Mostrar mensagens com a etiqueta Yslaire. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Yslaire. Mostrar todas as mensagens

terça-feira, 29 de julho de 2025

TOP 10 - A Melhor BD lançada pela Ala dos Livros nos últimos 5 anos!


A propósito da comemoração dos 5 anos de existência do Vinheta 2020, trago-vos um especial que começa a partir de hoje e que procura celebrar e assinalar a melhor banda desenhada que cada uma das principais editoras portuguesas editou nos últimos 5 anos. Durante as próximas semanas tentarei, pois, oferecer-vos um artigo por editora.

Convém relembrar que este conceito de "melhor" é meramente pessoal e diz respeito aos livros que, quanto a mim, obviamente, são mais especiais ou me marcaram mais. Ou, naquela metáfora que já referi várias vezes, "se a minha estante de BD estivesse em chamas e eu só pudesse salvar 10 obras, seriam estas as que eu salvava".

Faço aqui uma pequena nota sobre o procedimento: considerei séries como um todo e obras one-shot. Tudo junto. Pode ser um bocado injusto para as obras autocontidas, reconheço, e até ponderei fazer um TOP exclusivamente para séries e outro para livros one-shot, mas depois achei que isso seria escolher demasiadas obras. Deixaria de ser um TOP 10 para ser um TOP 20. Até me facilitaria o processo, honestamente, mas acabaria por retirar destaque a este meu trabalho que procura ser de curadoria. Acabou por ser um exercício mais difícil, pois tive que deixar de fora obras que também adoro, mas acho que quem beneficia são os meus leitores que, deste modo, ficam com a BD que considero ser a crème de la crème de cada editora.

Em cinco anos de edição ininterrupta de banda desenhada, há naturalmente muitos títulos editados e, como devem calcular, a tarefa não foi fácil e vi-me forçado a excluir obras fantásticas, mas, lá está, há que fazer escolhas e estas são as minhas escolhas.

Hoje começo com uma editora cujo contributo para o lançamento de boa banda desenhada em Portugal é verdadeiramente inegável: a Ala dos Livros.

Esta editora tem um catálogo que considero de extrema qualidade. São (muito!) mais as obras que adoro da editora, do que aquelas de que não gosto. Não foi fácil, mas aqui está o meu TOP

Eis, mais abaixo, as minhas obras favoritas lançadas pela editora Ala dos Livros:

sexta-feira, 4 de outubro de 2024

Análise: Sambre #7 e #8


Sambre #7 e #8 - Flor da calçada | Aquela que os meus olhos não vêem…, de Yslaire

Ao longo de uma vida a ler milhares de livros de banda desenhada - e mesmo sendo um claro amante das histórias aos quadradinhos, que muitos até consideram demasiado "benevolente" nas suas análises e opiniões - é natural que não se torne tão fácil assim que uma série entre para aquele conjunto fechado de obras que mudam a minha vida. Dito por outras palavras, há a BD muito boa, sim, mas que, apesar disso, não chega ao ponto de me tocar tão intensamente assim e, depois, há aquela BD mais rara, mais singular, mais única, que me toca cá no fundo, que me deixa viajar para longe, que me faz sonhar. Sambre é uma dessas séries.

Sendo visualmente linda, da primeira à última vinheta, esta também é uma série onde o belo e o putrefacto, o amor e o ódio, a riqueza e a pobreza, andam sempre de mãos dadas numa história trágica, num romance a la Shakespeare e numa história grandiosa que é difícil olvidar.

Portanto, em boa hora, a editora Arte de Autor começou a publicar esta série que, como tantas outras, tinha sido deixada ao abandono aquando da sua primeira edição portuguesa. Na altura, apenas os primeiros tomos da série foram lançados pelas editoras Baleia Azul e Witloof. Bem, para ser mais exato, o primeiro ciclo da série ficou fechado, sim, mas dado que a história continua as aventuras e desventuras da família Sambre, era uma pena que tivesse sido deixada a meio. A Arte de Autor voltou, então, a publicar os quatro primeiros álbuns, enquanto publicou os inéditos, em Portugal, volumes 5, 6, 7 e 8. Havia dúvidas sobre a possibilidade da série terminar no 9º ou 10º tomo, com vários sites a apresentarem informações díspares quanto a isso, mas - e com base numa entrevista que o próprio autor Yslaire deu há uns meses - posso confirmar-vos que Sambre está pensada para terminar em 2026 - ano em que a série comemora 40(!) anos - num álbum duplo que terá cerca de 180 páginas. Mal posso esperar por esse dia! O mau é que a espera ainda vai ser algo longa!...

Mas concentremo-nos, por agora, no mais recente álbum duplo, que reúne Flor da Calçada e Aquela que os meus olhos não vêem…, respetivamente os tomos 7 e 8 da série.

Neste volume, a narrativa continua a explorar a história dos protagonistas, principalmente a relação tumultuosa entre as várias personagens principais, dando-nos três subnarrativas aparentemente diferenciadas e paralelas: a vida trágica e pobre, a fazer lembrar Oliver Twist, de Judith; a vida cativa e exilada (e controlada pela sua tia) de Bernard-Marie; e a existência de Julie que, arredada de tudo e todos, procura uma nova forma de vida. A carga dramática mantém a sua característica intensidade, com cada uma das personagens a revelar um grande número de conflitos internos.

