capa dura
PVP: 16,90€

quinta-feira, 24 de novembro de 2022

Análise: Aurora Boreal em Reflexos Partilhados

Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, de vários autores - Kafre e Arga Warga

Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, de vários autores - Kafre e Arga Warga
Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, de vários autores

NOTA INTRODUTÓRIA: Nem de propósito. Quando ontem comecei as escrever as palavras que vos apresento abaixo pensei: “que fantástico que o Mestre José Ruy ainda esteja no ativo com 92 anos e que tenha participado neste Aurora Boreal em Reflexos Partilhados”. Mal sabia eu que, passadas umas horas, quando me preparasse para publicar esta análise, tivesse conhecimento do falecimento de José Ruy. A contribuição de José Ruy para esta antologia data de 2012, mas quer-me parecer que, em termos de publicação em livro, talvez seja este Aurora Boreal em Reflexos Partilhados o último livro a sair durante a vida de José Ruy. O que é assinalável.

-/-

Por alturas do último Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja, em Maio, foi lançada a antologia Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, que conta com a participação de vários autores portugueses como José de Matos-Cruz, José Ruy, Daniel Maia, Fernando Vilhena de Mendonça, João Raz, José Bandeira, Nuno Dias, Renato Abreu e Susana Resende.

Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, de vários autores - Kafre e Arga Warga
Devo admitir que o alcance das histórias deste livro me surpreendeu. E quando digo que me surpreendeu não tem de ser, forçosamente, uma coisa positiva nem negativa. Surpreendeu-me pois não conhecia todo o envolvimento em torno da personagem de Aurora Boreal. E talvez por esse motivo, fiquei quase atordoado com toda a viagem onírica que esta personagem transporta consigo e que está bem patente nas várias histórias que constituem esta antologia.

Dito por outras palavras, se esperam encontrar uma leitura simples e leve, como é, muitas vezes, apanágio das antologias de banda desenhada, Aurora Boreal em Reflexos Partilhados não será para vós. Por outro lado, se apreciam poesia, questões do metafísico e banda desenhada… é bem provável que devam conhecer esta antologia.

A personagem que dá mote a estas histórias foi criada em 2012 por José de Matos-Cruz e apareceu na sua trilogia de livros dedicados a O Infante Portugal. É uma figura feminina e sensual, carregada de elementos cósmicos, que a fazem parecer uma deusa do imaginário. 

Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, de vários autores - Kafre e Arga Warga
Não diria que exista nestas histórias uma linha narrativa que nos conte uma história concreta à volta da personagem. Ao invés, vão-nos sendo dado abordagens diferentes que colocam Aurora Boreal em variadas situações. Mas há sempre um toque de fantástico, de exótico e de transcendente nestas histórias.

Em muitos casos – não há como não – o leitor acaba por se perder na própria premissa, já que a mesma é demasiado lata e abstrata. No entanto, por vezes também sabe bem deixarmo-nos levar por narrativas mais psicadélicas. É o caso.

O estilo de ilustração que aqui podemos encontrar é expetavelmente muito variado, dada a quantidade de autores que participam na antologia. 

Destacam-se o belo estilo de sketch a carvão de Susana Resende, o estilo realista de Daniel Maia, o estilo mais clássico de José Ruy, ou a abordagem mais estilizada e abstrata de Renato Abreu.

Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, de vários autores - Kafre e Arga Warga

Como história, propriamente dita, fiquei agradavelmente surpreendido com Aurora Boreal e o Reverso do Universo, com desenho de José Macedo Bandeira, que nos dá um belo conto ambientado na temática de Fernando Pessoa.

Já quanto aos desenhos, enquanto confesso fã das ilustrações de Daniel Maia, posso dizer que as mesmas não desiludem e que revelam como o autor é virtuoso na execução de belos desenhos. Além disso, também tem a capacidade para ilustrar vários tipos de ambientes e histórias diferentes, o que revela que é um autor com um potencial enorme, ainda por explorar.

Em termos de edição, tendo em conta que é independente, parece-me que o trabalho é bastante decente. Este livro a preto e branco tem capa mole e um papel brilhante que me parece adequado. Acho apenas que deveria ter sido feita uma maior divisão entre histórias, uma vez que, por vezes, ainda estamos mergulhados numa história e já o conto seguinte começou. Julgo que mesmo que não fosse dada uma página branca entre histórias, ao menos poderia ter sido feita uma divisão gráfica mais inequívoca.

Em suma, Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, pelo universo alegórico-fantástico que traz consigo, é uma antologia bastante original na sua génese. Nem sempre de fácil de leitura, relembro, mas audaz nos intuitos de significados profundos que procura atingir.


NOTA FINAL (1/10):
5.5


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


-/-

Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, de vários autores - Kafre e Arga Warga

Ficha técnica
Aurora Boreal em Reflexos Partilhados
Autores: José de Matos-Cruz, José Ruy, Daniel Maia, Fernando Vilhena de Mendonça, João Raz, José Bandeira, Nuno Dias, Renato Abreu e Susana Resende
Edição: Kafre e Arga Warga
Páginas: 52, a preto e branco
Encadernação: Capa mole
Lançamento: Maio de 2022

Dia Triste para a BD Nacional: Faleceu José Ruy


Acabo de tomar nota que o Mestre José Ruy nos deixou no dia de ontem.

