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terça-feira, 7 de dezembro de 2021

Análise: O Homem de Lugar Nenhum – Volume 1

O Homem de Lugar Nenhum – Volume 1, de Tiago Barros e Fábio Veras - A Seita e Comic Heart

O Homem de Lugar Nenhum – Volume 1, de Tiago Barros e Fábio Veras - A Seita e Comic Heart
O Homem de Lugar Nenhum – Volume 1, de Tiago Barros e Fábio Veras

Entre os vários livros que a editora A Seita lançou durante o último Amadora BD, este O Homem de Lugar Nenhum, de Tiago Barros e Fábio Veras, que é editado em parceria com a chancela Comic Heart, foi um dos livros que mais interesse e expetativa motivou na minha pessoa. Porquê? Bem porque, sinceramente, não sabia bem o que esperar.

Tinha já uma ideia do trabalho promissor de Fábio Veras, que já nos tinha dado obras como Os Filhos do Rato (G. Floy Studio e Comic Heart) ou Jardim dos Espectros (Escorpião Azul), mas, tirando isso, e tendo em conta que o autor era acompanhado por Tiago Barros, que eu não conhecia, não sabia bem o que nos traria este O Homem de Lugar Nenhum.

E, finda a leitura deste primeiro livro (de dois), posso dizer que este poderá vir a ser um livro de culto na banda desenhada nacional. E quando utilizo o termo “poderá” é porque ainda há muita coisa em aberto. Há aqui muito potencial, é certo, mas ainda é difícil opinar taxativamente sobre uma obra que ainda vai a meio. Se o segundo livro conseguir fechar bem a história e limar algumas pontas soltas, sim, aí estamos perante um claro livro de grande qualidade da bd portuguesa. Uma referência. Mas também há o risco dos autores – principalmente o argumentista Tiago Barros – não conseguir agarrar bem a história e, consequentemente, fazer com que a mesma seja uma promessa não realizada. “A ver vamos”, como diz o cego. Diria que se O Homem de Lugar Nenhum fosse uma partida de futebol, estávamos, neste momento, no intervalo, após uma excelente primeira parte.

O Homem de Lugar Nenhum – Volume 1, de Tiago Barros e Fábio Veras - A Seita e Comic Heart
Portanto, por agora, resta-nos olhar para este primeiro tomo. Trata-se de uma história que saltita entre realidade e questões metafísicas. Acompanhamos um homem que, através de uma profunda reflexão que faz consigo mesmo – e com o leitor –, parece tecer considerações filosóficas sobre o princípio e o fim de algo, com o objetivo primordial de se encontrar a ele mesmo. Tudo nos é dado de uma forma bastante lata, sem que possamos, para já, perceber para onde nos pretende levar Tiago Barros. Como é que vai desabrochar aquilo que parece ser uma metáfora da vida e da existência humana. E somos levados ao sabor das afirmações inspiradas do protagonista. Com um pé na realidade mundana, que vive ao nosso lado, e com um pé em mundos e figuras fantásticas do lado de lá. Do lado da não-realidade. Do metafísico.

A escrita de Tiago Barros é verdadeiramente fabulosa! Texto inspirado, e muito quotable, que nos oferece monólogos que, na verdade, são diálogos feitos entre o protagonista da história – ou, talvez, o próprio autor? – e o leitor. E nisso, Tiago Barros, sendo um jovem autor, já é um autêntico mestre. E, talvez também por isso, a sua escrita me tenha remetido muitas vezes para Ed Brubaker, um autor que também é mestre na construção destes monólogos com o ritmo e a força certos. Se juntarmos a este texto em voz-off a arte de Fábio Veras, que aqui nos apresenta cores garridas, repletas de altos níveis de contraste, é quase impossível não pensar em Criminal, a obra maior da dupla norte-americana formada por Ed Brubaker e Sean Phillips. Claro que, em termos de conteúdo, haverão muitas diferenças entre as histórias contadas e ilustradas por uns e outros autores. Mas, não deixa de ser verdade, que são dois nomes aos quais somos muitas vezes remetidos neste livro.

