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segunda-feira, 27 de janeiro de 2025

Análise: Crónicas de Jerusalém

Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle - Devir

Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle - Devir
Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle

No passado mês de Outubro, por alturas do Amadora BD, a editora Devir fez-nos chegar o lançamento de Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle, autor de quem a editora já tinha publicado, há uns anos, Shenzhen - Uma Viagem à China, Crónicas da Birmânia e Pyongyang - Uma Viagem à Coreia do Norte. E tal como nessas obras, este Crónicas de Jerusalém assenta numa premissa semelhante. 

Trabalhando a esposa do autor na organização humanitária Médicos Sem Fronteiras, Guy Delisle acompanha a sua mulher, juntamente com os filhos de ambos, sempre que esta viaja para sítios do planeta onde costuma haver algum tipo de conflito político-militar. E, a partir daí, dessa experiência que o autor se vê forçado a fazer, vai-nos dando as suas crónicas, baseadas nas suas vivências e pareceres enquanto estrangeiro de um país de primeiro mundo num país onde toda a cultura e forma de estar são diferentes.

Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle - Devir
Crónicas de Jerusalém
não foge à regra e assume-se como (mais) uma obra singular que mistura o formato de diário gráfico com uma análise crítica e sensível sobre a vida quotidiana numa das cidades mais complexas e emblemáticas do mundo: Jerusalém. O livro acaba, pois, por combinar observações pessoais com comentários históricos, políticos e culturais sobre a realidade de Israel e da Palestina. Originalmente lançado em 2011, 14 anos depois o livro continua extremamente atual, pois este é um dos territórios do planeta onde, lamentavelmente, a concórdia entre as várias facções parece mais impossível.

Delisle apresenta Jerusalém como um mosaico de culturas, religiões e tensões sociais. A obra ilustra com maestria o choque entre judeus, muçulmanos e cristãos, evidenciando as camadas de significados e conflitos que atravessam a cidade. Delisle consegue captar os detalhes do quotidiano, desde os mercados e bairros até aos rituais religiosos, com uma sensibilidade que evita estereótipos simplistas. O autor demonstra como essas comunidades coexistem (ou não) dentro de um espaço geograficamente limitado, criando uma tensão palpável que permeia toda a narrativa.

Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle - Devir
O humor é outro elemento marcante do livro. Delisle usa a sua habilidade para tratar temas pesados com alguma ironia e leveza, transformando momentos tensos, como os longos procedimentos de segurança em checkpoints ou as conversas sobre política com os locais, por exemplo, em episódios que equilibram seriedade e comicidade. Essa abordagem não diminui a gravidade dos temas tratados, mas permite ao leitor enfrentar a complexidade da região sem se sentir sobrecarregado.

O que também é bastante notado na obra de Guy Delisle, é a perspetiva pessoal e pouco convencional do autor. Diferente em relação à forma como jornalistas ou historiadores analisam a região, o autor adota um ponto de vista de outsider, filtrando as suas observações pela ótica de um pai e marido que tenta levar uma vida comum e tão normal quanto possível num país onde a normalidade - pelo menos do ponto de vista de um ocidental - escasseia. 

Se esta abordagem humaniza a obra e convida o leitor a identificar-se com a perplexidade e com as descobertas do autor, também me traz a mim, enquanto leitor, uns certos "problemas". Não ponho em causa a relevância do trabalho de Delisle - que defendo, aliás, que todo o leitor de banda desenhada deve conhecer -, mas a verdade é que a postura demasiado neutra do autor acaba, quanto a mim, por tornar a leitura algo enfadonha e uma mera exposição de factos. O relato de Delisle não tem, por um lado, a força de um Joe Sacco que nos tira o chão perante aquilo que nos é relevado, nem, por outro lado, o humor ácido de um Zerocalcare que mesmo abordando coisas tristes, consegue fazer-nos gargalhar página sim, página não. Quanto a mim, Delisle acaba por se revelar algo "sem sal", demasiado morno. Mas, lá está, isto é apenas uma opinião muito pessoal. Reitero que os livros do autor são bons, originais e que saímos deles mais ricos... simplesmente, pelos motivos que aponto acima, o impacto não é tão grande como poderia ser, pois a a tentativa de Delisle em manter um tom neutro e despretensioso acaba por revelar uma certa apatia narrativa. 

Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle - Devir
A arte de Delisle é simples, mas bastante funcional e eficiente, capturando tanto a grandiosidade dos monumentos históricos, como os detalhes da vida quotidiana. Neste Crónicas de Jerusalém o autor utiliza mais cores do que o habitual noutras obras já por mim referidas, em que se manteve mais fiel a uma paleta de cores. E isso é uma mais valia neste livro e dá-lhe mais dinâmica visual. Não é um livro que procure ser belo do ponto de vista gráfico, mas acho que, mesmo assim, e especialmente na ilustração das paisagens locais ou dos monumentos mais emblemáticos da cidade, o autor faz um trabalho bastante convincente.

A edição da Devir é em capa dura baça, com bom papel baço no interior e uma boa encadernação e impressão. Acima de tudo, fico satisfeito por verificar que a editora manteve o seu compromisso para com a obra do autor, e seus fãs, lançando mais um livro do mesmo, já depois dos previamente editados Crónicas da BirmâniaShenzhen - Uma Viagem à China e Pyongyang - Uma Viagem à Coreia do Norte! Futuramente, espero que a editora nos possa continuar a dar mais obras do autor como Chroniques de Jeunesse ou  S'enfuir - récit d'un otage.

Em suma, Crónicas de Jerusalém é mais do que um simples relato de viagem; é um convite a um olhar atento a Jerusalém e às suas contradições sob uma nova perspectiva ocidental. Guy Delisle mantém-se fiel a si mesmo e, por esse motivo, decerto agradará a todos aqueles que já apreciaram as restantes obras do autor.


NOTA FINAL (1/10):
8.0


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle - Devir

Ficha técnica
Crónicas de Jerusalém
Autor: Guy Delisle
Editora: Devir
Páginas: 336, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Outubro de 2024

segunda-feira, 14 de outubro de 2024

Devir lança novo livro de Guy Delisle!




A Devir tem-se demonstrado muito forte neste mês de Outubro!

Não é só a Devir, para ser sincero, são todas, ou quase todas, as editoras portuguesas que têm estado a revelar os seus trunfos na manga para o principal evento de banda desenhada em Portugal que é o Amadora BD.

Incidindo especificamente na Devir, fico verdadeiramente feliz que a editora tenha estado a apostar em obras que vão além da sua oferta mais comum de mangá para adolescentes.

Depois do anúncio de obras como Maltempo, Bairro Distante ou Crianças do Mar, agora, é a vez de se confirmar a edição de Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle, de quem a editora já publicou Crónicas da BirmâniaPyongyang - Uma Viagem à Coreia do Norte!
Uma excelente notícia para os fãs do autor!

Mais abaixo, deixo-vos com a sinopse da obra e com algumas imagens promocionais.


Crónicas de Jerusalém, de Guy Delisle

Ao acompanhar a esposa numa missão humanitária em Israel, Guy Delisle instala-se em Jerusalém com a família durante um ano. Num passeio pelas ruas, à saída de uma igreja, na esplanada do café, o autor explora questões fundamentais da sociedade, mostrando-nos uma cidade imprevista, palco de conflitos e paixões, da forma perspicaz e divertida que já conhecemos.

Crónicas de Jerusalém recebeu o Prémio para Melhor Álbum de Banda Desenhada de Angoulême, em 2012.

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Ficha técnica
Crónicas de Jerusalém
Autor: Guy Delisle
Editora: Devir
Páginas: 336, a cores
Encadernação: Capa dura
PVP: 28,00€

quarta-feira, 30 de dezembro de 2020

Análise: Crónicas da Birmânia

Crónicas da Birmânia, de Guy Delisle - Devir


Crónicas da Birmânia, de Guy Delisle - Devir
Crónicas da Birmânia, de Guy Delisle 

Da autoria do canadiano Guy Delisle, a editora Devir brindou os leitores portugueses com este Crónicas da Brimânia. Do mesmo autor, a editora já havia lançado Pyongyang - Uma Viagem à Coreia do Norte (que também recebeu recentemente uma segunda edição da Devir) e Shenzhen – Uma Viagem à China. Dentro deste estilo, de crónica política de viagem, fica, deste modo, a faltar apenas a versão portuguesa de Crónicas de Jerusalém. Quem sabe, não estará para breve esse lançamento. 

