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quarta-feira, 30 de julho de 2025

TOP 10 - A Melhor BD lançada pela Arte de Autor nos últimos 5 anos!

TOP 10 - A Melhor BD lançada pela Arte de Autor nos últimos 5 anos!


Se ontem vos falei da melhor banda desenhada editada pela Ala dos Livros, hoje falo-vos daquela que considero ser a melhor banda desenhada editada pela Arte de Autor nos últimos 5 anos, a partir de 2020, em tom de celebração pelos 5 anos de existência do Vinheta 2020.

Não são muitos os anos, mas são muitos os lançamentos de boa banda desenhada por cá, o que dá eco à ideia, que eu subscrevo, que a edição de banda desenhada em Portugal vive um dos seus melhores períodos de sempre... se não for o melhor.

Já escrevi isto ontem, mas deixo novamente aqui esta informação, para o caso de ser o primeiro destes artigos que o leitor desta página encontra:

Convém relembrar que este conceito de "melhor" é meramente pessoal e diz respeito aos livros que, quanto a mim, obviamente, são mais especiais ou me marcaram mais. Ou, naquela metáfora que já referi várias vezes, "se a minha estante de BD estivesse em chamas e eu só pudesse salvar 10 obras, seriam estas as que eu salvava".

Faço aqui uma pequena nota sobre o procedimento: considerei séries como um todo e obras one-shot. Tudo junto. Pode ser um bocado injusto para as obras autocontidas, reconheço, e até ponderei fazer um TOP exclusivamente para séries e outro para livros one-shot, mas depois achei que isso seria escolher demasiadas obras. Deixaria de ser um TOP 10 para ser um TOP 20. Até me facilitaria o processo, honestamente, mas acabaria por retirar destaque a este meu trabalho que procura ser de curadoria. Acabou por ser um exercício mais difícil, pois tive que deixar de fora obras que também adoro, mas acho que quem beneficia são os meus leitores que, deste modo, ficam com a BD que considero ser a "crème de la crème" de cada editora.

Feita a introdução, passemos então àquela que considero como a melhor BD lançada pela Arte de Autor nos últimos 5 anos. Chamo a atenção para o facto de eu considerar que fará sentido fazer um TOP dedicado aos lançamentos que a Arte de Autor fez em conjunto com a editora A Seita. Mas isso ficará para outro dia. Como tal, as obras lançadas em conjunto pelas duas editoras não foram tidas em conta para este TOP.

Por agora, centremo-nos no TOP dedicado aos livros exclusivamente editados pela Arte de Autor.

Ora vejam:

quarta-feira, 5 de abril de 2023

Análise: Spaghetti Bros - Volume 4

Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor

Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina

Com este quarto e último volume, que inclui os tomos 13, 14, 15 e 16 da série Spaghetti Bros, criada pelos argentinos Carlos Trillo e Domingo Mandrafina, a editora Arte de Autor completou mais uma série de banda desenhada.

E, agora que é legítimo olhar para trás, observando com alguma distância a relevância e/ou pertinência da publicação desta série, especialmente tendo em conta os dias de escrutínio que parecem condicionar tudo o que dizemos ou escrevemos, diria que dificilmente Spaghetti Bros poderia ter sido uma aposta melhor por parte da editora. E quando digo isto, não me refiro a números de vendas – essa parte, goste-se ou não, está muito do lado de cá, o dos consumidores, e de tudo o que optamos por comprar ou não, baseado nos nossos gostos, cultura, conhecimento e, claro, poder de compra. Ao invés, refiro-me, e isso sim, à pertinência e relevância da publicação de uma obra polémica como Spaghetti Bros.

Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Esta é, afinal de contas, uma série onde abunda o humor negro, cáustico e pouco ético. Para os dias atuais, pelo menos. É uma obra cheia de estereótipos, com linhas de interpretação sobre o papel de cada um na sociedade, em que as personagens são machistas, más, abusadoras e criminosas. Está especial presente nesta série um retrato das mulheres na sua condição de subjugadas pelos homens e meros objetos daqueles. E sabem que mais? Que bom é que nos cheguem obras com este humor livre e sem mordaças no ano 2023.

Que fique bem entendido que não estou a preconizar que tenhamos estereótipos mentais – mas, lá está, é impossível não os ter – ou, mais grave do que isso, que consideremos que as mulheres devem ter um papel de subjugação perante o domínio machista e patriarcal que ainda impera na sociedade. Mas - caramba! - isto é uma obra de humor, com o propósito de divertir e fazer rir, feita em 1995 (mas em que a história é situada temporalmente algures no início do século XX), e em que se tentam retratar personagens amarguradas e amargas, que têm todo o tipo de defeitos que possamos imaginar. E mesmo defeituosas e eticamente reprováveis, é inegável que nos fazem rir.

Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Permitam-me levar o desabafo ainda mais longe: é pena que a banda desenhada seja, de facto, uma arte que não chega ao mainstream, a um grande público. Porque, se assim fosse, estou certo de que a série Spaghetti Bros seria completamente cancelada e criticada, tendo em conta os valores – em discordância com aquilo que nos dias de hoje é importante perpassar – que apresenta. E sim, não são valores que a série defenda ou sugira, mas sim que apresente. E talvez seja esta última frase que distingue o trigo do joio nesta questão de censuras e cancelamento ao humor que tanto nos incutem atualmente.

Não sou apenas eu que adoro Spaghetti Bros pois recordo que os próprios prémios VINHETAS D’OURO 2023 elegeram o terceiro volume desta série como a melhor obra de humor do ano passado. E relembro que a minha opinião, junto de 16 outras opiniões, que compõem o painel de jurados desses prémios, não tem qualquer relevância em termos de escolhas ou votações. O que, lá está, prova que Spaghetti Bros tem um humor viciante, que muitos apreciam. Ou sabem apreciar.

Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
É, pois, uma obra valiosa e que merece que lhe sejam feitas as devidas vénias.