O Homem de Lugar Nenhum – Volume 1, de Tiago Barros e Fábio Veras - A Seita e Comic Heart
Em termos visuais O Homem de Lugar Nenhum também se assume como uma obra ímpar na banda desenhada portuguesa. O talento e o potencial de Fábio Veras não enganaram ninguém nas suas obras supracitadas, mas é fácil chegar à conclusão que este é o melhor trabalho de Veras até agora. Deveras o é. O seu traço moderno, por vezes rude e arcaico, a fazer lembrar Eduardo Risso, mas com umas cores vibrantes que, tal como já referi, nos remetem para a série Criminal, ilustrada por Sean Phillips, está mais confiante do que nunca. E essa confiança permite a Fábio oferecer-nos um conjunto de momentos marcantes, de páginas que ficam na retina, já depois de termos prosseguido com a leitura do restante livro. Já para não falar na fantástica cena de sexo em que o autor se volta a recriar de forma magistral, fazendo-nos lembrar, desta vez, um Edmond Baudoin ou um Bastien Vivès. Muito bom!

Apreciei, ainda, e bastante, a capacidade e engenho do autor para nos apresentar boas soluções narrativas ao nível do uso de “câmara”, enquadramentos e a própria planificação das pranchas, que é airosa quando tem que ser e claustrofóbica quando também tem que ser. Atente-se, também, na boa capacidade de Fábio Veras para deixar a história respirar. A utilização de poucas vinhetas em algumas páginas, faz com que a narrativa não seja sorvida de uma só vez e se criem, dessa forma, as condições para que haja uma reflexão do leitor acerca do que se passa em termos de imagem e em termos de palavras. Ambos os autores juntam muito bem as suas forças, portanto, de forma a darem-nos um livro coeso, interessante e que nos faz indagar sobre o que ainda pode aí vir.

O Homem de Lugar Nenhum – Volume 1, de Tiago Barros e Fábio Veras - A Seita e Comic Heart
Confesso que as partes mais fantásticas, me levaram a temer um pouco pela história. Não é que não estejam interessantes ou não possam vir a ser unidas de forma magistral pelo argumentista. Mas achei que eram um pouco “areias movediças”, que podem tornar a história com alguns clichets escusados. Mas, como estamos ainda a meio da viagem, isto também pode não vir a acontecer sequer e, portanto, para já, deixo em aberto esta minha opinião sobre a aura mais metafísica da história. Porque a parte mais mundana, mais do dia-a-dia, é verdadeiramente fantástica! Foi nisso que os autores mais me surpreenderam e é aí que considero que está o néctar desta obra.

A edição d’ A Seita e da Comic Heart é excelente. Capa dura, papel brilhante de boa qualidade. Encadernação e impressão excelentes, também. Há ainda algumas páginas com esboços de Fábio Veras e um excerto do argumento, que nos permite perceber o processo de trabalho de ambos os autores. Nota final ainda para o bom grafismo da capa, lombada e contracapa. Tudo bem feito, portanto.

Em suma, e por agora, diria que estou muito entusiasmado com esta obra d’ O Homem de Lugar Nenhum. Há muitos bons apontamentos sobre o bom trabalho de ambos os autores, embora seja cedo, insisto, para tecer uma opinião final sobre se esta será uma obra de culto da banda desenhada portuguesa ou não. Tem potencial para o ser, sem dúvida. Mas resta-nos esperar pela parte dois.


NOTA FINAL (1/10):
8.5


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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O Homem de Lugar Nenhum – Volume 1, de Tiago Barros e Fábio Veras - A Seita e Comic Heart

Ficha técnica
O Homem de Lugar Nenhum – Volume 1
Autores: Tiago Barros e Fábio Veras
Editoras: A Seita e Comic Heart
Páginas: 136, a cores
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Outubro de 2021

terça-feira, 30 de novembro de 2021

Lançamento: O Homem de Lugar Nenhum #1




A grande quantidade de livros (oito, ao todo!) que a editora A Seita lançou no Amadora BD vai chegando, gradualmente, às livrarias e bancas.

Desta feita, é a vez de O Homem de Lugar Nenhum, o primeiro de dois tomos, da dupla de autores portugueses formada por Tiago Barros e Fábio Veras, chegar às bancas. Esta é uma edição d' A Seita e da Comic Heart.

Abaixo, fiquem com a sinopse da obra e algumas imagens promocionais.

O Homem de Lugar Nenhum #1, de Tiago Barros e Fábio Veras
O protagonista desta história está perdido. Quase consegue perceber onde está, mas não sabe como chegar onde quer ir. Está perdido num estranho mundo surreal, com perigos diversos e ameaçadores. Na sua jornada, por mero acaso ou por conveniência narrativa, encontra uma figura tão ou mais perdida que ele. Por vezes, um sentimento de camaradagem e de pertença fazem a diferença no nosso alento para seguir em frente.