A cadência narrativa impressa por Yslaire continua a ser lenta, mas com a história da jovem rebelde Judith, que é pródiga em acontecimentos marcantes, o autor consegue que o leitor nunca se sinta entediado ou deixe de querer estar mergulhado na leitura da obra. Essa é, aliás, uma característica da série Sambre e, diria mesmo, de todas as boas histórias. Assim que mergulhamos na leitura de um dos livros da série, o tempo e o espaço onde estamos parece parar, enquanto somos transportados até à Paris do século XIX e à história desta malograda família.

Também o lado sombrio da narrativa, com claros laivos góticos, se mantém bem presente. Se calhar, até de forma mais intensa do que nos anteriores álbuns. A escrita também se nos revela rica e complexa, com o autor a explorar os temas emotivos e profundos da paixão, da força do destino e das relações familiares.

E nada aqui é "leve". Pelo contrário, o amor em Sambre é "pesado" e amplamente marcado por sofrimento e sacrifício, tornando-se uma contante e um fado do qual nenhuma das personagens parece conseguir fugir. E mesmo estando geograficamente distantes, fica latente que o encontro entre Judith e Bernard-Marie se torna inevitável. Mas, quanto a isso, a ver vamos.

Quanto às ilustrações, devo dizer que, por incrível que possa parecer, Sambre parece continuar sempre a melhorar de livro para livro! Por um lado, compreende-se que, pela passagem de tantos anos entre os vários volumes da série, o autor tenha evoluído o seu traço. Por outro lado, também é comum em várias séries de banda desenhada que, com a passagem dos anos, haja, por parte do(s) seu(s) autor(es) um certo descuido visual, potenciado pelas vendas "certas" e "garantidas" de determinadas séries. Felizmente, este último cenário não é o que acontece em Sambre. Se formos olhar para os volumes 1 e 8 da série, veremos que o autor soube manter harmonia e congruência com a arte do primeiro volume, mas, ainda assim, evoluiu muito os cenários, as expressões das personagens, as cores, os efeitos visuais, a exploração da luz e das sombras, e tudo e mais alguma coisa. Já era muito bom no primeiro volume, mas é um verdadeiro tratado neste último livro. Com o seu belo traço em tons a sépia onde os vermelhos assumem protagonismo, há aqui várias vinhetas que poderiam ser pinturas expostas num museu, tal não é a sua beleza e tratamento técnico. Sinceramente, é um trabalho do melhor que há.

Avançando para a edição da Arte de Autor, também estamos perante um belíssimo trabalho. O livro enverga capa dura, com textura aveludada, bom papel brilhante no miolo e boa impressão e encadernação. A última página reserva alguns esboços de Yslaire. Tudo bem feito, portanto. Não costumo opinar sobre traduções mas, no caso concreto, não consigo deixar de dizer que a opção pela palavra "tiinha" para a tradução do termo francês "tatie" não me parece muito feliz e até me incomodou um bocado na leitura, já que a palavra aparece inúmeras vezes. Pode ser ignorância minha, reconheço, mas em 40 anos de vida nunca ouvi a palavra "tiinha" como diminuitivo de tia. Penso, portanto, que "tiazinha" - ou mesmo "ti", "titi" ou "titia" - seriam melhores opções que "tiinha". Ou mesmo a tradução para a palavra portuguesa sem diminuitivo, simplesmente "tia", teria funcionado melhor. Peço desculpa pelo preciosismo, mas é algo que me incomodou mais do que aquilo que eu gostaria. 

Mas deixando os pormenores e centrando-me no mais global e determinante, importa reforçar que estes dois novos capítulos de Sambre, com todo o seu dramatismo romântico, as suas palavras poéticas que ecoam no leitor, as suas personagens emocionalmente atordoadas e os seus desenhos verdadeiramente impressionantes - que deveriam ser considerados património cultural pela UNESCO - mantêm viva a certeza de que esta é uma das séries de banda desenhada da minha vida. Soberba, mandatória e digna de nota máxima!


NOTA FINAL (1/10):
10.0



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



-/-



Ficha técnica
Sambre #7 e #8 - Flor da calçada | Aquela que os meus olhos não vêem…
Autor: Yslaire
Editora: Arte de Autor
Páginas: 144, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 235 x 310 mm
Lançamento: Agosto de 2024


sexta-feira, 23 de agosto de 2024

Que maravilha, Sambre está de volta!!!



Os que me acompanham já sabem o quão fã eu sou da série Sambre, de Yslaire! É uma das minhas bandas desenhadas favoritas! De sempre!

Há algo nesta história, despudoramente trágico-romântica, que a torna única no universo da banda desenhada. E isto já para não falar nos desenhos, absolutamente maravilhosos, de Yslaire!

É uma daquelas séries de BD que considero irresistíveis e uma das minhas favoritas de sempre. Coloco-a nas dez melhores, sem qualquer problema. Por ventura, nas três melhores, até.

Portanto, e pelo menos para mim, é ALTAMENTE RECOMENDADA.

A editora Arte de Autor já fez saber que o livro deverá chegar às livrarias nos próximos dias. Relembro que se trata de um álbum duplo, que reúne os tomos 7 e 8 da série, que nunca haviam sido editados em Portugal. A partir deste momento, a Arte de Autor iguala os álbuns lançados no mercado original! Parabéns à editora por este marco e obrigado pela aposta!

Mais abaixo, deixo-vos com a sinopse da obra e com algumas imagens promocionais.


Sambre #7 e #8 - Flor da calçada | Aquela que os meus olhos não vêem…, de Yslaire
Para além do tempo, para além do ódio dos homens, o caso de amor entre Bernard Sambre e Julie, como uma brasa incandescente, irradia com toda a sua beleza nesta obra-prima. Yslaire escreve com as deslumbrantes palavras de paixão e desenha ardentemente este hino ao amor impossível.