Falando agora, mais concretamente, deste quarto volume, posso dizer-vos que “é mais do mesmo”. E que bom isso é! 

Os cinco irmãos Centobucchi continuam a fazer das suas, assumindo vidas onde imperam os valores opostos ao social e legalmente aceite. Amerigo continua um verdadeiro gangster raivoso e a sua bela e mais jovem mulher mantém um caso com o irmão deste, Tony, que é polícia de profissão. Por sua vez, as duas irmãs, Gipsy Boone e Carmella, também não são flores que se cheirem. A primeira é uma atriz malfadada, que acaba por aceitar fazer qualquer coisa para relançar a sua carreira artística, incluindo ser a estrela de filmes pornográficos, e a segunda, Carmella, embora pareça ser apenas uma triste mãe viúva com 3 filhos para sustentar e educar, não só foi a assassina do seu marido como, à noite, se transforma em assassina contratada, matando os homens depois de dormir com eles. Resta-nos o quinto irmão, o padre Frank que, apesar de tudo, ainda é a âncora da moralidade nesta família, embora também tenha os seus próprios fantasmas, pecados e telhados de vidro.

Querem melhor trama do que esta? Uma autêntica novela mexicana. Ou argentina, vá!

Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Cada volume reúne um conjunto de capítulos que, sendo independentes, acabam por se correlacionar entre si. E, neste último volume, ainda fiquei mais agradavelmente surpreendido por sentir que há uma tentativa de resolução da história. De “closure”, como dizem os ingleses. O início do volume é marcado pela iniciativa de James, o filho mais velho de Carmella, de redigir um texto/argumento sobre a sua família. Ora, isto não só gera situações divertidíssimas como permite ao argumentista Carlos Trillo criar um género de meta-comunicação, em que a história parece refletir sobre si mesma. E isto resulta num exercício muito bem feito por Trillo. Se Spaghetti Bros já era bom nos volumes anteriores, aqui ainda vai mais longe e consegue superar-se a si mesmo.

Pena é que, no final do livro, não se sinta essa tal “closure”. Parece que a história fica em aberto e não consegue fechar-se a si mesma, apesar da tentativa clara que houve para tal, ao longo deste volume. É apenas um pequeno detalhe, mas que, quanto a mim, falha em conseguir um final perfeito e totalmente satisfatório para a história global.

Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Olhando para os fantásticos desenhos de Mandrafina, mais uma vez estamos perante “mais do mesmo”. E, mais uma vez, que bom isso é! Citando o que já escrevi nos textos anteriores que escrevi sobre os volumes um, dois e três da série, posso dizer-vos que “o traço de Mandrafina é ágil, habilidoso e permite-lhe uma caracterização fiel e extremamente bem executada, quer dos locais, quer das personagens. A sua capacidade para caracterizar as expressões faciais dos irmãos Centobucchi e das restantes personagens, é de um talento raro e maravilhoso. O seu traço é elegante e clássico, fazendo lembrar as ilustrações de Will Eisner, com as devidas diferenças, claro. Visualmente é uma obra incrível que dificilmente não agrada a um amante de banda desenhada.

Quanto à edição da Arte de Autor, nada de mal há a objetar. O livro apresenta capa dura, com textura aveludada e suave ao toque, e detalhes a verniz. No interior, encontramos um bom papel baço, uma boa encadernação e uma boa impressão. Dou, mais uma vez, os parabéns à editora pela aposta numa série boa e, infelizmente, com um teor e um humor já fora do tempo atual que vivemos. Aproveito, já agora, para fazer votos para que a editora portuguesa aposte na obra Vieilles Canailles, dos mesmos autores. Não só a mesma é curta – com dois tomos apenas, que poderiam ser publicados num só volume integral – como faz um regresso à família Centobucchi, com os irmãos mais velhos (e mais cruéis ainda).

Em conclusão, Spaghetti Bros tornou-se, com alguma facilidade, diria, numa série que considero irresistível. Boas personagens, bons diálogos, belos desenhos, belo ambiente noir e um sem número de situações de rir à gargalhada. Está cá tudo! Recomenda-se, sem reservas, a todos os que, defendendo o humor livre e desbragado, apregoaram a plenos pulmões “Je Suis Charlie Hebdo”. Só com um humor livre e sem “mimimi” podemos apreciar o quão fantástico Spaghetti Bros é.


NOTA FINAL (1/10):
9.5



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor

Ficha técnica
Spaghetti Bros - Volume 4
Autores: Trillo e Mandrafina
Editora: Arte de Autor
Páginas: 196, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Formato: 210 x 285 mm
Lançamento: Fevereiro de 2023

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Spaghetti Bros está de volta com o volume final!




A Arte de Autor prepara-se para lançar o quarto e último volume da fabulosa série Spaghetti Bros, de Trillo e Mandrafina!

Estou bastante empolgado com esta novidade e aconselho-vos, por isso, a ler as minhas análises aos volumes um, dois e três.

Este quarto e último livro reúne os volumes de 13 a 16, que completam a série, e deverá chegar às livrarias já no próximo dia 2 de Março.

Abaixo, e como habitual, deixo-vos com a sinopse da obra e com algumas imagens promocionais.
Spaghetti Bros - Volume 4, de Trillo e Mandrafina

Trillo e Madrafina dão-nos a sua visão peculiar -- cruel e trágica -- da história da América moderna. 

Para tal, servem-se dos membros de uma família atípica, a dos irmãos Centobucchi, emigrantes italianos cujos vínculos se estendem a instituições tão diversas e ao mesmo tempo tão afins como a Máfia, a Polícia e a Igreja.

Uma imersão admirável na América impiedosa de 1929!