Há histórias que ganham o seu próprio sentido e personagens que têm a sua própria vontade, que parece sobrepor-se àquelas que um narrador lhes quer imprimir.

Fábio Veras (Prémio Revelação Amadora 2019) ilustra magnificamente esta história estranha e algo meta-ficcional escrita pelo argumentista Tiago Barros, que se estreia aqui em álbum, propondo-nos um conto onírico e que questiona o lugar da narrativa nos sonhos das nossas personagens, e dos nossos.
Primeira parte de duas de um romance gráfico com um toque de surreal e mistério, e que é um verdadeiro tour-de-force visual, acompanha o percurso de um conjunto de personagens que parecem não saber qual o seu papel real nesta narrativa, com excepção do misterioso e terrivelmente auto-confiante Andy, que se desloca entre dois mundos, o nosso, e um mundo paralelo para onde vai arrastar o grupo...

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Ficha técnica
O Homem de Lugar Nenhum #1
Autores: Tiago Barros e Fábio Veras
Editoras: A Seita e Comic Heart
Páginas: 136, a cores
Encadernação: Capa dura
PVP: 19,00€

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

Análise: Jardim dos Espectros




Jardim dos Espectros, de Fábio Veras

Jardim dos Espectros é a primeira obra em banda desenhada do jovem autor português Fábio Veras. Já depois disso lançou, com Luís Zhang, a obra Filhos do Rato, publicada pela G. Floy, que já foi analisada no Vinheta 2020.

Em Jardim dos Espectros, lançado pela Escorpião Azul, Fábio Veras é responsável pelo argumento e pela ilustração, assinando uma história que funciona como uma alegoria da vida e da morte e que, nos apresenta um autor com um enorme potencial para ser um dos nomes mais sonantes da banda desenhada nacional nos próximos anos.

Neste breve livro de 64 páginas, a preto e branco, o autor convida-nos a acompanhar a jornada de um forasteiro que chega a uma cidade para encontrar Núvia, um jardim onde vivem centenas de almas que já pertenceram a este mundo. No entanto, este tornou-se um local de medo e dogma junto da população local. Antigamente o jardim era alegre e repleto de vida mas, aparentemente, transformou-se num sítio onde passaram a ocorrer eventos misteriosos e estranhos. E já ninguém quer lá ir. No fundo, apresenta as características clássicas de um cemitério assombrado.


O protagonista fará então uma jornada pessoal, pela vida e pela morte, tentando, de alguma forma, ultrapassar traumas do passado que (ainda) vivem enclausurados dentro da sua pessoa e encontrar qualquer tipo de redenção, há muito almejada. E, ao longo da sua caminhada, encontra personagens do mundo dos mortos. Almas que vagueiam pelo local. A história assume, pois, um carácter metafísico, por vezes abstracto, mas com uma boa sensibilidade do autor, que apresenta uma grande maturidade e seriedade na narrativa que constrói. E isso, é talvez uma das melhores coisas neste Jardim dos Espectros.

Mas não é apenas isso que é impressionante. Em termos de arte ilustrativa, Fábio Veras, revela um enorme talento nato. Se em Filhos do Rato, afirmei que o autor “parece um daqueles jogadores de futebol que, sendo muito jovem e já revelando talento, é uma promessa para muita gente. Ainda não chegou aonde pode chegar, mas tem um enorme potencial para lá chegar”, em Jardim dos Espectros parece-me – e mesmo não esquecendo de que se trata de uma obra que antecede Filhos do Rato – que Fábio Veras está muito (mais) ciente das suas capacidades de ilustrador e consegue aqui uma arte com muita personalidade, com um traço livre e consistente, que permite o dramatismo que uma obra com esta profundidade de argumento exigiria. Um destaque à forma como o autor ilustra os ambientes – principalmente o arvoredo e vegetação do próprio jardim – deverá ser dado, tendo em conta a beleza transcendental que nos é passada. Maravilhoso na concepção.

Também na planificação da obra, que é bastante dinâmica e variada, o bom trabalho do autor merece destaque. Há um outro detalhe que achei muito audaz e curioso: são usados balões sem texto para representar diálogos de figurantes que aparecem na história. Um pequeno toque do autor, que (também) revela uma capacidade para reinterpretar a própria linguagem a banda desenhada.