Sambre ou a ilustração exacta e perfeita do "Romantismo", entre a escuridão da alma e a queima dos sentimentos. Um monumento.


Flor da calçada - Capítulo 7 – Última geração (1856-1868)

Paris, Junho de 1858. 
Judith é criada na pobreza de um orfanato, aterroriza apelas sombras da noite. Atraída como uma borboleta pelas mil luzes da capital, a menina rebelde emancipa-se, vive uma vida boémia, sobrevive entre a ralé. 

Em Roquevaire, o seu irmão gémeo, Bernard-Marie, cresceu assombrado pelos fantasmas dos seus pesadelos. E, sem o saber, sonha que um dia a morte os reunirá, a ele e a Judith, inevitavelmente. 

Apesar de tudo, os dois órfãos, com saudades da sua alma gémea, já se procuram no invisível, e tecem a teia do seu trágico destino…


Aquela que os meus olhos não vêem… - Capítulo 8 – Última geração (1856-1868)

Junho de 1862, 

La Bastide. 
Bernard-Marie tem a melancolia própria da idade. Para esquecer, apaixona-se por teatro, fotografia, entomologia e a migração das borboletas esfinge-caveiras. Mas sua tia Sarah, sofrendo devido ao distanciamento do adolescente, tenta desesperadamente reprimir o seu desejo de emancipação. 

Paris.
Judith é uma das principais atracções do País das Esfinges, um dos bordéis mais concorridos da capital. Sem escrúpulos, a órfã faz do seu corpo a ferramenta da sua ambição irresistível: tornar-se uma artista reconhecida e adorada. 
Sem o saber, Bernard-Marie sonha com a sua morte com Judith. Sem o conhecer, Judith procura a sua alma gémea, na sombra do espelho unidireccional do seu quarto público. Inconscientemente, apesar da distância e de tudo o que parece separá-los, a busca pela liberdade torna o seu encontro fatal e inevitável…

-/-

Ficha técnica
Sambre #7 e #8 - Flor da calçada | Aquela que os meus olhos não vêem…
Autor: Yslaire
Editora: Arte de Autor
Páginas: 144, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 235 x 310 mm
PVP: 31.50€

quarta-feira, 23 de agosto de 2023

Sambre está de volta!



A Arte de Autor prepara-se para publicar o volume que reúne os tomos 3 e 4 da série Sambre, de Yslaire!

É já na próxima semana que o livro deverá chegar às livrarias.

Portanto, agora que a história já não tem "buracos" no meio, já não há desculpas para que não se aposte nesta série fabulosa. É uma das minhas séries favoritas de banda desenhada, não me canso de dizer!

Agora que os tomos 1, 2, 3, 4, 5 e 6 estão publicados em três volumes duplos, para que a série fique completa, fica apenas a faltar que a editora portuguesa publique o volume que conterá os tomos 7 e 8 e o 9º e último volume da série que é esperado que saia, na sua versão original, no primeiro semestre de 2024.

Mais abaixo, deixo-vos com a sinopse da obra e com algumas imagens promocionais da mesma.

Sambre #3 e #4 - Liberdade, liberdade… | Teremos de morrer juntos?, de Yslaire (Álbum duplo)

Para além do tempo, para além do ódio dos homens, o caso de amor entre Bernard Sambre e Julie, como uma brasa incandescente, irradia com toda a sua beleza nesta obra-prima. Yslaire escreve com as deslumbrantes palavras de paixão e desenha ardentemente este hino ao amor impossível.

Sambre ou a ilustração exacta e perfeita do "Romantismo", entre a escuridão da alma e a queima dos sentimentos. Um monumento.

Liberdade, liberdade…

Capítulo III

Paris, 21-22 de Fevereiro de 1848.

A revolta ressoa pelos ares e o povo mobiliza-se aos gritos de “Liberdade, liberdade…” 

Mas ela tem tantas faces… A daquela, a guiar o povo, que Delacroix pintou em 1830, a de 1848, que Valdieu não pintará, e depois, aquela com que Bernard sonha e que se assemelha a uma rapariga de olhos vermelhos…
 
Naquele período conturbado, cada um pagará o preço por ter querido possuí-la, e mudar o seu destino… porque A Guerra dos Olhos é eterna e impiedosa.

Teremos de morrer juntos?

Capítulo IV

Paris, 23 de Fevereiro de 1848.

Pela manhã, a revolução parece ter falhado. Mas a tragédia estava apenas a começar.

Há um provérbio árabe que diz “não é a bala que mata mas sim o destino…” E o que Bernard e Julie juraram, foi morrerem juntos…

A história de um amor louco e de uma revolução demasiado jovem que acaba em sangue.

-/-

Ficha técnica
Sambre #3 e #4 - Liberdade, liberdade… | Teremos de morrer juntos?
Autor: Yslaire
Editora: Arte de Autor
Páginas: 120, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 235 x 310
PVP: 29,50€

terça-feira, 30 de maio de 2023

Comparativo: Sambre pela Arte de Autor, pela Baleia Azul e pela Witloof


Creio que os seguidores do Vinheta 2020 já saberão bem o quão feliz fiquei quando a Arte de Autor anunciou que ia lançar a série Sambre, de Yslaire. É uma das minhas séries favoritas de banda desenhada e tinha muita pena que a mesma permanecesse parcamente editada em português.