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Ficha técnica
Spaghetti Bros - Volume 4
Autores: Trillo e Mandrafina
Editora: Arte de Autor
Páginas: 196, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Formato: 210 x 285 mm
PVP: 25,50€


segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

Análise: Spaghetti Bros - Vol. 3

Spaghetti Bros - Vol. 3, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor

Spaghetti Bros - Vol. 3, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Spaghetti Bros - Vol. 3, de Trillo e Mandrafina

Se houve apostas bem conseguidas por parte da editora portuguesa Arte de Autor, a aposta na série Spaghetti Bros foi uma delas. Mesmo que, e estou a falar sem ter confirmado dados junto da editora, as vendas de exemplares fiquem aquém do esperado. Porque, até nesse caso, e espero que os leitores portugueses tenham o bom senso de dar, pelo menos, uma hipótese a esta série, a qualidade da aposta mantém-se. Dito por outras palavras, até mesmo quando determinada série não tem sucesso comercial, isso não invalida que a aposta da editora não tenha sido legítima e ancorada na qualidade intrínseca da obra em questão.

Este já é o terceiro volume de Spaghetti Bros – de um total de quatro – e posso dizer que, terminada a leitura da obra - que reúne os tomos 9, 10, 11 e 12 –, a sensação com que fico é a mesma de quando terminei de ler os volumes anteriores (qual Oliver Twist no refeitório do orfanato): “Quero mais, por favor! Quero mais!” Sabendo que, neste momento, a série já vai em três terços e já só falta publicar o último volume, não deixa de ser uma sensação agridoce.

Spaghetti Bros - Vol. 3, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
E tudo isto porque Spaghetti Bros – que eu não conhecia até a Arte de Autor ter apostado na série – enche as minhas medidas de leitor de bd de uma forma tão simples como esta: é muito bem desenhada, tem um argumento muito inspirado e divertido e, em último lugar, mas não menos importante, tem personagens que ficam connosco, no nosso imaginário, anos depois de finda a leitura. 

A família Centobucchi, completamente amoral, e tão fora do politicamente correto, acaba por ser uma lufada de ar fresco nos tempos atuais! E há nestes cinco irmãos algo profundo e tão eticamente errado que todos nós, estou certo, acabamos por admirar, como se fosse um guilty pleasure. “O fruto proibido é sempre o mais apetecido”, não é assim que é dito? 

Amerigo, o irmão mais velho, é um mafioso clássico sem escrúpulos. Muito ao jeito de Don Corleone de O Padrinho. Franck, é um padre que saltita entre o certo e o errado, entre o casto e o devasso, entre o bem e o mal. Maravilhoso! E provavelmente a minha personagem favorita de toda a série. Depois ainda há as irmãs, Catarina, uma atriz de Hollywood que tudo faz para (re)alcançar a fama e o estrelato; e Carmela, mãe de dois filhos, que ganha a vida a assassinar homens que seduz até ao seu leito. Por fim temos, Tony, um polícia que, mesmo podendo parecer, “o mais certinho”, acaba por ter de confrontar os seus próprios demónios, enquanto ama a mulher do seu irmão mais velho, Amerigo, que acaba por engravidar. Portanto, Tony é pai, tio e padrinho do filho de Mena! Pode-se não adorar uma trama destas? A mim parece-me que até o nosso Eça de Queiroz, autor que tanto adorava um bom e malandro enredo, haveria de gostar destes Spaghetti Bros! Como não?

Spaghetti Bros - Vol. 3, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
E se há um humor que se apoia nas situações caricatas e exageradas, também é verdade que, por vezes, e neste terceiro volume isso está mais patente ainda, o argumentista Carlos Trillo, nos deixa espaço para refletir. E logo a segunda história deste livro, Freaks, será um ótimo exemplo desta afirmação, quando, através dos olhos de uma criança, nos é permitido ver o quão nefasta pode ser a violência e "o errado" para uma criança. Fantástica forma como, entre risos, Trillo consegue revelar noção da sua própria história.

De resto, neste terceiro volume continuamos a acompanhar as peripécias que vão acontecendo aos cinco irmãos. Neste tomo, a irmão Catarina, a atriz conhecida por Gipsy Boone, recebe mais destaque do que nos livros anteriores, à medida que vamos vendo tudo aquilo que ela está disposta realizar, com o objetivo primordial de alcançar o sucesso cinematográfico, numa altura em que o cinema deixa de ser mudo para passar a ser sonoro. Como pano de fundo histórico, temos o crash da bolsa de Wall Street que deixou na miséria milhões de pessoas.

Com alguma pena minha, a sensual Carmela está um pouco mais ausente neste volume embora, mesmo assim, seja curioso ver como a sua experiência profissional inexistente, a impede de encontrar um trabalho justo e honesto, das 9 às 5. A única coisa onde ela é realmente boa é em ceifar as vidas dos seus amantes. E de resto, Amerigo, Tony e Franck também têm algumas peripécias marcantes que acontecem neste volume.

Spaghetti Bros - Vol. 3, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Acima de tudo, para além de uma história divertida, carregada de humor negro, que se lê muito bem, penso que é no conjunto de personagens marcantes, cheias de carisma e personalidade, que reside o segredo de ser tão bom ler Spaghetti Bros. Acontece exatamente isto em boas séries de televisão, em filmes, em romances ou, até, em videojogos quando as personagens são impactantes. E nesta série de banda desenhada não é apenas uma, nem duas, as personagens que nos marcam. Todos os 5 irmãos têm carisma suficiente para merecerem uma série só para si. E é por isso mesmo, que é uma série que considero tão rica.

E ainda nem falei da arte que Mandrafina nos proporciona! Verdadeiramente deliciosa! Tal como escrevi, por ocasião da análise ao primeiro volume, e repeti na análise ao segundo volume da série, o traço de Mandrafina “é ágil, habilidoso e permite-lhe uma caracterização fiel e extremamente bem executada quer dos locais, quer das personagens. A sua capacidade para caracterizar as expressões faciais dos irmãos Centobucchi e das restantes personagens, é de um talento raro e maravilhoso. O seu traço é elegante e clássico, fazendo lembrar as ilustrações de Will Eisner, com as devidas diferenças, claro. Visualmente é uma obra incrível que dificilmente não agrada a um amante de banda desenhada.” 