Embora a história seja auto-contida, com um final que fica resolvido em termos narrativos, a verdade é que o livro me pareceu algo curto. A juntar a isso, penso também que a obra ganharia se fosse editada pela Escorpião Azul num formato bem maior. E em capa dura, claro. 

Falando ainda na capa da obra, considero-a pouco apelativa. A ilustração da própria contracapa ou as ilustrações que acompanham as primeiras três páginas do livro, dariam melhores capas. É uma pena pois, a capa é a primeira coisa a saltar à vista de uma pessoa que passeia pelas lojas em busca de BD. Neste caso, a meu ver, claro, não será a capa que conquistará interesse. É apenas folheando a obra que o interesse há-de surgir para um livro que merece ser conhecido pelo maior número de adeptos de banda desenhada.

Em conclusão, esta é uma excelente surpresa, um ótimo cartão de visita de Fábio Veras, que vale muito a pena conhecer. Se Filhos do Rato é um livro interessante, Jardim dos Espectros apresenta uma maior profundidade narrativa e uma ilustração muito consistente e bem conseguida.


NOTA FINAL (1/10):
8.1


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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Ficha técnica
Jardim dos Espectros
Autor: Fábio Veras
Editora: Escorpião Azul
Páginas: 64, a preto e branco
Encadernação: capa mole
Lançamento: Maio de 2018

segunda-feira, 6 de abril de 2020

Análise: Filhos do Rato, de Luís Zhang e Fábio Veras



Filhos do Rato, de Luís Zhang e Fábio Veras

Nos últimos anos têm sido vários os álbuns de banda desenhada portuguesa que nos levam a cenários africanos. Congo, dos irmãos Duarte e Henrique Gandum, leva-nos às selvas luxuriantes do Congo que são habitadas por criaturas pré-históricas, enquanto que Vampiros, de Filipe Melo e Juan Cavia, nos levam até à Guiné, ao tempo da Guerra Colonial. À semelhança deste último, os Filhos do Rato, de Luís Zhang e Fábio Veras, remete-nos igualmente para a Guiné, para o período do agressivo conflito militar entre portugueses e forças guineenses que lutavam pela sua independência.

Considero natural e positivo que os autores portugueses de banda desenhada escolham como pano de fundo, os cenários africanos devido à presença - e influência - que Portugal teve nas suas antigas colónias e a todos os condicionalismos culturais que daí advieram. Não só para as colónias que eram controladas por Portugal, como também para a própria cultura portuguesa. Fazendo uma pequena nota pessoal, o meu pai serviu na Guiné durante este período conturbado e tenho, logicamente, uma ligação – pelo menos emotiva – a este tempo e a este lugar. Mais que não seja, pelas histórias que o meu pai sempre me contou. Por esse motivo, é ainda com mais prazer que vejo a guerra colonial em Guiné a ser retratada em vez do conflito em Angola ou Moçambique. Nada contra um potencial livro que foque os acontecimentos nesses dois países pois, como é bem sabido, qualquer um dos três cenários foi de uma extrema relevância, não só para Portugal, mas também – e principalmente – para os países africanos em questão. Mas a verdade é que sempre que se fala na Guerra Colonial, depressa se fala sobre Angola, muitas vezes descurando Guiné e Moçambique. O meu pai sempre me passou muitas informações sobre o que, de facto, se passou na Guiné durante este tempo. Dizia ele, que nem sempre os media portugueses davam a devida e real cobertura aos acontecimentos que tinham ocorrido nestes anos nefastos de conflito militar. É que, de facto, foi na Guiné que a guerra do Ultramar foi mais sangrenta e violenta.

Ora, ver um livro a retratar este tema é-me sempre bem-vindo. E este Filhos do Rato, de Luís Zhang e Fábio Veras, revela-se um livro interessante e pertinente, que merece ser aplaudido, pela iniciativa. Editado pela G.Floy e pela Comic Heart no início de 2019, esta é uma obra que vale a pena conhecer.

A sua história leva-nos até à Guiné, ao ano de 1973, já bem perto da aurora do 25 de Abril, e vai-nos mostrando episódios que antecederam a Revolução dos Cravos e episódios que já aconteceram depois do fim da guerra, com as claras repercussões do conflito militar, especialmente – mas não só – ao nível do foro psicológico.