Como costumo fazer quando há reedições, hoje trago-vos um comparativo entre a edição da Arte de autor e as edições da Baleia Azul e da Witloof. A Baleia Azul apenas editou o primeiro tomo da série. A Witloof publicou os volumes 2, 3 e 4.

Portanto, é motivo ideal para colocar as 3 edições em cima da mesa e compará-las entre si.

Em primeiro lugar, em termos de edição, convém relembrar que a Arte de Autor optou por lançar a série em álbuns duplos. Coisa que não tinha sido feita pelas outras editoras.

A edição da Baleia Azul é a mais diferente. Não só porque é a única lançada em capa mole mas, também, porque a própria conceção visual da capa e contracapa, naqueles tons escarlate que são emblemáticos para a série, também não existe. Parece, portanto, um livro mais "normal" e menos diferenciado. 

A edição da Arte de Autor acaba por ser bastante semelhante à edição da Witloof. São poucas as diferenças que se encontram entre ambas as capas. A edição da Arte de Autor tem uns vermelhos mais vivos e a capa tem uma textura aveludada - comum nos lançamentos da Arte de Autor - mais agradável ao toque. Mas, tirando isso, ambos os livros são muito similares.




Tendo em conta que a edição da Arte de Autor é em capa dura e que se trata de um álbum duplo, não é de admirar que o livro seja muito mais grosso dos que os outros, especialmente do que a edição da Baleia Azul.




Olhando para as contracapas, todas elas são bonitas mas tenho que dizer que a contracapa da Arte de Autor acaba por ser a mais bela. A editora optou por usar as duas ilustrações das capas do tomo 1 e do tomo 2. A capa do tomo 2 foi usada como capa deste volume e a capa do tomo 1 foi usada como contracapa. 

Devo dizer que, apesar disso, também gostava bastante da contracapa da edição da Witloof que tinha as capas dos cinco volumes do início da série (o 5º acabaria por nunca ser editado pela editora), com um pormenor delicioso: o volume em questão recebia um tratamento a verniz para o diferenciar dos demais.




Olhando para o interior da obra, quando comparamos a edição da Baleia Azul com a edição da Arte de Autor, há uma grande diferença ao nível do tratamento das cores. É que a impressão da Baleia Azul apresentava cores demasiado esbranquiçadas que tiravam algo do ambiente escuro e misterioso da série, como pode ser visto na imagem acima.
 



A questão das cores foi resolvida com a redição da Witloof, diga-se, que acaba por ficar bastante equiparada à edição da Arte de Autor, como pode ser visto acima. Nalguns casos parece-me que as cores da Witloof talvez sejam ligeiramente escuras em demasia. Mas a diferença é diminuta, admito.

Olhando para o todo, a edição da Arte de Autor parece-me melhor do que todas as restantes embora a edição da Witloof apresente uma qualidade bastante boa, também.




A única coisa onde não me parece que a edição da Arte de Autor tenha sido tão feliz, é na escolha das fonts para o texto manuscrito que aparece em algumas cartas. Mesmo assim, também aceito que esta seja uma opção mais estética porque, convenhamos, ambos os tipos de letra têm boa leitura.




Nota ainda, positiva, para a inclusão de uma belíssima ilustração na edição da Arte de Autor. A capacidade ilustrativa do autor Yslaire é verdadeiramente impressionante.



Por fim, a edição da Arte de Autor também inclui uma árvore genealógica das várias personagens e gerações que fazem parte da família Sambre. Um bom pormenor. Não sei se isto é, ou não, um compromisso da Arte de Autor para os leitores de que, além do arco principal da série, a editora ponderá publicar, no futuro, o restante arco de A Guerra dos Sambre que, embora sob a batuta de Yslaire, é desenhada por outros autores e que inclui 3 ciclos de 3 livros. 

Da minha parte, posso dizer que adoraria que isso acontecesse. Mas também considero que talvez ainda seja muito cedo para pensar, sequer, nessa hipótese. Para que isso pudesse, eventualmente, acontecer, acho que a série principal teria que vender muito bem. Fica o desejo, por agora.

Em suma, sendo verdade que a edição que a extinta editora Witloof fez de Sambre era muito boa, a Arte de Autor volta a não desiludir e apresenta-nos uma bela edição para uma obra absolutamente obrigatória. Já não há razões plausíveis para não se apostar nesta obra prima da banda desenhada europeia!

terça-feira, 11 de abril de 2023

Arte de Autor publica o primeiro volume de Sambre!


Passados cerca de dois meses, eis que a Arte de Autor volta a lançar um volume de Sambre

Desta vez, a editora lança o primeiro volume da série, que reúne os tomos 1 e 2, depois de, no passado mês de Fevereiro, ter lançado o volume que contém os tomos 5 e 6 desta fantástica série.

Ora, se (ainda) havia dúvidas de que a editora iria lançar a totalidade da série, eis mais uma prova do comprometimento da editora perante a série e perante os leitores portugueses. A Arte de Autor também já confirmou que o volume que reúne os tomos 3 e 4 da série deverá ser publicado no segundo semestre deste ano.

Reitero que esta é uma das minhas séries preferidas de banda desenhada portanto, considero-a não apenas recomendável mas mesmo obrigatória!

O livro deverá chegar às livrarias a partir de amanhã.

Mais abaixo, deixo-vos com a sinopse deste primeiro volume e com algumas imagens promocionais.