Spaghetti Bros - Vol. 3, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Ilustrações verdadeiramente bem executadas. Mas a tal aptidão incrível para a boa reprodução das expressões das personagens, é a grande mais valia de Mandrafina, diria, porque, por muito que o argumento de Trillo fosse bom, sem o trabalho visual de Mandrafina para dar (tão bem) corpo a estas personagens e histórias, não estaríamos perante uma banda desenhada tão interessante.

Só em termos de conceção de capa é que Mandrafina não consegue, a meu ver, resultados tão bons. Ainda que esta seja a melhor capa dos três livros publicados até agora, acho que bastaria que as sombras tivessem um preto compacto para que a capa funcionasse melhor. Mesmo assim, é a melhor capa até agora, sem dúvidas.

A edição da Arte de Autor continua impecável, como já o havia sido nos anteriores livros da série. Capa dura, com textura aveludada, bom papel baço e boa encadernação. Faço uma pequena nota sobre um pormenor que me fez um pouco de confusão na tradução que foi a expressão “filho DE puta”. Eu nunca tinha ouvido essa expressão em 37 anos de vida. E fez-me um bocado confusão. Mesmo que alguém use a referida expressão, diria que 99,9% dos portugueses diz “filho DA puta” e não “DE”. Não estraga minimamente o prazer da leitura, e isto é só uma minúcia minha, mas como é uma coisa que acontece em muitas vezes, recebe aqui o meu comentário.

Bem vistas as coisas, e concluindo, Spaghetti Bros é verdadeiramente delicioso e apetecível. O magnífico desenho de Mandrafina e o excelente argumento de Trillo fazem desta série uma aposta de grande nível que é obrigatório conhecer. Que venha o quarto livro tão depressa quanto possível!


NOTA FINAL (1/10):
9.4



Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Spaghetti Bros - Vol. 3, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor

Ficha técnica
Spaghetti Bros - Vol. 3
Autores: Trillo e Mandrafina
Editora: Arte de Autor
Páginas: 196, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Fevereiro de 2022

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

A família mais infame da BD está de volta!!!



É com grande satisfação e entusiasmo que vos informo que a família Centobucchi, verdadeiramente hilariante e infame, está de regresso, pelas mãos da Arte de Autor, naquele que é o terceiro livro da série Spaghetti Bros (de um total de quatro volumes), que compila os volumes 9 a 12 da série.

Esta é uma das séries que mais prazer me tem dado ler! Mal posso esperar por este volume.

O livro já se encontra em pré-venda no site da editora e deverá chegar às livrarias na próxima semana.

Mais abaixo, fiquem com a sinopse da obra e algumas imagens promocionais.
Spaghetti Bros -  Vol. 3, de Trillo e Mandrafina

Na família Centobucchi, três irmãos: Amérigo, um mafioso sem escrúpulos, Franck, um padre, e Tony, um policia; duas irmãs: Catarina, que se tornou a famosa atriz Gipsy Boone, e Carmela, mãe de dois filhos e… Eles não têm exatamente um entendimento cordial. 

Amérigo é alvo dos seus muitos inimigos, cada vez mais poderosos, que até acabam a querer atacar o próprio Franck! 

Quanto às meninas, elas são obcecadas pelo passado. Gipsy, estrela do cinema mudo, aceita muito mal o marco dos filmes falados e do crash da bolsa. 

Quanto a Carmela, sem experiência clássica, é bastante difícil para ela encontrar um emprego normal neste período de crise.
Como bom padre, Franck não suporta os pecados que pesam sobre os seus irmãos, sabendo que todos lhe mentem com medo de decepcioná-lo. As incessantes discórdias e derrapagens conscientemente começaram a dominá-lo. Tony, como um bom polícia, apega-se aos seus princípios, mas aos poucos descobre que a polícia está longe de encarnar a justiça que ele defende.

Enquanto alguns tentam de alguma forma superar a grande crise de 1929, Gipsy Boone está pronta para tudo, desde que regresse ao estrelato e se torne a musa de um jovem argumentista.

Uma imersão admirável na América impiedosa de 1929!

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Ficha técnica
Spaghetti Bros -  Vol. 3
Autores: Trillo e Mandrafina
Editora: Arte de Autor
Páginas: 196, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
PVP: 24,75€

quarta-feira, 14 de julho de 2021

Análise: Iguana

Iguana, de Carlos Trillo e Mandrafina - Vitamina BD - Mancha Negra

Iguana, de Carlos Trillo e Mandrafina - Vitamina BD - Mancha Negra

Iguana, de Carlos Trillo e Mandrafina

Iguana é um dos títulos que a extinta editora Vitamina BD, através da sua chancela Mancha Negra, editou quando estávamos no ano de 2002. A obra é da autoria da dupla argentina composta por Carlos Trillo e Domingo Mandrafina, que são igualmente os autores da aclamada série Spaghetti Bros, que a editora Arte de Autor tem vindo a publicar no último ano. Tendo em conta o final da Vitamina BD, esta é mais uma das obras que se encontram a um preço ridículo de 3€! E, por esse preço, esta oferta é irrecusável!

Iguana conta-nos a história da personagem com o mesmo nome da obra que até já tinha aparecido no álbum A Grande Farsa, dos mesmos autores, e que foi publicado em Portugal pela mesma editora. Iguana é um protagonista (ausente), por demais cruel, que, na localidade de La Colonia, é temido por todos, mesmo depois da sua morte! De facto, na primeira vinheta deste livro podemos vislumbrar Iguana a jazer morto, no chão. Mas, mesmo na condição de morto, Iguana parece ter o condão de amedrontar toda a população daquela cidade. 