Este é um dia muito triste para a banda desenhada nacional. Não só pela relevância da obra do autor, com tantos anos dedicados à 9ª arte, mas também porque se perde um homem que emanava simpatia, educação, classe e amabilidade.

O autor tinha 92 anos e encontrava-se completamente ativo, a trabalhar em novos álbuns de banda desenhada. Que louvável e bonito isso é!

Quando, há menos de um ano, me recebeu em sua casa, a propósito do seu PRÉMIO CARREIA dos VINHETAS D'OURO, que dizia não merecer, estivemos horas e horas à conversa. Mas não era uma daquelas conversas de circunstância, para "encher chouriços"... era uma conversa fluída, honesta e "sem tretas". Ensinou-me mais naquelas três horas do que ele podia imaginar.

Vê-lo a trabalhar, em formato digital, com mais de 90 anos, foi também uma verdadeira bênção.

Em jeito de homenagem, convido-vos a visualizarem, a partir do minuto 46:00, a atribuição do prémio carreira dos VINHETAS D'OURO 2021 ao Mestre José Ruy. Que, se não estou em erro, foi o último prémio que o autor recebeu.

A cerimónia de cremação realiza-se amanhã e o corpo será velado hoje, a partir das 16H00, na igreja da Amadora.

Sentidas condolências à esposa e restante família.





quinta-feira, 26 de maio de 2022

Antologia a ser lançada no FIBDB conta com alguns nomes ilustres da BD nacional!



Irá ser apresentada no Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja a antologia Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, que conta com a paticipação de vários autores portugueses como José de Matos-Cruz, José Ruy, Daniel Maia, Fernando Vilhena de Mendonça, João Raz, José Bandeira, Nuno Dias, Renato Abreu e Susana Resende.

Trata-se de uma co-edição Kafre / Arga Warga.

Mais abaixo, deixo-vos com algumas imagens promocionais e a nota oficial desta lançamento.


Aurora Boreal em Reflexos Partilhados, de vários autores
Aurora Boreal em Reflexos Partilhados é uma antologia de banda desenhada, em coedição de Kafre/Arga Warga. A personagem literária foi criada em 2012 por José de Matos-Cruz, com transfiguração original de Susana Resende. Participam nesta colectânea de obras curtas, inéditas ou já divulgadas como conteúdo extra, Daniel Maia, Fernando Vilhena de Mendonça, João Raz, José Bandeira, Nuno Dias, Renato Abreu e Susana Resende, também autora da capa e do grafismo, além de mestre José Ruy, numa colaboração especial.

A apresentação de Aurora Boreal em Reflexos Partilhados decorre no Domingo, 29 de Maio, às 16h30, no 17º FIBDB.

Aurora Boreal surgiu no universo romanesco/ilustrado d’O Infante Portugal (As Tramóias Capitais; 2007, A Íntima Capitulação; 2010, As Sombras Mutantes; 2012, pela editora Apenas Livros), concebido por José de Matos-Cruz, tendo nascido de uma relação efémera e sensual entre Oktobraia, uma heroína soviética exilada em Lisboa, e o Malsão, um portento cósmico que avassala o marasmo lusitano.

Menina e loira, emancipada em tríptico imaginado/literário (O Princípio Infinito; 2017-2018, O Eterno Paradoxo; 2019, O Círculo Imperfeito; 2020, por Apenas Livros), logo uma auspiciosa Aurora Boreal - irradiando além das luzes e das trevas - rompe os ciclos da infância e da identidade, pelo capricho súbito e intenso de uma libertação… Nessa aprendizagem mágica e germinal, Aurora Boreal suspende as coordenadas sobre o tempo e o lugar em que decorrem tais derivas e interferências. Do passado ao futuro, ou em actualidade virtual, a sua aparência torna-se então Presente - ainda adolescente, adulta ou idosa -, desafiando todas as rotinas, como um fenómeno telúrico e transfigurador!

Entretanto, Aurora Boreal compareceu no clímax pelos quadradinhos d’O Infante Portugal em Universos Reunidos (2017), com desenho de Daniel Maia, também coautor da história com José de Matos-Cruz, que elaborou o texto. Esta banda foi distinguida pelos XVI Troféus Central Comics, na categoria Melhor Obra Curta (2018).

Aurora Boreal em Reflexos Partilhados culmina, assim, uma incursão fantástica pelos meandros da realidade e em dimensões alternativas. Afinal, com mais simbólica ênfase de reinvenção - ao conferir, pela banda desenhada, uma abordagem múltipla e propícia às expectativas de cada criador artístico.

-/-

Ficha técnica
Aurora Boreal em Reflexos Partilhados
Autores: José de Matos-Cruz, José Ruy, Daniel Maia, Fernando Vilhena de Mendonça, João Raz, José Bandeira, Nuno Dias, Renato Abreu e Susana Resende
Páginas: 52, a preto e branco
Encadernação: Capa mole
PVP: 10,00€