Sambre #1 e #2 - Nada mais me importa… | Eu sei que tu virás…, de Yslaire

Para além do tempo, para além do ódio dos homens, o caso de amor entre Bernard Sambre e Julie, como uma brasa incandescente, irradia com toda a sua beleza nesta obra-prima. Yslaire escreve com as deslumbrantes palavras de paixão e desenha ardentemente este hino ao amor impossível.
Sambre ou a ilustração exacta e perfeita do "Romantismo", entre a escuridão da alma e a queima dos sentimentos. Um monumento.

Nada mais me importa…
Capítulo I - Segunda geração (1847-1848)

Roquevaire, Novembro de 1847. A segunda geração dos Sambre prostra-se em redor do caixão de Hugo. Mesmo morto, a maldição do patriarca paira sobre todos. Está lá Sarah, a filha mais velha que quer terminar A Guerra dos Olhos, a obra do seu pai. Bernard, o seu irmão mais novo, que sonha partir para outros lugares. A mãe deles, a viúva radiante que seduz o primo Guizot… E também existe a jovem caçadora furtiva de olhos vermelhos, que ronda em torno da Bastide e do último dos seus filhos… Entre Bernard e Julie, a maldita, começa uma paixão funesta… Vermelha como o amor, negra como a morte…
Eu sei que tu virás…
Capítulo I - Segunda geração (1847-1848)

Paris, Janeiro de 1948. Acusada da morte da mãe Sambre, Julie refugia-se em Paris. Torturado pela dúvida e pelos remorsos, Bernard aproveita o primeiro pretexto oferecido pelo primo Guizot para ir para a capital. Ainda não sabe que a sua busca o faz seguir os passos do seu pai e dos fantasmas de A Guerra dos Olhos… “Eu sei que tu virás…”, sussurrou Julie antes de fugir...

-/-
Ficha técnica
Sambre #1 e #2 - Nada mais me importa… | Eu sei que tu virás…
Autor: Yslaire
Editora: Arte de Autor
Páginas: 104, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 235 x 310 cm
PVP: 27,00€



segunda-feira, 13 de março de 2023

Análise: Sambre #5 e #6

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor
Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire

E cá está ele! Depois de anos e anos em que exasperei por uma edição portuguesa de Sambre, eis que a Arte de Autor me fez a vontade - a mim e a tantos outros, estou certo, que se deslumbraram com os primeiros 4 tomos de uma maravilhosa série assinada por Yslaire.

Esses primeiros quatro volumes foram originalmente lançados por cá pelas extintas editoras Baleia Azul – que apenas editou o primeiro tomo – e Witloof que publicou os volumes 2, 3 e 4.

Agora, e conforme já aqui referi várias vezes, a Arte de Autor resgata esta série para deleite dos seus fãs. Sambre é composta por 9 álbuns (sendo que o último volume ainda não foi originalmente publicado) e a aposta da Arte de Autor começa por publicar os primeiros álbuns que se encontravam inéditos em Portugal até agora, ou seja, os volumes 5 e 6. A editora optou por esta mesma tática, tal como fez com a série Armazém Central

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor
Sei que é algo que incomoda alguns leitores pois queriam, compreensivelmente, começar a ler a série a partir do primeiro número. Sobre esta questão, e para dissipar dúvidas, posso dizer que questionei a editora, Vanda Rodrigues, e que a mesma me disse que esta forma de atuar se deve à preocupação da editora em ajustar tiragens face à resposta do mercado. Para que não se produzam livros a menos, nem a mais. Por mim, considero ser algo bastante aceitável. Até porque, tendo em conta o histórico da editora em terminar as séries que começa, creio que até os leitores mais céticos poderão contar com a integral publicação desta série. Além de que, convém não esquecer, a editora tem nos seus planos a edição do primeiro volume (tomos 1 e 2) já no primeiro semestre de 2023 e a publicação do segundo volume (tomos 3 e 4) até final do ano.

Ora, a leitura deste Sambre #5 e #6 fez-me pegar na série do princípio e reler tudo do primeiro ao sexto volume. E que bom isso foi!

Já aqui o disse – e volto a dizer – mas, de facto, Sambre está entre as minhas séries preferidas de banda desenhada. Talvez só atrás de Blacksad e da já referida Armazém Central. Estas três são, sem dúvida, as três séries que eu salvaria se a minha casa estivesse em chamas e eu só pudesse levar três séries comigo. A afirmação é subjetiva, claro. Tentando justificar o porquê desta minha paixão por Sambre, posso dizer que esta série me dá algo, que muito aprecio em banda desenhada, mas que não é assim tão comum: um romance de época onde o drama amoroso das personagens é trágico e impactante.

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor
Sim, Sambre está impregnado de dramatismo e romance. Alguns acharão, possivelmente, que é romance a mais. Eu, no meu caso, adoro isto e até gostaria de o ver mais presente na banda desenhada. Pelo menos, naquela que é editada em Portugal. Sim, diria que livros como o recentíssimo Menina Baudelaire, do mesmo autor, ou A Vingança do conde Skarbek, de Sente e Rosinski, encaixam nesta vertente do drama de época desavergonhadamente romântico, mas, lá está, não são muitas as obras deste fôlego lançadas em Portugal. Até porque me parece que há espaço para a conquista de novos leitores (que normalmente não lêem bd) com este tipo de obras.