Por agora, cabe-me um olhar atento a este Crónicas da Birmânia. Tal como nos outros trabalhos de Delisle, estamos perante um livro de pequenas rábulas e apontamentos narrativos, que nos são dados através de breves histórias, com cerca de uma ou duas páginas, em que o autor nos conta as suas passagens do dia-a-dia. Como a mulher de Guy Delisle, Nadège, trabalha na Organização Médicos Sem Fronteiras, isso faz com que Nadège seja alocada em várias Missões dessa Organização, em locais bem distantes do mundo ocidental. O que permite a Guy Delisle que, através das longas estadias de trabalho da sua mulher, possa encontrar nelas o(s) tema(s) e o(s) ambiente(s) exótico(s) e alternativo(s) adequado(s) para a construção das suas histórias, vistas enquanto outsider. Também foi assim nas suas outras obras. E, desta vez, o destino do casal e do filho de ambos, é a Birmânia, também conhecida como Myanmar. 

Crónicas da Birmânia, de Guy Delisle - Devir
E este livro, assim como os outros trabalhos do autor, acaba por funcionar mais como um diário de viagem - ou de estadia, vá – do que como um conjunto de crónicas. É que, mais do que fazer uma dissertação sobre os problemas políticos do país, Delisle dá-nos um conjunto de histórias que mais não são do que retalhos do seu dia-a-dia. Como é a vida na Birmânia, como é difícil ultrapassar o calor que sempre se faz sentir, como funcionam as pequenas e as grandes características do povo e da sociedade locais; e que abismo separa esse quotidiano birmanês da realidade do mundo ocidental. 

E, desse ponto de vista, parece-me óbvio que a obra de Delisle seja de grande relevância. E não apenas para leitores de banda desenhada. Se alguém vai fazer uma viagem à Birmânia/Myanmar, ou se estuda relações internacionais e/ou políticas; ou se simplesmente tem vontade de saber mais sobre o país da célebre Prémio Nobel da Paz em 1991, Aung San Suu Kyi, terá nesta obra um importante contributo para a sua sede de conhecimento. No entanto, permitam-me não criar falsas expetativas: não pensem que Crónicas da Birmânia é um ensaio muito detalhado sobre o país. É apenas uma fonte de (algum) conhecimento. Permite-nos um breve vislumbre à temática. Isto porque o autor não parece focado em tornar a sua obra em algo meramente didático. E, por isso, acrescenta-lhe algum do seu humor. 

Crónicas da Birmânia, de Guy Delisle - Devir
Diria que é um humor ultra suave que, na melhor das hipóteses, me arrancou um sorriso da cara e não uma gargalhada. Tento não cair muito neste tipo de comparações porque, normalmente, acabam por ser injustas, mas olhando, por exemplo, para a série O Árabe do Futuro, de Riad Sattouf que, à semelhança das obras de Delisle, também nos revela uma história real e que põe em oposição o mundo ocidental com o oriental, diria que, quer o humor, quer as situações sérias e dramáticas retratadas, são bem mais "mornas" no trabalho do autor canadiano, do que na série da autoria de Riad Sattouf. Mas, claro, trata-se de uma questão subjetiva. O humor de Guy Delisle é temperado com perspicácia mas, muitas vezes, por não procurar ter uma punchline, fica um pouco a marinar na mente do leitor, tornando a piada em algo “seco”. A meu ver, até é na narração mais séria das situações que o autor testemunha, nomeadamente quando se desloca com as equipas dos Médicos Sem Fronteiras, que o livro se torna em algo mais marcante e interessante, revelando, sem grandes dramatizações, as reais condições de vida de certas populações que (ainda) sucumbem ao vírus da SIDA ou ao vício da toxicodependência. Ou, em muitos casos, de ambos. 