Iguana, de Carlos Trillo e Mandrafina - Vitamina BD - Mancha Negra

É então que uma bela jornalista americana, Susan Ling, desejosa de vencer o prémio Pulitzer, viaja para La Colonia para investigar a morte de Iguana e tentar reconstituir a sua vida. Para isso, terá que entrevistar um bom número de pessoas que conviveram de perto com o medonho Iguana. E é através desses relatos de personagens secundárias que vamos conhecendo a medonha e perversa personagem de Iguana. Mas, entretanto, a sua influência parece ser tão grande na jornalista que ela mesma acaba enfeitiçada pelo vilão de uma forma estritamente sexual. O seu êxtase sexual já só consegue atingir a apoteose se Iguana estiver na sua mente. Nem que seja através de uma máscara de Iguana na face de outro homem. A sua reportagem é depois tão aclamada que chega – nesta banda desenhada, atente-se – a ser adaptada para o cinema por Steven Spielberg e interpretada por Robert de Niro. Estas duas personagens reais chegam mesmo a fazer um breve aparecimento neste Iguana.

Se a ideia de ter uma história que procura desvendar uma personagem maléfica que, logo na primeira vinheta da primeira página, já se encontra morta me parece bastante interessante, considero todavia, que a história está um pouco “mal-amanhada”, com um enredo que procurando chocar e divertir ao mesmo tempo, acaba por estar demasiado preso a esses dois vetores, não conseguindo ser, no seu âmago, uma história tão marcante e bem conseguida assim.

Iguana, de Carlos Trillo e Mandrafina - Vitamina BD - Mancha Negra

Já a arte de Domingo Mandrafina, a preto e branco, tem o seu estilo próprio, muito em linha com aquilo que muitos dos leitores portugueses já conhecerão com a série Spahguetti Bros. O domínio das expressões faciais e da própria conceção das personagens e dos cenários é espantosa, pese embora o formato reduzido do livro não nos permita apreciar tão bem a sua arte como se consegue, por exemplo, na tal série, já mencionada, Spaghetti Bros, que tem um maior formato. 

Mesmo assim, em termos ilustrativos, Iguana é muito bom. A utilização das sombras e do espaço negativo, os enquadramentos dos planos utilizados, as soluções narrativas encontradas por Mandrafina... todas essas coisas revelam uma enorme qualidade que convém sublinhar. Amiúde, também são utilizadas algumas imagens em registo “fotografia”. Não gostei tanto pois pareceram-me não colar tão bem na arte do autor que, honestamente, vale mais do que essas fotografias que foram utilizadas. Mas, felizmente, é um artifício poucas vezes utilizado ao longo do livro.

Iguana, de Carlos Trillo e Mandrafina - Vitamina BD - Mancha Negra

Um destaque para a capa deste livro que considero bastante fraca. Nada tenho contra mamas – pelo contrário, na verdade – mas a questão aqui não é essa. Do ponto de vista de design de capa, com a imagem em dégradé no canto inferior direito e a forma como os elementos estão organizados, mesmo tendo em conta que o álbum é de 2002, é uma capa bastante fraca. Um bom exemplo de como não deve ser uma capa de banda desenhada. Não obstante, acho que deve ser dada uma nota positiva para o facto da edição portuguesa apresentar Susan Ling em topless. Todas as edições que encontrei pela internet fora apresentam a personagem em camisa de noite na capa. Encontrei até uma edição de Iguana, pela própria Vitamina BD nessa tal camisa de noite pelo que, calculo, houve duas edições portuguesas diferentes. No meu caso, gosto quando as editoras portuguesas não tentam ser politicamente corretas. Bem feito, Vitamina BD.

A edição é em capa mole com papel de qualidade decente. Penso que a obra mereceria uma edição mais cuidada por parte da editora. Mas os tempos eram outros, sem dúvida e hoje em dia, parece que todos nós estamos mal habituados relativamente às espetaculares edições que, agora, são lançadas em Portugal.

Em conclusão, Iguana é uma obra muito interessante, com um tema bastante chocante e pecaminoso, dos autores argentinos Trillo e Mandrafina. A arte deste último continua maravilhosa embora o argumento de Trillo nesta obra concreta pudesse ter sido mais bem trabalhado. Ainda assim, e tendo em conta que este livro ainda é facilmente encontrado pelo preço ridículo de 3,00€(!), a leitura deste Iguana reveste-se de obrigatoriedade.


NOTA FINAL (1/10):
7.8


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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Iguana, de Carlos Trillo e Mandrafina - Vitamina BD - Mancha Negra

Ficha técnica
Iguana
Autores: Trillo e Mandrafina
Editora: Vitamina BD (Chancela Mancha Negra)
Páginas: 84, a preto e branco
Encadernação: Capa mole
Lançamento: Junho de 2002

segunda-feira, 26 de abril de 2021

Análise: Spaghetti Bros – Vol. 2

Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor


Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina

A família mais disfuncional de sempre da banda desenhada está de volta! E é um regresso em grande! Ao nível daquilo a que os felizardos leitores do Volume 1 já puderam experenciar.

Se há papel importante que as editoras de banda desenhada (também) fazem, é o de curadoria em relação ao lançamento de obras menos badaladas. Isso permite que os leitores possam descobrir – ou redescobrir – boas séries de banda desenhada. Quando no ano passado a Arte de Autor, oportuna, foi buscar este Spaghetti Bros, apanhou muita gente desprevenida. Os que já conheciam, rejubilaram com o lançamento desta fantástica série em Portugal. Os que não conheciam, tiveram, certamente, uma das melhores surpresas do ano editorial do ano passado.

Portanto, é uma alegria ver que Spaghetti Bros, composto por 4 volumes, já tem metade da sua série publicada em Portugal.

Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Spaghetti Bros
é, de uma forma avassaladora, politicamente incorreto, subvertendo as regras do certo e do errado, sem escrúpulos e sem qualquer contenção. Numa altura em que, de forma geral, o entretenimento me entristece cada vez mais, ao ter posturas falsamente moralistas e (apenas e só) corretas aos olhos da opinião pública – recordo a série Os Simpsons, da qual sempre fui fã, que recentemente decidiu substituir o ator, que sempre fez o papel da personagem Apu, por um ator indiano (só para não ferir suscetibilidades) e que colocou um ator homossexual a dar voz a uma personagem homossexual (mais uma vez, com o único propósito de não ferir suscetibilidades) – é bom olhar para a banda desenhada e verificar que é uma forma de arte (ainda) bastante livre, havendo espaço para todo e qualquer estilo de histórias. Muitas vezes, politicamente incorretas nos valores que contêm. Mas, lá está, isso é, a meu ver, uma coisa boa porque a criação artística não deve ser sintética e falsamente moralista (nem sequer tem que ser moralista, sinceramente). A criação artística deve ser uma expressão, uma ideia, um output criativo. Acredito que se houvesse uma adaptação de Spaghetti Bros para uma série da Netflix, haveria um autêntico reboliço e, possivelmente, petições públicas e manifestações para que os responsáveis da série e, em última análise, os criadores originais Trillo e Mandrafina, fossem veemente criticados e marginalizados (e quão irónico é marginalizar os que, supostamente, marginalizam, não?).

Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
E porque é que falo sobre estes temas? Bem, como já referi acima, Spaghetti Bros é verdadeiramente incorreto. Entre aquilo que esta fantástica série nos oferece nas suas histórias, temos violentos criminosos, temos adultério, temos machismo, temos violações, temos padres criminosos, homens criminosos, mulheres criminosas, uma atriz que subiu na carreira cinematográfica após favores de foro sexual. Temos tudo aquilo que é tido como errado. Mas, ainda assim, Spaghetti Bros não poderia ser uma série mais deliciosa! E ponham nas vossas cabeças a ideia de que abordar estes temas não quer dizer promovê-los. Pode até querer dizer que são errados. Chamar a atenção para tal. Embora também não me pareça que seja esse o caso nesta série.

Portanto, serei eu ou os muitos amantes de Spaghetti Bros uns autênticos párias e vermes da sociedade? Ou esta série é apenas - e só - um conjunto de histórias divertidas, empolgantes, com personagens inesquecíveis e que serve, em primeiríssimo lugar, para entreter? Eu julgo que se trata desta segunda hipótese! E, acreditem, é uma série quenos deixa entretidos de forma deliciosa.

Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
O fantástico conjunto de 5 irmãos, emigrantes italianos, que constituem a família Centobucchi, e que procuram sobreviver das mais diversas formas nos Estados Unidos da América, inclui um gangster, Amerigo, que mata sem quaisquer escrúpulos; o padre Frank, cheio de atitude e de “telhados de vidro”; o polícia Tony, que procura levar uma vida de retidão; a estrela de cinema Catarina; e Carmela que, embora pareça normal e correta, com dois filhos à sua guarda, de noite é uma prostituta assasina dos seus amantes. Tudo isto parece um bocadinho over the top? Sim, é mesmo! Mas duma forma viciante.

O livro está dividido em 24 curtas histórias, de 8 páginas cada uma, cada uma delas com um título que é normalmente alusivo a um clássico do cinema. No entanto, estas histórias devem ser vistas mais como capítulos do que como histórias isoladas entre si, visto que, todas juntas, contam uma história maior. E isso até se sente mais neste segundo volume do que no primeiro. Em Spaghetti Bros – Vol. 1, como os autores estavam ainda a dar-nos a conhecer as várias personagens, algumas histórias pareciam mais isoladas entre si.

Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Neste segundo volume, embora alguns capítulos se foquem em aspetos mais concretos e relativamente independentes da história principal, a grande soma dos capítulos foca-se no romance do irmão mais velho, Amerigo, que parece finalmente encontrar uma mulher “a sério”, digna de ser sua esposa. Porém, nada é límpido nesta família e o que Amerigo ainda não sabe é que esta mulher mantinha uma relação com o irmão mais novo de Amerigo, o polícia Tony.

Ora, Trillo sabe utilizar muito bem todo o tipo de situações tensas e hilariantes que esta condição traz à trama, envolvendo também as outras personagens. O padre Frank, que neste volume, com alguma pena minha, parece estar mais sereno e menos agressivo, serve como pendor de retidão e tenta colocar juízo na sua família. Uma personagem nova e que ganha bastante importância neste segundo volume é James, o filho mais velho de Carmela, que acaba a servir como pombo correio entre Tony e Filomena. Não querendo adiantar mais sobre o argumento, com o receio de poder estragar algumas surpresas aos leitores que, inteligentemente, optarem por comprar este livro, digo apenas que a trama é muito divertida e pecaminosa de uma ponta à outra. Estão a ver Os Maias, de Eça de Queiroz, misturados com O Padrinho, de Mario Puzo? É mais ou menos nesse quadrante narrativo, que situo a família Centobucchi deste Spaghetti Bros.

Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
O trabalho de Mandrafina é de enorme qualidade e continua em linha com aquilo já feito no volume 1. Tal como escrevi na minha análise a esse primeiro volume da série, o traço do autor é “ágil, habilidoso e permite-lhe uma caracterização fiel e extremamente bem executada, quer dos locais, quer das personagens. A sua capacidade para caracterizar as expressões faciais dos irmãos Centobucchi e das restantes personagens, é de um talento raro e maravilhoso. O seu traço é elegante e clássico, fazendo lembrar as ilustrações de Will Eisner, com as devidas diferenças, claro. Visualmente é uma obra incrível que dificilmente não agrada a um amante de banda desenhada.”

Para mim, é um autor que apenas peca um pouco na execução das capas. Não são feias mas poderiam ser muito mais apelativas. Abrindo aleatoriamente o livro encontramos facilmente uma ilustração mais marcante e impactante do que olhando para a capa e isso faz-me concluir que a arte visual da banda desenhada em si é fantástica e que as ilustrações das capas é que são um pouco mais “fraquinhas”.