Ler os primeiros 6 tomos da série também me permitiu constatar que Sambre não é uma obra estanque entre volumes. É claro que acompanhamos uma história que, de um volume para outro, vai tendo continuidade. Todavia, posso dizer que há, para já, três ritmos e abordagens presentes na série: o primeiro volume; os volumes 2,3 e 4. E os volumes 5 e 6. No primeiro volume, talvez pela razão de Yslaire ter trabalhado conjuntamente com Balac no argumento, temos um ritmo deveras diferente. Quase rápido demais, diria. Em poucas páginas conhecemos as personagens, que marcarão toda a saga, e desenvolve-se – de forma algo abrupta, concedo – a enorme e Shakespeariana história de Bernard e Julie. Tudo acontece a um ritmo veloz. Depois, entre os tomos 2,3 e 4, há uma tentativa de dotar a série de uma maior ambiência política, já que a ação decorre durante o período da Segunda Revolução Francesa, na cidade de Paris, em 1848. Se a ação do primeiro tomo era rápida em demasia, a ação dos três volumes seguintes abranda de forma muito premente. Certos momentos são, quanto a mim, esticados um pouco em demasia pelo autor. Mas nestes tomos 5 e 6 a série volta a respirar melhor. O ritmo mantém-se lento – só mesmo o ritmo do primeiro tomo é que é acelerado – mas de uma forma mais coesa e pertinente. É dado tempo ao leitor – e às novas personagens – para melhor serem exploradas pela narrativa da história.

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor
Diria que é, especificamente, nestes quinto e sexto volumes da série, que o autor Yslaire melhor doseia a história, em termos de ritmo e cadência de enredo.

Sintetizando a história de Sambre num único parágrafo, esta série conta-nos a história da família Sambre e da maldição que, aparentemente, parece acontecer aos homens da família que, invariavelmente, se apaixonam por mulheres de olhos vermelhos. Ora, Hugo Sambre, o pai do protagonista Bernard, até começou por escrever o livro A Guerra dos Olhos onde separava a proveniência social e relevância do caráter de uma pessoa com base numa característica física – já viram isto em algum lado? No caso desta saga, para Hugo Sambre, aqueles que nasceram com olhos vermelhos são a escória da sociedade e não deverão, de forma alguma, ter contactos com a aristocracia, na qual se insere a família Sambre. Ora, como não podia deixar de ser, o jovem Bernardo apaixona-se, de forma fulminante, pela bela Julie que - adivinhem lá! - é portadora de uns belos e sedutores olhos vermelhos. A partir daqui, este romance proibido depressa dá lugar a uma dor dilacerante para ambos os amantes e as suas vidas acabam por percorrer caminhos trágicos, que parecem feitos para os afastar, mas que, de uma forma ou de outra, acabam, caprichosamente, por aproximá-los. É um amor de perdição à antiga, daquelas histórias de amor que, em vez de deixarem os amantes próximos do céu, deixam-nos próximos do inferno.

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor
Depois de todos os eventos decorridos no final do 4º livro – e que tentarei não divulgar aqui, Julie consegue sobreviver. Embora convenhamos que o facto de ter sido condenada à pena de morte não abone muito a favor da sua felicidade. Por ironia do destino, e mesmo que Julie anseie pela sua própria morte, as circunstâncias do momento retiram o seu pescoço da guilhotina e a bela mulher é transportada para a Guiana Francesa, com o objetivo de passar a viver nessa Colónia francesa, longe do fulgor cosmopolita parisiense. Enquanto isto, o filho de Julie e de Bernard, Bernard-Marie, é educado em Bastide, pela sua tia Sarah, enquanto lhe é dada uma educação baseada no intuito de negar a mãe do rapaz e prestar o devido culto ao pai de Bernard-Marie.

Enquanto é transportada, juntamente com outras reclusas, para a Guiana Francesa, há um violento naufrágio que leva Julie a uma pequena ilha da Irlanda. A partir deste ponto, o irritante e persistente comissário Guizot - que é primo dos Sambre - não desiste de procurar Julie pois é ela, segundo se crê, a causa da tragédia da família Sambre. Julie refugia-se nesta pequena ilha e encontra algumas novas personagens marcantes, mas a presença de Bernard, bem como a busca pelo seu filho Bernard-Marie, nunca deixa Julie encontrar a redenção e paz de espírito que almeja.

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor
Bem, se a história nos deixa cativados e mergulhados neste enredo onde coabitam as personagens, Sambre também é uma série assinalável pela sua beleza visual. Os desenhos com que Yslaire nos brinda são verdadeiras obras de arte! Há uma poesia, uma sensualidade, uma beleza nestas ilustrações que, só por si, já valeriam a compra de toda a série. Não só as personagens apresentam um carisma tal cuja presença perdura na nossa memória, assim que mergulhamos em Sambre, como os cenários - quer interiores, quer exteriores, quer rurais, quer citadinos - apresentam uma beleza eloquente. Um verdadeiro deleite para os olhos. Poesia em forma de desenho. Teatralidade em forma de pranchas de banda desenhada.

A paleta de cores também é mais outra das "armas" desta série. Com um belo uso do preto e das sombras, que ajudam a que haja um estilo quase gótico, muitas vezes sombrio, nos ambientes criados, é também na utilização do vermelho vivo e nos ocres que o autor consegue demarcar-se de restantes obras. O seu ponto de originalidade, vá. Como Frank Miller fez no seu Sin City, mas com as devidas – e demarcadas – distâncias, claro está.

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor
Mais do que um ilustrador de primeira linha em termos técnicos, Yslaire é um criador de imagens acústicas que se alojam na nossa memória. E diga-se que este volume está cheio dessas imagens emblemáticas: a espera de Julie para a sua vez na guilhotina, o embarque para o navio com destino à Guiana Francesa, Rosine a empurrar Bernard-Marie no baloiço, a visão do purgatório, o naufrágio sob a luz vermelha do farol, as cenas do funeral… meus caros, são imagens potentes, que nos marcam, e que são ilustradas com um virtuosismo singular. Maravilhoso da primeira à última página!