Crónicas da Birmânia, de Guy Delisle - Devir
Há algo importante que também me merece comentário. A obra original foi lançada em 2008 e, portanto, esta versão portuguesa da obra, que em boa hora chega ao nosso país, reconheço, aparece com um atraso de lançamento de 12 anos que acaba por ficar datado numa questão central: a de Aung San Suu Kyi. É que, se em 2008, a política birmanesa ainda era vista como um ícone da liberdade e uma mártir das mãos totalitárias do aparelho de Estado, com o passar dos anos, viu a sua situação alterar-se drasticamente. Desde 2016, que passou a integrar o Governo birmanês enquanto Ministra dos Negócios Estrangeiros. E, desde então, especialmente quando, em 2017, o Exército Nacional chacinou milhares de mortos em Rakhine, passou de mártir a vilã, gerando muita controvérsia e tendo levado a que muita gente tenha pedido a Aung San Suu para renunciar ao seu Prémio Nobel da Paz. Ora, não é que a leitura de Crónicas da Birmânia saia beliscada como estes acontecimentos mais recentes. Porém, julgo que a persona da política da Birmânia ainda é aqui tratada no seu antigo estado de graça. E isso torna a leitura algo datada. Nesse sentido, penso que uma breve introdução - e atualização - ao tema, poderia ter sido benéfica para os leitores portugueses com menos informação sobre este assunto. 

Crónicas da Birmânia, de Guy Delisle - Devir
Em termos de arte, e mesmo sendo verdade que as capas das suas obras são sempre bem sugestivas e bem executadas do ponto de vista do grafismo e ilustração, diria que Guy Delisle apresenta um estilo simples. Seria perfeito para o cartoon americano de onde, aparentemente, faz beber as suas inspirações mas, para um estilo que procura ser mais de novela gráfica, de crónica, por vezes pareceu-me algo pobre e demasiado despido, em termos técnico-gráficos. No entanto, honra seja feita ao autor por não nos dar um conjunto de crónicas em que a parte cénica é sempre igual. E isso é algo que por vezes acontece neste tipo de banda desenhada. Com efeito, ao ilustrar as viagens que faz durante a sua estadia na Birmânia, vê-se que há um esforço em passar para o leitor as paisagens que visitou. E aí, o livro ganha em importância gráfica, além da importância do texto. 

Em termos de edição, é um trabalho muito bem realizado pela editora Devir. Uma encadernação de boa qualidade, uma capa bem dura e um papel de boa gramagem fazem deste Crónicas da Birmânia um excelente “objeto-livro”. É igualmente assinalável que a Devir, que tem pautado os seus últimos lançamentos com obras do universo mangá, tenha, com esta obra, regressado ao lançamento de novela gráfica, mais direcionada para um público mais maduro. 

Em conclusão, a Devir está de parabéns por ter lançado a terceira obra deste autor canadiano, tão relevante e tão apreciado no mundo inteiro. Crónicas da Birmânia, não sendo perfeita, é uma obra que merece ser lida pelos amantes de uma bd mais adulta e com um cariz mais político-social. E que tenha uma leve – levíssima! - pitada de humor. Welcome back, Guy Delisle. 


NOTA FINAL (1/10): 
7.9 



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020




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Crónicas da Birmânia, de Guy Delisle - Devir
Ficha técnica 
Crónicas da Birmânia 
Autor: Guy Delisle 
Editora: Devir 
Páginas: 268, a preto e branco 
Encadernação: Capa dura 
Lançamento: Novembro de 2020

sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Lançamento: Crónicas da Birmânia



Surgem excelentes notícias da Devir

A editora portuguesa prepara-se para editar em dezembro a obra Crónicas da Birmânia, da autoria do consagrado Guy Delisle!

Abaixo, fiquem com a nota de imprensa da editora e respetivas páginas promocionais.


Crónicas da Birmânia, de Guy Delisle

Um relato esclarecedor e perspicaz sobre a Birmânia, no momento da passagem do autor pelo país, como acompanhante da sua mulher, numa comissão dos Médicos sem Fronteiras.

Autorretrato genial cativante e bem-humorado de um país e das pessoas que conhece durante esta estadia.


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Ficha técnica
Crónicas da Birmânia
Autor: Guy Delisle
Editora: Devir
Páginas: 268, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
 PVP: 24,99€