A planificação das histórias é bastante clássica e rígida. As páginas têm quase sempre 6 vinhetas quadradas por página. E é muito raro que o autor fuja a isto. Mas mesmo que isto possa parecer algo repetitivo, posso garantir que se há coisas que Spaghetti Bros não é, é uma série repetitiva e entediante. Na verdade, a leitura da obra acaba por ser viciante. A pessoa lê um capítulo de oito páginas e quando o acaba diz para si mesma: “só mais uma história”. E, quando dá por si, já leu o livro todo!

Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor
Relativamente à edição, a Arte de Autor coloca no mercado mais um livro bem conseguido. Capa dura e com textura aveludada, tão agradável ao toque, e detalhes a verniz que embelezam o aspeto da capa. O papel é baço e de uma boa gramagem. Uma pequena nota menos positiva, apenas: embora a capa seja dura, parece-me um pouco fina demais, tendo em conta a grossura do volume, e isso faz com que o livro seja um pouco frágil, se não manuseado com cuidado.

Uma nota de louvor merece ser dada à editora. São muitas as séries fantásticas, de alta qualidade, em que a Arte de Autor aposta. Daí eu ter referido que o papel de uma editora também pode (deve?) ser de curadoria em relação à banda desenhada de qualidade. Na verdade, e digo-o da forma mais sincera possível, a Arte de Autor não tem uma única série que eu considere “má” ou que não valha a pena conhecer. Mesmo assim, realço que séries como Spaghetti Bros, Verões Felizes, Armazém Central, O Castelo dos Animais, Bouncer, entre outras, não são apenas maravilhosas, como obrigatórias numa boa coleção de banda desenhada. Já não falando na série clássica de Corto Maltese ou de fantásticos álbuns one shot que a editora lançou como O Azul é uma Cor Quente, Como Viaja a Água ou Shanghai Dream. O catálogo da editora melhora de mês para mês. De ano para ano.

Em suma, não me canso de recomendar Spaghetti Bros a todos os amantes de banda desenhada. Sejam os que gostam de histórias de gangsters, sejam os que gostam de uma boa comédia de situação, sejam os que apreciem uma excelente arte ilustrativa a preto e branco. Ou mesmo aqueles que, num mundo cada vez mais composto por uma moral sintética de dizer e fazer aquilo que parece unanimente correto, procuram algo verdadeiramente disruptivo, pecaminoso e eticamente incorreto. Spaghetti Bros é todas estas coisas e muito mais! Um must!


NOTA FINAL (1/10):
9.3


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020



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Spaghetti Bros – Vol. 2, de Trillo e Mandrafina - Arte de Autor

Ficha técnica
Spaghetti Bros – Vol. 2
Autores: Trillo e Mandrafina
Editora: Arte de Autor
Páginas: 196, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
Lançamento: Abril de 2021

quarta-feira, 14 de abril de 2021

Lançamento: Spaghetti Bros 2




Esta semana vai pródiga em lançamentos de bd de qualidade! Desta vez, é a Arte de Autor que confirma a chegada da incrível família Centobucchi, de Spaghetti Bros!

O primeiro livro foi bestial e estou certo que o segundo não ficará atrás!

Com o lançamento deste segundo livro, que compila os volumes de 5 a 8, pode-se dizer que metade da série já se encontra publicada pela editora. Ficam a faltar mais dois livros que incluirão os restantes 8 volumes. Note-se que cada livro inclui 4 volumes da série.

Abaixo, fiquem com a nota da editora e algumas imagens promocionais.


Spaghetti Bros 2, de Trillo e Mandrafina

A família Centobucchi, imigrantes italianos nos EUA, não é das mais convencionais...

O mais velho, Amerigo, ficou para sempre marcado pela morte prematura da mãe e tornou-se um dos piores chefes do submundo de Nova Iorque. Cruel e impiedoso, faz reinar o terror à sua volta. 

O segundo, Frank, é um padre pouco convencional que não hesita em dar algumas boas correcções ao seu irmão mais velho com crucifixos. 

O pequeno António tornou-se... Polícia! 

Do lado das irmãs, não é melhor. A bela Caterina tornou-se actriz, e a doce Carmela, dona de casa, acaba por ser uma perigosa acompanhante que mata os seus amantes por encomenda. 

Neste caos familiar, o infame Amerigo envereda por um novo caminho…


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Ficha técnica
Spaghetti Bros 2
Autores: Trillo e Mandrafina
Editora: Arte de Autor
Páginas: 196, a preto e branco
Encadernação: Capa dura
PVP: 22,75€

terça-feira, 3 de novembro de 2020

Análise: Spaghetti Bros - Vol. 1



Spaghetti Bros - Vol. 1, de Trillo e Mandrafina 

Houve duas fantásticas surpresas que a editora Arte de Autor guardou para outubro deste ano. A primeira, já analisada no Vinheta 2020, é a maravilhosa série Armazém Central, de Régis Loisel e Tripp, que a editora recuperou recentemente. A segunda surpresa – não menos impressionante! - é o lançamento de Spaghetti Bros, da autoria de Carlos Trillo e Domingos Mandrafina. 

Embora já conheça algum do trabalho que esta dupla criativa produziu ao longo dos anos, confesso que não conhecia a série Spaghetti Bros, que é dividida em 4 volumes. E folheando apenas durante alguns segundos, não restam dúvidas: esta é uma série de estilo noir, ambientada na Nova York dos anos 30, e é detentora de uma arte espetacular, a preto e branco, por parte de Mandrafina. 

O que é que eu andava a perder! Para além da arte maravilhosa, a que voltarei, são as personagens que habitam esta série que nos cativam e nos prendem da primeira à última página. Verdadeiramente irresistível! 

O livro é composto por várias histórias de 8 páginas cada uma. Embora cada episódio possa ser lido de forma independente, todos eles estão ligados entre si, contando a história grande, aos poucos. É bom porque funciona bem das duas maneiras: os que apreciam histórias por capítulos, gostarão deste formato. Mas aqueles que preferem histórias grandes, também não terão problemas com este livro. São capítulos que se lêem como um todo. 