E, já agora, permitam-me dizer algo que me surpreendeu pela positiva. O próprio Yslaire parece ter melhorado os seus dotes de desenho ao longo da série. Os primeiros volumes de Sambre já tinham muita beleza, sim, mas, quando se lê a série de forma seguida, como eu fiz, é bastante detetável que a arte melhorou substancialmente. Os primeiros desenhos já eram marcantes e belos, mas não eram executados com tanta mestria técnica.

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor
Outra das coisas que muito me agrada nesta série são as fantásticas capas, com belas ilustrações e com o habitual fundo a vermelho. Por acaso, até acho que a capa escolhida pela Arte de Autor para esta edição – que pertence ao sexto tomo – sendo bonita, até nem é das capas que melhor exemplifica o que acabo de dizer e talvez a opção pela capa do quinto volume - que aqui aparece na contracapa - tivesse sido mais feliz. Mas será uma questão de gosto. A verdade é que todas as outras capas de todos os outros volumes são, a meu ver, lindas.

A edição da Arte de Autor apresenta ótima qualidade. O livro tem capa dura, com textura aveludada, e com o título da série a verniz. O papel é brilhante e tem uma boa espessura, enquanto que a impressão e encadernação do livro, apresentam boa qualidade. A opção pela edição da série em álbuns duplos parece-me ajustada e bem-vinda.

Em suma, Sambre é uma banda desenhada de qualidade superior, magistralmente ilustrada por Yslaire, que nos oferece uma história que retrata um amor impossível e condenável, bem ao jeito dos grandes clássicos da literatura. Impactante, tumultuosa e incomensuravelmente bela, esta é uma banda desenhada que todos devem ler!


NOTA FINAL (1/10):
10.0



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



-/-

Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…, de Yslaire - Arte de Autor

Ficha técnica
Sambre #5 e #6 - Maldito seja o fruto do seu ventre... | O mar visto do Purgatório…
Autor: Yslaire
Editora: Arte de Autor
Páginas: 104, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 235 x 310 cm
Lançamento: Janeiro de 2023

segunda-feira, 6 de março de 2023

Análise: Menina Baudelaire

Menina Baudelaire, de Yslaire - Ala dos Livros

Menina Baudelaire, de Yslaire - Ala dos Livros
Menina Baudelaire, de Yslaire

Quando soube que a Ala dos Livros iria editar Menina Baudelaire, de Yslaire, um autor que muito admiro pelo seu fantástico trabalho na série Sambre, fiquei muito, muito, muito satisfeito! Este Menina Baudelaire era, afinal, um livro que, na sua edição original francesa, já por muitas vezes eu tinha folheado em livraria e que me tinha deixado com um forte interesse por ele.

Agora, depois de lida a sua edição portuguesa, tenho que me render à evidência: por vários motivos, Yslaire é um dos meus autores favoritos de banda desenhada. E, sendo este o primeiro livro de 2023 da Ala dos Livros, só posso dizer que a editora portuguesa entrou com o pé direito neste ano. Estamos perante um livro de qualidade superior e altamente recomendado!

Olhando para a história em si, Menina Baudelaire procura ser uma biografia, não só de Charles Baudelaire – um dos mais proeminentes e consagrados poetas franceses –, como também da sua amada e musa, Jeanne Duval. E, sendo certo que se sabe bastante sobre a vida de Baudelaire, o mesmo não pode ser dito sobre Jeanne. Desta, da denominada Vénus Negra, poucas são as informações devidamente comprovadas. Há referências várias, aqui e ali, à relevância desta mulher na vida de Baudelaire, mas, para além daquele célebre quadro de Manet que, aparentemente, retrata Jeanne, muito pouco se sabe sobre a personagem.

Menina Baudelaire, de Yslaire - Ala dos Livros
Ora, adotando liberdades criativas, Yslaire procura mostrar-nos este lado oculto da história de Baudelaire e quem era a sua Vénus Negra, uma mestiça que, à época, e tendo em conta o seu tom de pele, muito indignava as gentes que rodeavam o poeta Baudelaire. Especialmente a mãe deste, que sempre tratou Jeanne com profundo desdém. Charles Baudelaire, porém, não queria saber disso e mergulhou numa paixão ardente e voluptuosa com Jeanne Duval. Esta mulher crioula e exótica, de origem incerta, acabou por ser a musa inspiradora de toda a vida do autor, cuja obra maior foi As Flores do Mal.

O erotismo está, pois, muito presente neste livro, permitindo ao leitor um vislumbre sobre a intimidade fogosa que ambas as personagens partilharam. Pelo menos, em boa parte da história. Porque, como qualquer experiência de amor que se alimenta exclusivamente do sexo - ou do mesmo enquanto fonte de inspiração artística -, também a história de Charles e Jeanne acabou por sofrer muitos revezes, à medida que o fogo que os unia se ia extinguindo. E, no final, o mel original da relação de ambos, deu lugar a um fel, demais amargo e amaldiçoante, para a vida dos dois amantes. O amor deu lugar ao ódio. A paixão deu lugar à repulsa. E as duas personagens acabam por cair - e morrer - em desgraça.

Menina Baudelaire, de Yslaire - Ala dos Livros
A história é-nos contada com base nas cartas que Jeanne Duval escreveu para a mãe de Baudelaire, após a morte deste, reclamando, devido à relevância que teve na vida do seu amante e na sua obra artística, parte da herança.