O protagonista é Baldé, um soldado guineense que luta ao lado das forças militares portuguesas. Mas, não era caso único. No final deste livro, há uma página que oferece aos leitores um breve contexto histórico (e que é muito bem-vindo, diga-se), que explica bem como existiram cerca de 27.000 soldados guineenses como Baldé. Estes soldados estavam numa situação muito delicada porque eram considerados traidores pelos seus compatriotas e, também junto do exérctio português, eram muitas vezes mal aceites e colocados de parte – embora Filhos do Rato até nos mostre que Baldé é respeitado e, pelo menos, ouvido, por alguns dos seus companheiros de armas portugueses.

Para além desses episódios do dia a dia das tropas portuguesas e de Baldé, há depois uma vertente mais de terror de psicológico, marcada de momentos simbólicos, que nos parece revelar os traumas que subsistem na cabeça dos soldados, já depois da guerra terminar. E embora estes momentos sejam graficamente interessantes, parecem ficar algo perdidos na narrativa. Acabam por ser momentos algo latos que talvez merecessem ter sido mais bem delineados em termos de argumento. Parece que o fio condutor da história podia ser mais claro e fluído.
No entanto, também se deve referir que algum texto que nos é dado por Luís Zhang, tem um cariz profundo e até poético, por vezes, que merece ser reconhecido.
Mas é na narrativa algo retalhada, que a história por vezes podia ter sido mais bem delineada.

Fábio Veras que tem dado nas vistas nos últimos dois anos, por vencer vários prémios de banda desenhada em Portugal e depois do seu interessante trabalho em Jardim dos Espectros, assume-se aqui como uma verdadeira promessa da banda desenhada portuguesa. O seu estilo parece ainda não estar muito definido o que, se por um lado pode relevar alguma inconsistência ao longo deste livro, também é verdade que permite abrir o leque de todas as suas capacidades enquanto ilustrador. Parece um daqueles jogadores de futebol que, sendo muito jovem e já revelando talento, é uma promessa para muita gente. Ainda não chegou aonde pode chegar, mas tem um enorme potencial para lá chegar. Assim é Fábio Veras. Em Filhos do Rato, o seu estilo é pois bastante diverso, com várias vinhetas a serem verdadeiramente impressionantes mas com outras a parecerem ter sido rabiscadas em 3 minutos. Nada contra as vinhetas que parecem ser feitas mais à pressa e com menos detalhe. Até pode ser esse o estilo de determinado autor. Mas quando isso é feito amiúde, em alternância a outras ilustrações com mais detalhe e mais bem produzidas, gera-se uma certa incoerência indesejada. Simplesmente, enquanto leitor, isso tira-me alguma da imersão que seria expectável numa narrativa como esta. Mas também é verdade que, Fábio Veras nos dá outras vinhetas super estilizadas, com uma arte profunda. O livro é quase sempre a preto e branco mas também existem páginas com cores vivas para demarcar certos acontecimentos na ação.

Fora a diversidade ilustrativa, o estilo de Fábio é bastante “sujo”, com as páginas cheias de pormenores rabiscados. Isto torna as páginas algo pesadas de acompanhar, pois há muita informação negativa que cria alguma entropia para o leitor. Importa, no entanto, referir que a planificação das páginas é um dos trunfos deste livro. Temos muita dinâmica, com tantas páginas a serem projetadas com vinhetas de todas as formas e feitios. Isso é bem-vindo em Filhos do Rato. Nas cenas de ação, porém, nem sempre tudo é perceptível. Por vezes o leitor tem dificuldade em perceber o que se está a passar, quem está a fazer o quê a quem. Isso advém do tal traço sujo, de ilustração algo difusa que, naturalmente, torna a leitura difusa.

Este é um livro interessante, que revela um bom esforço. No final, parece que podia ter ido mais longe, especialmente em termos narrativos, e que a arte de Fábio Veras, embora muito promissora, nem sempre consegue obter a unidade que se pretende. Não obstante, é um livro que merece ser conhecido pelos leitores portugueses de banda desenhada.

Fica a curiosidade no ar, pelos próximos trabalhos que esta dupla criativa poderá produzir.


NOTA FINAL (1/10):
6.8


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Ficha Técnica
Filhos do Rato
Autores: Luís Zhang e Fábio Veras
Editora: G. Floy e Comic Heart
Páginas: 88, a cores
Encadernação: Capa Dura