Acompanhamos as aventuras e desventuras da família italiana Centobucchi. Uma família que, à boa maneira italiana, nos remete para os Corleone de O Padrinho, de Francis Ford-Copolla, e que é composta por 5 irmãos, que são uns autênticos arquétipos da mafia. Se isto pode parece clichet, a verdade é que é na forma como as personagens se relacionam entre si, que esta série se torna verdadeiramente viciante. 

Temos Amerigo, o irmão mais velho, que é um autêntico gangster, que jurou assassinar o seu irmão mais novo, Tony, desde o dia em que a mãe, ao dá-lo à luz, perdeu a vida. Já Tony, antagonicamente, tornou-se polícia e embora pareça uma “boa pessoa”, também tem alguns fantasmas e segredos que encobre. Há também Frank, que é um padre de modos rudes que não tem qualquer problema em bater violentamente no seu irmão mais velho, Amerigo. Depois, temos as duas belas e sensuais irmãs: uma delas é Catarina, que se transformou numa estrela de cinema mas que, para isso, teve que vender a própria alma – e não só -, e finalmente, temos Carmela que, aparentemente, é a mais “normal” de todos, tendo constituído família. Mas também ela tem os seus podres e, quando o marido e os filhos estão a dormir, ela sai de casa, vestida de prostituta, e vai cometendo vários assassinatos, depois de ter relações sexuais com as vítimas. 

Estão a ver no que isto já vai? Moralmente reprovável e até escandaloso, ou seja... apetecível ao mais alto nível, certo?! Sim, é mesmo apetecível! É uma história muito bem engendrada por Trillo, com um trato muito adulto e, por vezes, violento, que nos oferece estas personagens carregadas de defeitos e vícios mas, pelas quais, acabamos por nutrir uma certa simpatia. 

E a isso também ajuda que Spaghetti Bros seja uma narrativa que é marcada por momentos dramáticos mas que, a par desses, também tenha vários momentos de humor. Não são raras as vezes em que o cómico de situação ou o exagero nas reações das personagens nos fazem sorrir. 

A comparação com a, igualmente genial, série Torpedo também é algo que nos salta à vista. O estilo visual é semelhante e a narrativa também aparece dividida em pequenos capítulos, que mesmo parecendo independentes entre si, se vão encaixando uns nos outros desvendando, aos poucos, a história maior da série. Embora me pareça que, eventualmente, Spaghetti Bros se leve um pouco mais a sério do que Torpedo. Seja como for, diria que ambas as séries são espetaculares e que uma é totalmente recomendável, caso se goste da outra. No meu caso, adoro ambas as séries. 

Em termos de arte ilustrativa, o trabalho de Mandrafina é absolutamente fantástico! O seu traço é ágil, habilidoso e permite-lhe uma caracterização fiel e extremamente bem executada quer dos locais, quer das personagens. A sua capacidade para caracterizar as expressões faciais dos irmãos Centobucchi e das restantes personagens, é de um talento raro e maravilhoso. O seu traço é elegante e clássico, fazendo lembrar as ilustrações de Will Eisner, com as devidas diferenças, claro. Visualmente é uma obra incrível que dificilmente não agrada a um amante de banda desenhada. Olhando até para a capa do livro e comparando-a com a arte presente nas pranchas, diria até que a a ilustração da capa fica bastante aquém dos desenhos que compõem o interior do livro. É preciso folhear o volume para que o encatamento pela ilustração surja facilmente. 

Destaque ainda para duas histórias mudas que funcionam de forma perfeita e que revelam, uma vez mais, a boa capacidade de Mandrafina para ilustrar de forma inequívoca uma narrativa muda. Não é seguramente algo que qualquer ilustrador consiga fazer. Pelo menos, tão bem. 

Só na planificação Mandrafina adota um estilo demasiado clássico, para o meu gosto. Cada uma das pranchas é constituída por 6 vinhetas quadradas e isto é feito ao longo de praticamente todo o livro. Contam-se pelos dedos de uma mão as exceções a esta regra. Diria que isto não é sequer um “problema”. Trata-se mais de uma opção do autor. Com uma arte tão bem executada, a verdade é que as páginas são plenamente cativantes, mesmo tendo uma planificação demasiado convencional. No entanto, penso que, eventualmente, a beleza desta banda desenhada ainda seria maior se houvesse uma maior dinâmica na planificação. Mas repito: não é um problema. É uma opção. 

A edição da Arte de Autor é (mais) uma edição de luxo. Papel de boa gramagem, título com acabamento a verniz e capa dura, com aquela textura aveludada que tanto aprecio e que a editora já usou em Armazém Central, O Castelo dos Animais, Os Cavaleiros de Heliópolis, entre outros. No final, um texto de duas páginas dá-nos uma breve contextualização da obra de ambos os autores. 

Em conclusão, esta é uma série maravilhosa de banda desenhada, com personagens inesquecíveis, ilustrações magníficas e que vai certamente encantar todos os amantes de histórias de estilo noir e/ou de gangsters. Embora o estilo, por ser clássico na ilustração, possa indicar que é uma obra mais direcionada para um público mais maduro, a trama construída por Trillo é tão bem intrincada que faz com que Spaghetti Bros possa igualmente apelar a um público mais jovem. Isto, claro, se esse público estiver disposto a dar uma oportunidade a esta série irresistível. Esta é mais uma cartada na mouche, por parte da Arte de Autor! 


NOTA FINAL (1/10): 
9.2 


Convite: Passem na página de instagram do Vinheta 2020 para verem mais imagens do álbum. www.instagram.com/vinheta_2020


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Ficha técnica 
Spaghetti Bros – Vol. 1 
Autores: Carlos Trillo e Domingo Mandrafina 
Editora: Arte de Autor 
Páginas: 196, a preto e branco 
Encadernação: Capa dura 
Lançamento: Outubro de 2020