A abordagem teatral que Yslaire dá a este Menina Baudelaire – bem ao jeito do autor, diga-se – permite que o leitor mergulhe de cabeça nesta história. Parece que há algo, desde o primeiro momento, que nos diz que estes dois amantes haverão de cair em desgraça, mas, de algum modo, também parece que “fazemos figas” para que a sua infame relação cresça e se desenvolva.

São muitas as imagens em que são explícitas as cenas de sexo. No entanto, devo dizer que nunca me pareceu que o autor Yslaire faz aqui uma utilização gratuita desta vertente mais sexual da obra, visto que todos os desenhos desse foro, que nos são dados, apresentam sempre uma componente artística e poética que, aliás, transformam esses momentos eróticos em pontos altos ao longo do livro. Um verdadeiro deleite para os olhos.

Menina Baudelaire, de Yslaire - Ala dos Livros
Por vezes, é verdade que há algum texto em demasia e não me agradaram particularmente as legendas, muitas vezes fora das vinhetas, sobre uma caixa de texto castanha, que pululam ao longo da obra.

Mas, se isto são pequenas nuances para uma obra magnífica, os desenhos de Yslaire parecem ter o condão de nos tirar o fôlego, da mesma forma que, aparentemente, Jeanne Duval tirou o fôlego a Charles Baudelaire.

Considerando-me um bom conhecedor da obra de Yslaire, que já observei cuidadosamente durante muitas horas da minha vida, devo dizer que há algo nas ilustrações do autor que o fazem sobressair dos demais. Há um charme, uma beleza, uma classe e uma sensibilidade nos seus desenhos que os tornam magníficos. Talvez não seja o autor perfeito para ilustrar uma banda desenhada de ação ou de aventura, mas, quando estamos perante uma história infinitamente romântica, com laivos de uma sensualidade de outrora com que, nos dias de hoje ousamos apenas sonhar, Yslaire é imbatível. Na minha humilde opinião, é o melhor autor para este tipo de histórias. Ora, este Menina Baudelaire, sendo uma história de época e carregada de amor e paixão, encaixa que nem uma luva nos interesses e vocação primordial do autor.

Menina Baudelaire, de Yslaire - Ala dos Livros
Sendo que, devido ao que acabo de escrever, em termos de ilustrações, Menina Baudelaire nos vai remeter para a igualmente belíssima série Sambre, há que dizer que este livro tem a sua própria identidade visual, com Yslaire a optar por várias técnicas ilustrativas diferentes para os seus desenhos. O seu traço é seguro de si mesmo, com as personagens a adquirirem um grande detalhe, mas também é verdade que certos ambientes e cenários apresentam um traço mais difuso e rabiscado, aumentando o pendor artístico e sombrio da obra. As imagens em que nos são dadas alucinações que Baudelaire e Jeanne experimentam quando estão sob o efeito de drogas e/ou de uma volúpia máxima, são uma verdadeira maravilha para os olhos. Algo belo e carregado de simbolismo, que merece ser analisado com detalhe por parte do leitor.

As cores do livro, onde predominam os tons a sépia e, ocasionalmente, tons de violeta, também são belíssimas e muito contribuem para a magnitude visual das ilustrações que compõem este livro.

Menina Baudelaire, de Yslaire - Ala dos Livros
Como ponto menos positivo tenho que dizer que considero a capa deste livro nada em linha com a grandeza das ilustrações do autor. Acho incompreensível que o autor tenha escolhido esta ilustração de Baudelaire que, com uma perspetiva tão picada, faz Baudelaire parecer "atarracado". Yslaire é que é o mestre e lá saberá a razão que o levou a optar por esta capa, mas eu acho uma capa verdadeiramente infeliz. Percebo a ideia da mesma, com a musa Jeanne Duval a emergir da mente de Baudelaire, mas acho que, em termos visuais, é uma capa que funciona bastante mal. Mas, lá está, talvez isto seja uma questão muito do meu gosto pessoal. A verdade é que acho o desenho de Yslaire tão bom que me chega a irritar que o autor tenha escolhido esta ilustração para a capa do livro. Acho que quase poderíamos abrir o livro de forma aleatória e encontrar, à primeira tentativa, uma ilustração mais digna para a capa do livro. Opiniões.

Falando da edição da obra, o trabalho da Ala dos Livros volta a não desiludir em nada. O livro apresenta capa dura, com detalhes a verniz na capa do livro que, mesmo não salvando a ilustração, a tornam, pelo menos, mais apelativa. No interior, o livro tem bom papel couché e excelente encadernação e impressão. No final, há ainda 3 páginas com os dados cronológicos da vida de Baudelaire que, sendo algo exaustivos, contribuem para um aumento do conhecimento sobre a vida do mesmo.

Em suma, e tal como já disse anteriormente, este é o “Ano Yslaire” em Portugal! Para além da muito aguardada (re)publicação da série Sambre, por parte da Arte de Autor, também já temos este fantástico Menina Baudelaire, por parte da Ala dos Livros. Aconteça o que acontecer em termos de lançamentos editoriais em 2023, não tenho medo de afirmar que Menina Baudelaire estará entre os meus livros favoritos do ano. Obrigatório, claro.


NOTA FINAL (1/10):
9.8



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



-/-

Menina Baudelaire, de Yslaire - Ala dos Livros

Ficha técnica
Menina Baudelaire
Autor: Yslaire
Editora: Ala dos Livros
Páginas: 160, a cores
Encadernação: Capa dura
Formato: 235 x 320 mm
Lançamento: Fevereiro de 2023